Conversa de Sábado à Noite – 15/5/1982 [RSN031] – p. 6 de 6

Conversa de Sábado à Noite — 15/5/1982 [RSN031]

* A propósito dela, na consideração dela, pelas orações dela, a Senhora Dona Lucilia nos obtém uma graça germinativa de nossa troca de vontades com o Senhor Doutor Plinio

Sobreviver é alguma coisa hoje em dia. Em segundo lugar, somos passageiros do mesmo navio, da mesma caravela.

(Sr. –: Havia uma aparente divergência aqui, mas era mais uma questão de forma do que de princípio. Nós estávamos falando sobre a devoção à D. Lucilia, como a coisa ia se processando até o final, que seria troca de vontades com o senhor. Um das partes diria o seguinte: que é preciso primeiro haver um despojamento do contato — tudo isto com a ajuda dela, evidentemente. Mas uma etapa… [ilegível ] …sorte e despojamento do contexto. Uma coisa até certo ponto formas e… [ilegível].)

Mais ainda: declarada ao próprio contexto, tanto quanto possível. A partir daí a pessoa alçaria um outro vôo, e então seria possível se chegar a esse termo final.

(Sr. –: Outra parte pensa de outro modo. Numa das reuniões aqui o senhor disse que o mundo revolucionário de tal maneira impregnou os ambientes e tudo, que estabeleceu com o homem moderno uma troca de vontade com Nossa Senhora; que necessariamente teria que haver essa troca de vontade para o Reino de Maria. a devoção a D. Lucilia era de molde a introduzir a pessoa, quem é devoto dela já fica introduzido numa clave em que se dá um início de uma troca de vontades.)

Em termos mais precisos, ela obtém uma graça germinativa da troca de vontade. Essa graça é a propósito dela, na consideração dela, pelas orações dela.

(Sr. –: Não haveria divergência entre a questão proposta pelo Sr. séria a respeito do rompimento do contexto e a que é proposta por mim, mas me parece que são duas coisas justapostas e que vão mais junto. Da minha parte eu gostaria muito que o senhor desenvolvesse essa devoção a D. Lucilia que já dá no início da troca de vontade. Dr. Márcio gostaria que o senhor falasse sobre o rompimento do contexto, como uma etapa necessária etc.)

* Para não sermos devorados pela força de contágio do contexto no mundo moderno, é necessário medir com severidade e precisão tudo quanto há de revolucionário em torno de nós



São aspectos bem distintos do mesmo tema. Eu posso tentar tratar um pouquinho de cada.

No que diz respeito ao afastamento do contexto, propriamente o mundo de hoje não seria o que ele é, ele não estaria faciado [?] à Bagarre, se ele não fosse tal que não [permitisse] a formação ou a subsistência de nenhum contexto que esteja em [ilegível] com ele que seja bom. Ele envenena todos os contextos à maneira dele. O que é um contexto? Um contexto será uma nação, por exemplo. Ou uma área de civilização, se você quiser. Quer dizer, várias nações vivendo de uma mesma vida comum cultural e espiritual etc. seria um contexto. Esse contexto é de um tal tipo que os contextos maiores exprimem e liquidam os contextos menores e torna impossível que os contextos menores continuem [ilegível].

Dou um exemplo grosseiro. Tomem [ilegível] minha [ilegível] da Europa, Portugal, Holanda, Suíça etc. Imaginem que, por uma preservação qualquer mais estável, algum desses países tivesse vontade de ficar vivendo no seu velho continente [?]. Eles, estando ligados à civilização moderna, não é possível. Ele só tinha um jeito: romper o contexto. Porque, tendo uma relação contextual com o mundo moderno, o mundo moderno é tal que uma relação contextual com o mundo moderno, o mundo moderno é tal que esmigalha isso e quebra.

Aquele povo, as [ilegível], do reino, ou melhor, do principado do Nepal, na medida em que as inseriam na civilização moderna, esse espírito deles desaparece. Eles só têm esse espírito porque vivem entre si, e por algumas razões não se encaixaram no contexto do mundo moderno. Mas o mundo moderno padece de uma doença que de tal forma o toma dos pés à cabeça, que quem toma qualquer nexo com o contexto geral dele, desaparece.

Isso que se dá no mundo moderno com um grande contexto. Porque, comparada com um indivíduo, mesmo uma nação pequena é um grande contexto. Para os suíços, por exemplo, a Suíça é um grande contexto: um país inteiro com território, riquezas, cidade etc. Esse contexto se compõe de contextos menores: são cidades; nas cidades, famílias.

Tudo isso, de alto a baixo, é meticulosamente pulverizado, de maneira tal que, ou se coloca na nossa posição, ou é liquidado. E a nossa posição é de tomar uma posição oficial de ruptura com o contexto. Isso que é externamente, é sobretudo internamente. Porque esse contexto é tão contagioso, que pode ser que o indivíduo se baldeie para nossa posição e comece a viver na nossa posição ….[?] no contexto fora, de tal maneira é contagioso.

Ainda agora tivemos soberbamente declamado no auditório o Livro dos Macabeus, que explicava aquele episódio muito conhecido da revolta dos Macabeus. O fato é que a pessoa precisa internamente [ter] compreendido que esse contexto tem um princípio unitário que faz dele a fonte de todo o mal, e que a gente tendo uma ligação contextual com qualquer das parcelas desses contextos, ele nos devora.

O que é essa reação contextual externamente? E internamente? Internamente é ter medido com severidade e com precisão tudo quanto há de revolucionário no contexto de cada um de nós. De maneira que, com implacável, inflexível severidade, nós tenhamos contexto [?], pesado e medido todos os outros. Porque um pouco do outro em que a gente não veja uma coisa revolucionária, e que por isso tome com engraçadinho, como bonita, como imponente, como o que quiser, o contexto nos penetra inteiro. Não há meio bom possível. Depois, tanto quanto possível, é preciso que o contexto existe [?] que estamos com oposição a ele; que nesse ponto, naquele e naquele outro estamos em oposição a ele. Porque do contrário se reconstitui uma conivência nossa com aquilo.

*Desde que uma alma queira mesmo, a Senhora Dona Lucilia faz, de repente, com grande suavidade, facilidade e bondade, a dificílima operação de romper com o contexto

O que eu tenho visto em relação a mamãe é que isto, que é uma operação dificílima e de arrancar berros, ela faz como uma gota que cai; e que, com grande suavidade, com grande facilidade, de um momento para outro, começa a germinar na pessoa uma coisa assim. E que essa germinação tem isto de próprio: que ela pode exigir muito sofrimento, mas se faz com suavidade. O aspecto de cirurgia desaparece e se faz com a bondade dela, desde que a alma queira mesmo. A devoção a ela, nesse sentido, é um convite para isso.

Vou dar um exemplo. Eu creio que o que definimos por contexto no fundo é de maneira tal que tem um certo caráter de troca de vontade. Quando as pessoas pertencem ao nosso contexto, no plano natural, não no sobrenatural, opera-se uma espécie de fusão das vontades, que é uma troca de vontade não a favor deste, daquele ou daquele outro, mas do ente comum chamado contexto. Podia não ser assim, mas nos dias de hoje é assim.

(Sr. –: Isto, em si, não é mau?)

Em si, quando não é mau, tem outras características, porque aqui é uma servidão.

(Sr. –: Mas pode haver uma união muito grande?)

Exatamente, que é diferente desta. Tome, por exemplo, um defeito que eu acho que é dos que penetram mais fundamente no homem: a preguiça. Os modos de ser da preguiça no homem são inenarráveis. Moleza, preguiça formam uma só família. Em geral, todo contexto tem uma forma de preguiça que penetra de tal maneira em todos os que são do contexto que é uma espécie de troca de vontade. E, às vezes, certas formas de decadência de uma país, de uma família não são senão a inabitação, profunda e a maneira de troca de vontade, do demônio da preguiça em todos. Por mais trágicos que sejam os efeitos, não abandonam isso. Vão até o fim levados por isto. O que é como se fosse uma vontade que penetra neles e que se substitui à verdadeira vontade deles. A gente não rompe com o mundo da Revolução, ou seja, com o contexto, importa nisso [?]. Tanto mais importa nessa espécie de troca de vontade com a Revolução, que é coisa má

Há uma porção de coisinhas que eu tenho observado ao longo da vida e que exprimem a realidade desse fenômeno. Por exemplo, locais de trabalho. Os locais de trabalho onde as coisas vão para a frente criam um espécie de contexto próprio. Um banco, por exemplo. O modo de trabalhar, o modo de viver, tudo do banco penetra naqueles. O modo de se divertir, até o modo do funcionário solteiro escolher a funcionária solteira com quem vai se casar são critérios que são vigentes como uma vontade coletiva despótica sobre cada um dentro do banco.

(Sr. –: O homem de Andareon.)

O homem de Andareon [?] é inteiramente assim. E nós, se não somos homens de Andareon. Somos homens de outras coisas. Mas todo mundo, ou é homem de alguém, ou é porque rompeu com a Revolução. É terrível isto!

Eu volto a dizer, com ela dá-se que, de repente, a pessoa sente que uma admiração, uma suavidade passam a viver, que alguns vínculos internos que eram reputados invencíveis caem no chão, deixam de ter significação, que a gente se sente atraído por outro lado. E é um processo. Mas se a gente for olhar esse processo, é uma união de vontade com ela que se faz. Mas é uma união de vontade que desloca nosso pólo para uma outra coisa. É preciso romper com o pólo antigo. Por exemplo, não é possível o indivíduo deixar de ser um homem de Andareon fingindo, para os companheiros de banco, que não é. Não sei se isto lhes sugere alguma pergunta.

(Sr. –: Tudo isto está muito bem, mas seria uma condição [ilegível…] esse despojamento, esse…)

Sim. Agora, muitas vezes isso nos é dado de um jato só. Às vezes recebemos uma graça, depois outra, depois outra.

(Sr. –: Já é dado por D. Lucilia como um resgate do contexto e em ordem e já um passo em ordem à troca de vontade.)

Já é um comecinho de troca de vontade. Quer dizer, a abolição de vontade usurpadora que estava lá e a restituição à pessoa de liberdade de escolher o para onde a graça está chamando.

(Sr. –: Isto é uma graça fenomenal.)

Tanto mais que ela não é o ponto terminal, mas eu acredito bem que isto seja uma troca de vontades com Nossa Senhora; em Nossa Senhora, com Nosso Senhor Jesus Cristo.

(Sr. –: Tudo isto está muito bom, muito claro, muito lógico, mas parece … muito rico e que o senhor está dizendo pouco.)

Não. O que falta? É muito rico, mas o que você quiser saber, pergunte.

(Sr. –: Eu não sei perguntar.)

(Sr. –: Se ele sente que está faltando qualquer coisa, é porque ele tem uma ou duas perguntas no fundo da cabeça.)

Está claro. Pergunte que eu respondo o que eu souber, com muito gosto.

(Sr. - Isto é tão profundo, que tem que bater, tem que chegar até a inocência. É uma mudança total na alma.)

Muito mais do que uma conversão do modelo clássico. Vamos dizer, por exemplo, um guricha do Nepal que se convertesse faria um itinerário menor do que muitos desses que se convertem. Quer dizer, é uma coisa fabulosa!

(Sr. –: Mas não é qualquer inocência.)

Não. Precisa ser uma grande inocência.

(Sr. –: A inocência correspondente à vocação.)

Correspondente à vocação, isto é fora de dúvida.

* Perceber pelo discernimento dos espíritos a beleza de uma alma… traz um gáudio que faz ver a frustração dessa vida, muda a mentalidade e prepara a troca de vontades

(Sr. –: Antes de vir para cá, eu passei no São Bento. Pensei que o Sr. João Clá estivesse lá e pensei conversar um pouco com ele, mas ele não estava. Mas eu entrei e estava olhando o prédio, todo o ambiente, tudo aquilo. E há pouco o senhor falava que toda organização tem um espírito que, no fundo, aqueles que pertencem à organização são modelados por aquele espírito. De um modo, a Revolução; de outro modo, seria a Contra-revolução. E vendo o São Bento, a gente percebe que ali, em todas as coisas que estão lá no prédio, em tudo, desde que se entra, sente-se que em cada coisa há a Contra-revolução presente. Nos planos do senhor para exprimir essa troca de vontade que ali a gente sente, qual seria o plano do senhor para levar aquilo a um apogeu cada vez maior?)

No MNF, exatamente esta semana vimos este ponto. Há uma certa atitude da alma humana diante do pulchrum que leva a ver um certo pulchrum, e esse pulchrum muda completamente a mentalidade humana, e parece que abre, no nosso caso concreto, enormemente, para a troca de vontade. O que é esse pulchrum? Como ele é? É difícil dizer. Na reunião do MNF isto vem largamente exposto. Vale a pena você pegar lá. Você lê habitualmente as reuniões do MNF?

(Sr. –: Sem habitualidade, mas leio algumas.)

Eu gostaria que fosse habitualidade.

(Sr. –: A devoção à Sra. D. Lucilia deveria ser indício, então, para nós da troca de vontade, obedecendo aos escalões sucessivos, cujo último escalão seria Nosso Senhor Jesus Cristo. Então, quais são as características dessa devoção para que ela dê isso? Como São Luís tem o tratado da devoção, e ela apresenta devoções boas, devoções certas e devoções erradas, quais são as características de devoção boa que dá na troca de vontade, e qual é a devoção que tem que ser retificada?)

A forma de devoção que estaria muito ligada a isto seria exatamente um zelo, um interesse especial pelo pulchrum, mas analisado assim. O pulchrum não propriamente como uma coisa estética, artística, mas um estado de alma, que tem certa beleza. Quando o estado de alma atua coletivamente sobre os membros de um grupo, daí tem esse pulchrum. Hoje eu estava vendo o Alardo em Jasna Gora. Uma pessoa pode estar de acordo com tudo quanto se proclama no Alardo, e eu estou certo que todos ali estão. Mas não lhe é dado ser dos elementos principais do Alardo. Porquê? [?]………… Mas se a pessoa assistir o Alardo com humildade, aquilo pode entrar nela e acender outra etapa da vida espiritual.

(Sr. –: Esta ruptura com o contexto tem que dar nessa atração pelo pulchrum? Uma vez que ocorre uma coisa, tem que ocorrer a outra. Este movimento atração da alma pelo pulchrum, como a coisa se dá propriamente?)

É uma certa beleza de alma que, pelo princípio de discernimento dos espíritos, você percebe a propósito de uma outra, o mais das vezes. Então, dá tanto gáudio que você percebe num olhar só a frustração da vida. Às vezes o demônio entra nisso tirando do indivíduo a percepção da frustração da vida.

(Sr. –: Na linha do que foi tratado, da troca de vontade, do rompimento com o contexto, de que se a pessoa tiver um pouquinho de ligação com o contexto, esse pouco acaba absorvendo inteiramente e fazendo dele um revolucionário. No sentido oposto, o que o senhor acha que seria necessário para o contexto bom expulsar o contexto mau? Porque via ter que haver a luta. Existe o contexto bom, representado, vivido numa parcela, enfim, de uma alma católica, de um varão católico. Para isto se formar um contexto e vencer o outro, o que estaria faltando na alma desse varão para formar um contexto e esse contexto se desenvolver e afugentar o outro, ou vindo a Bagarre etc. Para dar uma guerra mesmo. Porque no fundo a gente vê que vai ser a guerra dos contextos.)

Esse contexto tem que ser simétrico com o outro. Ou senão, ao menos na frente, ele tem que ser um ambiente — porque o outro não [?] é um ambiente; do lado de cá é um ambiente também [?] — que de um modo ora implícito, ora explícito, abarque, na mentalidade que ele dá, todos os campos da ordem do universo. Porque do outro lado abarca. Com algumas notas salientes que marcam essa noção da ordem do universo, especialmente nos pontos. Como também do outro lado. E que isso seja amado por nós, como o mal deles é amado por eles. Uma vez que eles penetram em alguns elementos fundamentais desse contexto deles, eles não admitem transigência, nem nada; é ali. Nós devemos fazer a mesma coisa.[Verificar bem todo esse parágrafo]

* A era da prudência está acabando: dentro de alguns anos, poderemos usar permanentemente o hábito e, assim, estouraremos com o contexto de maneira fabulosa

(Sr. –: Nisto até que ponto deve entrar a prudência, porque na geração nossa se aprendeu muito que se tinha que ter prudência com isso, com aquilo, com aquilo outro; e que na geração dos enjolras não há essa prudência e não há desastre. Na linha regras do jogo.)

Na ordem prática das coisas, eu acho que a era da prudência para nós está acabando, e que está chegando o momento de pôr tudo em pratos limpos. Nós mantínhamos uma certa prudência para não afastar demais de nós certos elementos, vamos dizer, moderados, com cuja apoio contávamos para nossos investimentos, ou melhor, nossas investidas; e que as coisas estão tomando um tal caráter que nós, daqui a pouco, não contamos mais com essa gente, e podemos dar investida a pontapé etc. E aí será preciso dizer. Não tenho nenhum arrepio em imaginar que dentro de alguns anos — se Deus nos infligir ainda alguns anos nesta ordem de coisas — também estaremos usando o hábito por aí. E com o uso do hábito e o [ilegível] bem estudado, a gente proclama mais do que com cem outras coisas. E que se possa, de fato, romper com o contexto.

(Sr. –: Já não se pode explorar mais um pouco o uso do hábito, atualmente?)

A coisa está assim num ponto. Eu acho que, se Nossa Senhora nos der a graça de fazer mais uma ou talvez duas campanhas grandes do tipo desta da Mensagem, a coisa fica madura para a gente sair de hábito. Mas sair de hábito para ir visitar a Europa, os Estados Unidos, para ir a um museu, para ir a um barbeiro. Usar permanentemente o hábito. Vocês sabem o estouro, no contexto, que uma coisa dessas seria! Uma coisa fabulosa! Exigiria que a pessoa com quem nós tratássemos notasse que não temos mais a mínima complacência para com o contexto dele, porque do contrário eles criavam as mesmas situações de novo.

(Sr. –: Aí era a operação Matatias mesmo.)

Matatias. E tocar mesmo a conversa.

(Sr. –: Não sei se foi dito na proclamação, mas a primeira coisa que os Macabeus fizeram foi fazer o expurgo dos que tinham pactuados com os gregos.)

Foi. E por isso seria preciso que houvesse uma regra de tratar os de contexto que eles compreendessem ou, pelo menos, fazer um jeito tal que é nosso e pertence ao contexto, viva viajando.[Verificar bem todo esse parágrafo]





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Alagoas, 1º Andar