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SN — 09/07/88 — Sábado
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CONVERSA DA NOITE - 9.7.88, Sábado
(GD: Frase de São Paulo: “Não sou eu quem vivo, mas é Jesus Cristo que vive em mim”. Se o Sr. poderia comentar essa frase, do ponto de vista da nossa vocação, união com o Fundador, etc.)
Bem, eu nunca lí um exegeta que comentasse esse texto. Eu vou dar a impressão que o texto, bem conhecido, me causa a mim. Mas naturalmente seria bom ver depois num exegeta, no Cornélio, qualquer coisa, como é que o texto de fato deve se interpretar.
Mas eu consider o seguinte. Que Nosso Senhor tem a respeito de cada um de nós um desígnio. E que para usar uma expressão correta do ponto de vista do português, mas que está muito usada hoje — pode se usar, é muito boa — o desígnio de Nosso Senhor a nosso respeito, a respeito de cada um, é enormemente abrangente.
Quer dizer, se a gente toma assim por alto… eu vou mostrar como a consideração superficial disso como chega a uma aparente banalidade. Então: “Não sou eu que vivo mas é Nosso Senhor que vive em mim”, é que eu devo realizar os desígnios de Nosso Senhor. Então eu devo abandonar meu próprio egoísmo, e devo fazer a vontade d’Ele. E nisso está a vida d’Ele em mim. Tudo isso é correto, mas é uma consideração muito limitada, muito superficial da realidade que está nessa vida d’Ele em mim. E aí a gente chega ao fundo do assunto a meu ver.
É que o desígnio d’Ele, para cada um de nós, não é apenas que nós tenhamos, por ex., que um homem vá ser religioso; que um homem chegue a uma alta posição num govêrno, e faça um decreto estabelecendo a união da Igreja com o Estado, em termos muito convenientes para a Igreja; e que outro faça isso, que outro faça aquilo…funde uma escola, uma Universidade Católica — isso faz parte dos desígnios de Deus sobre um homem. Mas nunca, absolutamente nunca, os desígnios de Deus sobre um homem se cifram naquilo que se poderia chamar a vida da obra dele, ou a obra da vida dele.
Mas Deus tem o desígnio de que nós tenhamos a alma de uma certa forma, que sejamos inteiramente configurados em nossa alma, de maneira a realizar um certo tipo de santidade, pela qual nós, sendo cada um o que é, imite a Ele dentro desta linha, dentro desta via que procede das peculiaridades de cada um, imite a Ele perfeitamente. E seja por assim dizer uma outra edição d’Ele. Isso é o que Ele quer.
Quer dizer, a personalidade d’Ele — Ele forma uma só Pessoa entre a natureza Divina e Humana, a união hipostática tem essa força — e que essa personalidade naturalmente é imensamente rica. E os homens que Ele criou, todos, desde Adão até os ultimos que vão existir, constituem uma série das quais cada um deve imitar a personalidade d’Ele num ponto, e ser como se ele não tivesse sido senão aquilo. E assim todos os homens repetem de algum modo, num grau maior ou menor, repetem NSJC, à maneira de uma coleção. De maneira que, visto o conjunto, dê uma super imagem d’Ele, que apresente no céu uma noção global d’Ele. De maneira que Ele olhando a humanidade toda que está glorificada no céu — não falo, portanto, dos precitos — olhando para essa humanidade, Ele se veja representado. E nessa representação encontre sua glória.
Isso é um pensamento que tem seu fundamento no fato de Nosso Senhor ao longo dos 6 dias ter feito a criação, no 7º dia Ele descansou. E viu a criação, viu que cada coisa era boa, mas o conjunto era melhor. Assim tb., é claro que a Nosso Senhor Jesus Cristo, enquanto Homem-Deus, vai ser dada essa glória de que todos os homens no céu, no seu conjunto, representarão a Ele, como a criação representa a Deus. Representarão a Ele. Mas que cada um que está no céu O representa bem, mas o conjunto representa melhor, e dá uma noção global d’Ele que nenhum homem deu.
Excepção feita de Nossa Senhora, mas “quand-même”, porque Nossa Senhora faz parte, é a parte mais esplêndida, mais gloriosa — de longe!! — entre as meras criaturas, do que representa a Ele. De maneira que sem Nossa Senhora tudo isso não valia nada. Mas com Nossa Senhora vale inimaginavelmente.
Então, Ele quer que eu toque toda a minha vida — mas a minha vida abrange meus olhares, meus pensamentos, abrange…vamos dizer, por ex., isso, essa bagatela: Estou falando com voces, estou esse dedo nessa posição. Isto indica temperamentalmente uma certa disposição de espírito ao distinguir uma idéia da outra, uma coisa da outra, eu fiz isso. Nunca em minha vida prestei atenão que fiz isso, mas de fato eu fiz. Isso no fundo exprime algo de minha mentalidade. Ele quer que seja como é a mentalidade d’Ele, vista nesse ângulo minúsculo que se chama “a individualidade de Plinio Corrêa de Oliveira”. Alí está ele, está toda uma criação d’Ele.
Mas isso é com GL, com Cel. CAHP, e este, aquele, aquele outro…E todos aqueles que andam por aí pela rua, e por tudo o mais… inclusive os que estão se perdendo!
Agora, para que nós sejamos capazes disso, Ele vê que nós somos vitalmente incapazes. Quer dizer, pela nossa mera natureza humana, em consequência do Pecado Original, etc., nós somos incapazes. E nós recebemos para isso, d’Ele, uma vida que é a vida da graça. A graça é um dom criado por Ele, mas que não é um dom por ex. à maneira de um chocolate, ou de um objeto material. Mas é um dom, quer dizer, é uma critura viva. É uma participação criada na vida incriada d’Ele. Eu recebo essa participação, e passo a viver com uma categoria por onde eu participo da vida do próprio Deus, e que me torna capaz de realizar o plano d’Ele a meu respeito — o qual plano abrange tudo,tudo, tudo dentro de mim.
Então, vamos dizer, eu poderia agora querer um copo d’água. E poderia beber água. É inteiramente indiferente que eu beba ou não beba água, moralmente. Mas se eu beber esta água agora de modo oportuno, temperante, eu agirei de acordo com Ele. Se eu beber essa água de um modo inoportuno, intemperante, por uma razão que não tem fundamento, o beber água é neutro, mas a ocasião que eu escolhí para beber água é uma ocasião que envolve razão moral.
E mais ainda. No beber a água, se eu beber “plum,plumplumplum…”, a coisa é uma; se eu beber com temperança a coisa será outra. Tudo, no modo de fazer as coisas neutras, envolve perfeição espiritual. E é para fazer a vontade d’Ele em tudo, e ser a cópia d’Ele em tudo, mas aquela cópia que só GL, ou CAHP podem fazer para ser GL e CAHP, para ser isso só eu e mais ninguém. Se eu ratear, ninguém mais fará!.. Se eu fizer bem feito, estará bem feito por toda a eternidade. Mas feito uma coisa que ninguém podia ter feito: era ser eu!
Agora, isso envolve a minha vida inteira. Em dois sentidos: que me toma inteiro, de um lado; e de outro lado, que é por uma vida vinda d’Ele que eu sou capaz disso.
Eu não sei se eu me exprimí claro nisso? A doutrina é uma doutrina lindíssima. De maneira que, tomando por ex., uma roda (estamos aqui…7 católicos, graças a Deus), nessa roda nós estamos conversando isso. Isso pode ser a causa de uma harmonia entre nós. Essa harmonia entre nós o que é? É um reflexo da harmonia que há entre as várias perfeições de Nosso Senhor Jesus Cristo. É o reflexo das harmonias interiores d’Ele, que as tinha naturalmente maravilhosas, insondáveis, superiores a todo louvor, etc., etc.
Bom, então, é realmente, se eu considero minha vida assim, e me entrego a isso, eu posso dizer que já não sou eu que vivo. Nesse sentido que eu não faço os meus planos, que eu não faço isso, não faço aquilo, aquilo outro, senão que faço os planos d’Ele, etc., etc. É Ele que vive.
Mas de um modo singular, porque eu não sou um boneco nas mãos d’Ele. Não sou como esses bonecos de João Minhoca, marionettes. Não sou uma marionette nas mãs dele. A marionette faz como o homem manda. Eu não. Eu quero, eu entendo, quero e sinto por iniciativa minha, proveniente da graça d’Ele, como Ele queria que eu fizesse. Quer dizer, é um penetrar fundo…mais fundo não se pode penetrar.
Mas aí tb. a gente compreende os segrêdos da misericórdia d’Ele. Porque voce vai ver, voce compreende bem o amor que Ele tem a cada um de nós. Para nós chegarmos de tal modo, a tal ponto nós chegarmos a ser unidos com Ele; quer dizer, ao sermos criados Ele teve o plano de que tal perfeição d’Ele, que nunca ninguém teria conhecido — ao menos entre os homens e excepção feita, naturalmente, de Nossa Senhora — que brilhasse em nós, é como se Ele tirasse de dentro de Sí mesmo um raio de luz, e fizesse sair e dar para aquele!.. E é um dos como que infinitos modos de ser d’Ele. Cria, aquilo está feito para isso.
Então a gente compreende como Ele nos ama. Quer dizer, fazendo-nos isso, não poderia deixar de nos amar infinitamente, porque Ele é infinito.
(GD: O amor que Ele tem a nós é um reflexo do amor que Ele tem a sí próprio.)
É um reflexo do amor que Ele tem a sí próprio. E aí a gente compreende por que é que Ele morreu por nós, para nós termos a graça e podermos realizar o plano. E se as pessoas meditassem sobre a Crucifixão nessa perspectiva — sobre toda a Paixão, não é? — tudo aquilo Ele fez, mas pensando em cada um de nós. E com a intenção de que, por ex., em concreto voces estivessem aqui essa noite e que tratássemos desse tema.
Bem, então, voces estão vendo bem que eu estou dando dados correntes da Doutrina Católica. Eu estou apenas coligando dados correntes da Doutrina Católica. Mas acontece que esses dados conduzem a um plano suntuoso, fabuloso. E de um gênero de união como não se pode imaginar que exista. Nem d’Ele conosco, nem de nós entre nós. Porque como duas quantidades ligadas a uma terceira estão ligadas entre sí, a gente vê a ligação, o nexo que há entre todos os filhos da Luz o que é. Uma coisa seríssima, e gravíssima, dulcíssima, infinitíssima, por assim dizer.
(Dr.EM: A esse título cada homem é insubstituível.)
É insubstituível. E voce olha para qualquer songamonga da rua, isto é verdade, porque se ele corresponder inteiramente à graça…um bandido de estrada — São Pedro Armengol — correspondeu inteiramente à graça, e dele nasceram sóis que ninguém imaginaria. Era um salteador no mato.
Quer dizer, em cada homem há tesouros desses escondidos.
Eu concluiria, antes de voces dizerem qualquer coisa, eu concluiria o seguinte. Que há uma coisa mais bonita ainda, que é isso. Que de fato nós constituímos assim um todo chamado Humanidade. Que Ele honrou unindo a natureza humana hipostáticamente a Ele, a esse grau. Mas essa humanidade que forma assim um universo, é apenas uma unidade do universo. Porque nós fazemos parte da criação. E na criação existem os anjos, de uma natureza superior à nossa; e se bem que a união hipostática não se tenha dado neles, eles, por sua natureza são muitos superiores a nós, são puros espíritos, etc. E que eles, os anjos, deveriam eles realizar um universo assim tb. Mas que eles não realizaram porque os demonios apostataram.
E que os planos se superpõem, de maneira que essa sociedade dos homens, tomados os que se salvarem e entrem para o céu, eles preenchem o lugar dos anjos. E nós ao mesmo tempo formamos com os anjos um todo, e formamos um todo à parte. É de uma grandeza desconcertante. Mas isso, mais o céu empíreo, mais a criação que vai continuar — sol, lua, tudo isso vai continuar — forma então o todo dos todos, no pináculo do qual está Nossa Senhora! Como mera criatura, é Ela. E acima d’Ela, Ele.
A gente compreende aí a Encarnação, o “verbum caro factum est, et habitavit in nobis”, etc…tudo isso forma aí, por sua vez, belezas que se voce for pensar, for pensar, for pensar, dão coisas extraordinárias. Feitas para a meditação da alma de cada um de nós. Nós há pouco vimos esses dito francês e nos regalamos de tal maneira. Está bem, mas muito mais é de regalar, são de regalar as coisas que Deus diz, que Deus fez, etc… E no céu nós vamos ver isso eternamente.
E isto a gente põe em risco assim: por um mal olhar na rua, cair morto na hora e ir para o inferno. Quer dizer, o que nós expomos à perda a qualquer momento, é uma coisa!…Mas olhe aqui: nós somos uns doidos, somos uns cretinos, eu não sei dizer o que é que nós somos! É assim.
(GL: E a união com o Fundador, como se situa nisso?)
É um universo dentro desse universo.
(GL: Deus fez os planetas, e a eles deu satélites.)
Depois há, por ex., satélites que tem seus satélites. A Lua é um satélite em torno da Terra, que é um satélite em torno do Sol.
(GL: Sim, mas eu digo na ordem das almas. Como é o operar da união que devemos ter com o Fundador?)
O operar dessa união é assim. Nosso Senhor, certas perfeições d’Ele, está na intenção d’Ele que sejam especialmente representadas. Especialmente representadas por outras criaturas. E para que essa perfeição brilhe bem, Ele não se contenta em que um homem a represente. Ele quer uma família de homens. Então às vezes é uma nação; às vezes é uma área de civilização; às vezes é uma Ordem Religiosa, etc. São famílias de almas que são chamadas a representar de algum modo uma certa perfeição d’Ele, ou uma certa constelação de perfeições d’Ele.
Agora, de todas essas representações, a família religiosa, ou como que religiosa (porque o nosso caso é o 2º), é uma família que tem mais riqueza de representação comum dos que as outras. Porque a natureza do vínculo que ela cria é uma natureza muito mais forte e maior do que os outros vínculos. No seguinte sentido, que com os outros são vínculos, vamos dizer por ex. entre os indivíduos de uma mesma Pátria — vamos imaginar os franceses! — há aquela vinculação natural que nós percebemos, que não vale a pena perder tempo qualificando. Depois tem os laços históricos, tradições históricas, tem tudo o mais que voces sabem, forma daquilo um conjunto natural.
Naquele conjunto natural tem os elementos sobrenaturais. Então aquilo forma, uma grande nação católica pode formar um corpo místico dentro do Corpo Místico. A doutrina do Corpo Místico chega a tal ponto que, por ex., eu ví uma vez uma referência antiga da Idade Média, ao “Corpo Místico da Universidade de Paris”. A Universidade de Paris naquele tempo não era uma Universidade qualquer, como é hoje, mas era uma espécie de crisol de ortodoxia muito especial, a que a Santa Sé atendia muito, tomava muito em consideração, etc. Então, “o corpo místico da Universidade de Paris”.
E assim uma família religiosa constitui um Corpo Místico. E nesse Corpo Místico, o Fundador deve apresentar de modo mais excelente as qualidades que o Corpo todo tem que espelhar. Mas cada um que é chamado a espelhar aquela perfeição dele, espelha essa qualidade enquanto existente no Fundador, e é uma repetição do Fundador, como o conjunto dos Fundadores é uma repetição d’Ele.
Então, as relações de alma tomam toda analogia. E daí a relação (subdito)-Fundador; segundo a terminologia aprovada pelo Pe. Cabrero de Antas, Senhor e escravo, etc., etc. Isso é o fundo da coisa.
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Eu me perguntava o seguinte. Nós devemos representar a CR. Ou seja, nós devemos representar o conjunto dos católicos, nós devemos representá-los enquanto em luta contra um perigo, contra um adversário do qual não temos conhecimento de que alguém de um modo tão consciente, tão definido, tão claro, tão intencional, tão constante, numa batalha tão aferrada, se importe como nós.
E portanto nós representamos em Nosso Senhor aquilo nEle, por ex. — por exemplo, hem?, porque é por exemplo apenas — aquilo nEle que contra todas as circunstâncias adversas, e passando por cima de tudo, se manteve inteiramente igual a sí próprio, nos lances mais humilhantes e mais terríveis da Paixão.
Quem de nós não consideraria com respeito um homem que a gente vê que está injustamente perseguido, está sofrendo no seu corpo tudo quanto se pode sofrer; está sofrendo na sua alma tudo quanto se pode sofrer, e que portanto tem esgares. Ainda que esses esgares fossem ridículos, nenhum de nós teria a coragem de rir dessa manifestação do infortúnio. E se alguém risse de um homem perseguido por causa da CR, e que tem esses esgares, risse na minha presença, meu desejo era de dar-lhe pelo menos uma bofetada! Pelo menos!
Agora, há qualquer coisa em Nosso Senhor por onde, durante toda a Paixão d’Ele, desde o verter o sangue no Hôrto das Oliveiras, transpirar sangue, até o “consummatum est”, Ele conservou toda a majestade, toda a serenidade, toda a dignidade, toda a autoridade doutoral, toda a capacidade e a irradiação de Salvador, mesmo quando Ele estava humanamente perdido. De tal maneira que Ele tenha a coragem de dizer para o bom ladrão: “Tu hoje estarás comigo no Paraíso”!
Quer dizer, Ele, o derrotado, o reduzido a zero…há uma lamentação do Antigo Testamento, profética, que diz isso: “Eu sou um verme e não um homem; eu sou o opróbio dos homens e o escárnio do povo” — isso era Ele na Cruz! Ele disse com aquela majestade e com aquela tranquilidade, como quem distribui coroas indestrutíveis: “Tu hoje estarás comigo no Paraíso”! Com mais majestade do que qualquer rei, qualquer imperador jamais teve. Pregado na Cruz! E o Bom ladrão crê nisso e se salva.
Quer dizer, há uma continuidade da santidade d’Ele, da grandeza d’Ele, da harmonia interna, do método, da ordem, nas circunstâncias mais adversas, mas mais adversas, que a gente meditando sobre a Paixão percebe confusamente, mas percebe. Tanto é que eu estou dizendo isso, voces podem dizer que é muito bonito, é lindíssimo, porque a beleza não está na minha cabeça: está nEle que teve. Mas, mas, voces devem ter a sensação de que eu estou explicitando uma coisa que voces sentiam.
(GL: E mais bonito é o que o Sr. disse, que a CR representa isso.)
Mas é! Quer dizer, por que é que é isso? Porque é os fiéis — fiés a Ele e iguais a Ele nos piores estertores da Igreja d’Ele. E isso é de uma grandeza estupenda!
(PHC: São os raios de luz, as virtudes que Ele tira de sí e dá para alguns… São limitadas as pessoas que receberam esse reflexo.)
Sabe, meu filho, o que é pior? São limitadas. Mas são muito menos limitadas do que parece. Mas a questão é que o numero dos que rejeitaram é colossal.
(PHC: O numero dos fiéis então, esses são poucos.)
Ah, esses são poucos. Bom, muitos são chamados, poucos são os escolhidos. Voce vê tudo quanto daria para nós ficarmos impressionados com a nossa própria grandeza na meditação de hoje à noite. E da grandeza do nosso vínculo. Porque nós às vezes temos impressão do seguinte. Nós, votos não temos; quando temos votos, são votos fáceis de rescindir, e assim mesmo não são os 3 votos completos, porque não inclue a Pobreza. O que é que nós somos na ordem das famílias religiosas? Como estrutura nem estamos nessa ordem. Nós estamos do lado de fora, no átrio dessa ordem, nem estamos nessa ordem.
Está bem. A tanta fragilidade estrutural se liga uma solidez, uma riqueza, e riqueza de chamado, e riqueza de missão, que é uma coisa desconcertante. E aí é que cada um de nós pode dizer: “Bendito o dia que me viu nascer; benditas as estrêlas que me viram pequenino; e bendito o momento em que minha mãe disse: nasceu um homem”! É verdade. Para sermos o que somos, é verdade.
Também, bendito o dia em que o Thau foi sentido por mim! Bendito o momento em que eu conhecí o Grupo. Bendito o dia em que eu dei meu primeiro passo nesse caminho. Bendito o momento em que me viu mocinho, transpondo esse limiar dessa porta! E bendita a continuidade que até essa noite me trouxe até aqui! Bendita Nossa Senhora, sem cuja oração nada disso teria sido possível! (Extraordinário!)
Quer dizer, é tanta grandeza, que eu uma vez ví — é uma coisa dolorosa… — um Padre, do tempo constantiniano hem?, resmungar indiretamente contra essa grandeza. Disse: “Deus a respeito de tudo acumula tais maravilhas, que a gente quase não sabe para onde se voltar, e se sente desproporcionado com isso”… Melhor não comentar, não é?
(GD: Se tivesse mais devoção a Nossa Senhora não se sentiria desproporcionado.)
Nada! Aí ele estaria inteiramente na proporção. Mas a questão é que exatamente o revolucionário fica com nós de estar a serviço de tantas maravilhas. Ele queria que o “euzinho” dele, desligado de tudo isso fosse adorado. Isso ele queria. Como é…Não é parecido com Nosso Senhor não. É no desembestamento de suas paixões, seus sentimentalismos, de suas besteiras, ele alí queria ser adorado. Mas é uma bêsta do Apocalipse.
(GL: O Sr. sempre teve noção explícita de que deveria representar e que representava isso?)
Não. Eu sempre sentí tudo isso confusamente. Foi estudando a Doutrina Católica, mas assim aos poucos, estudando a Doutrina Católica que eu vim a construir isso.
(GL: Mas o representar com essa ufania a autenticidade de NSJC na Paixão, e a inquebrantabilidade d’Ele, que o Sr. acaba de descrever agora…)
Não, com essa explicitação, é há pouco.
(GL: O que conduziu o Sr. a isso?)
Essas considerações parecem circulos concêntricos que tem depois um ponto central. Então a gente tomando posição certa num ponto desses, pode acontecer que todo o resto esteja implícito, mas que os circulos concêntricos que estejam nisso a gente và transpondo gradualmente. Quer dizer, explícitando, porque o ponto central já estava de algum modo comandando o formato da periferia mais afastada.
(GL: Então há outro ponto que é o ponto central.)
Não. A coisa toda começou em alguns pontos, que eu fui reunindo aos poucos. Primeiro a sensação que eu tinha — eu expus no MNF e voces todos tiveram, etc. — da própria inocência, da própria candura, e da graça (que eu não sabia que era a graça) que habitava em mim, que eu sentia muita graça, muita elevação, muita tendência para coisas absolutamente superiores, extraordinárias, mas não era a megalice de fazer carreira. Era uma outra coisa, uma outra ordem metafísica, celeste, das coisas, etc. — primeiro ponto.
Segundo ponto, é tudo isso tomando definição em torno do conceito da Igreja Católica Apostólica Romana, de NSJC enquanto Homem-Deus, Sagrado Coração de Jesus, e depois Nossa Senhora. Então, a Eucarístia, etc., etc.
Agora, pouco mais ou menos concomitantemente ou depois, essas coisas se misturam, tomando o conceito da batalha contra a impureza. Quer dizer, revelando-me amigos como se dava a perpetuação da espécie humana, fazendo com gargalhadas e com atitudes que me fizeram compreender o espírito da impureza, o mal da impureza visto especialmente no espírito da impureza. Então, um ódio irredutível a esse espírito, tomando em consideração que esse espírito era o contrário do que se deve ter, etc., etc.
A partir disso, a batalha. O mundo foi como eu sou, eu sou um resíduo. Eles são outra coisa. Eu não quero deixar de ser como eu sou, custe o que custar, e quero que eles sejam como eu sou. E como eles querem me forçar, eu resisto; como eu quero forçá-los, eles resistem. O resultado é uma batalha!
Bom, mas voce está vendo que no fundo vai se fazendo dia essa idéia central que eu acabo de expôr aqui. Isso é, vamos dizer, a série da coisa.
Não sei… Haveria tempo para mais uma pergunta, se quiserem me fazer, não sei se há?
(Vira a fita)
…Eu acho que a escravidão não é senão o desponsório espiritual visto em seus efeitos. Porque se NSJC é o Esposo e a Igreja é a Esposa, isso signífica que a alma fiel deve portar-se face a Ele com a receptividade, o amor, a docilidade da verdadeira Esposa em relação ao verdadeiro Esposo. Quer dizer, verdadeiro nesse sentido: reto, ordenado, etc., etc.
Mas a Igreja…cada um de nós é um grãozinho dessa Igreja. E portanto esses desponsórios místicos se realiza na alma de cada um de nós. Aliás, o que eu acabo de descrever aqui é um desponsório místico. E ao que se acrescenta uma luz nova, tomando em consideração a questão da mística ordinária de que trata o Pe. Garrigou Lagrange.
Então, se alguém resolve fazer-se escravo d’Ele para ser obediente a tudo quanto os representantes d’Ele nos mandam, isto é por causa de um desponsório místico que houve anteriormente, e que nós queremos tornar mais efetivo, exatamente por meio dessa sujeição; mais consistente, mais durável, mais efetivo, por meio dessa submissão. Mas o ponto de partida é o momento em que nós nos enlevamos por Ele, por Nossa Senhora, pela Igreja, nos enlevamos de tal maneira, que aceitamos que Ele nos governe do jeito que eu acabo de falar. É São Paulo: “já não sou eu que vivo, é Ele que vive em mim”.
Não sei se está clara a resposta?…
(Dr.MRD: Está clara, mas…)
Mas não responde a pergunta!..
(GL: Mas por onde a pessoa se une mais: pelos desponsórios místicos ou pela Sagrada Escravidão?)
O desejo, a deliberação de tornar-se escravo — no sentido das nossas publicações — esse desejo resulta de um élan, de um vôo para unir-se inteiramente. A escravidão é um meio de realizar essa escravidão. Não sei no que é que minha resposta não responde a pergunta…
(GL: O que é mais radical: uma carmelita que tem um desponsório místico com Nosso Senhor, ou uma carmelita que se faz escrava de Nosso Senhor?)
Ah, sei, eu compreendo. Minha resposta não responde essa pergunta. Eu tento dar agora. Eu acho que as duas, implícitamente fazem o seguinte: uma caminha para o ponto em que está a outra. Quem tem o desponsório místico tende para a escravidão. Quem tem a escravidão, tem um começo de desponsório místico, pelo menos.
(GL: E o que é mais radical, enquanto união?)
Enquanto união o mais radical é o desponsório místico, porque tem a alma da coisa.
(GL: Então por que São Luis Grignion prega a Escravidão a Nossa Senhora como a devoção e união mais perfeita a Ela?)
Eu creio que é muito legítimo, ele designa a coisa pelos seus aspectos mais palpáveis. Se ele tivesse que tratar dos desponsórios místicos, ele teria que fazer um Tratado para explicar o que quer dizer o desponsório místico para depois tratar da Escravidão. Então ele faz o contrário: ele introduz através do aspecto mais palpável, deixando o caminho aberto para o impalpável.
(CP: Ele diz isso no Tratado: “Esse é o 1º passo. Quem dará o 2º, etc., quem chegará ao 7º?”..)
Isso. Eu nem estava me lembrando disso. Indica bem que a Sagrada Escravidão é uma coisa que representa um despojamento muito grande, etc., mas que é um passo para outras elevações. No alto das quais tem que estar o desponsório místico.
(CP: E talvez a troca de vontades ainda mais em cima?)
Eu aí não tenho nenhuma certeza, mas eu creio que a troca de vontades é um aspecto dos desponsórios. Quer dizer, é a própria essência dos desponsórios. Feita a troca de vontades, está feito o desponsório místico.
(Dr.MRD: Está mais claro agora. Nos parecia que entre o estado atual nosso, de Escravidão a Nossa Senhora, até a troca de vontades — que é uma coisa supremamente radical — Ela colocou no nosso caminho um tapete que seria o desponsório místico. Assim nós estávamos encarando a coisa.)
Não, mas…haha, parece que é espírito de adaptação mas não é: o desponsório místico é um processo, não é um ato. Ele se consuma inteiramente no momento em que um a vontade e a outra se deram completamente. Mas é processivo. E a gente pode compreender que, portanto, a escravidão e o desponsório místico, e a troca de vontades, sejam aspectos de um mesmo processo unitivo, que vão quase se revezando ou se sucedendo, numa mesma realidade total.
(GD: Para chegar naquele ponto ideal, que é a troca de vontades…)
A troca de vontades inteira! A integridade da troca de vontades…da mentalidade, da vontade, de toda alma do indivíduo.
(Dr.MRD: Agora está bem claro!)
Haha!
Bem, meus caros, agora infelizmente eu sou obrigado a encerrar!…
“Há momentos minha Mãe”…
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