[Não
está indicado no microfilme, mas no índice, se
suspeita que seja uma Conversa de Sábado à Noite] –
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[Não está indicado no microfilme, mas no índice, se suspeita que seja uma Conversa de Sábado à Noite]
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Conversa de Sábado à Noite (Alagoas, 1ºandar) — 6/8/1977 — Sábado [AC 142] [Jorge Doná]
Houve severidade na Reunião de Recortes, mas sempre com muito afeto. Seriedade aqui é o nome da severidade. Foi muito bom que tenha ficado cunhada a moeda “Torre-salão-saleta”. A saleta não é propriamente a chacunière. A mentalidade saleta é algo diferente: ela não comporta uma amplitude de visão. Quem tem essa mentalidade é propriamente o borné.
No tempo de Luiz XIV não havia preocupação de viver em saletas. As dimensões de seu tempo era amplas. Até mesmo a Escalier des Ambassadeurs, a belíssima escadaria de Versailles, acabou sendo destruída para, de um momento ao outro dar tudo em saletas.
A vida humana deve se desenvolver entre o salão e a torre. Não pode ser vivida em um só deles. Quando se está no salão deve-se ter nostalgia da torre. Na torre não há nostalgia do salão, mas necessidade dele. Na torre deve-se ter necessidade do salão, mas não nostalgia. Mas quem está no salão não teve ter necessidade da saleta. Até mesmo o quarto, por vezes, deve exercer o papel de salão.
O gosto pela saleta é legítimo? Há momento em que legitimamente alguém pode ter desejo de estar em uma saleta? Compreende-se que exista saleta para rezar? Uma capela para Santíssimo Sacramento é legítimo? Sem dúvida que sim.
Na torre é legitimo e necessário o salão, mas quando se estiver no salão, deve-se manter saudades da torre para não ter vontade de procurar a saleta. É preciso freqüentar todas essas camadas, mas com ascese. É a ascese que dá a nota de equilíbrio de tudo.
Porões: entendo que neles se pudesse até mesmo montar capelas e salas de trono. Há salas de tronos nos palácios russos que parecem montadas em porões. Ivã, o Terrível, tinha um trono montado próximo há uma janela numa composição muito interessante. São estados de alma que se exprimem.
Vaticano: é uma palácio cheios de salas que sucedem até conduzir à Sala do Trono. Cada uma dessas salas funciona psicologicamente como eclusas mentais. Numa dessas salas vi certa vez um número enorme de chapéus de Bispos sobre uma cômoda, guardados por dois ou três Guardas Palatino. Um deles era muito forte e hierático, bonito de se contemplar. Passei pela sala das audiências gerais, pela Sala do Trono, só então atingi a sala onde o Papa me receberia. Ao sair da audiência respirava-se um pouco ao passar por essas salas no percurso inverso. Não se saía diretamente.
Na sala onde recebia os reis e príncipes havia um estrado para duas cadeiras — onde se sentavam os reis — e sobre este estrado era posto um outro estrado sobre o qual estava o Trono pontifício. Os reis olhavam de cima para falar com o Papa. Imagina-se que ali eram tratados os problemas de consciência de uma rainha. Uma imperatriz de Áustria… falando com S. Pio X. Uma rainha de Tonkin, com um intérprete aos seus pés… tradutore ou traditore.
Na questão torre-salão-saleta, o equilíbrio do pêndulo não consiste em estar parado no meio, mas sim em passar pelo meio indo para um dos extremos. Tem espírito profético quem tem calma, sem a mania de viver somente num desse lugares. Esse pêndulo é a imagem do desapego. Quando estiver na saleta deve sentir e fazer sentir que se é homem de salão e torre. São três aspectos de alma que se sucedem harmoniosamente, sem exclusões. Devemos ser sobretudo torre e não salão, e quando estivermos na saleta mostrarmos ser de salão. Temos que nos mostrar nessa hierarquia. Se ela rompe nos dois pontos mais altos — torre-salão — dá na predominância da inferior — saleta. O equilíbrio tem que ser mantido.
Imaginemos um homem habitando um palácio e com essas três dimensões de alma — não gosto do sentido da palavra “dimensão” tal como a uso aqui, mas que seja. O profeta está fora do palácio, sem vinculação com as coisas à maneira de castelão, mas mora na alma do castelão. Nossa vocação passa por duas etapas:
Primeiro, torre–salão–saleta;
Segundo, uma esfera de cristal [como que de] fora dos domínios do castelão, mas que é o nosso termo final. Estamos num mundo que transcende aquela primeira etapa, e é como que um mundo de cristal, onde a gravidade não atua. Não é a vocação do homem no fundo do poço que renunciou à torre–salão–saleta para ter um contato direto com o sobrenatural e com Deus. Não é isso. Nós não renunciamos à torre–salão–saleta. Tratamos e sentimos essas questões para transcendê-las. É pois uma outra posição que não é a do homem no fundo do poço. Qual é essa posição? Ainda não havia pensado nisso. Manusearei a pergunta para ver se dela extraio a resposta.
Há uma esfera de cogitações onde se gosta das três coisas e onde se acaba por intuir algo que não existe mas que é concebido por uma síntese abstrata. Dou um exemplo: quando se contempla uma obra de arte com retidão e amor de Deus, os sentidos acabam imaginando uma realidade superior a eles mesmos e na qual se comprazem. Sentem o que conceberam. E nisso entra uma degustação do Paraíso terrestre ou celeste à maneira de uma prelibação. É uma posição de alma com a qual se procura não só o teórico e o abstrato, mas na qual se sente algo análogo ao que existe, se bem que superior ao que existe. Quando se mora nessa posição de alma, aí encontramos o nosso claustro e a nossa esfera de cristal onde não há gravidade.
Wintherhalter procurou representar isso no fundo do quadro da Duchese de Nemours. Há uma luz que escapa das nuvens escuras e que dá a idéia dessa esfera de cristal. [Descrição do quadro]
Habitar essa esfera é estar numa situação quase angélica. Os homens que habitam aí são pré-anjos. São os homens que têm força para mover a História. Os que movem a História moram nessa esfera tendo o sinal mais ou menos na fronte. Podem ser pobres — como podem ser ricos também — mas são homens aos quais agrada o convívio com o esplendor das coisas. Não é o caneca amassada, de nenhum modo. Esse é o verdadeiro ato de humildade. É por onde renuncio a ser eu mesmo e me dou a algo que me une ao meu Anjo da Guarda. Esse é o verdadeiro ato de humildade. Não é jantar com o chauffer. Essa renúncia exige que nunca deguste um elogio que me é feito, que nunca me atribua uma força pessoal sem reconhecer o auxílio de Nossa Senhora, nem me compare com ninguém a propósito de nada. Depois de uma atitude assim vem o Paraíso interior. Esse é o cristal da esfera. É a nossa via espiritual e a nossa Ordem de Cavalaria. É-se cavaleiro quando se combate dentro desse paraíso, com a beleza que as coisas tem nessa esfera.
A FMR e o pátio são o símbolo do próprio egoísmo. Convida-nos a nos unirmos a ele, mas nos preocupamos com FMR para nos encontrarmos a nós mesmos e nos salvarmos do chamado que ele nos faz. Chama-nos a abandonar um eu cuja característica é viver fora dessa esfera e convida-nos a migrarmos para ela. Aceitar esse convite seria como entrar no carro de fogo de Elias. Por vezes se sente essa realidade mais real do que a própria realidade.
A Reunião de Recortes foi bem degustada e em algumas partes essa esfera de cristal apareceu claramente para muitos. Quando aparece aquele fundo de luz do Wintherhalter, as caras se transfiguram. E a maior parte dos que ali estão são almas que vão para os recortes. Vão na esperança de que algum recorte dê ocasião para que algo assim saia.
Nas Reunião de Recortes se toca o divino.
A Igreja e o Estado são sociedades perfeitas, constituem um cosmos com dignidade especial que toca no divino. Quando se analisam as coisas da Igreja há um como que tocar no divino. O carisma profético faz resplandecer os fenômenos da Igreja, do Estado e das nações, sentindo-se então um coruscamento divino. São luzimentos divinos, como quem mexe numa seda belíssima da qual partem reflexos assim.
Hoje, algo do carisma profético brilhou no auditório. Formou-se um arco voltaico — talvez os dois pólos não brilhassem com a mesma intensidade — mas formou-se esse arco. Quando o seu carisma profético atua no nosso carisma receptivo, há esse brilho especial. E o pessoal já vai à Reunião de Recortes esperando pegar uma coisa dessa. O eremita itinerante vem de Saboó para presenciar essa coruscação e é ela que no fundo prende a todas na T. Até mesmo alguns, como X, vão como cegos que perderam quase totalmente a vista, mas que se põem na janela para ver a luz. É triste ver as almas que abandonam isso por ninharias. Há casos em que se tem a ilusão de se ter perdido essa esfera e de ter rompido com ela. Vem o tédio e a inapetência espiritual. Peço que nessa hora faça um ato de Fé em minha palavra de que isso é coisa do demônio. Ainda nessa hora saiba que continua vivendo na esfera e que é bem-aventurança passar por essas borrascas. Já passei por borrascas assim e todos temos que passar por elas. Vale a pena! Não se diz isso na hora da borrasca, mas é assim.
A assistência às reuniões do MNF exige uma suprema preparação para não se pedir a graça de morrer. Aquilo tudo é tão lindo e a nossa situação tão incerta… E o mais interessante é que tenho quase certeza de que se alguém pedisse essa graça seria atendido. Mas que Purgatório teria! E que luta teria que travar em sua agonia. Seria uma covardia pedir isso. Mas se alguém pedisse, creio que seria atendido. Ela atenderia com a tristeza com que a mãe atende o filho ingrato. Ela atenderia como atendeu os judeus que pediram reis.
O Mandrix sobe e preciso pensar mais para continuar. O conhecimento da transesfera, por dentro, ganhou muito com essa noite.
A transesfera é atingida pelos sentidos dotados de um senão divinatório do metafísico,que vem algo que não existe aqui, mas existe no Paraíso, tendo sua plena realização na Visão Beatífica. A transesfera é um lugar psicológico onde Deus é mais visível. Devemos procurar ver isso, já tendo algo disso em si — é ser transesfera viva. Procuro abri-los para a transesfera e vocês devem aceitar isso. O fundo da realidade é deixar-se tocar pela transesfera.
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1ºAndar