Conversa de Sábado à Noite (Alagoas, 1º andar) – 9/6/1979 – Sábado [AC I - 386-387] – p. 13 de 13

Conversa de Sábado à Noite (Alagoas, 1º andar) — 9/6/1979 — Sábado [AC I - 386-387]

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A TFP seria muito esplendorosa se não tivesse nada do espírito tíbio * No fundo é um não querer ser sério * A seriedade de nosso Pai e Senhor na escolha do estilo de vida que adotou: ser um bom católico pequeno-burguês, ou lutar e servir Nossa Senhora na batalha contra o mal * Uma concepção meio primitiva da conversão na Bagarre * A pessoa mudar de mentalidade colocada nas aflições da Bagarre significa um certo esforço, uma certa acuidade de análise de vista para ver e entender o que está se passando * A integridade no considerar a problemática, escarafunchar cada ponto e dar uma solução adequada específica, faz parte do dever profissional * As observações radicais e improváveis fazem parte do modo de ser do amor * O conjunto de fatos e elucubrações que constituem a nossa história foram constituídos com um acerto e coroados com uma série de sucessos, mesmo dentro do revés, que não são normais * As Reunião de Recortes não fazem ver os cegos, mas fá-los andar desembaraçadamente * Outros exemplos da vida da TFP que mostram que a não-ruína total é tão contra a ordem comum das coisas, que tem o aspecto de um milagre discreto quando se vê o conjunto * “Nossa Senhora colocou dentro do meu thau virtualidade muito maiores do que as agora se exercem” * Cabe perguntar qual a hora em que Nossa Senhora solta as legiões de anjos arregimentadas para um determinado acontecimento — Enquanto não chega essa hora, ir empregando os métodos correntes

(Sr. João Clá: [Lê a parte da profecia de Nossa Senhora do Bom Sucesso em que fala do “Varão muito amado” e da “balança do santuário”].)

* Levantando hipóteses para a augusta e lindíssima expressão “a balança do santuário” proferida por Nossa Senhora do Bom Sucesso

A expressão “a balança do santuário” é uma expressão augusta e lindíssima.

O que é a balança do santuário?

Vê‑se que é uma balança na qual as coisas estão pesadas na presença de Deus. Mas não está tudo dito sobre isso. Tem‑se a impressão que há uma…

A balança do Céu é de algum modo o Coração Sapiencial de Maria. Porque Ela é Rainha do Céu e da terra e Ela que faz justiça. Fazer justiça é atribuição de rei. Dirá o bom do meu Castilho que é atribuição do magistrado… Não, a suprema justiça é o chefe de Estado, do rei.

Então Ela é a balança da corte celeste.

Mas Ela é tão mais do que isso… que não sei se a expressão é muito adequada.

(Sr. João Clá: Não, Ela diz que a balança do santuário seria colocado nas mãos desse filho muito eleito d’Ela, do século XX.)

Agora, o que é que será então essa balança do santuário?

(Sr. João Clá: Para que tudo seja feito com peso e medida.)

Aí, a tomar em rigor, seriam os critérios do MNF. Porque os critérios do MNF têm como um dos pontos capitais em vista que tudo seja feito com conta e medida. De acordo com a ordem posta por Deus, querida por Nossa Senhora.

(Sr. João Clá: São Miguel usa a balança, em representações, porque está fazendo a justiça contra os anjos maus.)

[Por] isso poder‑se‑ia dizer que a balança do santuário seria — mais uma vez então — a justiça de Deus que ele aplica. Ele leva o símbolo da justiça da causa pela qual ele luta.

Aliás, é curioso, mas a balança de São Miguel não tem os dois pratos iguais. Os pratos …[inaudível]… para indicar que um peso das… [inaudível].

Uma coisa é a lei, outra coisa a justiça. A justiça é a ação que… [inaudível]… de acordo com a lei.

Agora, a conta, peso e medida onde é que você encontra?

Pode encontrar no MNF, quanto aos assuntos tratados no MNF. Sobretudo quanto ao conjunto da sociedade temporal.

* A expressão “cual terna niña” pressagia acontecimentos terríveis antes e uma punição gloriosa depois

(Sr. –: A expressão “cual terna Niña”.)

Aqui o que a expressão tem de tremendo é que dá a idéia de um revigoramento da Igreja como tendo voltado aos seus primeiros tempos. Mas também uma destruição. Para Ela depois de vinte séculos tomar como ponto de partida o estado e as proporções de uma menina…

O que significa na Igreja uma infância em condições tais que Ela é embalada por um Varão? O que significa isso? É muito misterioso, muito misterioso.

Quer dizer, a Igreja terá sido reduzida a um estado de debilidade espantoso!

(Sr. João Clá: Mas também volta à inocência.)

Sim, não tem dúvida. A inocência primeva, o ponto de partida, etc. É fora de dúvida.

Quer dizer, pressagia acontecimentos terríveis antes e uma punição gloriosa depois, que aquele rapaz cantou hoje de um modo soberbo!

Como chama mesmo o rapaz? José Afonso.

* A TFP seria muito esplendorosa se não tivesse nada do espírito tíbio

Mas isso mais ou menos em tudo a gente vê o pecado se acumulando, crescendo. O que hoje explica a tibieza é tal e qual! O estado de espírito em que nós caímos é o do tíbio que provoca o vômito. Isso é… querendo imaginar na ordem do possível uma tibieza maior do que essa, não existe!

Agora, o que é que segura? Qual é o freio? Aqui é o ponto!

Há alguma falha em nós que determine isto?

Eu estava dizendo hoje à tarde que os restos desse espírito determinam uma espécie de atamento da TFP. E que a TFP seria muito esplendorosa se não tivesse nada desse espírito.

Se você imaginar uma TFP “sim, sim; não, não” até o fim, o esplendor e o crescimento dela seriam incríveis! O número de pessoas que afluiriam seria muito considerável! Mas muito considerável!

* No fundo é um não querer ser sério

Agora, o que impede que a TFP de ser assim “sim, sim; não, não”? É a questão.

(Sr. João Clá: Não será falta da visão do todo do senhor enquanto um conjunto, representando a Igreja, representando a Cristandade?)

É, mas não sei se é o furo da questão. Porque quando a pessoa diante da verdade e da virtude que adere, ela adere com a necessária seriedade, o todo lhe entra pela alma.

(Sr. João Clá: Mas há falta de visão do todo?)

É, nisso ele tem razão.

Agora, o mal não está sobretudo na compartimentização, mas a compartimentização é um fruto ou uma insuficiência… [inaudível]… ao menos aqui. E no fundo é um não querer ser sério. É uma espécie de preliminar: aquilo que eu amo, eu já amarei com seriedade total. Porque é justo, é humano, é bom… eu tomar as coisas inteiramente a sério e fazer a idéia de que nada deve ser tomado inteiramente a sério. É uma criteriologia por onde a gente não toma inteiramente a sério as coisas.

Alguém dirá: “Eu tomei tal coisa a sério!”.

Você vai prestar atenção, não tomou a sério. Teve apegos. Mas apegos não são sérios. São casos sérios, é outra coisa! Apego é uma voragem, é uma apetência desordenada, etc., mas não é uma coisa séria!

Aquele rapazinho que me perguntou agora à noite como é que se passou comigo quando eu resolvi deixar o mundo dos corcundinhas e tomar o outro e eu dei a explicação, pelos olhares, etc., eu vi — tive a impressão pelo menos — que eles entenderam o que era, mas que grosso modo não tiveram.

(Sr. –: Ninguém teve.)

Ninguém também não quero dizer, mas pelo menos poucos.

E eu disse a ele assim… um falou: “O senhor certamente em certo momento recebeu uma graça…” Não, graça recebi, é claro! Mas não é uma graça como ele está imaginando: quer dizer, em certo momento um enlevo maior pelo lado para o qual optei. Então, ó!…

* A seriedade de nosso Pai e Senhor na escolha do estilo de vida que adotou: ser um bom católico pequeno-burguês, ou lutar e servir Nossa Senhora na batalha contra o mal

Não, nada disso! Eu vi uma coisa, vi outra, conheci bem e fiz a comparação. Cheguei à conclusão de que convinha tal coisa e na hora decidi, com o favor de Nossa Senhora eu espero que definitivamente.

(Sr. –: Qual foi o caso?)

É o que eu estava dizendo, que em menino eu tinha diante de mim duas idéias, dois estilos de vida.

Um era daqueles corcundinhas piedosos que eu via no Coração de Jesus, pequena burguesia, vida muito arranjadinha, muito gentinha. Dois irmãos, vida muito direitinha, uma casinha onde moravam os dois, etc. E dentro do Largo Coração de Jesus, que era um largo muito parado, muito tranqüilo e sonolentamente presidido pela imagem de D. José Camargo de Barros, a estátua, dando uma bênção com uns dedos gordos, tranqüilos também. E os sinos, o toque de sino caía em cima daquilo assim preguiçosamente, nos dias quentes, formava uma vidinha burguesa à sombra da Igreja. Todo largo pequeno‑burguês.

Outra era a vida das pessoas de uma educação melhor, uma categoria melhor. Mas então com obrigação de galgar, de serem brilhantes, de lutarem, e servir a Nossa Senhora na batalha contra o mal! E não enclausulado dentro do bem num nível pequeno que não exige esforço.

E entre as duas coisas — eu tinha apetência para ambas — escolhi uma! Com a graça de Nossa Senhora. Mas na hora de escolher cortei a outra definitivamente! Isto é que é seriedade.

Mas pelo geral dos olhares eu entendi que eles sabiam como se faz isso quando se quer. Porque isto está na natureza de cada um de nós. Mas não tinham feito.

* Argumentos para cortar com um e seguir outro estilo de vida: o sossego burguês sossega o corpo e o temperamento, e o sossego aristocrático sossega o corpo e o temperamento através da alma e dos dons da alma

(Sr. –: O senhor chegou a dar argumentos para cortar?)

O que era mais excelente, mais… vamos dizer o seguinte: eu tendo pendor para as duas coisas, eu era mais fiel ao bem assumindo do que ele tinha de mais esplendoroso e lutando por ele onde ele era perseguido, do que assumindo no que ele tinha de menos esplendoroso e não lutando por ele, deixando‑o entregue à própria sorte.

Eu era menino, eu não me dava conta que eu não tinha direito de deixar tais ou quais meios de ações pessoais meus adormecerem inúteis, putrefactos, dentro da fase legítima para uma praça de bairro, mas ilegítima para um homem a quem Nossa Senhora tinha dado possibilidade de fazer algumas outras coisas.

Eu estava, portanto, mentindo a mim mesmo se eu aceitasse uma coisa dessas, mas me atraía enormemente pelo sossego. Reputado sempre por mim — pelos meus lados maus — como a coisa mais apetecível da vida.

Mas com o tempo depois eu aprendi outra coisa: que o sossego — que eu chamaria entre aspas — do aristocrático é muito mais sossegado e muito mais agradável do que o sossego burguês. Porque o sossego burguês sossega o corpo e o temperamento, e o sossego aristocrático sossega o corpo e o temperamento através da alma e dos dons da alma. É uma outra forma de sossego.

Um pouco o que Camões pôs naquela estrofe, meio imprudente de citar, dele: “Estava a linda Inês posta em sossego nos verdes anos, gozando o verde fruto…”

Este sossego da Inês de Castro não é o sossego de… [inaudível]… por assim dizer. Não tem nada de burguês. O sossego de burguês é outra coisa.

Não sei se compreendem que para a cabeça de um menino é muito difícil coordenar tudo isso… Eu tenho uma certa necessidade de sossego, vocês talvez notem que quando eu vou descansar, eu descanso inteiro. E com muito agrado de descansar. Eu gosto de descansar.

Bem, mas eu não sabia que eu renunciando ao sossego era levado ao sossego maior. [inaudível] às voltas dos desígnios da Providência a respeito de cada um.

Mas eu falo aqui é do propósito de não ser sério, de não tomar as coisas a sério, de achar que a gente não tem que se comprometer com nada, nem engajar com nada, nem viver para nada! A não ser aquilo que no momento é agradável fazer. E que esse agradável tem que ser versátil, vário e caprichoso. No capricho está a alegria. Na estação do capricho estão alegrias.

É exatamente o contrário. Mas tem na cabeça de noventa e tanto por cento das pessoas…

A isso Nossa Senhora… [inaudível]… horror!

* Inconformidade com o desassossego causado pelos tios e primos em casa da avó

Eu tinha um casal de tios que moravam em Santos e quando vinham a São Paulo hospedavam‑se em casa de minha avó, onde eu morava também. Então eles iam e vinham para Santos a toda hora! E a minha tia resolvia as viagens assim: ela telefonava para o marido, tomava um trem — descia‑se de trem naquele tempo —, vem o dinheiro, na última hora manda vir algum táxi ou manda vir logo o automóvel… [inaudível]… vai, entra correndo, bá bá bá… até o minuto… [inaudível]… minha prima ia para Santos. E era a última na fileira de pessoas que entrava dentro do automóvel para seguir para Santos.

Quando acabavam de embarcar, a casa ficava tranqüila… [inaudível]… eu dizia: “Oh, maravilha!”

De repente, uns dias depois, nunca se sabia quando, nunca se sabia que horas, nem nada, aparecia o trio e um… [inaudível]… uma Fräulein, uma coisa assim, às vezes uma sobrinha… [inaudível]… apareciam. A casa ficava num reboliço.

Eles moravam no andar de baixo, mas gente desassossegada não sossega vendo lugar onde tem sossego. Então… [inaudível]… todo lado para levar o desassossego por toda parte! Eles não sossegam. Em pouco tempo estava a casa toda num pandemônio.

Eu me trancava no quarto: “Ao menos aqui a horda não entra. Ah! sossego. Um grande dom. Os homens de hoje não sabem nada, estão cegos. Sossego… [inaudível].

Aliás, é preciso dizer, Jasna Gora e Êremo de Elias têm sossego também. Não têm o ambiente único do São Bento, mas têm o sossego. E no Êremo de Elias aos poucos eu vou tendo a impressão de que o sossego vai sedimentando, vai tomando mais raiz.

(Sr. –: Na sede do Reino de Maria também.)

Na sede.

Dizia‑se que indo a enjolrada faltaria a seriedade à sede. Não é verdade. Absolutamente. Eles têm uma conduta muito séria lá. Totalmente séria. Eles podem ser um bocadinho devastadores, mas…[inaudível]… isso é inevitável. Uns cinqüenta todos os dias ficarem em pé nessa sala o tapete vai embora. Não tem remédio.

* Uma concepção meio primitiva da conversão na Bagarre

(Sr. –: Essa seriedade não virá no caos da “Bagarre”, em que não haja mais opção de meio termo?)

Nenhum dentro do Grupo tem dúvida a respeito do seguinte: que oscila constantemente entre a santidade e os abismos do enxovalhamento moral.

Agora, por duas razões.

Uma razão eu compreendo que… [inaudível]… uma pessoa que tenha bom espírito possa não ser sensível a essa razão. É o caso Joyeux.

Mas uma outra, que a pessoa não pode deixar de ser sensível desde que tenha um pingo de brio, é que o que está aí fora é a derrocada a todos os modos e de todos os gêneros, o enxovalhamento moral completo. Porque não estamos mais vivendo no meio da imoralidade, nós vivemos no enxovalhamento de qualquer moralidade!

Agora, como é que um sujeito que está nessa alternativa concebe o sossego, quer dizer, o meio termo?

É só porque ele participa em algo desse enxovalhamento. Não se pode negar. Se não tem horror a esse enxovalhamento, participa do enxovalhamento!

Mas há muito mais! É que durante a Bagarre… Há uma concepção que é meio primitiva da conversão na Bagarre. A conversão é vista de modo heresia branca: que o sujeito no calor da Bagarre verifica que ele pecou tantas vezes contra tais mandamentos e diante da cólera de Deus ele resolve não cometer mais esses pecados. Digamos até que por amor de Deus ele resolva não cometer mais esses pecados. É uma atrição ou contrição conforme o caso.

Bom, isso de nenhum modo caracteriza a conversão na Bagarre. Porque os pecados aí são vistos na perspectiva de todos [os mandamentos], menos do primeiro. E o ponto onde é preciso ter a conversão é o primeiro mandamento!

(…)

* A pessoa mudar de mentalidade colocada nas aflições da Bagarre significa um certo esforço, uma certa acuidade de análise de vista para ver e entender o que está se passando

como é que se faz a conversão pelo primeiro mandamento? Como é que o indivíduo abjura efetivamente do pecado de Revolução? Como é que ele se torna efetivamente um contra‑revolucionário a 100%? Que ação os acontecimentos da Bagarre têm que produzir na alma dele para ele odiar a Revolução como deve e amar a Contra Revolução como deve?

Aí é preciso uma finura de alma, uma seriedade, uma fidelidade… pouco comuns! Quem é que vai ter isso durante o tempo da Bagarre?

Porque imaginar que o sujeito resolve emendar‑se de nove mandamentos e entra heresia branca para o Reino de Maria… não se converteu na Bagarre. No dia seguinte já começou tudo. Eles já estão desenterrando os… [inaudível]… e tudo o mais!

(Sr. –: É preciso um milagre.)

É, eu ia agora exatamente tratar da questão dos… [inaudível].

A pessoa colocada nas aflições da Bagarre, mudar de mentalidade significa — pode significar — um certo esforço, uma certa acuidade de análise de vista para ver e entender o que está se passando.

E aqui está o ponto da indiferença: é uma preguiça de fazer esse esforço de alma. Tendo que pensar muito ou querer muito, a falta de seriedade é fundamentalmente a seguinte volta: pode‑se levar uma vida como ela deve ser vivida dentro das normas, não levando o inteligir e o querer até suas últimas pontas. Mas deixando uma quota de… [inaudível]. Porque Deus-homem, verdade-erro, bem-mal, moral, tá tá tá, comporta uma ponta de relativização e portanto um grau de moleza.

Essa é a coisa.

E daí vem a preguiça de entrar a 100% em algo. É a preguiça.

O exemplo é o tapete que Luís XVI tinha… [inaudível]. Para não ir mais longe.

(…)

Nicolau II e… tudo mais que vocês queiram.

(Sr. –: O difícil é o permanente dessa posição.)

É, e quando não é permanente, não chegou a constituir. São veleidades.

* A integridade no considerar a problemática, escarafunchar cada ponto e dar uma solução adequada específica, faz parte do dever profissional

Por exemplo, essa impressão eu vou dar relativamente aos médicos, porque o exemplo me ocorreu sobre médicos, hoje. Mas é tudo no mundo contemporâneo.

Um médico tem doente. Ele vai e cuida do doente. Agora, quando chega a hora dele dar as diretrizes sobre como o doente deve proceder à vista da cura que ele obteve, como conservar a cura, etc.,é preciso uma certa previsão: “Esse organismo que tenho diante de mim está sujeito a tais riscos especialmente. Quer pela constituição do organismo, quer pelo estilo da personalidade, quer por outras conseqüências. E eu vou prever os riscos para dar a ele uma diretriz em duas gamas. Eu vou prever, prevenindo‑o contra… vou fazer a lista dos riscos mais prováveis e depois vou fazer outra lista: é dos riscos mais graves, embora sejam menos prováveis. E vou dar a ele um procedimento completo contra o mais provável, de um lado; e contra o mais grave que pode acontecer na medida que se possa, de outro lado. Aqui está uma diretriz. Proceda”

Essa integridade no considerar a problemática e escarafunchar cada ponto para o caso concreto e dar uma solução adequada específica para aquele caso concreto, faz parte do dever profissional!

Eu tenho a impressão de um muito bom número de médicos não têm claramente a idéia de que isto é assim.

(Dr. Edwaldo ‑: É certo.)

Entretanto, você sabe muito melhor do que eu que fora disso não há cliente que apareça.

(Dr. Edwaldo: O próprio interesse está em jogo.)

Gravemente! Porque pode ter desapontamentos e inconvenientes dos mais sensíveis.

Bem, resultado: quando de repente acontece uma coisa dessas ele foge. Nós conhecemos casos… Não tem coragem de enfrentar.

Bom, forma uma vida pobre, sem retidão! “Não, não, isso não é viver”.

Agora, o ser assim dá às pessoas uma preguiça soberana. Soberana! Preferem qualquer conseqüência.

E durante a Bagarre é possível que tenha que exercitar esse tipo de… [inaudível], vencer esse tipo de preguiça. Porque é só analisando assim que a Bagarre converte.

Não é porque um comunista espetando um de nós com a baioneta ou ameaçando com tiro. Não é isso, mas é muito mais! É uma infâmia que nós vemos e diante da qual nós nos devemos indignar como deveríamos nos indignar! Mas então agüentamos com todas as conseqüências…

Aquilo se relaciona com aquilo outro, isto afunda assim. Encho o meu espírito de cogitações a esse respeito e procedo en consequence.

Agora, quem quer fazer isso?

Falei de médico. Você pode imaginar advogado. Engenheiro! Engenheiros… mas os prédios não ruem!. Eu digo: também os homens não morrem! Será que não morrem? Com que insalubridades, com que defeitos, com que precariedades são feitos esses prédios que estão por aí? Ninguém sabe.

Eu vejo muito isso — quando a TFP está em risco — a estranheza que causam as providências que eu tomo. Causam sempre estranhezas. Não adianta! Olha que já é uma escola, já conhecem esse modo de agir; mas sempre causa estranheza.

Eu resolvo de repente uma providência ultra‑urgente. O sujeito fica pasmo! Uma providência suave é difícil… [inaudível]… do casinho. É que aquele casinho improvavelmente pode dar um casão do outro mundo! Então vale a pena fazer. É um casinho que provavelmente resolve‑se por si, porque os casinhos provavelmente resolvem‑se por si!

Bom, e se estourar? Resposta no fundo é: deixa estourar, porque até lá não quero levar o meu esforço. A resposta… [inaudível]… é essa. Não… [inaudível]… possível revelar o que está chegando.

* As observações radicais e improváveis fazem parte do modo de ser do amor

(Sr. –: Isso que o senhor diz é causa ou efeito do amor à Contra‑Revolução?)

É o modo de ser do amor. O amor verdadeiro é desse modo!

Vou dar um exemplo de uma elevação muito menor que do tema que estamos tratando, mas imagine um homem que tenha, por exemplo, um cuidado de cinco salas com objetos preciosos, num museu.

Ele tem os cuidados correntes, mas o melhor da vigilância dele se dirige para dois pontos.

Primeiro para os cuidados mais imediatos: as vitrines se estão sólidas,.. [inaudível]… as possibilidades de atentados que estão bem previstas, etc.

Há depois as previsões contra os desastres terríveis que podem dar‑se dentro da linha do improvável. Por exemplo, não haverá um maníaco que durante o dia substitui esse quadro verdadeiro por uma cópia? Não haverá a possibilidade de, de repente, dar cupim em tal objeto que está exposto ali? A umidade não estará prejudicando tal pano assim? A luz do sol que está entrando nesse ano por esta janela, por onde há trezentos anos ele não entra, porque havia um prédio e foi destruído o prédio para construir o arranha céu, durante esse tempo está entrando luz do sol aqui, essa luz do sol não vai prejudicar a contextura de tal tecido que está exposto?

Quer dizer, as demolições radicais e improváveis fazem parte do modo de ser do amor que o homem tem pela sala. Isso é um modo de ser do amor.

* O conjunto de fatos e elucubrações que constituem a nossa história foram constituídos com um acerto e coroados com uma série de sucessos, mesmo dentro do revés, que não são normais

(Sr. Guerreiro Dantas: [Faz uma longa pergunta em que apresenta as nossas condições más e a insuficiência dos meios comuns para remediar essa situação. Então pede que o Sr. Dr. Plinio tome dons extraordinários para nos desencalhar, pois hoje o preternatural, o visgo da Revolução é de tal forma, que não existem mais soluções comuns].)

Em larga medida é verdade.

Vamos dizer o seguinte: o que decide é o extraordinário. O comum continua a funcionar em alguns pontos, mas o que decide é o extraordinário.

(Sr. Guerreiro Dantas: O senhor citava a questão da doutrina sobre os eflúvios e que em Abel deve ter havido em profusão inaudita. E que o senhor pelo que tem feito até hoje, o método é pela lógica, observação da realidade, interferência na realidade…)

A questão é que eu acho que você interpreta perfeitamente meu procedimento: pela razão, tomando a economia comum dos acontecimentos, etc. Você interpreta perfeitamente, mas devendo colocar dentro, acrescentar o seguinte: que se você vê o conjunto dos fatos que constituem a nossa história, fatos grandes e pequenos que constituem a nossa história, depois o conjunto de elucubrações doutrinárias feitas a propósito deste e de outros fatos, você tomando esses dois conjuntos, ambos conjuntos foram cada um — no campo do pensamento ou da operação — constituídos como você disse, mas eles foram constituídos com um acerto e coroados com uma série de sucessos, mesmo dentro do revés, que não são normais. Dentro do revés às vezes, às vezes fora do revés, que não são normais. E que indicam habitualmente algo que vai além, algum tanto além de toda economia comum em função da qual tudo aquilo foi pensado.

* As Reunião de Recortes não fazem ver os cegos, mas fá-los andar desembaraçadamente

Para dar a você um exemplo, as Reuniões de Recortes.

As Reuniões de Recortes são estritamente reuniões calculadas dentro da economia comum. Mas estritamente, arquetipicamente.

Bem, você vê muito bem as renitências que há em relação às Reuniões de Recortes. Mas você observar décadas de Reuniões de Recortes em que vem gente de todos os cantos que podem assistir à reunião, e depois outros que adiam viagem para poder assistir à reunião também, você acaba vendo que a reunião realiza a triste maravilha de fazer tíbios agirem como se tivesse fervor. O que equivale a dizer, a cegos que não se curaram da cegueira, mas caminharam com desembaraço de como quem vê.

Os efeitos globais de todo esse esforço são muito menores do que é o forte do esforço, mas muito maiores do que o forte da infidelidade permitiria.

Isto eu tenho como coisa certa!

* Outros exemplos da vida da TFP que mostram que a não‑ruína total é tão contra a ordem comum das coisas, que tem o aspecto de um milagre discreto quando se vê o conjunto

Vou aos exemplos. São ligados direta ou indiretamente à Reunião de Recortes, mas isso faz parte da vida da TFP.

Eu vejo algumas pessoas passarem fora da TFP, por assim dizer fora da TFP, sem contatos com ninguém, jogadas de lado, etc., dez anos ou mais. De repente, por uma razão qualquer, vêm morar em São Paulo — o Azevedo por exemplo — e vêm tomar contato com a TFP.

A gente deve dizer que durante o tempo que ele estava fora, ele procedeu como um sabugão de primeira categoria. A gente vai ver, apesar disso, ele conservou um nível de relativa generosidade que faz com que aqui ele volte a uma forma que não era de imaginar.

Assim você pode pegar dezenas!

Por exemplo, todo esse Êremo, a partir de Nossa Senhora Rainha Martirum, é isso.

Você veja, por exemplo, o Sebastião. Eu me lembro que uma vez durante o Estrondo eu fui falar durante a noite lá na Casa de Pedra para a censura não pegar. E uma das vezes estava saindo de lá o Sebastião. Eu pensei: “Ah, aí está o Sebastião”. Eu até tinha… se fosse fazer um elenco da TFP não colocaria o Sebastião. Quer dizer, eu lembrava que ele existia, mas não me lembraria na hora de fazer uma lista. Falamo‑nos como dois bons amigos que há não sei quanto tempo não se vêem.

Bem, fecha a Casa de Pedra, põem o homem dentro da… [inaudível]… ele acaba eremita itinerante.

Quer dizer, o efeito é miraculoso no sentido de ele dar algo que não é a ruína total. E essa não‑ruína total é tão contra a ordem comum das coisas, que tem o aspecto de um milagre discreto, mas salientíssimo, quando a gente vê o conjunto, ao qual ninguém presta atenção.

(…)

Bem, então eu não diria — como acaba de dizer, aliás, excelentemente, por vários lados, meu querido Guerreiro — que essa ação miraculosa não se exerça. Ela é o tipo de ação inadvertida, mas que se você for abrir os olhos explode a cada canto! Mas a cada canto ela explode. E a todo momento você vê a TFP chegar às beiradas da aniquilação e depois ela lança um dardo mais do que o outro.

* “Nossa Senhora colocou dentro do meu thau virtualidades muito maiores do que as agora se exercem”

O que você poderia perguntar, isso sim, é se Nossa Senhora exerce essa ação inteiramente incomum sem ser… não por meu intermédio… [inaudível]… inteiramente incomum. Por que é que Ela não exerce em escala mais ampla, de maneira a não nos sustentar apenas numa ruína que não se sustentaria, mas reconstruir as ruínas? Essa é a pergunta. E não nos conter nos limites, nas fronteiras do adversário, mas liquidar o adversário.

Eu percebo que Nossa Senhora colocou dentro do meu thau virtualidades muito maiores do que as agora se exercem. Nisso eu dou a você todíssima razão.

Essas virtualidades são bem dentro do estilo que você descreveu?

Talvez não. Mas em todo caso são virtualidades muito maiores do que as que agora se exercem.

Quase que o que agora se exerce serve apenas para o seguinte: eu ser uma pessoa que está de pé, entre outros, dentro do panorama nacional. Porque o que a TFP faz é, em última análise, fazer número atrás de mim. Em última análise é.

Eu sei que nossos conterrâneos chilenos têm escrito livros muito bons, foi feito um livro no Uruguai muito bom, sei! E uma porção de outras coisas do gênero. Mas, em última análise, é fazer número. Porque…. [inaudível]… porque se eles não fizessem número atrás de mim, eu não era admitido nem sequer na conversa do café de… [inaudível]. Chega até esse ponto.

Agora, entrementes dá no colorido a tudo que está se passando. O fato de eu estar presente no panorama dá um colorido a tudo que está se passando a esse mal estático.

Portanto, é uma coisa… [inaudível], mas muito pequena em relação ao que tem que se passar.

* Cabe perguntar qual a hora em que Nossa Senhora solta as legiões de anjos arregimentadas para um determinado acontecimento — Enquanto não chega essa hora, ir empregando os métodos correntes

(Sr. –: A outra virtualidade já está na alma do senhor?)

Já está, acho que já está. Mas há um determinado momento em que ela se fará sentir.

Bem, esse momento o que é que impede que chegue? Porque a gente tem a impressão que esse momento está como que atrasado.

Só pode ser uma causa existente em mim, ou nos membros do Grupo, ou no mundo. Não há outra zona!

Bem, eu não me desculpo no caso. Eu por via das dúvidas vivo de pedir perdão a Nossa Senhora por mim. Mas cabe — nós estamos conversando sobre vocês no momento — perguntar qual é a hora em que Ela solta as legiões de anjos d’Ela, que Ela pode ter retidas na mão para qualquer… prontas e organizadas, arregimentadas para um determinado acontecimento. Mas perpetuamente na calma de um oásis sem lançar a ofensiva que se espera.

A pergunta é: qual o ponto que impede isso?

A única coisa que tem é a gente procurar segundo os métodos do raciocínio tomista, verdadeiro: analisar os fatos observados com espírito de fé para chegar a alguma conclusão e, enquanto não chega essa hora, ir empregando os métodos correntes.

Porque fazer outra coisa está na mão d’Ela.

Bem, isto é o que é? Ou como é? Também não sei…

Isso que se dá com a vida interna da pessoa, dá‑se também com a vida externa.

(…)

quer dizer, nós estamos rodeados de milagres que nós não sabemos ver porque nós não temos essa segurança do sim e do não. Porque… [inaudível]… quem sabe se tanto faz, fica assim, faça assim ou outro assim! Está bom, e esses cinqüenta passos por que é que se explicam assim? Quer dizer, isso cabe dentro da economia comum?

Evidentemente não cabem.

Agora, eu percebo que há alguma coisa que é um passo não sem relação a Nossa Senhora ou um passo de Nossa Senhora com relação a nós, mas é um passo que tem que ser dado e que se afiguraria a meu espírito com a grandeza de uma cena do Apocalipse. “Eis que venho! Eis que venho breve”, uma coisa assim. Ela entra, intervém. Mas que há um mistério que segura isso.

A persistência dessa esperança [da vinda d’Ela], com tão poucas razões internas e externas para se esperar, são razões logicamente suficientes, mas a impressão, a mola das impressões contrárias é fantástica!

Vocês estiveram na saída do Santo do Dia agora à noite, não? Vocês talvez viram a debandada dos meninos em corrida para o oratório.

Bem, é evidente que aqueles meninos vão para se encontrar comigo diante do oratório. Mas na realidade eles são levados por uma esperança fortíssima de algo que deve vir e que eles esperam já encontrar quando forem ao oratório.

Como é que esse milagre, como é que esse fato tem que se produzir? Depois quais são os estilos de ação que daí decorrerão?

Tudo isso é muito, muito, muito enigmático.

Eu acho, por exemplo, mais ou menos impossível negar que a morte de D. José Gaspar tenha sido um milagre. É claramente um milagre.

Para um filho das trevas… [inaudível]… um milagre!

Está bem, mas aquele milagre não foi antecedido de nenhuma ação grandiosa de minha parte…

(…)

mas eu julgo notar que ela perdeu algo do seu ar de adolescente. Ela perdeu algo do seu entrent

(…)

era uma recém-entrada… deixou de ser vedette… [inaudível]… está louco, por exemplo. A se confirmar, é muito de diagnóstico. De fato ele sumiu, ele se eclipsou misteriosamente. É muito digno de nota…

Bem, nem sequer os prognósticos, entretanto, são legítimos a esse respeito.

Quer ver outro fato digno de nota que toca no milagre?

A morte do F. Não se pode negar.

Quer ver um outro fato que toca no milagre e esse um milagre de caráter exorcístico…

(…)

portanto, essa minha calma não é uma calma inativa. Começos de movimento que eu julgo que, tendo oportunidade, eu os emprego. Mas… mistério fica!

Eu creio ter dito bem o que vocês compreenderão melhor tudo quanto, depois de uma conversa dessas, depois de circunscrito o mistério, vocês então puderem compreender o que é que a Providência quis pondo no seio da ação d’Ela essas incógnitas, esses mistérios.

Meus caros, está uma hora…

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