Conversa de Sábado à Noite (Alagoas, 1º andar) – 10/12/1983 – Sábado [RSN 50, VF 19 e AC VI 83/11.39] – p. 12 de 12

Conversa de Sábado à Noite (Alagoas, 1º andar) — 10/12/1983 — Sábado [RSN 50, VF 19 e AC VI 83/11.39]

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A pessoa quando é colocada no extremo do bem, as próprias qualidades que ela não tem extremamente boas, estranham” * “Quando nós convivemos com o sublime, ou nós sublimamos, ou nós vulgarizamos o sublime com que convivemos” * O grande pavor do Sr. Dr. Plinio de que, por uma falta sua, a Providência mude o rumo dos acontecimentos * Dias atrozes que passou durante o estrondo Fedeli-D. Mayer * A importância de nós compreendermos a arte real * Fomos chamados a uma graça muito especial de amor de Deus, que é amando o Fundador, como São Francisco Xavier amando Santo Inácio * Mentalidade do “graça nova”, católico praticante: habituado à velha segurança da Igreja, quer manter essa segurança, inclusive correndo o risco da luta * Sugestão para uma reunião apresentando casos concretos dos Correspondentes Esclarecedores * O problema é formar elementos de resistência à revolução progressista no bairro * Dois modos da graça atuar: no “público de procissão”, pela via do flash; e no “público de calçada”, pela visão gradual e orgânica das coisas

* As atrações do mundo e a hipotética ilha medieval perto do Rio de Janeiro

(Sr. João Clá: … isolados do mundo, mas o mundo como é, que chegaria um momento em que muitos teriam tentação de voltar para as cidades do mundo.)

Sim, sim. Depois eu me lembro que eu perguntei no auditório quantos dos que estavam ali estavam dispostos de fazer o voto de nunca sair da ilha. Hipoteticamente. Não tinha um. Um ou outro dizia que queria o direito de passear no Rio de Janeiro uma vez ou duas por ano.

É verdade que eu coloquei a ilha hipotética num lugar muito aliciante. Talvez num lugar mais austero a tentação fosse menor. Mas eu quis colocar a antítese, então coloquei assim.

O sujeito compreensivelmente tem muito menos tentação de descer em Cananéia do que no Rio. Mas, mesmo assim, quem não se aguentaria e iria ao Rio, acabaria indo a Cananéia. Esse é o fato.

(Sr. Paulo Henrique: Nesse ponto houve honestidade no auditório, confessando que não aguentariam.)

É. E olha que eu figurava uma ilha medieval, com toda a vida medieval, com nobreza, clero, povo, corporações, universidades, tudo. Os melhores diziam que uma vez ou duas ir ao Rio de Janeiro eles precisavam. Mas, na realidade, quando fossem ao Rio, depois eles ficariam inconsolados de ir apenas uma vez ou duas, e quanto melhor fosse a ilha, mais eles ficariam fanatizados pela terra firme. Essa é a pura verdade.

* “A pessoa quando é colocada no extremo do bem, as próprias qualidades que ela não tem extremamente boas, estranham”

(Sr. Paulo Henrique: […} Por que se passa isso? Chega a ser um mistério de iniqüidade?)

A pessoa quando é colocada no extremo do bem, as próprias qualidades que ele não tem extremamente boas estranham. Quer dizer, até as qualidades da pessoa chiam.

Eu que tenho uma tendência, miseravelmente espezinhada pelos médicos, à boa gastronomia. Dou a você um exemplo.

Você imagine que eu tivesse que levar de repente uma vida de trapista. Eu que ando bem gostando de gastronomia, estranharia muito o menu trapista: peixe, legumes, e no dia de festas ovos. Ovos duros. Naturalmente pão. Eu estranharia. E quanto mais eu for gastrônomo, mais eu estranharia.

Resultado é que uma coisa que eu considero uma qualidade, uma virtude ser gastrônomo, chiaria lá.

(Sr. Paulo Henrique: Se o senhor pudesse formular de novo.)

Aplique o exemplo. Eu estou habituado a comer de um determinado modo, apesar da miséria do regime como algumas vezes algumas coisas boas. Eu se fosse obrigado a comer só essas coisas, a minha abstinência que não chega a essa perfeição chiaria. E eu, numa trapa, teria o conflito criado pelos meus defeitos, mas também pelas qualidades, as quais Nossa Senhora não me pediu que eu levasse àquele ponto. Porque ninguém é obrigado a levar todas as perfeições ao mais alto grau possível, baste que as leve a grau heróico.

* “Quando nós convivemos com o sublime, ou nós sublimamos, ou nós vulgarizamos o sublime com que convivemos”

(Sr. Paulo Henrique: […] No caso de São Bartolomeu, Nosso Senhor fez aquele elogio enorme dele, depois na paixão ele defeccionou. Como se deu isso?)

Há uma tentação muito fina que é a seguinte: quando nós convivemos com o sublime, ou nós nos sublimamos, ou nós vulgarizamos o sublime com que convivemos.

Eu vou dar a você um exemplo.

Você imagine uma pessoa que convivesse com São Bernardo. Ou ficava com uma alma à altura, quer dizer, punha dentro de si algo da sublimidade que havia em São Bernardo, então viveria muito bem, ou seria levado forçosamente a ver São Bernardo injustamente de um modo não sublime.

Vamos dizer que ele fosse um irmão leigo, destinado pelo superior ao serviço de São Bernardo, e São Bernardo tivesse, por exemplo, o hábito de amarrotar muito a túnica, a batina. Ele resmungaria: “Esse amarrota-batinas não percebe que isso não se faz? Todo mundo aqui troca uma batina por semana, esse homem tem que trocar três vezes. Eu tenho que lavar, tenho que arranjar isso para ele. Uma trabalheira que ele me impõe apenas por causa de seus modos de gesticular, etc. Heee! troca batinas medonho!”. Ia por aí.

Então essa alternativa, por onde a pessoa é chamada a uma coisa muito fina: ou se sublima com ela ou ela a acaba destruindo. Vulgarizando, depois destruindo.

* Recebido em Bologna por um “campeão da vulgaridade”

É muito do Grupo. Por exemplo, eu acredito bem que na atitude de dois campeões da vulgaridade, que são o Fedeli e o Gomide, tenha entrado muito disso.

Não vale a pena nós num momento de lazer falarmos disso, mas eu não posso me esquecer de uma cena ridícula que eu presenciei na Europa.

Quando nós fomos lá em 62, para o Concílio, o Gomide estava estudando lá, ele ia fazer uns estudos, uma invenção que tinha feito, etc., uma coisa para a qual ele parece que não conseguiu aprovação universitária e não se doutorou. Uma coisa assim, eu não me lembro bem o que foi.

Mas ele residia em Bolonha. E nós tínhamos resolvido ir a Bolonha que, você sabe, fica no caminho Roma-Milão. O termo final de nossa viagem era Milão, tomarmos o avião e irmos de Milão a Paris. Fomos de automóvel até Milão, e de Milão em avião até Paris.

Combinamos com ele, gentileza para com ele, telefonamos, avisamos que íamos passar pela cidade onde ele morava, se ele queria estar conosco, etc. Então marcamos tal hora assim num restaurante chamado Papa Galo, que ele nos reservasse uma mesa, etc.

Nós fomos. Nós estávamos saindo de Roma, então empacotar livros, empacotar objetos, liquidar o secretariado, etc. Com a geração-novíades do pessoal da Martim e eu que não sou muito pontual também, nem me julgo na obrigação de cumprir um horário assim, eu exijo tanta coisa de mim, é normal que eu tenha um pouco de flexibilidade com o meu cansaço, chegamos atrasados lá. O restaurante grande, mas havia mesas.

Não é dizer que estava aquela mesa separada e o pessoal caindo em cima do Gomide. Não é verdade. O restaurante grande, comida superabundante, etc. Eu entro e encontro uma cena sublime: o Gomide em pézinho, apoiado assim com uma mão sobre uma das mesas, como o Napoleão poderia estar no rochedo de Santa Helena segundo a ficção romântica, olhar incendiado, explodindo.

Eu cumprimentei-o amavelmente, e ele me cumprimentou sumariamente. E eu disse a um dos da Martim, que naquele tempo conheciam melhor a ele do que eu o conhecia:

O que aconteceu com o Gomide?

Ele não tolera atrasos, e não compreende que o senhor tenha chegado atrasado.

É uma tendência à vulgaridade da parte dele. Não compreender que no nosso caso era razoável.

Uma disposição de alma dessas, multiplicada numa porção de outras circunstâncias, poderia dar nisso.

(Sr. Paulo Henrique: D. Mayer também.)

(Sr. Fiúza: D. Mayer, o campeão da vulgaridade.)

Ah, campeão. Ele tem coisas de vulgaridade incalculável.

(Dr. Edwaldo: […] No caso figurado de São Bernardo, o outro deveria ter para com ele todo apreço, embora não compreendesse certas coisas de São Bernardo.)

Perfeitamente. E é precisamente a posição que ele não queria assumir. Ele gostaria de substituir-se ao sósia, e numa ocasião em que o sósia estivesse para aparecer bancando ele, ir ele.

* O que une D. Mayer e Mons. Lefebvre é mais o ódio ao Sr. Dr. Plinio do que a afinidade mútua

Querem me perguntar alguma coisa, meus caros, da reunião de hoje, qualquer coisa? O Paulo Henrique tem uma pergunta que era sobre a reunião de hoje, não sei se está inteiramente respondida.

(Sr. Paulo Henrique: Sim.)

Se queriam me fazer uma outra pergunta, qualquer coisa.

(Sr. Guerreiro: […] Essa união de D. Mayer e Mons. Lefebvre não será para dar-lhes um certo prestígio internacional para depois se voltarem contra o senhor?)

Eu acho que isso é assim, que eles pretendem, unidos, atirar-se contra nós. O que os une é muito mais o ódio do que a afinidade mútua. Ódio a mim.

Nesse sentido, o Paulo Henrique veio trazendo notícias de Roma, eu não quis dar na reunião, mas que sob reserva…

* O grande pavor do Sr. Dr. Plinio de que, por uma falta sua, a Providência mude o rumo dos acontecimentos

(…)

quinhentas situações assim. Quinhentas é um número simbólico, mas podia ser cinco mil, de tais e tais coisas que a gente tem a impressão de que está tudo acabado, e não tem mais saída. Depois Nossa Senhora vai, ajeita, e arranja de um modo ou doutro, etc.

As coisas continuam. Mas sempre o meu pavor é quando as coisas parecem tomar um rumo não desejado pela Providência. Porque se eu tivesse certeza que este é o rumo desejado pela Providência, eu entraria com calma. O meu pavor não é que aconteça uma determinada coisa que eu não quero que aconteça, mas é que esteja fora do rumo da Providência que acontecesse. E, portanto, eu fiz alguma coisa que fez com que a Providência se desagradasse de mim, permitisse que acontecesse uma coisa que era contra o rumo dela. Aí é o medo.

Em cada estrangulamento vem esse receio: “Eu não terei feito alguma falta de generosidade interna, muito profunda, da qual eu não me dou conta, mas pela qual eu tenho responsabilidade? E não é por causa disso que a Providência faz o navio singrar para o outro lado?”.

Assim, me tem acontecido uma pilha de coisas que me davam a impressão que a Providência não quereria. Depois a gente vai ver, etc., está bem. Mas na hora não. E às vezes as coisas se apresentam de um modo que…

(…)

* Dias atrozes que passou durante o estrondo Fedeli-D. Mayer

Por exemplo, esse caso: Fedeli e D. Mayer. O Gomide é de tal maneira quantité négligeable no negócio, que nem vale a pena mencionar. Mas o Fedeli e D. Mayer, essa questão de culto.

Eu tinha idéia de que era proibido realizar culto a pessoa viva. Mas eu entendia como culto o que se entende pela linguagem comum. Seria prestar culto a alguém se, por exemplo, eu me sentasse num estrado ou num altar, e uma pessoa viesse e rezasse, pedisse a minha intercessão para esse ou para aquele. Aí seria um ato de culto. Mas que o mesmo pedido feito fora dessas circunstâncias não era culto.

Então, por exemplo, alguém me pedir que reze por alguém, é uma coisa comum. Aliás, todo mundo pode pedir. Uma pessoa pode, por exemplo, ver um de nós na igreja — e já tem acontecido a todos —, passa uma senhora e diz: “Olha aqui, reza para meu marido que está muito doente”, qualquer coisa. Não é culto, é uma coisa que segundo toda evidência é legítima.

Então, eu estava inteiramente tranqüilo de que nunca uma acusação de culto a mim pegaria. E ele andava rosnando essa acusação e eu não me preocupei a mínima, porque julgava que nunca uma acusação de culto assim pegaria.

Quando eu começo a estudar, o João começa a estudar, o Átila começa a estudar o que é o culto, eu vi que o culto é toda a manifestação de reverência que se tem à pessoa, quer por qualidades humanas quer por qualidades sobrenaturais. E que há um culto chamado cívico, que é por razões temporais.

Por exemplo, o prêmio Nobel da Paz, aquelas coisas, aquelas festividades que fazem é um ato de culto. Uma guarda de honra é um ato de culto. É culto cívico. [Vira a fita]

atribuindo a esta pessoa uma santidade heróica e homenageando-a por causa disso, é um ato de culto religioso.

Ora, segundo toda evidência, eu tinha permitido que muitas pessoas se fizessem coisas que revelam na cabeças delas essa intenção. E sem eu me pronunciar sobre o fato, eu tinha deixado correr o marfim, porque não me tinha parecido nem ilegítimo nem mal.

Eu não fui consultar um tratado de Direito Canônico, porque não temos tempo, etc., e a certeza de que não encontraria, então toca o barco. Mas nunca me passou pela cabeça que isto constituísse um culto.

Resultado, vem de repente essa ofensiva e eu disse: “Essa ofensiva deve ter por detrás D. Mayer, porque é impossível que D. Mayer estando assim conosco, o Fedeli não tenha consultado D. Mayer antes. E é impossível que ele solte isso sem ouvir D. Mayer. Logo, provavelmente, um homem formado na Gregoriana tem isso em conta de culto. Logo, isso é culto. Logo, eu caí numa esparrela e deixei toda a TFP cair numa esparrela por causa disso. E nunca dos nuncas eu vou encontrar nos livros de Direito Canônico uma justificação para minha atitude”.

Aí fiquei num estrangulamento único.

Até que o João e o Átila, cada qual por seu lado e por vias diferentes, foram fazendo estudos. O Àtila estudos de caráter doutrinário e o João estudos de caráter hagiográfico, histórico. Então, provando à saciedade que, contra o que eu imaginava, está ultra-estudado pelos canonistas. E que, teoricamente, doutrinariamente, prestar culto a alguém por suas virtudes sobrenaturais, a uma pessoa viva — portanto, não canonizada — não é contra o Direito Canônico. Está ultraprovado.

E os exemplos que o João arranjou, se eu não me engano, pela massa da coisa, seiscentos exemplos mais ou menos de caso de culto prestado em vida. Aí desafogou-me muito. Mas esses estudos levaram uns dois ou três meses para fazer, e até eu estudar, ver que era, eu passei por um estrangulamento do outro mundo.

Você vê bem que isso poderia determinar uma desagregação da TFP. Porque se este ponto não estivesse estudado no Direito Canônico — é um ponto tão mínimo, que podia não estar estudado —, nós teríamos desagregações dentro da TFP. Era uma coisa forçosa. Até certo ponto compreensível.

Então é o mais recente.

Depois há coisas assim: também culto a mamãe, culto a uma pessoa não canonizada. Você sabe que no torvelinho do primeiro mês, digamos, ou dos primeiros dois meses, nem eu me lembrei que na carta que eu escrevi ao “Estado de S. Paulo”, revista por D. Mayer antes e lida por todo clero, é fora de dúvida, eu afirmava o culto prestado a mamãe. Ninguém piou nem miou. Porque naquela carta está afirmado que vão lá e rezam, e que eu achava isso direito.

Tem mais ainda: o D. Arns numa declaração de que ele prestava culto à mãe dele, etc. Tem documentos assim no arquivo. Mas eu nem me lembrei naquele torvelinho.

Eu passei dias atrozes. Naturalmente me dominando. Eu tenho impressão que ninguém notou que eu estava triturado pelos fatos dessa maneira. Mas de fato estava.

E aí vinha o receio: “Isso não será um castigo por alguma infidelidade sua?”. Podia ser. É uma barbaridade.

Coisas assim na minha vida, mas às torrentes.

(Sr. F. Antúnez: O senhor sempre se põe o problema infidelidade do senhor, nunca da nossa.)

Por uma razão muito simples: é que pela de vocês eu tenho uma responsabilidade menor, porque afinal de contas cada homem carrega o peso do próprio corpo, e para as minhas eu tenho inteira.

* Um exemplo do nível da argumentação do Fedeli

(…)

Ainda outro dia eu soube do Fedeli, acho que comentei com vocês aqui, mas não com o Guerreiro nem com o Paulo Henrique, uma coisa do Fedeli que é do outro mundo.

Não sei se lembram, mas vocês todos devem ter visto: o Fedeli ainda estava no Grupo e ele ia aos Buissonets, quando havia reunião minha, mas ele ficava mariscando gente no pátio lá fora, de gente que não cabia, ele induzia à conversa para fazer propaganda revolucionária. Depois levava lá para aquele corredor, etc. Propaganda contra mim o tempo inteiro.

Então uma noite ele saiu com essa: “O Dr. Plinio disse que é contrário à palavra ‘gozo’não quer que se empregue a palavra ‘gozo’. Vamos examinar um pouquinho. Afinal de contas a palavra ‘gozoso’os ‘mistérios gozosos’, isso é um mal? Então por que é que a palavra ‘gozado’ é uma palavra má?”.

Um argumento de lo último! Porque eu não disse que a palavra gozo em si é uma palavra má. Eu disse que é uma palavra que recebeu uma conotação em nossos dias que é uma conotação má, e até péssima. A extrema fímbria toca ao sensual.

(Dr. Edwaldo: Diretamente. Se usa aí no sentido mais depravado possível.)

Então caminhou mais a palavra do que eu imaginava.

Bem, e é claro que quando se começou a falar de mistério gozoso não se tinha nem um pouco isso em vista. E que isso é um hábito velho. Vocês, com certeza, pegam missais do Brasil colônia ainda, livros de devoção, você encontrará referência aos mistérios gozosos, como encontra dolorosos e gloriosos.

(Dr. Edwaldo: No catecismo, o homem foi feito… e gozar a Deus por toda eternidade.)

Exatamente.

Agora, as palavras mudam e com o tempo, vão tomando conotação que podem ou não perder essa conotação. De momento é assim.

Então ele dizia: “Eu não sei, não vejo nada de ruim nisso”. Mas documentinhos tão de quinta ordem, que não chega a ser argumento, é babação de criança. É criança que baba, não tem outra coisa.

* A importância de nós compreendermos a arte real

Mas o que eu acho na Reunião de Recortes foi um dos pontos mais importantes hoje é aquela questão das tendências da Opinião Pública. Aquilo dá uma espécie de visualização da TFP que eu dei ali. Não sei se ficou bem claro para todos o alcance daquela visualização.

Quer dizer, o normal no Reino de Maria era a TFP ter gente assim que soubesse detectar em que condições estão todas as tendências da Opinião Pública, de maneira a poder apresentar as verdades segundo as apetências. Isto é que é propriamente a alma da arte real.

Eu tenho a esperança que no Grand‑Retour se veja isso. E que talvez para um ou outro ainda venha antes. A vocação dá os elementos para isso.

(Sr. Paulo Henrique: Com o “Grand‑Retour”boa parte veria?)

(…)

* Fomos chamados a uma graça muito especial de amor de Deus, que é amando o Fundador, como São Francisco Xavier amando Santo Inácio

como é que a Bagarre Azul desvirtuou completamente, como a Bagarre Azul tornou impossível — por culpa nossa — de me verem, como se desvirtuou completamente, tudo o mais, tudo isso foi dito. Agora é compenetrarem-se, pedirem perdão a Nossa Senhora e tocar a vida para frente.

(Dr. Edwaldo: As fotos de ontem à noite, muito ilustrativas desse isolamento. Muita gente em torno, mas distantes.)

E depois é preciso ver as coisas como são. A gente não pode ter ilusão a respeito das coisas. No meio de tudo isso entra também resquícios de espírito revolucionário que entram em choque comigo, entram megalices e outras coisas do gênero. Entram.

(Sr. Poli: Isso é tudo para nós e o resto nada.)

Não, aí a formulação não está boa, dizer que o resto não é nada, isso não. Nós temos todo o resto.

Por exemplo, a devoção a Nossa Senhora é incomparabilissimamente mais do que isso, a perder de vista.

(Sr. Poli: A devoção a Nossa Senhora é alimentada por isso.)

Como cada elo da corrente é mantido pela presença de todos os outros elos.

(Sr. Paulo Henrique: Sem esse elo, nossa devoção a Nossa Senhora se evanesce.)

Isso sim, não se mantinham. Isso sim.

Aí tem o seguinte: os outros elos são elos inapreciáveis, que nos dão a salvação da alma, vida da graça, etc. Agora, este elo pode representar uma graça mais especial e mais preciosa.

Vamos dizer o seguinte: amor de Deus. A substância da virtude católica é amor de Deus. Quem não tem amor de Deus, não tem nada. Agora, nós não podemos dizer que a graça que São Francisco Xavier tinha de amar a Santo Inácio era uma graça maior do que a graça de amar a Deus. Não se pode sustentar. Mas é fato que ele foi chamado a amar a Deus por uma graça de amor de Deus muito especial, que era amar a Deus amando Santo Inácio.

Mas isso é preciso ter muito cuidado para formular, porque do contrário aí tem Mutucas de toda ordem que exploram.

(Sr. Paulo Henrique: Se não houvesse Santo Inácio, ele se perderia.)

Se perderia.

(Sr. Paulo Henrique: É o nosso caso, o elo da vocação.)

(Dr. Edwaldo: Ele dizia que Santo Inácio era Deus na terra para ele.)

Exatamente. A gente poderia tomar assim: o que é mais importante, a graça do batismo ou a graça da vocação religiosa? É evidente que a graça do batismo é mais importante. Não pode ter vocação religiosa se não tem batismo. A graça do batismo prepara, conduz, habilita para a vocação religiosa, é o pressuposto, a condição para a vocação religiosa é o batismo, sem batismo não tem nada feito. Mas a graça da vocação religiosa é uma graça excelente e rara, dada para a gente cumprir as promessas do batismo de um modo especialíssimo que Deus nos fez o favor de querer de nós daquele jeito.

Então, é preciso ver a graça da vocação religiosa na perspectiva da graça do batismo. Aí a coisa se põem em ordem.

(Sr. Paulo Henrique: Mais ou menos na linha do moço rico do Evangelho. Se a gente não for por aquela estrada…)

É. Se o moço rico do Evangelho… muitos acham que ele se perdeu. De fato, o que ele tinha feito antes era mais importante, ele tinha cumprido todos os mandamentos. Era menos importante dar a fortuna aos pobres, porque o sujeito pode não dar a fortuna aos pobres e salvar-se. Mas como ele não deu a fortuna aos pobres, ele perdeu. Porque quem recusa a graça muito rara e muito seleta, pode, conforme o caso, perder as outras graças.

Então, a coisa expressa com os devidos matizes dá muito bem.

* Mentalidade do “graça nova”, católico praticante: habituado à velha segurança da Igreja, quer manter essa segurança, inclusive correndo o risco da luta

Mas meu sonho com a TFP, propriamente, era de uma TFP tendo todas essas coisas…

(…)

E cada um dos membros atuais da TFP, mais os que entrarem, terão graça para isso. Tem e terão. Eu tenho firme esperança nesse ponto. Será agora, será nos tormentos da Bagarre, quando será?

Uma das coisas que prepara muito para isso é o serviço de Correspondentes Esclarecedores, para os quais vocês estão designados, porque é um laboratório de análise disso, dos melhores. São regras de Opinião Pública que a gente haurindo, tratando, tem uma coisa que a comissão antiga de Opinião Pública não tinha, que era condição de aplicação.

(Sr. Paulo Henrique: Mas era desejo do senhor.)

Era desejo. Mas naquele tempo a massa humana estava muito menos preparada para ser interessante e ilustrativa disso do que hoje.

Porque hoje, com a graça nova, as condições de aproveitabilidade disso fervem, as pessoas sentem isso. Neste sentido, trabalhar na graça nova é uma graça insigne. E para vocês um benefício sem nome.

Eu vou dizer uma coisinha que eu não disse nas reuniões da graça nova, e talvez nem diga porque não me ocorra. Mas qual é a mentalidade específica, o estado temperamental específico do pessoal da graça nova? Dentro dessas ondulações do temperamento público, qual é a mentalidade específica deles?

Eu estou falando dos que foram outrora católicos praticantes. É diferente dos que estão desalveolados, estão vindo. Dos que foram outrora católicos praticantes, qual é a posição deles?

A posição temperamental deles é a seguinte:

Eles estavam inteiramente seguros dentro da Igreja Católica. E tão, tão seguros, que viram avolumar-se o caos e não acreditaram que era caos. E não acreditaram que era caos porque não pode ser caos, na Igreja não pode dar caos.

Agora, porque eles estavam habituados a uma velha segurança dentro da Igreja, eles não estavam fartos dessa segurança, não estavam no período de querer aventura, isso não, mas eles estavam numa situação temperamental de inteiramente abastecidos de segurança, tanto quanto no temperamento humano pode estar, de repente eles se dão conta do caos. Eles, na defesa da sua própria segurança, querem acabar com o caos se entrincheirando nas posições antigas que lhes dava segurança e continuando a luta a favor dessas posições. E aí correndo o risco da luta para evitar um caos que ainda seria mais doloroso que o risco.

É mais ou menos a posição de quem resolve partir para a guerra convencional de medo da guerra atômica. Eles consideram a vida sem a ordem da Igreja uma coisa como a guerra atômica. Preferem entrar na guerra convencional: “Isto é Igreja, esta restinga é Igreja, aqui eu estou, daqui ninguém me tira, daqui eu vou dar tiro”. Dar tiro no sentido figurado da palavra, evidentemente. Mas esse é o estado temperamental deles.

Isso varia um pouco de público, mas os que forem católicos praticantes da Igreja de fato e que romperam com o padre, no fundo a evolução foi essa.

Então, sem descrever para eles que eles estavam nesse estado, as reuniões, as conversas têm que bater nesse leitmotiv: “Nós afinal de contas, temos direito a essa segurança, nós estamos nessa posição, esse caos aí vai nos roubar isso, onde é que se viu”, etc.

Eles nem comentarão porque entra para o subconsciente. Mas nós os teremos consolidados num ponto precioso do espírito.

Suponho que no estado católico por excelência, isto ainda seja ainda mais marcado. Porque é gente que não gosta de caos.

Hein, meu PH, nossa gente lá não gosta de caos, nada, nada. Então para dizer lá, podiam inclusive deixar o José Cyro ouvir isso, não seria nada mau. Ou deixar alguns ali dos mais velhos ouvirem, qualquer coisa, esse trechinho, escrever, nem precisa ouvir. Porque orienta um pouco como bater o negócio. Eu acho isso bonito.

* Sugestão para uma reunião apresentando casos concretos dos Correspondentes Esclarecedores

Bem, meus caros, fugit irreparabile tempus.

(Sr. Paulo Henrique: Não tem fatinho?)

Fatinho… ahahah!

(Sr. Fiúza: A questão do fundador, para eles da graça nova também tem muito o que dizer.)

Aliás, a atitude deles para comigo, no fim da reunião, indica isso. [Vira a fita]

(Sr. Guerreiro: Pode ser uma visão pessimista, mas a gente mexe, mexe, mexe com essa gente, com muita gente para tirar alguma coisa que vale a pena. Parece um círculo de pulgas…)

(Sr. Poli: Só que é um círculo de pulgas que muito político importante gostaria de ter.)

Nem me fale!

(Sr. Paulo Henrique: É a questão do público de procissão e o público de calçada. Alguns vão na procissão e a grande maioria fica na calçada.)

Eu gostaria que você me fizesse essa pergunta, Guerreiro, assim como você está fazendo, numa reunião de Correspondentes Esclarecedores. Porque isso supõe uma explanação muito maior e supõe também que a sua pergunta fosse ilustrada por alguns casos concretos contados por você e que eles também, os outros membros da comissão, pudessem também ilustrar com casos concretos, porque é hora de descer no concreto. Então, já não são as coisas gerais.

Porque, por exemplo, tudo isso que eu disse hoje na Reunião de Recortes é genérico. O que você está pondo é uma coisa concreta, porque acaba sendo que nem é… você apresentou ainda em termos um pouco genéricos, mas a sua pergunta é quanto aos grupos em que você está trabalhando.

Você apresentou em termos genéricos por duas razões:

Você queria evitar de ter que entrar em pormenores que podem não interessar aos da sala. Por outro lado, porque você deseja que os outros também se beneficiem de uma explicação, que dada apenas em função de um caso concreto pode não ser tão útil para o benefício dos outros.

Mas de fato eu gostaria que você então desses vários fatos concretos para eu estudar e dar para vocês no momento o que me parece a solução concreta, que varia muito de lugar para lugar.

Por exemplo, em Belo Horizonte tem muita gente que mais ou menos poderia ser vista com uma perspectiva de graça nova — não é propriamente graça nova, mas mais ou menos — e de um nível bem melhor do que esse. Como tratar esse pessoal? E como tratar o pessoal de nível mais miúdo com quem você e José Cyro andaram tomando contato? Como tratar? E aí tomar no concreto, eu acho que é muito importante.

* O problema é formar elementos de resistência à revolução progressista no bairro

(Sr. Fiúza: É povinho de capilaridade.)

Mas a realidade está nas capilaridades.

(Sr. Guerreiro: […] A ação do senhor é para uma elite de pessoas.)

Uma elite de almas. Aqui pega o problema de classe social e afasta ainda mais. É uma elite de almas.

(Sr. Guerreiro: Mas é uma gentinha…)

Mas ele briga no bairro. A gente consegue que ele seja um elemento de resistência no bairro à Revolução progressista como ela se apresenta? Esse é o problema. Ou como público de calçada, ou como público de procissão — portanto, uma pessoa retirada, mas que nos é simpática, gravita em torno de nós —, ou como uma pessoa que entra na luta, é preciso que ele tenha conhecimento do problema progressista como se apresenta no bairro dele, quais são as pessoas, que devastação está fazendo, que mal faz lá e do que é que pode adiantar uma reação dele.

Nas duas claves, a gente deve conhecer: procissão ou calçada. E deve ser orientado a desenvolver essa luta ali.

* Dois modos da graça atuar: no “público de procissão”, pela via do flash; e no “público de calçada”, pela visão gradual e orgânica das coisas

Daí em algum tempo começa a haver algumas graças para alguns para ver muito mais. E é assim por flashes. E para outros começa a haver uma visão gradual, orgânica, maior das coisas.

Os flashes são quase exclusivamente para o pessoal de procissão e só dá para o pessoal de calçada na medida que é para levá-los para a procissão. Para o pessoal de calçada, alguns vão nesse crescimento orgânico. Mas isso é sobretudo crescimento de pessoal de calçada.

Quer dizer, a partir da briga deles, eles começarem a se interessar por uma briga um pouco mais vasta, geral, uma noção histórica, etc. Mas a questão é entrar na briga deles ali e ver no que é que a vidinha deles exerce um contrapeso contrário a essa briga.

Agora, é preciso andar com vagar, pelo seguinte: praticamente o que vai acontecer é que, a crise universal se acentuando, todos eles vão maturando muito mais do que a gente imagina. Isso é que vai acontecer de concreto, um trabalho da Providência modelando os fatos sociais, e da graça adaptando as almas, dispondo as almas para tomarem posição.

Eu gostaria de expor isso.

Até gostaria, Fernando, de mandar escrever isso e depois eu exporia numa reunião que tivéssemos ocasião de fazer.

Meus caros, vamos andando.

(…)

* Missa no dia 13, em Genazzano

(Sr. Paulo Henrique: Estará sendo celebrada uma missa no dia 13, no altar de Nossa Senhora do Bom Conselho em Genazzano, pelo senhor.)

Me alegra muito! Mas tradicional?

(Sr. Paulo Henrique: Sim. Vai de Roma o padre, já contratamos.)

Precisa controlar o homem ver se vai mesmo, hein? Me importa no mais alto grau.

Qual é o padre?

(Sr. Paulo Henrique: O que celebra para o Una Vocce.)

O que é mesmo o Una Vocce?

(Sr. Paulo Henrique: Movimentozinho do Neri Caponi.)

Ah sei! Todos ocultistas.

Capponi, um ocultista medonho, deve estar carregado de cólera comigo, não?

(Sr. Paulo Henrique: Cólera. Não podia ouvir o nome do senhor.)

É miserável.

(Sr. Poli: Vamos fazê-lo ouvir muitas vezes se Deus quiser.)

Ahahah!

Há momentos minha Mãe, que minha alma…

*_*_*_*_*