Conversa da Noite – 8/7/89 – Sábado . 15 de 15

Conversa de Sábado à Noite — 8/7/89 — Sábado

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Graças da Sala do Reino de Maria; Dureza de alma, e saudade da bagatela * Pressas humanas e lentidões de Deus; Correr atrás dos perfumes do Reino de Maria!; Obediência cega: a “beatitudo incomprehensibilitatis”; O requinte de amor quando Nosso Senhor dorme é não acordá-Lo, e até dormir junto com ele * A vocação do Senhor Doutor Plinio: que existe Fé na terra * Como o SDP acompanhou o processo revolucionário ao longo dos anos * Elementos sobrenaturáis e preternaturáis da ”psy-war” * Dominio do SDP sobre a própria sensibilidade

* Graças que a Providência destina para as reuniões na Sala do Reino de Maria

não tenhamos ilusão, mas essa sala está produzindo esse efeito, em parte por razão de uma graça. Não é só a sala. A parte ornamental da sala existe, mas não é só isso.

É que a graça que a Providência destinava a dar para aquela sala, para os que comparecessem àquela sala, esta graça a Providência liberou para agir hoje à tarde. De maneira tal que se sentia um tanto a graça dos antigos tempos.

(Dr. EM: A sala parece que tinha saudades disso.)

É, é isso. Era um modo, a meu ver, da Providência dizer que ela tinha saudades de nos ver lá.

* Os “reproches” da Providência para os que se cansam das graças

Mas não deixava de entrar nisso um pequeno reproche. Porque quando nós resolvemos mudar para Jasna Gora, me pareceu que houve uma certa ligeireza nessa mudança, que representava o que eu sentia, que todos sentiam dentro da sala: é que a sala estava gasta. E quando uma coisa que é canal de graça nos parece gasto, os gastos somos nós!

E é um dos pontos difíceis para nós, penosos e duros, é como nós nos desgastamos com a graça. Quer dizer, dentro de pouco tempo a graça deixa de ser nova para nós, e deixando de ser nova nós queremos outra coisa. É, aliás, a constante da vida do Grupo.

E, naturalmente, nessas condições eu tenho receio de tomar uma deliberação muito drástica, dizer: “Não, as reuniões vão ser agora, daqui por diante, na Sede do Reino de Maria”. Acho mais prudente a gente deliberar fazer uma reunião por mês na Sede do Reino de Maria. Depois, conforme for, vai se tornando mais frequente, etc.

É um pouco cacofônico, hem? São duas salas tão diferentes — Sede do Reino de Maria e Jasna Gora — que é um pouco cacofônico. E o ambiente da Sede do Reino de Maria é outríssimo! Mas quantas e quantas vezes, passando por lá, eu sentia que era uma sala morta na vida do Grupo. Tão morta, que eu não sei se vocês chegaram a tomar nota, que a freqüência da sala durante o dia cessou! Antigamente era quase que uma extensão da capela. Cessou! E a sala estava morta.

* Desgaste nosso que faz “sofrer” a Providência: a nossa dureza de alma, e a saudade da bagatela

(Sr. PHC: Parece que se rezava mais na sala do que na capela. Na Rua Pará eu tenho certeza…)

Não, e no começo da Rua Maranhão era também. Mas havia esses desgastes. Foi se desgastando, desgastando, e deu nisso. Depois, por várias razões, o MNF também não pôde realizar-se lá. Então, mais uma vez desgaste. E esse desgaste, eu creio que é uma coisa — aqui entre nós, na intimidade — uma coisa que por assim dizer faz sofrer a Providência. Porque é uma dureza de alma muito grande nossa. Porque em geral, o que produz o desgaste é a saudade da bagatela.

* Um exemplo: Armantiair, convidado a ser príncipe, com saudades dos cocheiros

Eu estou me estendendo um pouco demais, mas eu conto um caso. Saint Simon conta que havia no tempo de Luiz XIV, no primeiro período do reinado dele, um Príncipe de… não é Armantiair, mas é um nome mais ou menos assim. Esse homem era descendente, em linha reta, do rei X da França. E era, portanto, um homem da Casa Real, muito remotamente. Porque é um rei que tinha governado não sei há quanto tempo.

Bem, vieram se casando ao longo dos séculos, com famílias, com casas adequadas, etc., mas muito apagados na França. Eles moravam no interior, eram ricos, mas ninguém os procurava, eles não procuravam ninguém — viviam de lado.

E que o Mazzarino — uma raposa! — achou que se ele reerguesse essa Casa, ele poderia tirar disso algum proveito para a política dele. Era gente tão nobre, que o Luiz XIV, que não visitava ninguém, de vez em quando ia visitar esse Príncipe. E quando o Luiz XIV entrava no parque do Príncipe, ele dava a direita ao Príncipe. É uma distinção que não dava para ninguém da Casa Real nem nada. Era uma coisa do outro mundo!

Bom, e só tinha um descendente, que era rapaz. Então o Mazarino convidou — mas o convite era uma imposição — que o rapaz fosse serví-lo como ajudante de ordens, uma coisa assim, numa viagem que ele fez para o sul da França.

E o rapaz foi. E ia dentro da carruagem do Mazzarino, sentado no mesmo banco com o Mazzarino. Mas que quando ele estava com o Mazzarino, ele dormitava. Que era só parar o carro para as trocas de cavalo, tudo o mais, o rapaz se lançava de dentro do carro para ir conversar com os cocheiros, que paravam também e formavam roda, porque era uma série de carruagens. E o Mazzarino mandava chamar. O rapaz atendia, e daqui a pouco voltava para os cocheiros…

E durante todo o tempo isso se deu assim. O Mazzarino chegou, mandou restituir o rapaz em casa. E a família se extinguiu…

Acho que eu não preciso acrescentar nada, não é?

* Renunciamos aos principados que Nossa nos destina no Céu e nesta terra

O que é que levava esse rapaz a conversar com os cocheiros? É uma coisa que nos leva a nós a baixarmos o nível, e querermos banalidade, querermos ninharia, querermos coisinha, renunciando aos principados que Nossa Senhora nos destina — não só no céu, mas na terra, na ordem da Providência.

E por causa disso eu tenho medo de me engajar muito resolutamente numa coisa muito elevada. Se eu estiver sendo injusto, eu dou a mão à palmatória.

(Sr. GL: Cabe a nós rezar e acertarmos o passo.)

Porque o negócio é esse, não é outro. Daí a proposta cacofônica de ir uma vez por mês à Sala do Reino de Maria. E se houver uma certa persistência, então continuar. Do contrário, discretamente, não irmos além do nível onde as pessoas querem ir.

Eu vejo algumas caras meio consternadas, mas… o que eu posso fazer? A coisa é essa.

* Objeções que podem levantar contra a Bagarre, como ela se apresenta: ela aparece como um peso…!

Bem, isso era um ponto que eu ia tratar. Eu ia tratar de um outro ponto, muito de passagem também, mas são coisas assim que se comentam melhor, mais adequadamente, mais para o bem de Nossa Senhora, numa roda pequena do que numa roda grande. Por isso é que eu estou aqui para falar.

É o seguinte. No que diz respeito à Bagarre, de que eu falei hoje à tarde, há um ponto que se pode levantar, que é a questão seguinte.

Está bem, mas essa Bagarre assim, com o processo da guerra revolucionária, supõe uma precipitação muito pequena de acontecimentos. Realmente é a Bagarre, mas supõe que, afinal de contas, isso possa durar muito. E possa durar muito essa vida civil, essa vida terra-terra, com suas banalidades, e com o peso que ela traz — com, também, a não realização de nossas esperanças.

E isto é para nós de um peso muito grande. De maneira que eu não dei uma boa notícia. Eu dei uma notícia que, no que nos diz respeito, causa certa perplexidade.

Tanto mais que o Sr. está com 80 anos — poderia me dizer alguém —, o seu tempo de vida qual é? Se não for o seu tempo de vida, qual é o seu tempo de validez? E, portanto, o que o Sr. carrega consigo nos acompanha durante quanto tempo? E como será sem isso?”

(Sr. GL: Uma pergunta não alheia a uma boa dose de infestação.)

Não. E era uma pessoa infestada que me fez a pergunta. Eu tratei com afeto, com o carinho que eu podia, etc., mas a pobre pessoa estava infestada. Mas eu acho que assim, num ambinte onde há bom espírito, onde se pode conversar á vontade, etc., se pode tratar dessa questão com o cuidado necessário, porque é uma questão espinhosa, mas se pode tratar da questão.

* Pressas humanas e lentidões de Deus: os judeus no deserto

Quando a gente vê a atitude de Deus com o povo judaico que migrava pelo deserto, aquela coisa toda, a gente vê que havia uma espécie de diálogo: os judeus tinham uma pressa excessiva, mas compreensiva por vários lados, de chegarem à terra eleita; e Deus permitia obstáculos, que eram consideráveis, para que eles chegassem até a terra eleita.

E no fundo havia neles um problema assim: “Será que minha leistung, minha endurance, tem um pavio tão comprido quanto Deus quer que demore a provação? Eu aguento isto?” É a pergunta.

* A promessa de ver a instauração do Reino de Maria

Conosco, com a circunstância de que eu falava semana passada, ou atrasada — numa semana dessas em que eu tratei com vocês disso aqui —, há uma promessa da Providência dentro dos nossos corações, pela qual nós esperamos assistir, juntos, e em tempo hábil, a instauração do Reino de Maria na terra. Eu tratei disso…

(Sr. GL: Foi no MNF.)

Foi no MNF? Bom, talvez até com certo pormenor eu tenha tratado, porque no MNF eu trato as coisas com muito pormenor. E eu mostrei que não se deveria dizer o seguinte: “Isso é um cálculo egoísta, você quer assistir o Reino de Maria, mas é um desejo seu, Deus pode dispor de você de outra maneira, tátátá…” Mas há uma qualquer coisa da graça que faz que, quando nós esperamos assistir a implantação do Reino de Maria, todas as virtudes nossas encontram campo propício para medrar. E quando nós não temos isso, as virtudes encontram um campo muito menos propício, muito mais árido.

O que habitualmente é um sinal de que a graça sanciona a nossa aspiração, ou é até autora da nossa inspiração. E que nós devemos, portanto, esperar isto.

* “Tensões” entre Deus e o povo judaico

Ora, esse curso da Bagarre assim, dados os vagares que têm vindo até aqui, dão receio que iguais vagares levem até não sei onde.

E a isto, a atitudes assim do povo hebraico, Deus respondia sempre assim: Ele fazia milagres, e lembrava milagres anteriores. Como quem diz: “Eu posso tudo! E eu que pude fazer por ti tal coisa, tal coisa, tal milagre, tal milagre, e que te mostrei nesses milagres o meu afeto, Eu saberei dosar, fazer uma dose entre o comprimento do seu pavio e o tempo que eu vou pôr, que é uma dose de equilíbrio que Eu conheço!”

Bem, mas onde havia uma espécie — se se pudesse dizer assim — de tensão entre o povo judaico e Deus. E nessa tensão, várias vezes o povo judaico explodiu contra Deus. Deus castigava, e o trajeto se tornava mais longo. Exemplo característico foi quando eles fizeram adorar aquele ídolo, aquela coisa toda. Evidente que eles pediram ao ídolo para apressar a chegada à terra prometida. E Deus fê-los girarem pelo deserto muito tempo. Foi um castigo dessas coisas.

(Dr. EM: Mas eles tinham uma data fixa. Eles sabiam que iam girar durante 40 anos, e depois chegariam à terra prometida.)

Mas eles tinham uma qualquer coisa por onde eles julgavam de cada vez, de cada provação, que eles não entrariam na terra prometida.

(Dr. EM: Eles se revoltavam com freqüência.)

Talvez por achar que 40 anos era muito, talvez por achar que Deus estivesse rompendo o pacto. Porque Deus várias vezes os deixava em situação em que parecia que o pacto estava roto.

Por exemplo, chegar diante do Mar Vermelho, acossados pelo exército do Faraó, eles deviam ter medo de que era o fim. E Moisés abriu o caminho, e eles atravessaram. E assim, outros episódios.

* Deus criou a tensão para fazé-los dignos da Terra Prometida

Agora, acontece o seguinte. Que assim Deus criou, Deus fazia uma espécie de tensão entre eles e Deus. E eles deviam aguentar essa tensão —sustinere. Porque era uma prova de fidelidade que Deus queria deles, para eles serem dignos dessa odisséia extraordinária que eles estavam fazendo. E eles não queriam aguentar.

* Aplicação à espera da Reino de Maria

Bom, eu acho que a Providência faz uma coisa muito parecida conosco. Não nos marcou os 40 anos, mas fez-nos andar não sei quanto tempo, através de que vales e montes, etc., em circunstâncias em que cada vez, durante essa longa demora, iam sucedendo acontecimentos que levavam a tornar mais tênue a muralha que nos separava do Reino de Maria, ou menos grossa a muralha que nos separava do Reino de Maria. Mas estávamos separados: nós não víamos o Reino de Maria.

* Nossa Senhora nos dará o que a graça prometeu

Bem, e agora, com o dito hoje à tarde, foi visto que a muralha ainda estámais tênue. Mas, pelo jogo normal das coisas, poderia durar. Mas nós devemos ter confiança de que Nossa Senhora não nos pedirá alguma coisa além do tamanho do nosso pavio. E que nessa espera há uma proporção entre a nossa tensão e o que nós podemos aguentar. E que Ela dará nesse momento.

E é a confiança nesta proporção que me mantém, por exemplo, animado aqui. Porque do contrário… romperia! Quer dizer, é o krach! Seria o meu krach. Mas, exatamente, eu confio que Nossa Senhora tome em conta, na sua misericórdia, essa tensão. E que apesar dos meus defeitos, etc., Ela me leve para o outro lado da ponte.

* “Correrei atrás de teus perfumes”, ó Reino de Maria!

E acho que é uma posição que todos nós devemos tomar. Nós temos tantas e tantas coisas feitas, que foram graças especiais do nosso passado, que atestam uma predileção especial e pessoal de Nossa Senhora por cada um de nós. Essas graças trazem-nos o perfume do Reino de Maria, que está distante ou não, mas que nos indicam que, andando atrás desse perfume, nós percorremos o nosso trajeto. Segundo uma expressão do Cântico dos Cânticos: “Correrei atrás dos teus perfumes”.

Assim também são os perfumes da Providência. Por exemplo, fazemos reunião aqui á noite, fazemos reunião na Sede do Reino de Maria… Há às vezes uns perfumes, uma coisa em que a gente vê algo de extraordinário, que gosta, que se alegra, que fica encantado. Mas que são promessas: “Meu Filho, confie! Essa é a rota dos perfumes!”

Depois, coisas que sucedem, que são realmente extraordinárias, não se poderia duvidar de que são coisas extraordinárias, não é?

* Deus suaviza a demora

E depois, de qualquer maneira, para suavizar a nossa demora, ou para torná-la menos árida, acontece ainda que, se Deus não nos dá o humanamente impossível que nós queremos, que é a proclamação do Reino de Maria — não nos dá já —, Ele nos dá pequenos humanamente impossíveis. Pequenas coisas humanamente impossíveis, Ele nos dá, que fazem sentir que Ele nos deu coisas que pareciam um desafio ao bom senso. E, entretanto, ali estão. Eu, daqui a pouco, vou indicar uma.

* Indo atrás dos perfumes, depois das lutas, teremos o Reino de Maria

Ali estão, e que nos fazem entender que esses perfumes, mais os pequenos impossíveis onde nós caminhamos, constituem uma longa rota coberta disso. E que nós devemos acreditar que no fim, numa hora do equilíbrio da tensão, em que Ele diga: “Basta!”, vem o Reino de Maria com o seu esplendor! Na ponta não sei de que lutas — mas as lutas não é o que nós tememos — na ponta de não sei de que lutas, que problemas, vem afinal isso. E isso deve nos sustentar a nós.

Quando nós somos fiéis nessa posição, tudo floresce em nós. Quando nós não somos fiéis, as coisas não florescem, fenecem. Então, há alguma coisa aqui que indica a voz de Deus, pedindo a crença no improvável. E essa crença Ele exatamente pede mais aguda, àqueles a quem vai dar mais.

Eu termino com isso, com o que eu vou dizer agora…

(Sr. GL: Não, está muito bom…)

Não, não. Eu acho que nessa reunião se deve tratar do tema que vocês tenham preparado, e não do tema que eu trago…

[Protestos, etc.]

* Como Deus provou aos Apóstolos, com a revelção dos mistério da Eucaristia

Bom, é o seguinte. Eu não sei se vocês pensaram, quando Nosso Senhor falou da Missa para aquele pessoal que estava lá, o grau de confiança que Ele pediu? Eu não digo dos Apóstolos não. É dos que apostataram. Porque Ele falou, mas não falou com muita clareza. Se Ele falasse com muita clareza, ainda seria mais difícil, talvez. Talvez Ele tenhna falado, por misericórdia, sem muita clareza. Mas falar de comerem a carne d’Ele, e beberem o sangue d’Ele! O que é que aquela gente estava entendendo disso? É uma coisa do outro mundo!

(Sr. PHC: Pegar o pão e dizer “este é o meu corpo”… É uma coisa que metafisicamente falando…)

É um disparate! “Tomai e bebei: este é o meu sangue”… Bem, mas primeiro, para os que apostataram, não foi nem sequer isso. Foi: “Quem não comer minha carne, e não beber o meu sangue, este não terá parte comigo”, ou não terá a vida eterna, eu não me lembro bem. Edwaldo que é fiel nas…

(Dr. EM: É isso mesmo.)

Não terá parte comigo. Agora, comer a carne?! Mas vão matá-lo, assá-lo? E se não fizermos isso?! Isso é um convite ao assassinato!

Depois, eles deviam sentir o que São Pedro sentiu, quando Nosso Senhor perguntou depois aos Apóstolos: “E vós? Não vos ides também?” A resposta de São Pedro: “Para onde iremos, Ssenhor, se só Vós tendes palavra de vida eterna?”

Bom, os outros também deviam sentir: “Este aqui tem palavra de vida eterna. E agora eu vou comê-lo?! Eu vou destruir o homem que tem palavra de vida eterna?” É uma coisa do outro mundo!

(Sr. PHC: Rompe com todas as axiologias.)

Uma coisa… Não?

* Nosso Senhor pediu uma obediência cega: a “beatitudo incomprehensibilitatis”

Mais ainda. O homem supremamente santo, supremamente sábio, de uma coerência no que diz e no que fala incomparável, convida-nos a uma coisa que parece o crime! Porque se temos que comer a carne, e beber o sangue, temos que matá-lo. Ou não é isso? Ele vai morrer, e nós vamos ter que comê-lo?

Ele, na força da idade, podem imaginar a impressão de saúde que Nosso Senhor dava de durar não sei quanto tempo? Ele, na força da idade, Ele estar nos dizendo isto?

Entretanto, Ele sabia o que Ele estava dizendo. Quer dizer, Ele tinha feito para aquele pessoal maravilhas, e queria que acreditassem no incompreensível. A tal beatitudo incomprehensibilitatis de que fala o Cornélio.

Ele queria que acreditassem naquilo que Ele estava dizendo, cegamente! Vencendo essas objeções tão razoáveis. Isso é o que Ele queria.

* Nosso Senhor Jesus Cristo fez um pré-juizo, e aos que tiveram a coragem de crer no inverossímel, confirmou em graça com Pentecostes

Bem, a tal ponto, que aos outros discípulos Ele voltou-se — os que não foram embora — e disse: “Vós também não vos ides?” Quer dizer, em determinado momento Ele encerrou as contas com aquela gente, e disse: “Quero ver quem dá saldo!” É uma espécie de juízo, hem?!

Bem, mas aqueles que tiveram a coragem de crer no inverossímel, a esses Ele deu depois — através dos precipícios que vieram! —, no fundo, a perseverança e a confirmação em graça com Pentecostes.

Eu acho isso aí de toda beleza, de toute beauté. Mas é um tema muito bom para meditação nossa, a propósito deste ponto, do qual eu não fujo. Seria roubar-lhes uma ocasião muito boa de fidelidade, [não] considerar isso de frente.

* Pedir a Nossa Senhora a força para aguentar esa provação, pedir que Nosso Senhor levante na barca, e mande parar a tempestade

Alguém dirá: “Dr. Plinio, isso que o Sr. está dizendo é bonito. E até é lógico. Mas o que o Sr. quer, eu não tenho força para enfrentar isso!”

Eu digo: “Meu filho, aí é outra coisa. Vamos rezar. Rezemos juntos. Por meio de Nossa Senhora nós obtemos tudo. Vamos com calma rezar, não vamos, sobretudo, nos agitar nem angustiar. Ela que nos abra os olhos para nós podermos ver isso, para nós seguirmos isso. Mas não desanimemos, nem nos agitemos.”

Nesse sentido, Nosso Senhor dorme na barca da alma de cada um de nós. E Santa Teresinha tem um comentário surpreendente a respeito de Nosso Senhor dormindo. Eu acho muito bonito eles acordarem Nosso Senhor: “Domine, salva nos! Perimos” — Senhor, salvai-nos! que estamos perecendo!” Nosso Senhor levanta e manda… E parece que Nosso Senhor quando manda aplacar a tempestade, a gente tem impressão de que é uma coisa… A gente pode imaginar a beleza da cena, não é? E a gente tem impressão que Nosso Senhor gostou do pedido.

* O requinte de amor quando Nosso Senhor dorme é não acordá-Lo, e até dormir junto com ele

O comentário que um deles fez depois — não sei, talvez Edwaldo se lembre, talvez tenha sido São Pedro — é o seguinte: “Verdadeiramente os ventos e os mares obedecem a Ele!”

O comentário de Santa Teresinha foi outro. Ela disse: “O Divino Mestre está dormindo na barca, e está cansado. O requinte do amor seria não acordá-Lo. Mas confiar que com Ele na barca, Ele não nos deixaria perecer, ainda que Ele estivesse dormindo”. É um bonito comentário.

(Sr. GL: O Sr. uma vez me disse: “Eu iria mais longe do que Santa Teresinha: eu me poria a dormir junto com Ele”.)

É. Mas é verdade. A confiança conosco chega até esse ponto.

* Uma recompensa demasiadamente grande

Agora, vocês já pensaram no galardão que está na ponta dessa confiança? É uma recompensa, a seu modo, excessivamente grande. Aquela promessa que Ele fez, não é?: “Serei Eu mesmo vossa recompensa demasadiamente grande”. O Reino de Maria será para nós a recompensa demasiadamente grande. E todos nós que constituímos este último batalhão que luta contra ventos e marés, contra o mundo inteiro que vem, contra tudo, em última análise contra a aparência do socorro de Deus — está bem, esse batalhão terá um papel decisivo para a vinda do Reino de Maria. E terá com isso uma glória extraordinária! Que os homens esta terra reconhecerão e aclamarão!

Esta é a minha resposta diante da situação que fica criada. Porque a situação está criada. Eu não nego!

* A demora de asitir a uma demolição da Igreja e da sociedade civil, que leva tempo, com a certeza da vocação pela qual Nossa Senhora tirou-nos de dentro da multidão

Não sei se querem me perguntar a esse respeito alguma coisa, querem dizer alguma coisa. Eu estou às ordens.

(Sr. NF: E a situação é uma possível demora da destruição da ordem civil. É isso?)

É isso. Destruição da ordem civil, e uma como que destruição da Igreja. Bem, mas pela lentidão que tem o processo da guerra psicológica. Essa lentidão parece deitar diante de si etapas muito maiores do que a gente quereria. Daí o problema que eu pus. Quer dizer, isso se arranjará. Caminhemos na nossa rota, na confiança, primeiro, na palavra de Nossa Senhora, segundo a doutrina católica.

Mas, em segundo lugar, com a idéia de que nós temos sobre nós, pairando, uma vocação especialíssima, uma vocação a seu modo única, para a qual deve corresponder uma providência única. Porque a vocação é um chamado de dentro da multidão, para fazer alguma coisa. Não é uma coisa assim…

E, portanto, para essa tarefa única há uma graça, um apoio único. E para essa tarefa e para esse apoio únicos, nós devemos confiar — contra ventos e marés — que a gente chegará. E é o que eu tinha me esquecido que disse ao Gonzalo, o Gonzalo está lembrando agora: é deitar-se ao lado de Nosso Senhor, e dormir. Ou deitar-se aos pés de Nosso Senhor, e dormir.

Quer dizer, o quê? Ter calma dentro dessa situação, que realmente é uma situação que causa, humanamente, perplexidade. E que só se desperplexiza à vista da confiança.

* A Providência parece criar uma tensão e uma espera maior do que a graça prometia, mas é preciso saber esperar para “ter parte comigo…”

(Sr. GL: E nós temos que olhar para o Sr., porque do contrário a barca afunda mesmo.)

De maneira que… nesse ponto eu não insisto, mas daí vem exatamente isso. Um problema, uma tensão: os fatos parecem demorar mais do que aquilo que é uma promessa interior da graça em nós, que nós veremos o Reino de Maria. E não veremos apenas enquanto uns velhos mulambos, que estão num catre, e abençoam a aurora que nasce — já seria lindo! Depois de ter lutado por esse reino, já seria lindo —, mas é de atuar no Reino de Maria!

Então, como será? Eu não sei. Mas eu tenho razão para esse ato de confiança. Esse ato de confiança é um rationabile obsequium. Deus, Nosso Senhor Jesus Cristo, fez assim com os seus Apóstolos. Nossa situaçãoé única em nossa época, mas não é inédita. Exemplo: “Se não comerdes da minha carne, e não beberdes do meu sangue, não terás parte comigo”, etc. Quer dizer, a exposição lógica é essa.

Agora, por outro lado, temos uma porção de fatos — eu ia contar um, daqui a pouco conto — que indicam um como que milagre frequente, para intervir nas nossas coisas, e salvar as nossas situações, e tocar para frente. E nos manter, apesar de nossas misérias! Talvez esse seja o maior milagre, o mais tocante, o mais comovedor. Porque o conjunto da obra já realizada é superior a nós! É superior a nós.

Agora, há o quê? Entra aqui, então, a teoria da tensão entre Deus e nós, que Ele vai levando até certo ponto, em que Ele intervém. E nós devemos esperar isso: em determinado momento chegar um ponto em que Ele intervém, Nossa Senhora intervém. E tocarmos com confiança, porque as coisas se resolvem.

* Um exemplo: Ao fazer a Sala do Reino de Maria, poucos pensavam poder encher… 

O fato que eu ia mencionar hoje, não é um fato novo, mas me chamou muito a atenção. Vocês conhecem o fato. Quando ós organizamos a Sala do Reino de Maria, achávamos que a TFP cabia lá na Sala do Reino de Maria. Fizemos com tanta candura, e pusemos ali. Hoje… uma coisa que não pára de encher, o que chega de gente, etc. E assim mesmo, daqui a pouco, a Sede do Reino de Maria pode não chegar mais.

Bem, mas isto é não tomando em consideração o pessoal que não vai à reunião. E não tomando em consideração que muitos dos que ainda estão para vir nessas férias não chegaram, não estão aqui. Isto é assim.

E aí a gente vê que, quando fizemos a sala do Reino de Maria, considerávamos essa enchente um inverossímel para o qual não valia a pena fazer planos. E esse inverossímel está realizado. Mas realizado com sobra!

Bom, isso é exatamente o que nos leva a ter confiança, amparo, etc., é também isto: a série de fatos extraordinários que enchem a rota de nossa história. E que são, a seu modo, milagrinhos. E às vezes não tão pequenos!

Aqui estaria uma teoria, um ponto de referência para esse problema.

(Sr. Poli: Uma vez o Sr. disse, a respeito dessa provação dos Apóstolos: “Se um homem qualquer me dissesse: ‘Eu vou te dar o meu corpo para comer, e o meu sangue para beber’, eu diria: esse homem é um louco. Aquele Homem me dizendo: ‘Eu vou te dar o meu corpo para comer, e meu sangue para beber’, eu me ajoelharia diante d’Ele, e diria: Esse é o meu Deus!”)

É mesmo. É mesmo. Quer dizer, há uma graça… Por exemplo, aqui nesse momento da reunião, eu tenho impressão que há uma certa graça. Agora, essa graça não quer dizer nada? Ela não é nada?

Aí vem a teoria dos perfumes. Quantos perfumes de graças… não é? Como o mundo longe dessa graça é diferente. Na nossa Índia, hem, meu Aloísio? Onde nós estamos por esperança, e mais nada! Bom, isto é… Diga meu Nelson.

* A crise da Igreja, prefigura do Fim do Mundo: “Haverá Fé na Terra?”

(Sr. NF: O Sr. disse sobre uma aparente destruição da Igreja…) [Vira a fita]

comum, dos que tratam do negócio, suponho que seja o consenso comum dos teólogos, que os homens que viverem no fim do mundo serão em número muito pequeno, os fiéis. E que a Igreja estará reduzida a um número muito pequeno, a ponto de se dissolver. Nosso Senhor até perguntou: “Quando o Filho do Homem vier — a segunda vinda — encontrará a Fé na terra?” O que isso significa, em última análise? Porque Ele sabia se encontraria ou não.

Quer dizer um número tão pequeno, que justificaria que os homens se perguntassem: “Haverá Fé na terra?” E aí viria Deus com sua pompa e majestade, julgar, etc.

Agora, como os acontecimentos que nós vemos aqui são uma coisa precursora do fim do mundo, uma espécie de mise-en-scène do fim do mundo, acontece que também agora se deve estabelecer que não é absurdo que a Igreja esteja reduzida a tão poucos. Mas a questão é que muitos têm essa provação: “Ainda existe a Fé na terra?” Porque é uma coisa que… (…)

* A vocação do Senhor Doutor Plinio: que existe Fé na terra, e por isso não seja o Fim do Mundo

levantar num Continente do terceiro mundo uma bandeira para ser agitada diante dos homens, e que de um modo ou de outro todos os homens vão conhecendo. E que mostra que a Fé integral, Católica, Apostólica, Romana, existe na terra! E isto é a nossa vocação! (…)

* Exemplo impressinante com o sr. Emeterio, numa igreja da Bolivia

(Sr. GL: O Sr. Emetério estava na Bolívia, e entrou com uma postolando numa Igreja de uma paróquia lá. E havia algumas pessoas, etc., e um padre ali junto. E o padre disse: “Vamos fazer uma cerimônia aqui, agora. Vamos todos nos dar as mãos”. E o Sr. Emetério ficou sem jeito de sair, e pegou na mão do membro do Grupo que estava com ele. E aí fizeram uma roda, e começaram a invocar o Espírito Santo, etc… O Sr. Emetério apavorado, como o Sr. imagina. Aí então sai uma mulher do meio da roda, e começa a falar em várias línguas, a dizer coisas, etc., possessa mesmo. E o Sr. Emetério então invocou o espírito do Sr., para que o Sr. se fizesse presente e atrapalhasse aquele negócio. Ele começou a fazer jaculatórias, etc. E imediatamente a mulher ficou paralisada, e não conseguiu dizer mais uma palavra. O padre então dispersou o negócio, tranquilizou a coisa, etc. E quando iam saindo, o Sr. EF e o outro, a tal mulher veio ao encontro dele, com ar assim tranquilo, e disse: “Senhor, permita que lhe diga uma coisa?” - Sim, claro. “O Sr. não se dá conta de que foi o Sr. que atrapalhou tudo o que estava acontecendo comigo?”)

Que coisa curiosa!! Que coisa impressionante!! Uma coisa impressionante!

(Sr. GL: Ele ficou impressionadíssimo! Porque não só o demônio ficou quieto, mas sabia perfeitamente que era ele a causa.)

Que coisa impressionante! Mas, meu filho, por que é que você não escreve ao Emetério, pedindo um relatório escrito disso? Ou passa um grafonema. Eu acho que vale a pena. Porque vale a pena ler isso em plenário. Mas vale a pena! Eu fico impressionado.

Bem, é dos fatozinhos que… Mas esse é mais do que um fatozinho. Se ele pudesse mandar uma fotografia da mulher… encontrar a mulher por lá, e fotografar. Por que não?

Bom, mas vamos para o tema da noite!

* Como o Senhor Doutor Plinio acompanhou o processo revolucionário ao longo dos anos, em função das metamorfoses, até chegar à crise da Igreja

(Sr. NF: A impressão que eu tenho é do Sr. sempre indagando, sempre perguntando, sempre com os olhos postos nos acontecimentos.)

Continuamente. E à espera dessa hora, hem? A principal pergunta é: “Chegou a hora?”

(Sr. NF: Mas o que é que a Providência “sussurra” para o Sr., sobre o fim dos fins? O que o Sr. sente a respeito das disposições da Providência sobre esse fim?)

Por incrível que seja, essa pergunta, assim, eu a punha no tempo em que parecia… enfim, jogando com as probabilidades, não se podia ver, não se podia prever uma outra forma de desfecho, do que uma espécie de Armagedon, um combate imponente, terrível, etc., em que os destinos de toda a humanidade se realizassem.

Nesse tempo eu conhecia a Revolução e a Contra-Revolução, e o caráter processivo da Revolução e da Contra-Revolução. E era o que entrava de cheio nesse cálculo. Mas, depois, entrou aquilo que eu respondi, creio que foi ao Rodrigo, quando eu falei de algo que entrou e que complicou o curso das coisas, porque o mundo deixou de acompanhar com tanta credulidade o que a Revolução ia dizendo.

(Sr. GL: A falta de persuasão.)

Falta de persuasão, a insuficiência da força de persuasão, em face de algo que se ergueu, e que tornou difícil a Revolução de ir para frente. De onde ela ter que recorrer ao consenso, e recorrer ao abobamento, à extinção do lumen rationis, e todo o processo que se lhe seguiu. E foi durante isso que eu conheci a guerra psicológica revolucionária.

E então eu percebi que a guerra tinha metamorfoseado, e não tinha cessado, à vista dessa situação. E que daí veio o resto dos acontecimentos.

Mas quando isto era uma coisa ponderável — batalha de um contra outro — eu perscrutava muito os acontecimentos. Mas que deixei de perscrutar quando entrou na linha dos imponderáveis.

A perscrutação nasceu de novo quando eu comecei a ver a Igreja cair aos pedaços. É a pergunta que você me punha há pouco. Mas até onde, e até quando? E aí eu vejo essa demolição se dar, dar-se gradualmente, dar-se cruelmente, e lentamente, como se deu a Paixão d’Ele. E eu não sei qual é o momento em que Ele bradará “Consummatum est”, e a terra inteira se sacudirá.

De maneira que eu fico muito na perplexidade. Essa é a resposta franca.

Bom, e qual era a pergunta!

* Elementos sobrenaturáis e preternaturáis da ”psy-war”

(Sr. NF: Seria possível o Sr. nos dar a percepção do divino que o Sr. teve na guerra que sempre conduziu, e nas batalhas que travou, e que vem travando.)

A resposta é sem graça… É uma pergunta tão bonita, a resposta é sem graça. O que eu posso fazer?

Antes de tudo, eu queria dizer o seguinte. Eu tenho omitido de dizer, por lapso de memória, uma coisa e outra, mas precisa notar o seguinte. A guerra psicológica revolucionária, considerada enquanto um sistema de luta entre as almas, a propósito da Revolução e Contra-Revolução, ela entra dentro do sobrenatural e do preternatural. E não fica apenas no que os tratadistas do assunto fazem.

Eles descrevem um fenômeno, mas eles não tomam em consideração que, no caso concreto, esse fenômeno é todo embebido de sobre e de preternatural. O que dá à guerra uma beleza, e um lado augusto, muito maior do que normalmente se poderia imaginar.

Seria mais ou menos como uma guerra de cruzados, em que se poudesse ver, ao mesmo tempo, a luta dos anjos e dos demônios, enquanto os cruzados lutam na terra. E a batalha — eu vou dizer agora uma coisa um pouco figurada — mas a batalha do anjo de Godofredo de Bouillon, contra a batalha do demônio de um Mohamed não sei o quê, que estivesse lutando do outro lado. As coisas não são tão simétricas assim como eu estou pondo. É exemplificandi gratia. Podem ser às vezes ser tão simétricas assim.

* Um campo que o Senhor Doutor Plinio deixou de analizar por humildade, para não ver a grandeza da própria missão

Mas acontece que, eu, que vejo tanto essa fímbria e uma porção de coisas, eu confesso — também é sem graça, mas o que eu posso fazer? — que eu teria que olhar essa luta, e olhar-me a mim mesmo na luta. E que eu teria receio de me entregar a uma pesquisa desse ponto, e que a humildade que me é necessária me faltasse. Porque eu acho arriscado para um homem ele imaginar o futuro da grande ação que ele vai desenvolver, sem que ele deixe queimar as asas pelo incêndio do amor-próprio.

O homem que ganha a vitória, no momento em que ele ganha a vitória, ele sente em si, como nós sentimos inseparavelmente, a própria miséria humana. Mas quando ele olha a sua vitória na projeção da História, e na glorificação dos outros, ele não sente a miséria humana… E ele facilmente começa a tomar o vício de se ver como centro dos acontecimentos. E o D. Chautard está ali com a sua austeridade e sua autoridade, me prevenindo que fuja disso como uma peste, porque então a Contra-Revolução com as minhas mãos não vencerá!

E, por causa disso, eu não me permito de olhar para o quadro para o qual a muito justo título você olha.

(Sr. Poli: Está uma resposta fabulosa.)

Mas muito sem graça!

* Um exemplo da grandeza da luta exprimido na foto com roupa de “torero”

Eu posso até precisar uma coisa. No meu tempo de mocinho, de menino — eu não sei bem em que época — começava a me nascer reflexões dessas. Porque eu já percebia alguma coisa, eu já tratei disso, do que seria o futuro, etc., me começava a vir à alma.

Mas, antes mesmo de D. Chautard, eu percebi que nessa reflexão — eu não tinha a doutrina que D. Chautard tem — mas eu percebia que nessa reflexão entrava qualquer coisa que deslocava o centro da cruz de Nosso Senhor, para mim. Então parei de pensar.

E, por exemplo, exprime bem o meu estado de espírito a esse respeito, uma fotografia que o Átila tem na sala dele, de mim menminote, mocinho, que Mamãe fantasiou para uma festa de um hotelzinho, festa de carnaval de um hotelzinho lá em Prata, de pseudo-espanhol. Não tem nada de espanhol. Ela me fantasiou de espanhol, e eu estava pensando na legenda da Espanha: heroísmo, cruzada, etc. E pensava o seguinte: “Eu com essa roupa — é uma candura de rapaz, porque é uma roupeta realmente improvisada, não se pode imaginar uma coisa mais pobre — eu com essa roupa vivo um pouco da luta que eu devo viver!” E me encantava de viver isto, usando aquela roupa.

Eu não percebo no meu olhar ali, nada que represente uma concessão, e nem sequer ainda uma tentação da falta de humildade. Mas se compreende por onde podia chegar. Então, trancar! E por isso… o panorama está trancado! O que eu posso fazer?

(Sr. Poli: O Sr. trancou um panorama, mas abriu outro maior.)

Isso é o que eu falei, que todo mundo sente a miséria humana em si. Equivale a dizer que eu sinto.

(Sr. Poli: Mas a retidão, a seriedade, a humildade, o desejo de derrotar a Revolução, isso não pode sem pensar em si, porque a Contra-Revolução não vence desse jeito…)

Não pode, não pode. Não nos termos em que o Nelson pôs a pergunta: coletivamente nós, etc. Ainda vai. Mas no termo “eu”, eu preciso tomar cuidado.

* Como o Senhor Doutor Plinio sente a promessa de vitória de Nossa Senhora durante as mais árduas batalhas: Em Defesa

(Sr. NF: Mas, por exemplo, nós, cooperadores, quando estamos em campanha: campanha difícil, árdua, calor tremendo, comida ruim, etc. No fim do dia, quando vamos fazer o balanço do dia, a gente percebe que foi visitado por Nossa Senhora várias vezes durante aquele dia. E que nós estávamos no frufru do manto d’Ela, quando pensávamos que estávamos debaixo do calor e com fome. Então, o Sr., por exemplo, batalha do “Em Defesa”, tem que ter sentido essa proteção de Nossa Senhora…)

Incontáveis vezes,

(Sr. NF: Pois essa é a pergunta…)

Mas nunca pensei no seguinte. Por exemplo, o Em Defesa da Ação Católica. Eu calculei inteiramente o lance, tudo, etc., até já descrevi isso várias vezes. Mas nunca procurei sentir a beleza do lance, em termos legitimamente quase artísticos, com o receio de exatamente minha atenção se voltar sobre mim. Porque indiscutivelmente quem estava escrevendo o livro era eu… E depois eu sabia bem que a vítima do kamikaze era eu. Então, não podia fazer.

Eu compreendo que numa outra alma isso não produza esse efeito, e até estimule. Portanto, eu não deesaconselho essa reflexão a todos. Mas é prerigosa. Ela é perigosa.

* A idéia de “held”, heroi, na infancia

Eu me lembro mais que, em menor ainda, eu nem tinha idéia da “Revolução e da Contra-Revolução”, que me apareceram depois. Mas eu tinha idéia, sentia pano para manga em mim, para coisas muito grandes, e tinha aspiração dessas coisas grandes. E a fraulein Mathilde, no modo de tocar as coisas, e de falar, e literatura alemã que ela punha na minha mão, etc. [aparecia] un held: um herói!

A palavra se reveste de um lumen, e de uma tônica, de uma coisa, que me encanta! E que a idéia de que — eu não sabia bem porquê — eu seria um dia un held na força do termo… É incrível o seguinte: fez-me muito bem! E essa essa esperança me ajudou a tirar da moleza… (…)

que era em mim supina! Então foi a esperança disso, a beleza, o fascínio disso, o desdém que eu sentia da minha própria moleza, que me ajudou. E eu tenho certeza que era uma coisa da graça. Mas, em determinado momento, eu vi que era preciso, tanto quanto possível, ser held, mas sem pensar demais na batalha.

* Dominio do Senhor Doutor Plinio sobre a própria sensibilidade, até nas coisas legítimas e que dizem respeito à luta RCR

(Sr. GL: Agora, por exemplo, uma epopéia como a do grupo da Colômbia, que vive ali em estado de alerta contínuo, o Sr. não olha para isso, ou olha?)

Uma coisa que é difícil dizer… (…)

não deixar entusiasmar nunca pelo espetáculo de uma campanha, desse entusiasmo sensível, que vem aos borbotões. Porque eu não posso deixar de amar torrencialmente isso. Mas porque eu via que isto… cuidado! Quando eu reconhecer que o perigo existe, será tarde demais. Eu tenho que desviar esse perigo, antes de reconhecer que ele está próximo.

(Sr. GL: Mas, por exemplo, quando o Sr. Cícero contou ao Sr. que cravou o estandarte nas Filipinas, o Sr. reagiu de modo diferente?

Vocês estão fazendo perguntas legítimas, muito internas. Se eu estou falando de mim, é porque vocês estão perguntando. É preciso notar bem isso. Sempre que eu falo de mim é porque estão perguntando. Não é pelo gosto de falar de mim.

Aqui talvez seja uma construção psicológica própria. Mas a coisa comigo passa-se de tal maneira que, quando uma coisa poderia produzir em mim um élan desses, há uma coisa qualquer por onde eu posso fechar, como eu fecharia esse aquecedor. E acompanhar inteiramente tranquilo, com a cabeça vendo bem o que você está dizendo, porque o indivíduo precisa ser não sei o quê, para não ver o que você está dizendo — é isto!

Mas imobilizando, sem enregelar, pondo para dormir com normalidade, a minha própria sensibilidade. De maneira que a razão e a fé ficam vendo que a sensibilidade não faz uso da palavra. E assim você me deve ter visto cem vezes! Também diante das piores situações, hem?

* Dever dos membros do Grupo de se entusiasmar com os lances da luta RCR

(Sr. GL: Mas para nós é um dever nos entusiasmarmos por essas coisas. Agora, o Sr., sendo o autor da coisa, eu não sei…)

É, mas aí que está a diferença. Para vocês deve ser assim! Para mim deve ser o contrário. Para vocês deve ser assim. (…)

(Sr. NF: A superioridade de Nossa Senhora sobre os anjos, não vem do caráter de militança d’Ela, que é de pasmar? E como o Sr. é o militante por antonomásia, a pergunta é como encontrar no longo passado de lutas do Sr., no poder que o Sr. teve de encurralar a Revolução, e na terra enquanto homem destruir a Revolução, como encontrar uma semelhança com a predileção de Nossa Senhora — do “ipsa conteret” — manifestada a uma criatura, a uma Mulher, a uma Mãe….)

É. Podemos deixar a pergunta para tratar na próxima vez… (…)

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