Santo do Dia – 2/12/1969 – p. 3 de 3

Santo do Dia — 2/12/1969 — 3ª-feira

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Uma ficha do ódio contra-revolucionário. Em Bui, ao julgar pelo começo se trata de um episódio da guerra da Vendée. Em Bui 600 infortunados foram assassinados num estrita prisão que não recebia ar a não ser por um respiradouro. E eles morreram lá asfixiados sobre os próprios excrementos e no meio de cadáveres que ninguém pensava em tirar de lá. Os senhores estão entendendo a cena. Quer dizer, são inimigos da Revolução Francesa que são jogados numa sala grande, provavelmente de um castelo, qualquer coisa; que tinha aqueles subterrâneos para defesa e que algum fosso que servia de respiradouro. Então eles foram atirados lá e não havia instalações sanitárias de maneira que eles não tinham remédio senão sujar aquele local que além disso tinha cadáveres em decomposição. Então eles morreram asfixiados com os maus odores que se desprendiam de todos esses fatores. E 600 logo de uma vez. Se a Inquisição tivesse feito isso, hein? E porque esse ódio contra seiscentos porque eram bons, é o ódio do mal contra o bom, é o mais formidável dos ódios que há. Só deveria haver um ódio maior. Era do bom contra o mal, mas deveria haver, não é? Porque o bom,em geral, é bobo.

Bem, esse é o suplício que Mernée teve renovado na Vendée pela fraternidade filosófica. Quer dizer, que já tinha havido em outros lugares de Mernée suplício igual. Em Glisson o castelo feudal do velho Condestável [ilegível] na sala dos arquivos mais de trezentos camponeses lá se refugiaram com suas mulheres, suas crianças. Eles imaginaram assim escapar aos assassinos. Uma ordem enviada pelo partido Cordelier – Cordelier era um clube de revolucionários, – o clube deseja que se enforque essa tropa de vítimas sem defesa. Oa azuis acabaram, – os azuis eram os republicanos – de os apanhar e eles vão ser fuzilados mas que por um requinte de crueldade foi-se decidido fazer com que eles morressem de forma mais horrorosa. A morte foi a seguinte. Na parte interior do castelo se encontra uma larga cisterna, – cisterna é uma espécie de poço, fossa. Joga-se na cisterna “quel meilleur”, quer dizer, todos misturados, todos aqueles que foram encontrados a mão naquela sala. Pouco a pouco a cisterna se encheu inteiramente, o poço se encheu de gente. Então a Revolução tomou providências a fim de não deixar os trezentos vandeanos senão um lugar necessário para sofrer e nossos [ilegível] . Ouve-se os brados deles, eles são logo deitados como mercadorias uns sobre os outros e postos assim como se fosse num armazém. Quando o poço está regurgitando desses homens, dessas mulheres canta-se a Marseillaise e o Ça Ira e dançam-se farândolas desesperadas ao som dos gritos partindo das cisternas. Os operários foram chamados e assim, enfim a tampa da cisterna foi murada. Durante esse trabalho os republicanos dançavam para abafar com seus gritos de alegria as angústias e o último alento de todos esses infelizes. Isto é tirado de Crétineau Jolly de L’Histoire de Vendée Militaire. A descrição não está talvez muito clara e vale a pena eu dá-la melhor. Era o caso como o anterior [ilegível] uma cisterna que dava para uma sala que antigamente eram guardados arquivos. Eles pegaram até as pessoas, [ilegível] até pessoas refugiadas e eles tomaram outras pessoas que puderam encontrar e com essas pessoas eles foram acumulando uns sobre os outros e depois quando ficou tudo cheio foram enchendo o próprio boca da cisterna.

E depois eles acabaram murando a tampa para não entrar ar nenhum e enquanto se fazia isto os pobres dos católicos e monarquistas gemiam de dor do lado de fora os republicanos dançavam uma farândola. Esse é o fato que se passou.

Agora os senhores podem imaginar uma insensibilidade maior do que alguém que vê trezentas pessoas, trezentas famílias. Se trata aí, são trezentas famílias. Quando uivando (?) [ilegível] que pedem a libertação [ilegível] pedem piedade para seus filhos nada adianta. Eles estão dançando e se divertindo cantando a Marseillaise e o Ça Ira contra camponeses, não é contra nobres.

Porque esse ódio feroz, porque esses nobres tenham [ilegível] o crime de serem contrários à Revolução Francesa está acabado. E porque eram bons. Esses nobres e camponeses tinham [ilegível] o crime de serem contra a Revolução Francesa. Eram com poucas [ilegível] encarcerados, está acabado. Isso [ilegível] deve voltar a nos lembrar o ódio que se [ilegível] contra …

Sobretudo nesse período que nos somos objetos de muitas manifestações de estima e de amizade é bom, é útil, é salutar, necessário, é indispensável nós nos lembrarmos desse ódio. Os senhores souberam da carta que nós recebemos aqui ameaçando-nos com uma bomba [ilegível] o prédio. Com uma carta anônima [ilegível] para uma mulher. Não tomo a sério a carta. Eu acho que essa bomba não vai ser atirada pelo menos é o mais provável. Mas eu considero a mulher que escreveu isso se pudesse jogaria essa bomba. Agora porque e que ela tem esse ódio, porque nós somos bons e ela é má. Exclusivamente por causa disso. Agora, porque é que eu estou insistindo nisso com os senhores? qual a utilidade prática que isso tem para os senhores? Um dos senhores vai me dar essa resposta a título de adestramento. O senhor, por exemplo.

(Sr. Adauto Reame: A utilidade que o senhor visa insistindo [ilegível] isso é que nós temos uma tendência a sempre a achar que os maus não são tão maus quanto na verdade são. Quer dizer, nós sempre estamos alaranjando a coisa e sempre vendo um lado por assim dizer positivo neles e acaba nos diminuindo o ódio que nós devemos ter a eles. O senhor quer que cada vez nos compenetremos mais do ódio que eles tem e portanto nós devemos ter a eles. Quer dizer voltar a coisa contra eles.)

É isso. Agora o senhor acertou. É portanto voltar a coisa contra eles. Bem, eu insisto apenas em que eles são maus ou eu dou mais uma nota. Falta na sua resposta que está exata, falta uma pequena nota. Qual é?

(Sr. Adauto Reame: O senhor insiste que eles são maus mas são maus contra os bons e propriamente que os bons não são, não tem o ódio contra eles.)

É bem verdade. Só tem uma coisinha. O que que é? É que portanto eles nos odeiam a nós, não é? E isso é importante, o resto está bem apresentado. O senhor vai me responder. Qual é a razão pela qual [ilegível] a tendência a alaranjar a maldade deles? A ver de modo laranja a maldade deles? Qual é a razão disso?

(Sr. - : [faltam palavras].)

Eu não ouvi bem. O que é?

(Sr. - : [faltam palavras] uma tendência a ter [faltam palavras].)

Uma tendência a ter ligação com todo…

(Sr. - : [faltam palavras] uma ligação com o mundo, etc.)

É essa tendência, é bem verdade. Mas essa tendência decorre de que defeito moral? Deve decorrer de vários, não é verdade? Um deles; o senhor se lembra de um deles, que dever ser?

(Sr. - : [faltam palavras] a compenetração.)

A compenetração, a falta de compenetração então.

(Sr. - : É.)

Poderia ser, mas o principal deles é outro. Senhor Lauro.

(Sr. Lauro Cirne Quintiliano: É o sentimentalismo do brasileiro, romântico.)

É a preguiça.