Conversa de Sábado à Noite (Alagoas, 1º andar - 1:30 AM) – 30/7/1983 – Sábado [AC VI - 83/07.41-42] – p. 17 de 17

Conversa de Sábado à Noite (Alagoas, 1º andar - 1:30 AM) — 30/7/1983 — Sábado [AC VI - 83/07.41-42]

Nome anterior do arquivo: 830730--Conversa_Sabado_Noite__b.doc

* O Sr. Dr. Plinio limpando os cinzeiros da sede da Rua Vieira de Carvalho, para salvar a coesão do Grupo * O Sr. Dr. Plinio fazia isso porque via o filão de ouro na alma dos membros do Grupo — Pelo lado prosaico: o medo de ficar sozinho o resto da vida * Os problemas de convívio no Grupo cujas origens estão em questõezinhas, acarreta abismos entre as pessoas * Para fazer apostolado com os membros do Grupo mais novos, o Sr. Dr. Plinio chegou a habituar-se com o absurdo * As afrontas do Pacheco — No fundo queria diminuir o Sr. Dr. Plinio para se sobressair* O discernimento dos espíritos não é inquisitorial, não vê só os defeitos, mas vê também a ação da graça nas almas, animando a fazer apostolado com elas * A natureza do Sr. Dr. Plinio inclinava-o a ser um homem mole, desinteressado por outras pessoas e gozador da vida — Para cumprir a sua vocação, teve que revirar-se completamente, adquirindo qualidades que não tinha * Com atos de piedade declarados diante da sociedade paulista, o Sr. Dr. Plinio arruinou sua reputação * As tentações contra a Fé e a ajuda de Nossa Senhora * O ataque dos membros da Congregação Mariana ao Sr. Dr. Plinio * Os ziguezagues simultâneos são úteis para a formação da plasticidade * “Se alguém me tivesse dito que eu ia sofrer isso, eu me desencorajaria — Se Nossa Senhora fez assim com ele, não fará coisas dessas comigo? Eu terei coragem de suportar?” * “Os caminhos mais revirados, inopinados e malucos, estes caminhos são o arquicaminho do homem de bom senso” * “Saiam daqui esperando que vocês vão ter a graça, como eu tive” * “Eu estou certo de que, se eu não tivesse sofrido essa imensidade, eu não teria feito bem a vocês — E que se vocês não sofrerem muito também não farão bem nenhum”

e o pai dele é detetive. E ele tem assim, misturado… o estudo que eu peço a ele é um misto de “detetivança” e de intelectualidade. E ele é um detetive ideológico muito bom.

Para trabalhar para a Inquisição ele seria um homem de primeira ordem. E tem mandado material, tem me mandado coisas. Há três camaldulenses designados para ir consumindo o material que a BAC fornece.

(Sr. Nelson Fragelli: O assunto que ele pesquisa é reservado.)

Não, aqui para vocês não. Mas vocês não me repitam.

(…)

* Notícias alvissareiras vindas de vários países

Na Irlanda. E o núcleo do grupo são quatro irmãos que têm meio sangue irlandês, um quarto escocês e um quarto inglês. Mas eles descobriram, através desse grupo — pai também entusiasmadíssimo por nós, o pai desses irmãos — toda uma zona da opinião conservadora irlandesa, muito mais conservadora do que da Inglaterra e muito aberta a nós. De maneira que se nós tivéssemos gente para montar um Bureau na Irlanda, só a Irlanda absorvia o Bureau.

De outro lado, o Aloísio que chega à Austrália e encontra o movimento dos enjolras tão desenvolvido que está com 72 apostolandos!

É preciso notar: não é gente que freqüenta já a sede. São contatos.

Mas para um grupinho da Austrália é impressionante. E um filipino que ele conheceu numa viagem, assim de passagem por lá e com quem ele deixou a “RCR”, escreveu dizendo — a expressão não me agrada muito — que ele pode orgulhar‑se de ser um verdadeiro contra‑revolucionário depois de ter lido a “RCR”. E quer ir à Austrália para ser recebido como membro da TFP.

(Sr. Nelson Fragelli: Que grandes notícias.)

Bem, da Suécia uma organização…

(Sr. Nelson Fragelli: Tudo isso o senhor soube no Despachinho agora?)

É, o Despachinho ficou parado uns dez dias por outras ocupações e tive que rever. Tomei o dia de hoje. Passei até agora despachando, porque essas coisas não podem esperar. Vocês compreendem que elas vêm carregadas de consultas. Eu estou dando o lado positivo. As consultas — você tem experiência — vêm, devem vir.

Então, um grupo da Suécia, uma organização anticomunista e anti-socialista, fundada em 1915 — eu tinha 7 anos — que se reuniram, estudaram nossas coisas… Vocês conhecem. Sobretudo você, está conhecendo bem.

Reuniram e estudaram nossas coisas, chegaram à conclusão de que eles não tinham nada de melhor a fazer senão se transformar numa TFP sueca. E que então mandavam oferecer… você sabe que, de repente, a coisa sai assim lá.

E de outro lado queriam saber se nós tínhamos Bureau na França ou na Alemanha, para tomar contato. Já mandei dizer que tem em Frankfurt e que tinha também em Paris, mas que mais valia pena dirigir‑se a Frankfurt, tinha pessoas habilitadas para, etc… E que eles fossem a partir daqui um mês, contando que — mais ou menos — dava tempo para você ou o Caio chegar até lá, para tomar os contatos.

Bem, eu não quero dizer que esse grupo seja assimilável por nós. Começa que não sei se serão católicos.

* Toda esta situação indica uma mudança muito grande no panorama da TFP

Mas indica uma…

(Sr. –: Indica muita coisa.)

uma situação que, se vocês somarem à verdadeira fome devorante de ação da TFP que vai se multiplicando aí pelos grupos de periferia urbana, etc., indica…

Depois a enjolrada que vai entrando aos tropéis, indica uma mudança de panorama da TFP, tão grande, como a gente quase não sabe agradecer a Nossa Senhora adequadamente.

(Sr. Nelson Fragelli: É uma explosão.)

É uma explosão.

(Sr. Nelson Fragelli: O núcleo de periferia urbana… não sei!)

Eu mandei o recado a você. Você não recebeu, não? Eu fiz um simpósio em São Bernardo onde eu dei toda a teoria, todo o plano dos núcleos e que está sendo executado. O Guerreiro é um grande propulsor disso em São Paulo, e o Fiúza em Minas.

(Sr. Nelson Fragelli: Grandes mãos.)

É, o Fiuza tornou‑se bipolar. Vai, passa uma parte do tempo dele aqui alisando a irmã, e uma parte do tempo trabalhando em Minas.

Eu até achei pitoresco, ele veio de Minas, depois de ter estado com um núcleo de negros extremamente pitoresco — que realiza Congadas, essas coisas todas, por tradição imemorial —, e combatido por gente de fora, não sei o quê, que procura a TFP para se pendurar em nós. Ele está desenvolvendo muito esse apostolado, entre outros.

Eu disse que eu queria, que eu gostaria muito — se você tivesse propensão para isso — que você lesse esse simpósio, antes de voltar para a Alemanha.

(Sr. Nelson Fragelli: Eu não tinha recebido o recado ainda.)

Mas é isto. O Guerreiro que não tinha entrado nesse movimento ainda quando se realizou o simpósio, leu depois e estudou. E o Fiúza participou do Simpósio, não foi Fiúza?

(Sr. Fiúza: Não, eu estava fora quando houve o Simpósio. Li.)

Leu também. Mas vale a pena ver por aí como é o movimento.

Depois o Guerreiro, o Glavan, outros podem contar a você como está acontecendo aqui. Mas acho que valia a pena mesmo você sair daqui bem informado sobre isso. Como está em Minas o Fiúza podia contar para você.

(Sr. Fiúza: O plano [é] de uma envergadura nunca vista.)

Nunca vista. E o conjunto de núcleos de periferia de base… não o conjunto do que estou falando aqui, da Suécia, Austrália, não é isso não. É dentro do Brasil.

Quem poderia dizer a você coisas interessantes sobre o plano para os Êremos Itinerantes — que eu gostaria muito que você conhecesse bem também — é… mas a massada é que são dois mudos que dirigem e superdirigem isso. São o Plinio Xavier e o Kallás. Eles não são expansivos, mas o que você conseguir extrair de qualquer um dos dois seria muito útil.

Porque eu gostaria que você chegando à Europa pudesse comunicar isso tudo ao pessoal que está na Alemanha, que está na França. Paulo Henrique deve chegar aqui de um momento para o outro. Na Espanha o João esteve há pouco lá e deu jornal-falado. Mas, ao Narses, tudo o mais. Porque isto é indispensável.

* Estar informado sobre as proclamações lidas no Auditório São Miguel, é essencial, debaixo de certo ponto de vista, para os que não moram em São Paulo

Assim como se faz a proclamação do que acontece fora nos auditórios, no Auditório São Miguel à noite, também convém haver uma espécie de proclamação dessas coisas nos núcleos de fora.

(Sr. Nelson Fragelli: Oxigênio para a gente, panorama, é a grande TFP dos sonhos.)

Graças a Nossa Senhora tudo isso é — numa palavra um pouco exagerada — inebriante. Aliás, isso eu não sei também se vocês em Frankfurt, em Paris, etc., ficam informados das repercussões lidas no Auditório São Miguel. São informados?

(Sr. Nelson Fragelli: Sim, ficamos, ouvimos.)

Então, para vocês que estão fora, debaixo de certo ponto de vista o essencial é a proclamação no Auditório São Miguel. Mas todo esse trabalho de periferia urbana, não é dado no Auditório São Miguel, porque não há tempo. Mereceria, [mas] levaria uma semana para ser dado.

Mas para você compreender a diferença de ambiente… você foi eremita em Jasna Gora muito tempo. Você calcule que o bairro de Itaquera se revela francamente receptivo. Você viu bem o frio daquilo, o isolamento daquilo. Nós vivíamos ali como se fossemos o consulado da China.

(Sr. Nelson Fragelli: Exatamente! Houve tempo lá que passamos em prontidão esperando uma invasão.)

Era mesmo perigoso. Bom, invasão tem perigo na Austrália.

* Na Austrália, a família de um apostolando faz pressão sobre o rapaz, com a falsa idéia de que a pessoa que pratica a pureza fica tuberculoso

Imagine que há uma rapaz finlandês — a Austrália tem gente do mundo inteiro lá — na Austrália que freqüentava um grupo de hippie ou “hippieformes” do bairro dele. Esse rapaz se converteu e passou para o grupo e recebe pressões da família. Mas fenomenais! Naquela linha clássica: “Se você ficar casto fica tuberculoso”. Olha, que isso é lero‑lero que eu ouvia contar quando era pequeno, no colégio São Luís.

(Sr. Guerreiro: Isso eu nunca ouvi. Nunca tinha ouvido essa.)

Eu sim. Olha aqui, quando o Adolphinho começou entrar no Grupo a minha tia me procurou muito seriamente e me disse o seguinte:

Você garante que o Adolphinho levando uma vida pura como você leva — e quer que ele leve —, Adolphinho não ficará tuberculoso? É uma pergunta de uma mãe, e você tem toda responsabilidade de consciência pelo que você responder.

Eu disse:

Eu não posso garantir que o Adolphinho não fique tuberculoso por outra causa. Não está na minha mão — ele era muito franzino — , mas eu posso garantir que por isso não será. Mas que pode ser por impureza. Se ele ficar impuro pode ser.

E eu era muito gordo naquele tempo. Eu disse a ela:

A senhora olhe para mim. A senhora acha que eu tenho algum risco de ficar tuberculoso? Seu marido é médico. Seu marido vê algum risco remoto de eu ficar tuberculoso? Então, vamos ver as coisas como são. Esses padres que estão todos por aí são tuberculosos?

Naquele tempo os padres eram castos. Ela se convenceu e deixou o Adolphinho entrar no Grupo. Então, a família exercia essa pressão.

* Ameaça de invasão da sede na Austrália porque um apostolando converteu-se para a religião Católica e pratica a pureza

[Voltando ao caso do australiano], a família exercia essa pressão. O rapaz foi morar na sede, apesar de tudo. Foi procurado um dia que foi visitar a família, por um judeu que era um dos chefes da ganguezinha à qual ele pertencia, dizendo a ele que era uma verdadeira vergonha ele ter se convertido para a religião Católica — a família é protestante — e ter‑se feito batizar no católico, abjurar, batizar lá.

Bem, que era uma outra vergonha ele passar a ser homem casto. E que se ele perseverar nisso, os desta gangue do bairro onde ele mora, uma noite dessas iriam atacar a sede para fazer depredações, como vingança contra a desonra inflingida assim ao bairro.

É nossa luta! É nossa luta! A toda hora enfrentando coisas. E pode acontecer, hein! Meu conselho:

Vão ao delegado, contém o caso e peçam uma especial proteção, uma especial solicitude para qualquer chamado, caso, durante à noite, aconteça alguma coisa. Mas não dêem o nome do judeu. Porque se for à polícia prendem o judeu, e começa uma vendeta depois entre os dois grupos, que não acaba mais.

Porque aí vocês dão pretexto à agressão, é uma vingança contras uma denúncia vil. “Quem não vê que o pobre do judeu estava apenas brincando, mas vê‑se que nós somos uns anti‑semitas implacáveis.” Vinha por aí! Por aí direto!

Ponham trancas e tranquetas em todas as portas e janelas da sede. Quanto ao mais, deixar correr o marfim.

* A dificuldade do Sr. Dr. Plinio para atender todas as consultas e casos que vêm de todos os cantos do mundo

(Sr. Guerreiro: Se começar em todo canto do mundo esse desabrochar assim de entusiasmo, como o senhor fará para dirigir toda a TFP? Ahahah!)

Eu também não sei. Porque já não dá para dirigir.

O Despachinho, você calcule, eu tenho que — além do tempo perdido com o que você sabe — atender séria e fundamentalmente o José Raimundo. A segunda-feira deve ser consagrada a isso. Mas seriamente, porque é todo um mundo, toda uma questão polêmica com os bispos católicos que são do lado da SWAPO.

Um moçambicano que escreve para cá pedindo um apoio e não conseguiu o endereço do José Raimundo na África do Sul e quer um entendimento conosco, não sei mais o quê. Enfim, é toda uma política e toda uma história do José Raimundo.

Bem, tenho que me preparar com gáudios e regozijos para uma conversa séria com o Nelson Fragelli e o Caio, mas várias conversas sérias, vários assuntos para serem levados a fundo.

Mas está para chegar aqui um trio de negros da ilha de Granada, que apelam para a TFP, para defender a ilha, que é uma espinha na Venezuela.

(Sr. Nelson Fragelli: Parece que é um caso muito interessante esse.)

Muito!

(Sr. Fiuza: Foram contatos do Sr. Merizalde?)

É apostolado do Merizalde. E o Merizalde leva em dia toda uma política na América Central, alto bordo.

Bem, está para vir o Mário que traz torrentes de temas. E temos o Brasil continuamente se movendo. A América do Sul e daí para fora. É uma coisa de não se saber como fazer.

Já não dou conta do recado, não sei como fazer!

Eu fiquei muito inspirado pela solução do Mons. Lefebvre… Nomear um superior adjunto.

(Sr. Fernando: Alemão!)

E alemão, é isso! Quem sabe lá, hein! É uma coisa!

Outro dia tive uma conversa com os três padres de Campos, de seis horas consecutivas. Acabou meia-noite e tanto.

(Sr. Nelson Fragelli: O senhor foi jantar pouco antes de uma da manhã.)

É. É assim, não há mãos a medir.

Bom, quem faz tudo é Nossa Senhora. Servis inutiles sumus. Ela realmente quem faz.

* O Sr. Dr. Plinio limpando os cinzeiros da sede da Rua Vieira de Carvalho, para salvar a coesão do Grupo

(Sr. Guerreiro: Agora, isso tudo, penso que dá ao senhor um ânimo redobrado.)

Ah! fora de dúvida! Fora de dúvida!

Eu alcancei o período — bom, eu alcancei todos os períodos —, mas que era problema para nós, já contei aqui, a guerra interna do grupo da Martim e da Pará, a guerra interna dos cinzeiros.

O Fernando fumava à noite e deixava os cinzeiros cheios de tocos de cigarro. E ia embora. E ficava aqueles tocos de cigarro cheirando mal durante todo o dia. Tínhamos uma limpadeira insuficiente e era preciso sacudir, jogar os tocos de cigarro no lixo, à noite, antes de ir embora. Mas o Fernando não se prestava a isso, ele… que a era a única solução razoável.

Então, era preciso que cada noite fizesse um. E quando chegava a noite de um, aquele encrencava. O Pacheco encrencava, aquele outro encrencava, depois saia confusão: “Ó minha noite, é sua noite”, etc… E isto ameaçava trincar o Grupo!

Bem, quando nós mudamos para a Rua Vieira de Carvalho, eu não disse nada, mas aí eu morava embaixo, no quarto andar. Eles saíam, eu não disse nada, comecei eu a jogar fora os tocos de cigarro. A guerra desapareceu, eu salvei a coesão do Grupo.

Você pode imaginar coisa mais deprimente do que um grupo que a gente com o qual a gente começa um “Êxodos” destes, e que pode trincar‑se por causa da guerra dos cigarros?

(…)

* O Sr. Dr. Plinio fazia isso porque via o filão de ouro na alma dos membros do Grupo — Pelo lado prosaico: o medo de ficar sozinho o resto da vida

discernimento dos espíritos, vendo que nessas pessoas — apesar de toda essa miséria — havia um filão, uma coisa que era de ouro. E que valia a pena tudo para salvar esse filão de ouro, porque em toda minha vida eu não tinha encontrado coisa igual.

E aquela tarefa rebarbativa para manter de pé arbustos partidos e acesas as chamas que ainda fumegam, que aquilo ainda era a manutenção de um tesouro sem igual. Com a certeza de que, en aquel entonces, no mundo eu não encontraria coisa igual àquela.

Isso é o lado não prosaico. Põe o lado prosaico. A idéia seguinte:

Se aquele grupo se desfizesse — eu tinha naquele tempo trinta e poucos anos — eu teria uma longa vida, provavelmente, a viver diante de mim, no isolamento mais trágico e mais absoluto que se possa imaginar. Fazendo o papel de um homem marginalizado completamente, sem futuro e sem razão de viver. E para o qual era mil vezes melhor morrer do que arrastar essa vida.

Porque seria isso. Eu não tinha a menor ilusão, a menos que eu quisesse pactuar, começar a falar palavras porcas, fingir que freqüentava casas de tolerância, etc… Mas isso já era me prostituir, já era perder o estado de graça.

Bem, se eu quisesse conservar o estado de graça eu teria que levar esta vida. Com a vergonha do que eu tinha sido. O homem que na sua juventude subiu como um rojão e, de repente, caiu como uma pedra.

Quá, quá, quá, olhe ele lá”.

É o que teria sido.

E o terror desta vida, com um vago pressentimento de que ela seria longa. Eu sentia minha saúde, sentia minha vitalidade, sentia que eu era um relógio com muita corda, me levava a essa convicção.

E, em terceiro lugar, outra reflexão: quando eu não conhecia esse grupo, como eu sentia falta de conhecer gente que pensasse como eu, e como eu, apesar das pequenas misérias, era próximo desta gente tão distante de mim.

* Os problemas de convívio no Grupo cujas origens estão em questõezinhas, acarreta abismos entre as pessoas

Várias vezes, recebendo grafonemas de Paris, Frankfurt, etc., me veio isso ao espírito: se era só deixar um desses rapazes três meses sozinho em Frankfurt, que ele daria tudo para conversar com aquele que ele brigou na véspera. Daria tudo! E quando encontrasse aquele me mandaria um grafonema: “Conheci um brasileiro extraordinário, que autoriza as maiores esperanças, etc…” .

E aqui entre nós, como hoje à noite o Guerreiro não veio, eu faço a vocês uma confidência: indo ao Êremo de Elias, tirando à parte um ou outro camaldulense que há lá, eu vejo que eles vivem isolados um do outro, do modo… a quilômetros. E penso o seguinte: “Se eles se tivessem conhecido ontem, eles moveriam céus e terras para um trazer o outro para dentro do Grupo. E por questõezinhas que eu não sei quais são… eu não entro nessa análise, mas são as questões de Frankfurt, tais quais!

São um pouco as questões do Grupo inicial do Rio e um pouco as questões de Minas. Questõezinhas!

Abrem‑se abismos entre uns e outros que não têm solução.

Não é verdade isso?

(Sr. Nelson Fragelli: Inteiramente!)

E mais engraçado é o seguinte: posta a questão, vamos dizer, por exemplo…

(…)

entramos com um ideal de bom convívio que nós sabemos que fora não existe. Como esse ideal não se realiza, a nossa frustração se desfecha em reivindicações. E não há senão muito poucos que resolvem abaixar a cabeça sempre, ceder sempre, conceder sempre, apanhar sempre e ficar sempre por baixo.

* Para fazer apostolado com os membros do Grupo mais novos, o Sr. Dr. Plinio chegou a habituar-se com o absurdo

(Sr. Poli: Fiquei tocadíssimo com um episódio que o senhor contou numa reunião do MNF, quando o senhor estava fazendo revisão da “RCR” com Dr. Castilho em Campinas.)

Ah! aquilo é verdade!

Eu fui fazer a revisão da “RCR.” Não existia o Êremo de Amparo naquele tempo. E por essas ou aquelas razões eu precisava sair de São Paulo para fazer a revisão, e fomos a Campinas. Havia um hotel razoável lá, fomos lá.

Mas eu tinha que levar comigo alguns da Rua Pará e o bando da enjolradinha da, então, Martim Francisco, porque do contrário, eles ficavam sem centro de gravidade e brigando uns com os outros aqui. Não iam à sede, aquilo se desconjuntava.

Então, ao mesmo tempo eu estava revendo um livro, e nas horas vagas servindo de diversor para o pessoal. E o pessoal da Martim era tão diferente da minha geração que eu fui me habituando aos maiores absurdos.

Em certo momento, eu estava fazendo a revisão com o Castilho e eles por ali borboleteando. O Castilho me disse qualquer coisa desse gênero:

O senhor, porque não muda sua cadeira de cá para lá para não tomar tal vento?

Qualquer coisa assim.

E eu ouvi mal, fui, e pus minha cadeira exatamente dentro do foco dos ventos, uma coisa mais ou menos assim, fiz uma coisa absurda. O Castilho caiu numa gargalhada. Eu disse:

Mas do que você está rindo, Castilho?

Ele disse:

O senhor está se familiarizando de tal maneira com o absurdo, que o senhor já cede sem discutir. O senhor ouviu mal o que eu disse e seguiu um conselho absurdo, porque o senhor foi se pôr onde eu aconselhei para não [se] pôr.

(Sr. Nelson Fragelli: É verdade.)

E era verdade. “É absurdo, vá correndo fazer!”.

(Sr. Poli: Os absurdos que Nossa Senhora tem exigido do senhor! Só do senhor mesmo, porque…)

Mas a questão é a seguinte: nós devemos tolerar‑nos nesses absurdos. A tolerância para o absurdo é uma coisa incrível.

* As afrontas do Pacheco — No fundo queria diminuir o Sr. Dr. Plinio para se sobressair

(Sr. Nelson Fragelli: O senhor nunca contou nada por respeito à pessoa, mas eu soube por uma ou outra pessoa das brutalidades que o Dr. Pacheco fazia com o senhor, desacatos…)

Afrontas!

(Sr. Nelson Fragelli: Isso nos sustenta muito. Sendo o senhor quem é, sofrer essas afrontas, é uma coisa…)

O Pacheco… a coisa é essa:

Um bom tempo antes dele apostatar, por razões que até agora não contei… eu conhecia as razões que o levaram a apostatar e, de pena dele, para ajudá‑lo, eu fechava os olhos com risco para reputação do Grupo. E ele cada vez mais arrogante comigo.

Depois de ter apostatado ele me contou que o desejo dele, enquanto eu o mantinha no Grupo por mera misericórdia, hein!…

(Sr. Fernando: Ele sabia que o senhor sabia?)

Sabia! Conversamos muitas vezes, tentei ajeitá‑lo, arranjá‑lo, endireitá‑lo “n” vezes, em conversas longas. E ele disse depois que a razão daquelas afrontas era de me desconsiderar e de me achincalhar aos olhos do Grupo, para ver se assim ele prevalecia com o prestígio e inteligência dele e me excluía da presidência da TFP.

Nem era TFP naquele tempo. E ele ficava presidente. Ou pelo menos, ficava numa situação de pareado comigo. E que para isso era preciso reduzir‑me ao último da humilhação diante dos outros.

Ele que sabia que bastava um gesto de minha mão, assim… que ele estava liquidado. Então, se levantava, fazia aquelas afrontas, etc., sabia que eu poderia dizer a ele o seguinte:

Pacheco, interrompa e já! e você sabe por que! Saia!

Era uma coisa inenarrável! Depois, ele é homem bem inteligente, o Pacheco. Uma das belas inteligências que eu tenho conhecido, é o Pacheco. Hoje está meio gagá. Mas naquele tempo era, e já era meio gagá.

Uma magnífica inteligência!

Vocês o conheceram pessoalmente, assim, dentro do Grupo? Eduardo muito! Fiúza talvez um pouco. O Poli conheceu. Edwaldo deve se lembrar.

Ele, para ver assim, não se dava valor a ele. Mas quando ele começava a falar, ele não só tinha uma locução muito fácil, mas torrencial, agradável, com termos muito apropriados, muita verve, um jogo de fisionomia muito agradável, um timbre de voz para falar, para expor, admirável! Muito interessante. Era uma pessoa de primeira qualidade! De primeira qualidade!

E ele, como tal, era um ornato para a TFP, mas um ornato! Para a TFP, quer dizer, para aquele grupinho. Mas ele era o contrário do senso político, porque um gênio explosivo, agressivo. Não tinha observação das coisas diplomáticas, fazia disparates, era o contrário.

Vejam a comodidade com que ele queria tomar uma posição de direção que exige tino político de toda ordem, de todo tamanho, todo jeito. Ele ia se instalar ali assim.

E, eu me lembro as últimas reuniões dele, ele empezinho — era baixinho —, bramindo.

Você não conheceu a sede da Vieira de Carvalho, conheceu? Era um auditoriozinho de umas quinze, vinte cadeiras e uma mesa. Eu na mesa e ele bramindo:

Você disse tal coisa, isso não se pode sustentar, isso é um terminologia filosófica imprópria, porque tem isto, tem aquilo, tem aquilo, etc…

E numa das coisas ele tinha razão. Eu disse a ele:

Pacheco, aí você me desculpe, mas foi cansaço.

Ele disse:

Cansaço, hein! Que justificativa! Se você estivesse cansado, não fizesse a reunião!

(Sr. Guerreiro: Nossa Senhora!)

Quer dizer, é você dizer para um burro de carga que acabou vergando, você dá um pontapé no burro e diz: “Você não serve nem para carga, então, vai apanhar!”.

E ele sabia que bastava eu fazer isso… que ele estava pulverizado.

* Após o Pacheco ter apostatado, D. Mayer ainda o recebia na Sede do Reino de Maria — D. Mayer o fez um dos mentores do seminário de Campos

Hoje em dia é dos aderentes do Fedeli. Ah! lefebvrista enragé, aderente do Fedeli, entusiasmado. Fala mal de nós, etc… E o D. Mayer, no último tempo que freqüentou o Grupo, começou receber visita do Pacheco na sede.

(Sr. Guerreiro: Na sede?)

Na sede da Rua Maranhão.

(Sr. Nelson Fragelli: Outra afronta!)

Aí eu disse a D. Mayer:

Vossa Excelência é dono da sede. Sempre foi dono de todas as nossas coisas, dispõe delas como entende, é uma honra para nós tê‑lo aqui. Mas eu queria lhe pedir um favor. Vossa Excelência sabe porque o Pacheco saiu do Grupo. Não me receba o Pacheco aqui, por favor.

(Sr. Nelson Fragelli: Que bonito!)

Ele me disse:

Não, mas eu recebi só muito de passagem, etc..

Eu disse:

D. Mayer, me perdoe, mas se fosse uma vez só eu não diria nada. Mas é a segunda vez. E eu vejo que Vossa Excelência tem relações com ele cada vez mais estreitas. É provável que — ele mora quase em frente — ele a toda hora esteja aqui e Vossa Excelência sabe que nós não podemos ter isso assim.

Ele me disse:

Pois não!

Sem manifestar agastamento. No dia seguinte veio me dizer:

Olha, você sabe, aquela história do Pacheco, eu tenho que dar uma satisfação a você. É que eu vinha entrando aqui no portão e o Pacheco vinha passando, e o porteiro me vendo chegar, abriu o portão…

E as coisas se puseram que engrolou uma coisa qualquer que não era afirmação, mas era insinuação de que o Pacheco insinuava, não… que o Pacheco tinha entrado na frente dele. Eu fiquei com vontade de dizer para ele: “D. Mayer, isso valia para uma vez, quando muito! E mesmo assim Vossa Excelência podia dizer ao Pacheco: ‘Pacheco, quem sabe se vamos conversar em sua casa…´”. Que é ali perto.

E agora convidou o Pacheco para ser um dos mentores da organização do seminário dele em Campos. Há mais, o Padre Olavo estava me contando que o Pacheco vai muito a Campos, que ele está aposentado, não tem o que fazer, não tem ambiente aqui em São Paulo e vai muito a Campos.

Quando ele chega [em] Campos começa a conversar com aqueles padres tradicionalistas, conversas também sem fim. E que solta muita coisa errada em matéria de doutrina, que os padres depois comentam entre si que é errada, mas que querem todos muito bem o Pacheco, colaboram muito bem com o Pacheco.

(Sr. Nelson Fragelli: Se fosse o senhor…)

Caía o mundo em cima de mim!

(Sr. Poli: É bom que ele esteja metido nesse quadro. O senhor tem anzol para revirar a coisa na hora que quiser.)

Quer dizer, pode‑se tirar proveito dessa situação. Mas isso indica bem, serve de subsídio a posteriores, para estudo do tempo que o Pacheco estava no Grupo, que D. Mayer, etc., para se compreender esta mentalidade.

* O discernimento dos espíritos não é inquisitorial, não vê só os defeitos, mas vê também a ação da graça nas almas, animando a fazer apostolado com elas

(Sr. Nelson Fragelli: Tem certas coisas na vida do senhor, que no bom sentido, são incompreensíveis. Por exemplo, isso tudo pelo que o senhor passou: muito moço, subiu muito…)

Caí vergonhosamente!

(Todos: Não!)

Aos olhos do público. O público achou uma vergonha. Em si não é. Honrosamente.

(Sr. Nelson Fragelli: Honrosamente. E aí o senhor portador de uma certeza, de um modo de ser, de uma via na situação atual da Santa Igreja. E na medida em que o senhor vai transmitindo o que é, este grupo parece se esfacelar.)

É isso, tal qual!

(Sr. Nelson Fragelli: Isso como provação para o senhor, é incompreensível como o senhor pode ter vencido, como pode ter perseverado com tudo que desaba, ou que parece desabar.)

Aqui vem o auxílio do discernimento dos espíritos. Porque em geral esse discernimento dos espíritos é interpretado no Grupo como discernimento dos defeitos. Entra isso, mas não é só. É também discernimento da obra do Espírito Santo, da graça, naquela alma que tem defeitos. E, portanto, o lado positivo.

E é esse discernimento dos espíritos que me animava. Porque eu continuava a ver a mão de Deus ali. Senão, eu não agüentaria.

(Sr. Nelson Fragelli: Muitas vezes eu penso que — o senhor já disse várias vezes que não é —, o senhor manteve uma Fé tão acesa, dentro de circunstâncias tão adversas, que eu diria, só mesmo um homem tendo uma visão poderia se manter. Porque do contrário, não se…)

É bem verdade! Nunca tive essa visão. Mas esse discernimento dos espíritos como ele é, que é de olhar dentro da pessoa e ver o filão áureo ali dentro, com a precisão com que eu vejo o nariz, porque essa é a questão! Aí vem uma coisa que não é uma visão, mas é um auxílio sobrenatural, eu vejo que é.

Aliás, isso mostra bem como esse discernimento não é o discernimento inquisitorial dos defeitos apenas, mas é o discernimento do que tem de bom. De onde a espera, de onde o afeto, de onde a paciência, de onde a segurança. Porque vejo a mão de Deus ali.

(Sr. Poli: Uma luz fantástica no meio do mundo da Revolução, de não se saber o que dizer.)

* A natureza do Sr. Dr. Plinio inclinava-o a ser um homem mole, desinteressado por outras pessoas e gozador da vida — Para cumprir a sua vocação, teve que revirar-se completamente, adquirindo qualidades que não tinha

Nós estamos numa noite de reminiscências, eu receio que não seja bem exatamente o que vocês quereriam.

(Sr. –: Está magnífico!)

Eu peço reserva, mas desses desencontros houve um que eu nunca falei…

(Sr. –: Pode gravar?)

Pode, mas não para espalhar para os grupos todos, é só para camaldulenses. Luizinho, circuito fechado.

Mas houve um que eu nunca falei, mas é de cair de costas.

Eu já disse que eu, por natureza, sou o mais mole dos homens, um verdadeiro pirão de batatas. Essa moleza se conjuga com outros defeitos, porque além disso entra — em relação a quem não é eu, não por sentimento de superioridade, não é isso, mas é por alteridade — uma displicência para com os outros e um desinteresse para com os outros, total!

Quer achar tal coisa de mim, vá às favas! Eu faço o que eu quero! Se você não gostar, você não gostou…”. [Vira a fita]

diretamente o contrário.

(Sr. Guerreiro: Problema de enfrentar o respeito humano não era…)

Nem isto. Você vai ver depois o resto, é uma coisa incrível. Minha idéia era a seguinte: nem me comparar, porque o comparar supõe um certo interesse pelo outro.

Mas o próprio dos moles é um desinteresse pelos outros, que não dá vontade de ser mais nem dá vergonha de ser menos. “Eu sou outro, arranje como quiser! eu vou tocar minha vida!”.

Em parte minha placidez vem daí: “É? Deixa ser, vou tocar o marfim”.

Junto com isso, é próprio dos moles, uma tendência a ver tudo en rose e achar que tudo vai correr bem. Mas que se não correr, ainda vale a pena ver en rose, porque somado o sofrimento das decepções, é menor do que o sofrimento das apreensões. [Risos]

Estou escandalizando vocês, mas eu estou dando a coisa como é.

E uma tendência, por aí, para o imediato. Eu não oculto. Portanto, para o deleite dos sentidos como sendo a realidade da vida. O que era muito de minha geração.

Então, por exemplo, comer bem, beber bem, dar gargalhadas, fazer viagens à Europa em navios palácios, etc., é o sentido da vida. Não tem outro. “Eu gozei, vivi! Se não gozei, não vivi! E o resto não me interessa!”.

Agora, para dar um homem que cumprisse a minha vocação eu tive que me revirar e dar um homem razoável, empenhado nos outros, planejador, fazendo as coisas, previdente, etc… Eu tive que me revirar completamente, e adquirir uma série de qualidades que eram o oposto de meus defeitos capitais.

Uma, duas ou três, ou quatro vezes na vida, eu julguei que eu tinha adquirido vitórias tão significativas que era o patamar definitivo. Logo depois vinha a Providência me pedindo uma virtude nova que era o contrário harmônico da virtude que eu tinha adquirido.

E que era, na linha da virtude, parecida com o defeito ao qual eu tinha renunciado. De maneira que é uma espécie de gesticulação em sentido oposto, que você não faz idéia o dolorido que tem.

* Com atos de piedade declarados diante da sociedade paulista, o Sr. Dr. Plinio arruinou sua reputação

Por exemplo, eu faço uma série de renúncias, porque em determinado momento o respeito humano colou em mim. Eu tinha idéia, essa idéia eu tive sempre…

(…)

Vindita! In concreto constituída pela pequena burguesia, contra a classe que eu queria salvar e perseverar, preservar, ou… eu exprimo bem o trocado do negócio?

É medonho! Ou eu fazia isto, ou não tinha caminho para mim. Fiz.

Eu contei já a vocês que eu cheguei a fazer isso: a Igreja de Santa Cecília era uma Igreja muito freqüentada por gente da sociedade naquele tempo.

Na missa das 11, que era a missa elegante, eu fazer a Via Sacra, durante a missa, para todo mundo me ver fazendo Via Sacra, que era uma atitude de carola, e que eu arrebentava com minha reputação e punha aqui “homossexual” ou “impotente”, na testa, um letreiro.

Depois ir me ajoelhar junto a um grã-fino que estava assistindo a missa — vocês sabem como —, ir me ajoelhar — conhecido meu, colega —, puxar um tercinho azul claro e começar a rezar diante dele. E ele dar uma gargalhada assim… e ficar quieto. Quer dizer, estraçalhei! Estraçalhei!

Bom, quando eu transpus o “Cabo da Boa Esperança”, fiz isso, eu me lembro de mim mesmo rezando no Coração de Jesus, diante da imagem de Nossa Senhora Auxiliadora — sempre a imagem de Nossa Senhora Auxiliadora — alegrando‑me com o caminho percorrido, mas sentindo de outro lado a expatriação medonha em que eu estava.

E pensando o seguinte: “Bem, agora chegou a hora de pelo menos eu, nessa luta em que entrei, desdobrar as qualidades de combatividade, de agilidade, de raciocínio, tal ou qual folga de vocabulário, que eu já adquiri. E de lutar de peito aberto, com as energias que eu tenho, com os predicados que eu tenho, eu posso tentar qualquer coisa de sério contra os adversários de Nossa Senhora. E rezando para Ela”.

* As tentações contra a Fé e a ajuda de Nossa Senhora

Estoura em mim uma espécie de impressões ilusórias, de tentação contra a Fé, durante seis meses, em que eu me vi praticamente, subjetivamente, expulso da Igreja, que era a única coisa que eu queria, era a Igreja.

Mas uma coisa que eu nunca pensei que houvesse tentações em minha vida. Uma coisa em que todas as qualidades adquiridas não valiam nada! E nada era nada!

Bem, me ponho a rezar muito mais. Eu rezei enormemente nesse período. Foi‑me muito proveitoso, debaixo do ponto de vista da vida espiritual, mas era mais uma reviravolta, era uma lição da energia. Eu tinha adquirido tanta energia. Tudo isso não ia sem energia. “Está bom, fique sabendo que sem o auxílio especial da graça, sua energia não lhe vale nada! Nossa Senhora lhe entrega uma tentação qualquer do demônio, você fica arrebatado pelo pior”.

Então, a verdade simétrica com a idéia de força de vontade. Era preciso levar ao último ponto.

* O ataque dos membros da Congregação Mariana ao Sr. Dr. Plinio

Bom, passa esse período, eu me instalo dentro da Congregação Mariana. E naqueles pequenos burgueses começa um ataque deles a mim, porque eu sou um grã-fino, aristocrata e que não me fundo com eles.

Grã-fino nunca fui, mas na ótica deles era um grã-fino. Que eu tinha, portanto, maneiras, modos de ser… e vinha insinuado o seguinte:

Nós nos convidamos uns aos outros, para as casas uns dos outros. E na casa da Da. Gabriela nenhum de nós pisa. Nem encontramos jeito de convidar, o Plinio, para nossas casas”. Era o que vinha insinuado.

Junto com uma fama de pretensioso, das Filhas de Maria, porque eu não pensava em me casar com nenhuma delas. Então, eu que deveria sustentar os privilégios e direitos da…

(…)

* Os ziguezagues simultâneos são úteis para a formação da plasticidade

enquanto ainda estava no auge de minha carreira de deputado, crash na minha família. O dinheiro que minha avó tinha e que era o que mamãe devia herdar para viver comodamente, dignamente, viver como vivia aqui, esse dinheiro desaparece.

E eu sentindo um apelo vivíssimo para consagrar minha vida ao apostolado, vendo diante de mim um futuro profissional, para evitar de entregar mamãe para um asilo de velhos aí, qualquer. Porque ninguém, exceto eu, ajudaria.

Onde ganhar dinheiro? Começa a batalha da confiança na Providência. O homem dos planos e das previsões passa a ser o homem para viver o jour le jour na incerteza. E lá vai daí para frente, num ziguezague sem fim, sem fim. Que é o pendant do ziguezague do apostolado, é o ziguezague na vida interior.

Depois ziguezague simultâneos formam um conjunto muito vantajoso para a formação da plasticidade. E lá vai daí para frente!

* “Se alguém me tivesse dito que eu ia sofrer isso, eu me desencorajaria — Se Nossa Senhora fez assim com ele, não fará coisas dessas comigo? Eu terei coragem de suportar?”

Moral da fábula, mesmo porque já está ficando tarde:

Se alguém me tivesse dito que eu ia sofrer tudo isso, eu me desencorajaria. E em cada etapa que eu seguia eu tinha pensado em arranjar uma solução e respirava. Vinha outra. Eu dou graças a Nossa Senhora de não ter visto de antemão, porque para cada etapa vinha uma graça especial. E se eu procurasse imaginar minha resistência antes de vir aquela etapa, eu fracassaria, não teria coragem de enfrentar.

Mas assim como para os mártires vinha a coragem do martírio, para mim vinha a coragem diante daquela circunstância.

Então, de um lado eu conto isso a vocês, porque o Nelson acaba de me dizer que anima. De outro lado… eu digo especialmente o Nelson, porque de vocês todos é com quem estou menos, e é natural que eu queira aproveitar a conversa mais para utilidade dele do que dos outros. Isso é um lado da questão.

Agora, outro lado é vocês fazerem a pergunta seguinte: “Se Nossa Senhora fez assim com ele, não fará coisas dessas comigo? Eu terei coragem de suportar?”.

É uma pergunta que vem forçosamente.

E a resposta é uma resposta rigorosamente teológica, e é a seguinte:

Para o que Ela pedir, quando Ela pedir, dará coragem. Antes disso não dará e, portanto, não preveja. E eu acabo fazendo um elogio da santa imprevidência.

(Sr. Guerreiro: Mas cheia de razoabilidade.)

É cheia de razoabilidade.

(Sr. Guerreiro: Cheia de razões.)

Cheia de razões.

* “Os caminhos mais revirados, inopinados e malucos, estes caminhos são o arquicaminho do homem de bom senso”

Mas para dizer só mais uma palavrinha, considerem o seguinte: se eu tivesse contado isto a vocês há cinco anos atrás, vocês talvez não agüentassem. Hoje agüentam a perspectiva, porque vai chegando a Bagarre e vocês vão sendo postos ao lado do muro.

E é natural, vai haver coisas, vocês todos, vai haver coisas… E havendo coisas é preciso que vocês tomem bem a idéia: os caminhos mais revirados, inopinados e malucos, estes caminhos são o arquicaminho do homem de bom senso. E a Providência leva por lá.

Nenhum de nós vai repetir a vida do outro. Todas as vidas são diferentes para a glória de Nossa Senhora. Eu não quero dizer que vai acontecer com vocês isso, vai acontecer outras coisas, de outro modo, vocês têm outras almas, com outros feitios.

Mas vão acontecer coisas de cozinhar! Em cada momento vocês terão a graça necessária, ainda que tenham a impressão que não têm, e vocês vão exclamar: Eli, Eli, lamma sabacthani.

* “Saiam daqui esperando que vocês vão ter a graça, como eu tive”

Mas dão o passo. Depois perceberão que tinham a graça e por isso fizeram. Mas tudo redunda da graça. Resulta, quero dizer, da graça, cuja intercessora é Nossa Senhora. Porque não dizer… e os intercessores secundários que Ela escolhe. Essa é a doutrina Católica.

Então, não saiam daqui se perguntando se agüentariam o que eu agüentei. Saiam daqui esperando que vocês vão ter a graça, como eu tive.

Porque eu caprichei nesses dados biográficos, mostrando bem de que lama eu saí. Depois uma coisa espantosa, porque quem olha minhas fotografias de menino.. eu discirno em mim a vocação, o “Thau”, tudo aquilo que está na Oração da Restauração, eu discirno em mim. Entretanto, havia tudo aquilo que eu acabo de contar, lado a lado, misturado. Esses somos nós!

E Nossa Senhora nos conduz, passo a passo, para outras coisas.

* “Eu estou certo de que, se eu não tivesse sofrido essa imensidade, eu não teria feito bem a vocês — E que se vocês não sofrerem muito também não farão bem nenhum”

(Sr. Nelson Fragelli: O senhor venceu tudo isso, mas o senhor…)

Vou vencendo. Venceu se dirá quando eu morrer.

(Sr. Nelson Fragelli: Mas o senhor também adquiriu o poder de vencer isso em seus filhos, porque comigo, essas dificuldades foi o senhor que discerniu, foi o senhor que ajudou, foi pelo senhor que veio a graça. É a minha vida de Grupo. E nesse ponto o senhor, como em tudo, é muito luciliano. Quer dizer, o senhor adquiriu a paternidade sobre tantos filhos, e conduzi‑los, levá‑los, porque de fato é assim.)

Eu estou certo de que, se eu não tivesse sofrido essa imensidade, eu não teria feito bem a vocês. E que se vocês não sofrerem muito também não farão bem nenhum.

Sine sanguinis [fusione] non fit remissio. Quem não sofre, não compra almas.

(Sr. Nelson Fragelli: Nem compreenderemos o que o senhor nos dirá.)

Não. Nada, nada! Pelo contrário, começa a avenida dos “nós”.

Não, tal coisa, não, porque não sei o quê…” lá vai a história mar alto. É por causa disso!

Bem, meus caros, falei como uma torrente.

(Todos -: Muito obrigado!)

Vamos rezar a Oração da Restauração que costumamos rezar aos sábados à noite.

Há momentos minha Mãe…

Ave Maria, Filia… Ave Maria, Mater… Ave Maria, Sponsa…

Mater Boni Consilii a Genazzano…

Nossa Senhora do Bom Sucesso…

Meus caros, Nossa Senhora os ajude! e dê toda espécie de graças!

(Sr. Poli: Foi a noite da misericórdia.)

Enfim, foi o que Nossa Senhora [deu].

Vamos andando!

*_*_*_*_*