Conversa de Sábado a Noite ─ 8/4/87 ─ 4ª feira . 9 de 9

Conversa de Sábado à Noite ─ 8/4/87 ─ 4ª feira

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Os medievais tinham uma riqueza de percepção da graça que os antigos não tinham. Comparação de Notre Dame com Subiaco * Na Antiguidade Católica Deus se debruçava sobre os homens, na Idade Média Deus os elevava ao Céu, e no Reino de Maria os “introduzirá” em Seu Coração * O gótico ordena a alma e acaba com o temperamento desordenado, dando o arquétipo do repouso * O Thau proporciona um conúbio entre a inteligência e a vontade acalmando a sensibilidade e aguçando-a, dando-lhe uma certa força que ela não tem * O Grand-Retour nos dará o “quid” da Idade Média mais um super-algo * A ressonância do espírito da Santa Igreja na alma da Senhora Dona Lucilia ─ Restos da ordenação medieval na São Paulinho * As harmonias internas do Sr Dr Plinio quando criança tendiam para tudo que refletisse o “quid” medieval * O Senhor Doutor Plinio tem um conhecer amoroso das coisas e as vê no que elas tem de reflexo de uma perfeição eterna. Fundamentalmente ele é isso

(Sr. Gonzalo: [pergunta sobre a vocação do Senhor Doutor Plinio])

* Idade Média e Thau ─ O Thau foi algo a mais na linha da graça que não havia no Antigo Testamento

Antes disso, eu queria também fazer uma pequena retificação no que eu de fato disse. Quer dizer, você repetiu com fidelidade o que eu disse, mas, depois pensando sobre o que eu disse, eu achei que minha formulação não tinha correspondido bem o que é na realidade, o que era meu próprio pensamento. Eu gostaria de retificar.

É o seguinte: dizer que a Idade Média não tinha tido thau… não foi o que eu disse, mas você também não disse isso. Você diz que eu tinha dito que tinha um toco, portanto um elemento germinativo inicial, a Idade Média tinha tido. Mas, esse elemento germinativo inicial era apresentado de um modo que não tinha toda a precisão necessária.

Ela seria um meio termo histórico entre a humanidade sem thau ─ anterior a Nosso Senhor Jesus Cristo ─ etc., com exceções dos homens de Deus do Antigo Testamento, mas não fazem parte da antiguidade pagã. Bom, então, os homens sem thau da antiguidade e os homens da Idade Média ─ a Idade Média um meio termo cronológico entre esses homens e os do Reino de Maria, o Segredo de Maria ─ e, enquanto tais, eles vistos de um lado se parecem com o outro. E se nós os compararmos com os do Reino de Maria, a comparação é colossalmente favorável ao Reino de Maria. Mas, se nos compararmos aos homens anteriores à Idade Média, aos pagãos, a gentilidade antiga, com eles, a comparação é fabulosamente favorável a eles. Não é?

* O Thau nas catacumbas ─ Comparado ao mundo romano, havia algo à maneira da Thau lá

Onde a coisa é muito difícil de deslindar é se esse thau existia nos católicos dos tempos das catacumbas, comparados aos da Idade Média. Dir-se-ia que sim, porque se o thau é um predicado próprio do católico, então aqueles que eram santos, mártires, e que davam exemplo de tantas virtudes, não só na hora do martírio, mas na perseverança admirável deles dentro do mundo pagão, etc., etc., isso tudo deveria levar a que se dissesse que eles tinham thau.

* Os medievais tinham uma riqueza de percepção da graça que os antigos não tinham. Comparação de Notre Dame com Subiaco

Bem, comparado com o mundo romano havia algumas coisas neles que eram à maneira do thau, é indiscutível. Bem, mas não sei se não despontou com a Idade Média alguma riqueza de aperçu da graça, alguma coisa assim que é mais que os antigos não tinham. Isso eu não sei. E, não sei portanto, se se pode dizer sim ou não. Fico muito na dúvida. O fato é que os medievais tinham.

Bem, e que se a gente toma o que por exemplo… as descrições que o João me fez de Monte Cassino [Subiaco]. Acompanhadas de fotografias magníficas de Monte Cassino [Subiaco], muito persuasivas, muito penetrantes da alma humana. A gente compara com Notre Dame, o Mount Saint Michel, etc., etc., há qualquer coisa naquilo que por mais que sejam sublimes as coisas beneditinas, não estão ali. Não sei se concordam.

(Sr. J. Clá: Totalmente.)

* O “quid” medieval da graça brilha especialmente naqueles que hoje lutam contra os inimigos dele

Então há ali alguma coisa que espelha algo e que não é indispensável, senão talvez germinativamente ao espírito católico, mas que foi dado à Idade Média. Ora, este quid difícil de definir, este quid precisamente, parece que aos que fazem a contra-ofensiva, contra aquilo que acabou, na Idade Média, com esse quid, nesses é chamado a brilhar mais do que na própria Idade Média.

E eu tenho impressão de que isso ajuda a colocar os pingos nos is, enfim, põe tudo mais direito. E que isto é portanto um elemento que nós devemos tomar em consideração, em muita consideração, na ponderação de tudo isso.

* Na Antiguidade Católica Deus se debruçava sobre os homens, na Idade Média Deus os elevava ao Céu, e no Reino de Maria os “introduzirá” em Seu Coração

Vamos precisar então um pouco mais. Se nós tomamos Monte Cassino e outras coisas do gênero, coisas magníficas ─ não digo do ponto de vista de arte, porque Monte Cassino é bonito, mas do ponto de vista de arte, não é tão incontestável, me parece.

Estou falando de Subiaco, Monte Cassino é lapso de linguagem, Subiaco. Do ponto de vista artístico não é tão fabuloso. Tem coisas belas, etc., etc., mas não é tão fabuloso.

Bem, se nós vamos tomar o Subiaco e a Sainte Chapelle, a gente diria que o espírito católico está de tal maneira em Subiaco, está de tal maneira presente, que a gente não sabe o que dizer.

Bem, a gente chega lá, pelo que o João descreve, pelo que eu senti vendo as fotografias de Subiaco, a gente tem a impressão que toca o céu com as mãos. Está bem. Você toma monumentos veneráveis, como a igreja de São João de Latrão, ─ a igreja de São João de Latrão é muito venerável ─ bem, toma outras coisas assim, anteriores à Idade Média. Bem, imaginem o Santo Sepulcro de Nosso Senhor Jesus Cristo, outras coisas, tem tudo o mais que queiram, [não?] está ali presente uma certa comunicação de sublimidade que não se confunde com o conceito de santidade, conceito mais genérico de santidade. Isto é, dentro do conceito de santidade, tem um elemento específico dentro do conceito genérico de santidade. Há nisso um elemento específico.

Como é esse elemento específico? É algo que se diria por meio de que Deus dá aos homens a possibilidade de verem mais fundo especificamente na sublimidade d’Ele.

Vamos dizer que, na clave Subiaco, é Deus do alto do céu debruçando-se sobre os homens e tratando com eles. É tocante. Mas, no gótico é Deus estendendo a mão da terra e levando os homens ao céu.

(Sr. N. Fragelli: O senhor poderia repetir por favor?)

Pois não. Você toma as coisas da antiguidade católica, você vê neles algo como Deus debruçando-se sobre os homens, o céu que baixa à terra e inunda aos homens com sua bondade, com sua sacralidade, com sua grandeza… uma coisa muito bonita.

Mas, se você toma a Idade Média, não. É Deus que passa a mão no homem e o leva até o alto do céu. Ele pega o homem na terra e eleva. Mas, coisa curiosa, depois o homem, recebendo essa elevação, é capaz de penetrar as coisas que ele fez, com uma presença da graça maior do que a presença da graça nas coisas anteriores.

(Sr. N. Fragelli: Penetrar nas coisas que Deus faz?)

Não, que o homem faz. As obras de arte, por exemplo Mount Saint Michel.

(Sr. Paulo Henrique: E o outro passo, que é a do Reino de Maria?)

É, aqui está a questão. Eu vou dizer uma coisa que é um pouco artificial. O que eu vou dizer agora não tomem ao pé da letra, porque é conjectural e um pouco artificial. Mas eu imagino que seria como que Deus que elevou o homem até o céu, fazê-lo penetrar no próprio Coração de Maria, e no próprio coração d’Ele.

(Sr. –: Que maravilha!)

É uma coisa desse gênero. Mas isso não tomem muito ao pé da letra porque é preciso… é muito lógico, mas para isso é preciso uma certa graça acompanhar o que a gente está dizendo.



(Sr. N. Fragelli: Mas corresponde ao que a gente sente…)

É, mas há qualquer coisa que não está ainda inteiramente bem ajeitado.

(Sr. Gonzalo: Porque, o que é isso propriamente?)

* A racionalização do temperamento com a “amorização” da inteligência proporciona um equilíbrio de alma que o geração-nova não tem

É o seguinte: eu suponho, é no homem assim orientado para Deus, etc., etc., para Nossa Senhora, mas com a seguinte peculiaridade… tenho impressão: é que na operação puramente intelectual entra qualquer coisa de sobrenatural e de amoroso que não é pura inteligência. Entra uma tal ou qual operação da vontade cheia de amor, que não é pura inteligência. Não é inteligência geométrica, não é inteligência, se você quiser, nem puramente filosófica.

Bem, e assim como de algum modo a vontade é… a inteligência é penetrada de como que vontade por este dom de ser puxado até Deus, para ver dentro do céu digamos assim, do mesmo modo também a vontade é dominada pela inteligência de maneira que ele não tem os pulos, ou tem menos pulos de cabra cega que o temperamento costuma ter.

É uma espécie de racionalização do temperamento ao lado de uma espécie de amoração, ou amorização, da inteligência. Eu suponho. Mas, isso eu suponho, não tenho nenhuma certeza, estou lançando no ar, etc. Mas, vocês provavelmente vêem que há qualquer coisa nisso.

(Sr. Guerreiro: Quase um pouco a volta ao homem “adâmico”.)

É, é isso…

Bem, e que põe um equilíbrio na alma ─ não me queiram mal, vocês sabem que eu falo com vocês como pai para filhos ─ que é o contrário daquilo que não seria inteiramente equilíbrio nas gerações que vieram depois da minha…

De maneira que… que é isso meu Cel., estou falando demais?

(Cel. Poli: Não! Está fabuloso!)

Essa relação que põe a alma nesse movimento, esta relação tem qualquer coisa que transforma o homem, de ogiva quebrada que era, em ogiva onde se acertaram os dois pontos.

* O gótico ordena a alma e acaba com o temperamento desordenado, dando o arquétipo do repouso

E, então, você veja o efeito disso em nós pelo gótico. Porque sem dúvida nenhuma o gótico não podia ser concebido sem uma força de arquetipização muito grande.

O gótico, todo ele, é uma arquetipia que o homem conseguiu explicitar em obras de arte, enfim, em toda a cultura medieval. Está bem, agora, o gótico ordena, sem nós percebermos, o bas-fond das nossas almas. E tudo quanto é impulso, quanto é movimento temperamental desordenado, etc., etc., encontra dentro do gótico uma espécie de ordenação, uma espécie de sensação, in radice, que faz com que a pessoa sem necessidade de muitas lutas e de combates, se encontre de repente envolto e embebido e introduzido numa harmonia interior que ela não tinha.

Por exemplo, uma coisa que é conatural com o gótico: o órgão. Quem ouve um órgão bem tocado, um bonito órgão bem tocado, e tem alma para ouví-lo, recebe uma espécie de distensão elevante, não é um mandrix, não é um repouso, é um arqui-repouso! É um arquétipo de repouso.

Agora, o que que é esse arquétipo de repouso? É exatamente um estado de alma ─ para retomar suas palavras ─ meio paradisíaco. Mas em certo sentido mais paradisíaco celeste do que terrestre.

(…)

* O Thau proporciona um conúbio entre a inteligência e a vontade acalmando a sensibilidade e aguçando-a, dando-lhe uma certa força que ela não tem

E aí cabe exatamente bem a idéia de tudo quanto foi o gótico. Agora, o que que a Contra-Revolução acrescenta a isso?

Você sabe que se São Tomás me aparecesse, eu não me poria apenas de joelhos, mas eu mandava cavar um buraco no chão para eu entrar no buraco e de dentro do buraco venerá-lo. Tal ele é e tal a admiração que eu tenho por ele, etc., etc., que eu não me sentiria à vontade a não ser de dentro de um buraco.

Bem, e não é dizer que ele ficasse no alto duma montanha e eu embaixo… não, é num buraco. Ali em presença dele estaria meu lugar.

Bem, sem embargo disso, tudo de tonéis de doutrina que tem sido dado no MNF, etc.,etc., tem campos dos quais eu creio que ele não cogitou.

(Sr. N. Fragelli: É certo!)

Se ele tivesse cogitado teria tratado com aquele talento, com aquela santidade que ele tinha. Talento incomparável, santidade admirável, ─ a Igreja não gosta que se compare uma santidade com outra ─ então não quero dizer santidade incomparável, mas digo santidade admirável. Mas, talento incomparável!

Bem, e teria dito coisas muito maiores, muito melhores, mas o fato é que essas coisas ditas são um campo onde exatamente esse conúbio de alma se exprime em mil terrenos, em mil direções, de todos os modos. Entre a inteligência e a vontade, acalmando a sensibilidade e aguçando-a, dando-lhe uma certa força que ela não tem. Não é tornando-a mais sensível, é tornando-a mais penetrante. Isto é o que eu diria.

(Sr. Paulo Henrique: Porque a densidade de thau, historicamente, de São Tomás era muito menor do que a época de hoje, para o Reino de Maria, nesse sentido que o senhor falou dos thaus. São Tomás de Aquino foi medieval. O que existe de agora em diante é uma outra proporção, uma outra densidade.)

* O Grand-Retour nos dará o “quid” da Idade Média mais um super-algo

Uma coisa muito curiosa é o seguinte: a Companhia de Jesus de seus grandes dias foi um termo médio entre a Idade Média e o que viria depois. Aqueles ardores de Santo Inácio, e São Francisco Xavier, aquela superpotências daqueles… São Roberto Bellarmino, e aqueles feitos todos da Companhia de Jesus tinham qualquer coisa que era a Idade Média mais algo. É uma coisa positiva.

Bem, eu tenho a esperança de que com o Grand-Retour, nós sejamos a Idade Média mais algo, mais algo. E que esse longo arrastar-nos por onde nós temos arrastado, venha a ser uma prova para nós de que temos que atribuir tudo isso à graça e não a nossas capacidades.

Quer dizer, Ele deu porque Ele quis dar. Porque Ele teve pena, quis dar, deu.

(Sr. J. Clá: Pena, ou amor?)

Não. Pena é o amor que se tem para com o miserável…

(Sr. Gonzalo: Ele tem amor para com o senhor e pena para com nós!)

* “Para os meus filhos minha forma de rezar é ter paciência”

Ah, não, não, não, não! Não… pena de mim!… Aliás, vocês não acreditam quão é o interminável petitório para que Ele tenha pena de mim… é isso mesmo…

(Sr. Gonzalo: Isso nunca.)

(Sr. Guerreiro: O senhor acrescentar então um pedido, Ela tenha também muita pena de nós, se não…)

Não, eu peço mesmo. Eu peço mesmo!

(Sr. Guerreiro: Seria um petitório dois…)

Ah, tem… é verdade. Mas vou te dizer do meu petitório, que para mim eu rezo… não levem a mal, mas para os meus filhos minha forma de rezar é ter paciência, ouviu… que é uma oração.

(Sr. J. Clá: Que bonito!)

(Sr. N. Fragelli: Extraordinário!)

(Sr. Gonzalo: Nossa Senhora!)

(Sr. J. Clá: E que oração!)

(Sr. Gonzalo: Meu Deus do céu!)

(Cel. Poli: Como é mais fácil rezar, não é?)

É mais fácil rezar… a risada do Fernando diz bem isso…

* O gótico produz uma união da inteligência com a vontade ordenando a sensibilidade

(Sr. N. Fragelli: Queria perguntar… duas coisas: no gótico o senhor vê essa união de vontade com a inteligência?)

Vejo, ─ com a sensibilidade…. da inteligência com a vontade com um efeito ordenativo para a sensibilidade. E isto tudo fruto duma elevação.

(Sr. N. Fragelli: Agora, a soldadura disto no Reino de Maria deve ser mais firme…)

Ah, eu acho que mais rico, tudo, é uma outra era nesta linha.

(Sr. N. Fragelli: Agora, outra coisa… não sei bem o rumo que o senhor ia dar agora…)

Eu estou também assim, indo à la bonne venture, porque eu não, não… eu sei que é como o João gosta. Eu não tinha projeto de falar sobre isso. Eu tinha me esquecido qual era a matéria de sábado.

(Sr. N. Fragelli: Mas, quando o senhor falava do gótico e o senhor dizia que é como que o penetrar no Coração de Maria, Coração de Jesus…)

(Sr. Gonzalo: Isso é do Reino de Maria, não do gótico.)

(Sr. N. Fragelli: Ah, eu pensava…)

Não, não, Reino de Maria.

(Sr. N. Fragelli: Isto que o senhor disse se sente muito tendo em vista a Sede do Reino de Maria, portanto… no coração do senhor. Aquela penumbra… aquela ordenação enorme que existe ali, todos os tropéis de alma são silenciados… então a pergunta é: em relação ao thau, em relação à vocação, o passo que deve ser dado já se observa muito.)

Enquanto eu falo…

(…)

* A ressonância do espírito da Santa Igreja na alma da Senhora Dona Lucilia ─ Restos da ordenação medieval na São Paulinho

e sai. No tempo primevo, primevo, primevo, eu quero lembrar-me. Então, eu me lembro por exemplo de todo o ambiente…, naturalmente tendo como matriz mamãe. E a Igreja Católica. Para uma criança de quatro, cinco anos, essas coisas se interpenetram. Ela um modelo de católica, a Igreja Católica é aquilo segundo o que ela se modela, e portanto mais admirável do que ela, etc.

Bem, uma criança não sabe dizer isto, mas sabe sentir. Não tem em desordem esses conceitos, se é uma criança ordenada. Bom, mas então, agora, voltando ao caso, dá-se o seguinte: é que eu me lembrava que eu sentia uma… assim… em tudo o que me rodeava, até no ambiente externo de minha casa, até nas outras casas, quando eu ia a pé com a fraulein ao Jardim da Luz, passava por casas muito bonitas com jardins muito bonitos, etc., etc., nas outras casas também.

E alguns aspectos da São Paulinho, certos pôres de sol da São Paulinho, certas coisas dessas, eu sentia que daquilo partia um… daquilo se irradiava um fulgor por onde aquelas coisas eram aos meus olhos… comparadas com o que eram aos meus olhos, com o que era aos dos outros, eu percebia que aos meus olhos eles eram como seda, e aos olhos dos outros eram como pano.

E aos olhos dos que eram pecadores eram como estopa. E na seda eu falo por causa daquilo que a seda tem de luminoso. Toda seda tem qualquer coisa de luminoso e de um brilho próprio. Eu não digo no sentido emoliente da seda, é outra coisa.

* As harmonias internas do Sr Dr Plinio quando criança tendiam para tudo que refletisse o “quid” medieval

Então eu me lembro por exemplo, ─ já falei disso várias vezes ─ o papel de parede do meu quarto. No meu tempo de pequeno todas as casas eram todas empapeladas. Então também tinha papel de parede no meu quarto. E eu dormia, fazia sesta lá. Eu ficava com as venezianas abertas, quer dizer o vidro aberto e as venezianas fechadas.

E, naturalmente eu via mais luz entrar, eu via os desenhos do papel de parede, eu via a minha roupa de cama, eu via os objetos etc., etc., e nada disso era de grande luxo, mas para meu olhar era faustoso, magnífico, brilhante, etc., sem me dar um pingo de megalice. Nem entrava em questão. Megalice no caso nem entrava em questão. Mas era uma coisa que não tem palavras, soberbo, estupendo, etc., etc., era assim.

Bem, e isso sendo assim, eu notava que meu ser inteiro tendia para isso, mas que as harmonias internas do meu ser eram também assim, e que eu estava, eu mesmo, internamente cheio desta luminosidade, que não me… * [Vira a fita] * … natural, de uma espontaneidade tão sadia.

Eu me sentia tão voltado para toda espécie de virtudes com isso. E para toda espécie de ordenação, que também não se podia passar pela cabeça… não passou pela cabeça que tivesse alguma coisa de mau. Achava o próprio caminho das coisas, mais ou menos como se fosse um de vocês aí saísse desse quarto, ─ infelizmente confinado por minha causa ─ chegasse a esse terraçozinho e respirasse um ar bom, vocês não vão se perguntar se o ar bom é porque tem oxigênio… respiram o ar bom, está acabado.

Esse Cláudio que esteve aqui, ele chega e respira esse ar bom, ele nem sabe de oxigênio nem de gás carbônico, nem nada disso. Assim, eu era perante essas coisas.

* O Senhor Doutor Plinio tem um conhecer amoroso das coisas e as vê no que elas tem de reflexo de uma perfeição eterna. Fundamentalmente ele é isso

Aqui está a mola mestra da coisa, porque era um conhecer amoroso, mas era um amor cognoscente. Bem, e era algo que me apresentava, por algo que eu sou levado a supor hoje, ─ notem a força da palavra “supor”, as limitações da palavra “supor” ─ que era ação da graça, eu era levado a ver as coisas todas numa linha de perfeição quiçá superior às próprias naturezas delas.

Quer dizer, duma linha de perfeição que é em toda linha da natureza delas, não chocava, todo o contrário, levava essa linha da natureza ao máximo, mas depois alguma coisa a mais que naquilo não é senão um reflexo de uma perfeição eterna, absoluta, etc.

Aqui está o élan fundamental da arquetipização, a desorientação histórica, mas o élan fundamental da arquetipização. E tenho certeza que eu descrevendo tudo isso, vê um ou outro, um traço disso em mim.

(Sr. Gonzalo: Inteiramente, inteiramente!)

Bem, e vocês que diziam tanto que queriam me conhecer… esse é o modo de me conhecer, é isso. Eu sou isso. Fundamentalmente sou isso.

* O senso da Ordem do Universo no Senhor Doutor Plinio: mexer nos Grandes de Espanha é mexer com ele

Bom, então, o resultado: é que por exemplo eu sei que D. Bertrand está me esperando. Para mim pesa muito na balança que sendo ele quem é, nós estejamos fazendo ele esperar pela razão mais justa do mundo…

(Sr. J. Clá: É de comover o que aconteceu o outro dia aqui na área, ontem de manhã. O senhor estava ouvindo aquela história toda da Espanha, ihh! uma caceteação monumental, entende, porque isto e aquilo, e lei de não sei quanto… e o senhor estava dizendo isto, não adianta fazer nada. Mas quando o senhor soube que o projeto de lei de Reforma Agrária do partido socialista visava acabar com as propriedades, as terras dos Grandes de Espanha, o senhor se tomou de indignação…)

Ah, foi!

(Sr. J. Clá: E a partir daí o senhor liquidou com o assunto.)

Ah, foi, foi. Fiquei indignado realmente…

(Sr. J. Clá: Foi extraordinário. Aí, depois disso foi, foi uma coisa… realmente extraordinária.)

Não, porque basta mexer em Grandes da Espanha, que eu que não sou Grande e não sou de Espanha, me sinto ferido num ponto fundamental meu.

(Sr. Paulo Henrique: As arquetipias do senhor são feridas…)

Feriu minhas arquetipias, exatamente…

(Sr. Gonzalo: O senhor falava no caso de D. Bertrand.)

Bem, porque está me levando a pensar em encerrar…

(…)

depois eu penso, numa outra ordem de afetos, em que meu querido coronel tem que levantar às sete horas da manhã…

(Cel. Poli: Não, não…)

Você pode dissentir quanto quiser, amanhã vai estar todo nervoso, etc., o que que adianta…

(Cel. Poli: Não… amanhã vou…)

Não, não, não… e por isso… meu caros…

(Sr. –: Extraordinário!!)

Agradeçamos a Nossa Senhora.

(Sr. J. Clá: A coisa curiosa, teve bênção de começo ao fim.)

(Sr. N. Fragelli: E depois continuamos…)

É, vocês me lembrem sábado.

(Sr. Guerreiro: Uma coisa muito bonita foi a noção nova de ordem, para a qual o senhor apontou, e vai muito nessa linha.)

Vai. Você lembra de sábado à noite, que nós tratamos.

(Sr. Gonzalo: Tem muita coisa!)

Tem muita coisa sim, e se Deus quiser, sábado estamos lá! Vamos rezar então três Ave Marias a Nossa Senhora para agradecer.

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