Conversa
de Sábado à Noite – 13/7/1985 – p.
Conversa de Sábado à Noite — 13/7/1985 — Sábado [VF 30] (Augusto César / Flavio Lorente)
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(Sr. Gonzalo Larraín Bustamante: Graça que caracteriza a família do senhor, etc., e que os familiares tenham intuído algo disso, de uma certa vocação para uma liderança natural. Por exemplo, o Tio Toni, de que o senhor nos falou outro dia, tinha algo disso.)
Tinha. Era talvez o que menos tinha na família, mas tinha.
(Sr. Gonzalo Larraín: Dª. Gabriela, etc. O senhor podia tratar um pouco disso, como a Providência se coloca nisso, etc.)
É preciso tomar em consideração, primeiro, o seguinte.
Que há na História, um modo da Providência encaminhar os acontecimentos, através das famílias. Com os individualismos do século passado etc., isto se perdeu de vista. Mas, a gente lendo a História Sagrada, nota muito como Deus orienta a História do mundo através das famílias prediletas, em razão de uma pessoa predileta, que nasceu na família ou que Ele espera que nasça na família, e que tudo vai orientado para isto.
E também as nações. Por exemplo, tomar a Pérsia. A Pérsia é uma nação pagã. Mas é fora de dúvida que Ciro é uma pessoa amada por Deus, e que [foi] incumbido por Deus, [de] determinadas obras no mundo do tempo dele. E que quando ele irrompe na História, ele irrompe como vencedor, e as coisas se [colocar?] [colocam] diante dele. Era um homem amado por Deus. E era dentro do paganismo Mas, que [a] gente vendo os antecedentes [do?] [de] Ciro, o pai, avô de Ciro, etc., percebe que Ciro estava sendo modelado pelos antepassados.
O Alexandre, o pai dele, Filipe, era um homem bem menor do que ele, mas já tinha o Alexandre em gérmen. Isso são grandes casos históricos, que eu dou porque é mais cômodo argumentar com eles. Porque esses são os que a gente conhece. Mas, a experiência mostra que há também famílias menores, muito menores, às vezes incomparavelmente menores, mas com que a Providência toca uma região, toca um país, etc., e que a meu ver provém isto, em parte pelo menos — deve ter outras razões mais profundas —, mas de caráter hereditário de certas predileções. Deus amou alguém que correspondeu à graça. E porque aquele correspondeu, Deus dá tal, tal coisa para aquele alguém.
Até que a família, globalmente considerada, não cumpra a sua missão. Então decaí e ela some da História. Às vezes são períodos muitos rápidos; às vezes são períodos maiores. As famílias podem viver séculos, podem viver mil anos como os Bourbons. Mas em geral, o guiar a História através das famílias, e dentro das famílias guiar as famílias através de um ramo; de dentro dos ramos, guiar um ramo predileto através de indivíduos, isto é uma coisa que existe e não tem conversa.
E, portanto, se compreende que numa família de um mundo que era um mundo muito colateral no tempo em que viveu, quer era Portugal e depois Brasil, e uma família que não desempenhou um grande papel em Portugal, e que desempenhou um papel mediano no Brasil, a Providência pode ter querido determinada coisa dessa família, e pode ter dado coisas que a família correspondeu e não correspondeu, mais ou menos, e vai daí para frente…
(…)
Conversando sobre a Europa que o indivíduo viu, você percebe o que ele é capaz de ver. Você está rindo, porque você está [se] reportando a parentes seus, que você conhece.
(Sr. Gonzalo Larraín: Não, não… Estou pensando no senhor…)
Bem, há gente que vai a Europa, e que volta com vistas de caixeiro viajante. Outros voltam com vistas de porco sensual, e que conta coisas que teve em Paris, em tal lugar assim, que pegou uma “fassura”, essas coisas horrorosas! Mas, trazer a civilização da Europa num comentário, e perceber que o sujeito compreendeu a Europa a largos haustos no que ela tinha de tradição católica, que ele não percebia que era católica; pegar o sabor da rés monárquica, o sabor da rés aristocrática — mesmo da rés “sacralis” —, pegar o sabor e contar a visita da Europa com esse sabor, eu não vi como ele.
Bem, e não é só a arte de ter visto, é a arte de contar. Porque há pessoas que viram, mas não sabem contar. O que a gente pode fazer? Não sabem contar. Não têm comunicação. Ele tinha uma comunicação enorme! Ele sabia fazer sentir aquilo tudo bem… De maneira que, a bem dizer, de dentro dos olhos dele, eu aprendi gostar mais da Europa do que através de todos esse álbuns e coisa que via, antes de ir a Europa.
Eu consigo ser claro…
(Dr. Edwaldo Marques: Nós temos uma experiência parecida.)
“Uiiii!”. Abstraiamos disso.
E isto de tal maneira que a gente percebia e era o melhor do negócio. A gente percebia que ele, o por onde ele apreciava assim a Europa, eram coisas características da pessoa dele que coroava. E que, portanto, aquilo impregnava a ele, e fazia um todo só com ele. De maneira que ele não sendo em nada um europeu, ele era um brasileiro, neto ou bisneto de português, sem nenhum outro sangue europeu a não ser esse, ele, de fato, exprimia toda a rés européia de modo perfeito.
Eu dou um exemplo…
(…)
(Sr. Guerreiro Dantas: Mas, no fundo caminha para o senhor isto é assim mesmo? O senhor sente assim?)
É assim. É uma das razões do pânico de nós.
(Sr. Guerreiro Dantas: É surpreendente, como é que isso vai acontecendo?)
Eu acho que entra alguma coisa de molejo natura de vida, mas entra muito mais de uma espécie de graça grande, difusa, que já antes de vir a Bagarre, já fala um pouco do Reino de Maria.
Agora, eu tive uma experiência disso. O PA organizou para eu falar aos rapazes de quatro grupos de São Paulo, pelo telefone, numa espécie de conferência telefônica, juntos. Então, tinha o São Bento, Praesto Sum, Acies Ordinata e Saúde. Eu percebi perfeitamente que eles não tendo ido reunião de sábado à noite, eles ficavam todos nas respectivas sedes, meio com falta de ar… Bem, vocês podem imaginar, são rapazinhos entre quinze e dezoitos anos. Um sábado à noite, todo mundo de idade deles está na perspectiva de algo novo, de uma noite diferente. E a bem dizer, tudo durante a semana encaminha para isto.
Você imagina, por exemplo, em concreto São Bento e Praesto Sum: ou eu me engano, ou São Bento tem uns trinta, quarenta eremitas e o Praesto Sum outro tanto. E uns casarões enormes em que eles ficam sobrando. Os outros, pelo contrário, acumulados em casinhas minúsculas, em que eles ficam pisando uns em cima dos outros. Bem, ao menos chegar uma hora em que alguém mais velho, de fora, telefona para eles e depois tem a [aventura?] [ventura] de ser um telefone junto, em que falam todos pelo mesmo telefonema, etc., é um ar!
Tanto é que o Sr. Fernando Antúnez me propôs de fazer isto, eu, naturalmente, achei monótono, porque eu não tenho os talentos de um animador. Mas aceitei logo! Porque me alivia a idéia de que eu vou poder interromper a noite de tédio deles, dizendo alguma coisa.
É natural; vocês compreendem isso sem a necessidade de mínima explicação.
Bem, agora, eu vi como estava com eles, pelo telefone. Eles estavam muito contentes de falar comigo, e sentindo realmente esta necessidade de ar. Nenhuma tentação de pular o muro! Na idade de vocês podia ocasionar! Vocês sabem que eram favas contadas! Na minha idade pulavam! Não tem conversa!
O que está havendo de novo? Não exageremos nada, isso é com eles. Muitos dos que estão lá não vão corresponder à vocação, etc. Mas, de qualquer maneira, algo de novo começou. É evidente!
(Sr. Guerreiro Dantas: Nesse pessoal dos Correspondentes e Esclarecedores ter algo nesse sentido também.)
Muito! Eu gosto que você toque nisso até.
(Sr. Guerreiro Dantas: Numa destas visitas eu notei muito isto, com uma senhora casada, [que] [ter?] [tem] dois filhos, mas ainda não se casou na Igreja Católica, e está querendo se casar na Igreja Católica, etc.; e a gente sentia uma graça por detrás da mulher, de que Nossa Senhora está empurrando para a TFP ela e o marido.)
Sabe o que é incrível? É o seguinte. É gente que tem no mundo de hoje, o papel que tem numa casa de construção pouco antiga, onde, por exemplo, na laje da cozinha, ou do banheiro, não sei, onde tem ladrilhos, ou não sei se isso se dá com carpete, com parquet, não sei se dá, mas enfim, aquilo às vezes se abre um pouco, e sai uma formiguinha, saí uma coisa lá de dentro e não faz parte da casa. É uma intrusa nascida dos desvãos e nas obscuridades da casa.
Assim são eles no mundo de hoje. Eles são… eles não fazem parte nem do clero, nem da nobreza, nem do povo. É uma espécie de ralé tão baixa, que no ponto onde vocês os conhecem, eles já foram menos. Esta gente parece que não sofreu ainda a osmose do processo revolucionário clássico. Ao menos é o que eu, em contanto com os Correspondentes Esclarecedores tive uma certa impressão. Não são [Contra-Revolução?] [contra-revolucionários], mas não são revolucionários clássicos. E ficam chocados com a Revolução, que eles percebem confusamente como um caos, à espera de algo.
Você teve outro dia uma expressão muito interessante que se usa lá nas direitas nos Estados Unidos: gente mal tratada pela Revolução, uma coisa assim…
(Sr. Mário Navarro: “O esquerdista agredido pela realidade”.)
É. Elas são pessoas agredidas pela realidade, mas que de fato… Porque o problema é o seguinte. Você pega uma pessoa dessas, ela e o marido, quando passaram pela fase ruim da adolescência… eles não tiveram a adolescência ruim que vocês tiveram. Bem, o não ter tido essa adolescência ruim, dá um desenvolver natural ao homem em que as agulhas de injeção da Revolução não penetram!
(…)
Quando você começou na nossa vocação, a TFP era uma torre do meio de uma planície, e essa planície estava cheia de víboras. De maneira que não se podia pensar em fazer o apostolado fora, [sem] ser mau espírito. Apostolado fora era só candidato ao Grupo. Com não candidato ao Grupo não tinha apostolado possível. E depois não era possível mesmo!
Agora isto é mais ou menos como a Arca de Noé que se abre! E que se permite um desembarque! É isso! Isso é grandioso na História da Contra-Revolução e da Revolução! Um fenômeno novo! Na Vila Moscou você vai encontrar gente…
(…)
Por quê? Por que [é] que jovens são estes? É a “enjolrada”! Agora, você põe um menino desses, engaja no processo revolucionário, dá para ele um bonito automóvel; a possibilidade de participar de prazeres, e preocupações mundanas de saliência, de relevo, etc., ou faz dele um estudioso e um “ploc-ploc”, [você?] [ele] está perdido! Está perdido!
(Sr. Guerreiro Dantas: Agora, como é que ainda transparece uma certa graça, é meio surpreendente.)
Não, não é isso! É uma outra coisa. Eu compreendo.
(Sr. Guerreiro Dantas: A gente fica estupefato!)
Está bem, meu filho, mas acontece que nós, sentados nessa cadeira, não aprenderíamos isso. E ficaríamos com uma noção irremediavelmente curta da realidade. Você sabe o que é que seríamos nós se não houvesse a “enjolrada” da Saúde, dessas Moscou, etc? Nós estamos aqui formando um círculo e comentando: “Que pena, tudo acabou mesmo, olha tal tarado, olha tal não sei o quê, e aconteceu não sei o quê; esse é o fim e tinha que ser, ‘babábá’…” [Nós?] [Não] nos passava pela cabeça que aí também o alvo [está caminhando?] [estava caminhando] de encontro à flecha! De fato está!
E aí é muito bonito nós vermos o seguinte: é mais ou menos como um sujeito que em pleno inverno, resolvesse meter um britador em cima da camada de gelo, furando encontrasse a natureza viva embaixo. Então, tivesse uma surpresa: “Que é isso?! Tem então terra viva embaixo desse gelo?! E ali eu percebo que há bichos que vivem! Percebo que há sementes que começa a brotar debaixo do gelo! Mas, então não é inverno? Como pode ser isto?”.
Assim nós estamos também. Nós estamos vendo em pleno inverno, abrimos os britadores, e percebemos que vem uma [pulsée?]. Mas, a questão é a seguinte: é que é este o primeiro inverno no qual aparece alguma coisa por debaixo.
(Sr. Gonzalo Larraín: Como interpretar esta graça? Seria Deus abrindo as comportas da graça, em virtude da fidelidade do senhor?)
Seria uma hipótese, da correspondência do conjunto da TFP também. Mas é uma hipótese… Eu não tenho elementos para negar, de tal maneira que haja uma continuidade entre eles; porque eles, em última análise são os descendentes de um povinho que um dia foi católico! E essa continuidade, com as irregularidades dessa continuidade… Eu contei a você a história de uma família, e todas as irregularidades da continuidade, e todas as perseveranças da continuidade, não é?
É preciso ver.
(Sr. Gonzalo Larraín: No fim do mundo não será assim.)
Não, não!
(Sr. Gonzalo Larraín: Não obstante teve filhos de um povo católico.)
Mas, aí a História terminou!
(Sr. Gonzalo Larraín: Mas, por alguma razão agora não terminou.)
Aí é mistério do post scriptum. Da península com istmo, etc. É [um] mistério.
Mas vocês querem ver duas coisas que fizeram parte do despachinho de hoje à noite:
Eu acabei percebendo por umas perguntas… porque o despachinho é feito numa tal rapidez, que não dá tempo da gente perguntar as coisas que quer, porque do contrário não se vence a matéria. Mas apareceu esta pergunta singular no despachinho: diretrizes para os jovens simpáticos a TFP na Venezuela, passarem as férias fora de Venezuela. Se, manda [para] o Brasil, se manda para…
(…)
Já num outro país inteiramente diferente, havia um caso assim… infelizmente este caso me escapou agora [no] momento… Mas, era um caso também… Quem era?… Ah!! As Filipinas! O grupo daquele menino nas Filipinas está crescendo muito! E já está nos dando medo! Ele, por exemplo, tem um telefonema por mês com o Chictto!
(…)
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