Santo do Dia (Sala dos Alardos) – 5/4/1969 – sábado – p. 13 de 13

Santo do Dia (Sala dos Alardos) — 5/4/1969 — sábado

Nome anterior do arquivo: 690405--Santo_do_Dia_Sabado__a.doc

[Cotejado com 690405-2sds: foram consideradas as palavras manuscritas; o que aparece em amarelo não consta neste microfilme, mas já havia no texto.]

[Cotejado com o 690405-1sd5: foram consideradas as palavras manuscritas; o que aparece em azul é o que consta neste microfilme, e o que aparece em verde não consta neste microfilme, mas já havia no texto.] [Eduardo Meira]

[Ao fazer os subtítulos, procuramos tornar o texto legível, eliminando as cores e escolhendo as palavras que parecem mais acertadas. O ideal seria conferir tudo com a gravação. Tais observações em cores permanecem no arquivo 690405—sds@CORES.] [C.A.P.]



Aquela sobre a qual convergiram as alegrias e as glórias da Ressurreição. Caráter matinal da alegria pascal. Atitude de Nossa Senhora face à Ressurreição. Maria Madalena e São João: amor e espírito de hierarquia. O sudário e a dignidade da Face de Jesus. O Coração de Jesus teria se rompido em dois. Sofrimento de Nossa Senhora ante as dores de seu Filho. A primeira a ver o Ressuscitado. Esquecimento da Ressurreição e alegria em constatá-la.

Evangelho da Paixão – VI? VII? A Ressurreição

Contraste entre a vida no Grupo e a vida fora dele * A narração da Ressurreição * Aquela sobre a qual todas as alegrias e as glórias da Ressurreição convergiram * O caráter matinal da alegria pascal * A atitude de Nossa Senhora e das Santas Mulheres face à Ressurreição * Que Nossa Senhora nos faça como o Anjo da Ressurreição * Maria Madalena corre para falar com o chefe da Igreja; o senso de hierarquia * Anjos proclamam a Ressurreição * Amor e espírito hierárquico de São João: chega primeiro, mas espera por São Pedro * O sudário e a dignidade da Face de Jesus * O Coração de Jesus teria se rompido em dois * O sofrimento da Nossa Senhora ante as dores de seu Filho * A primeira a ver Jesus Ressuscitado * Esquecimento do anúncio da Ressurreição e alegria ao constatá-la

* Contraste entre a vida no Grupo e a vida fora dele

Meus caros, muito simbolicamente, a Providência permitiu que pelo jogo natural dos fenômenos meteorológicos caísse uma tempestade tremenda, pouco depois do nosso sino ter anunciado a Ressurreição de Nosso Senhor e de nós estarmos aqui nesta paz, no esplendor destas luzes, na beleza de nossa sede, na quietude da alegria de nosso convívio fraterno, aos pés de Nossa Senhora, de tal maneira que se estabelecesse um contraste chocante entre o que vai aqui dentro e o que vai lá fora.

Parece-me que esse contraste tem algo que representa para nós um ensinamento, e é nós compreendermos, de um lado, a diferença que vai entre a vida de quem está no Grupo, por mais que essa vida possa comportar provações, possa comportar tormentos, possa comportar às vezes dificuldades, e, depois, aquilo que vai aí fora. Para termos um pouco a idéia de que o nosso Grupo é como que uma arca de Noé, dentro da qual se encontra tudo aquilo que deve sobreviver, tudo aquilo que deve constituir o mundo de amanhã, não no sentido de que só nós devemos sobreviver, mas que os valores morais que aqui estão, são amados, e pelos quais nós estamos dispostos a dar nossa vida, são aqueles que devem sobreviver amanhã, que devem ser o fundamento do mundo de amanhã. Eles flutuam no meio da tempestade. No recinto em que eles são cultuados, em que eles florescem aos pés de Nossa Senhora, junto à relíquia do Santo Lenho, à Coroa de espinhos, aos cravos que são fac-similares dos cravos da Paixão, à Coroa de Nossa Senhora, esse contraste produz necessariamente em nós um sentimento de gratidão a Nossa Senhora. Porque Ela tão imerecidamente nos chamou para essa situação, para esse aconchego, para essa proteção, para esse brilho no meio das trevas, para essa segurança no meio da tormenta, essa missão numa hora em que todo mundo abandona a missão que deve ter.

* A narração da Ressurreição

Com estas considerações, nós vamos iniciar o comentário do Santo Evangelho que corresponde ao dia de hoje. É tirado da “Concordância dos Santos Evangelhos”, de Dom Duarte.

Na noite do sábado, quando já raiava o primeiro dia da semana, Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, e Salomé, compraram perfumes para virem embalsamar a Jesus. No primeiro dia da semana, partindo muito cedinho, estando ainda escuro, chegaram elas ao sepulcro ao levantar do Sol, trazendo os perfumes que tinham preparado. E diziam entre si: “Quem nos há de afastar a pedra da entrada do sepulcro?” Porque ela era muito grande. Eis que houve um grande terremoto, porque um Anjo do Senhor desceu do céu e, aproximando-se, rolou a pedra e sentou-se sobre ela. O seu aspecto era como o relâmpago e suas vestes como a neve. De medo dele, assustaram-se os guardas e ficaram como mortos.

Maria viu a pedra afastada do sepulcro e foi correndo ter com Simão Pedro e com o outro discípulo que Jesus amava e lhes disse: “Tiraram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde O puseram”.

As outras mulheres viram também a pedra afastada do sepulcro e, entrando, não encontraram o corpo do Senhor Jesus [Cristo]. E aconteceu que estando elas consternadas por esse motivo, eis que se apresentaram junto delas dois homens vestidos de roupas deslumbrantes. E como elas se atemorizassem e baixassem os olhos para o chão, lhes disseram eles:

Não temais, porque sei que procurais a Jesus que foi crucificado. Por que procurais entre os mortos Aquele que está vivo? Não está aqui, mas ressuscitou como tinha dito. Recordai-vos do que vos disse Ele quando estava ainda na Galiléia: “É preciso que o Filho do Homem seja entregue nas mãos dos pecadores, que seja crucificado e ressuscite ao terceiro dia”.

Vinde ver o lugar onde foi posto o Senhor, e ide prontamente dizer aos seus discípulos e a Pedro que Ele ressuscitou e vai adiante de vós para a Galiléia”. Aí O vereis, como Ele vos disse. Eis que eu vos preveni”.

Então, recordaram-se elas das palavras de Jesus, e saindo, fugiram do sepulcro, porque as tinha acometido o tremor e o pavor, e a ninguém disseram coisa alguma por estarem possuídas de medo.

Entretanto, saiu Pedro e aquele outro discípulo, e vieram ao sepulcro. Ambos corriam juntos, mas aquele outro discípulo correu mais apressado do que Pedro, e chegou primeiro ao sepulcro.

Inclinado-se, viu os lençóis postos no chão, mas não entrou. Chegou, pois, Simão Pedro, que o seguia, e entrou no sepulcro e viu os lençóis postos no chão. Mas o sudário, que estivera sobre a cabeça de Jesus, não estava posto com os lençóis, senão que estava dobrado num lugar à parte.

Então, pois, entrou também aquele discípulo que primeiro tinha chegado ao sepulcro: e viu e acreditou, pois ainda não compreendiam a Escritura, que Ele havia de ressuscitar dos mortos.

E os discípulos voltaram de novo para casa. Tendo Jesus ressuscitado de manhã, no primeiro dia da semana, apareceu primeiramente a Maria Madalena, da qual havia expulsado sete demônios.

Ora, estava Maria junto ao sepulcro, da parte de fora chorando. Enquanto chorava, inclinou-se, olhou para o sepulcro, e viu dois Anjos vestidos de branco, sentados, um à cabeceira, outro aos pés, onde tinha sido posto o corpo de Jesus.

Disseram-lhe eles: “Mulher, por que choras?” Respondeu-lhes ela: “Porque tiraram o meu Senhor e não sei onde O puseram”. Dizendo isto, voltou-se para trás, e viu a Jesus, de pé, mas não sabia quem Ele era.

Disse-lhe Jesus: “Mulher, por que choras? A quem procuras?” Julgando ela que fosse o jardineiro, disse-Lhe: “Senhor, se O tiraste, dize-me onde O puseste e eu O levarei”.

Disse-lhe [então] Jesus: “Maria!” Voltando-se, disse-Lhe ela: “Raboni!”, o que quer dizer “Mestre!”

Disse-lhe Jesus: “Não Me toques, porque ainda não subi para meu Pai, mas vai dizer aos meus irmãos que Eu subo para meu Pai e vosso Pai, para meu Deus e vosso Deus”.

Este lindíssimo Evangelho da Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo está tão cheio de ensinamentos nas linhas gerais e nos pormenores, que se teria a tentação de comentar tudo. Mas, evidentemente, a concisão obriga a não fazer comentário. Mas me parece que, como a linha geral é bastante conhecida, é mais interessante nós irmos comentado daqui, de lá e de acolá, um ou outro pormenor, que é ilustrativo. Então, eu repito e vou comentando.

Na noite de sábado, quando já raiava o primeiro dia da semana, Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, e Salomé, compraram perfumes para virem embalsamar a Jesus.

* Aquela sobre a qual todas as alegrias e as glórias da Ressurreição convergiram

A gente se pergunta: três Marias; onde está a outra Maria? Onde está Nossa Senhora? A gente vê que a dor d’Ela era tão grande, o recolhimento d’Ela era tão grande, a esperança d’Ela era tão grande, que ela pairava por cima de todas as circunstâncias concretas e de todas as providências concretas, mesmo as mais augustas, mesmo as que mais dissessem respeito ao corpo de seu Divino Filho. Ela estava num recolhimento, Ela estava fora e acima de todos os acontecimentos. E, por causa disso, as outras A serviam e faziam por Ela, por mediação d’Ela, por instigação d’Ela, pelas ordens d’Ela aquilo que Ela mesma quisera fazer.

De tal maneira nós devemos imaginar Nossa Senhora no estado excelso de recolhimento em que toda a dor da Igreja, em que todo o júbilo da Igreja, toda a esperança da Igreja estavam concentrados para depois serem distribuídos para todos os fiéis ao longo de todos os tempos. E é por causa disso que Aquela que é, depois de Nosso Senhor, o centro da Ressurreição, porque Ela é Aquela sobre a qual todas as alegrias e as glórias da Ressurreição convergiram de Nosso Senhor como sobre o foco central; d’Ela não se diz nenhuma palavra, porque Ela é superior a todo louvor, é superior a toda referência, é superior a qualquer menção. Ela paira acima de tudo. Cabe-nos a nós apenas pensar nisto e continuar, reverentes, a narração, porque na soleira da porta do quarto onde estava Nossa Senhora não penetrou o cronista do Evangelho, e também nós não somos dignos de penetrar. É apenas sentir esses perfumes da devoção a Nossa Senhora do lado de fora e nos enlevarmos ao passar. Esta é a razão do silêncio deste Evangelho a respeito de Nossa Senhora.

* O caráter matinal da alegria pascal

Depois continua:

No primeiro dia da semana, partindo muito cedinho, estando ainda escuro, chegaram elas ao sepulcro ao levantar do Sol, trazendo os perfumes que tinham preparado. E diziam entre si: “Quem nos há de afastar a pedra da entrada do sepulcro?” Porque ela era muito grande.

Vejam que coisa bonita: elas chegaram ao sepulcro quando raiava o dia. Por que está dito isto no Evangelho? Porque a alegria pascal tem qualquer coisa de matinal.

Nosso Senhor, que sai de dentro da morte é simbolizado como o sol que se levanta de dentro da noite. Os senhores já pensaram na primeira noite de Adão? Quando ele viu caírem as trevas sobre o mundo, e ele depois adormeceu? O medo de que nunca mais as coisas se reparassem… e voltassem ao que eram… E quando ele viu o sol surgir de novo de dentro da noite e que ele viu esse esplendor, o pensamento da ressurreição? Nosso Senhor era o sol que saía de dentro da escuridão1 da morte, e aquelas que foram tomar conhecimento d’Ele chegaram ao sepulcro exatamente no momento em que o símbolo figurava a realidade que se tinha passado.

Quer dizer, aí os senhores vêem como Nosso Senhor ama a natureza que Ele criou, como Ele gosta de fazer todas as coisas em consonância com essa natureza, e dando valor ao símbolo de que Ele mesmo é o Autor. Então, os senhores compreendem também, adequadamente, porque o Evangelho menciona essa hora. Todas essas coisas têm um mundo de sentidos místicos, de sentidos alegóricos, de sentidos reais. Aqui está um desses significados.

* A atitude de Nossa Senhora e das Santas Mulheres face à Ressurreição

Bem, agora, elas levavam perfumes que tinham preparado para isso. Isso nos lembra exatamente aquele dito de Nosso Senhor, que o Corpo d’Ele quando recebeu o perfume daquela mulher, estava já sendo preparado para a sepultura. Os cadáveres eram aromatizados com perfumes. Elas estavam tão certas, tão esquecidas da profecia da Ressurreição, e tão certas de que Nosso Senhor não tinha ressuscitado, que levavam tudo, o ungüento, para ungir o Cadáver. Elas chegam lá e encontram um Deus ressuscitado!

Os senhores estão vendo como era razoável que Nossa Senhora pairasse acima dos acontecimentos. Nossa Senhora sabia que Ele não seria encontrado lá. Ela tinha que incentivar o ato de piedade delas, mas Ela não podia participar desse ato, que não correspondia ao que Ela sabia. Então, elas lá foram com os seus perfumes. Esses perfumes eram uma expressão da alma delas. Quem oferece perfumes é porque tem amor e gostaria que sua alma subisse a Deus como um perfume de um odor suave. Elas levavam ungüentos perfumados para ungir a Nosso Senhor.

Agora, vejam, de outro lado, a confiança dessas mulheres. Elas sabiam que havia uma pedra muito pesada lá. Elas podiam temer perseguições, e a tarefa que iam fazer era impossível, mas nada as deteve. Elas confiaram que, obedecendo à voz interior da graça, não seria uma pedra que lhes haveria de atrapalhar o cumprimento da missão. Que maravilhosa lição para nós! Quantas vezes a graça nos chama para alguma coisa. Mas nós dizemos: “Mas quem tirará uma pedra tão pesada de nosso caminho?” A resposta é esta: “Contemos com Nosso Senhor, porque se a graça nos chama para lá, não há pedra que alguém não afaste”.

No caso concreto, os Anjos afastaram a pedra. Quantas vezes os Anjos têm afastado pedras dos nossos caminhos! Confiança, e caminhar de encontro a todas as pedras, porque os Anjos as removerão para nós, por ordem de Nossa Senhora.

* Que Nossa Senhora nos faça como o Anjo da Ressurreição

Continua:

Eis que houve um grande terremoto, porque um Anjo do Senhor desceu do céu e, aproximando-se, rolou a pedra e sentou-se sobre ela. Seu aspecto era como o relâmpago e suas vestes como a neve.

Os senhores não imaginam como eu sinto não ter o mínimo talento possível para a pintura, porque eu gostaria de saber pintar isto. É a imagem, ou ao menos umas das imagens, que eu faço de um Anjo. E é um Anjo descrito pelo próprio Espírito Santo. Pode haver uma coisa mais gloriosa, mais espiritual, mais casta, mais forte, do que um espírito que é como um relâmpago, mas vestido como a neve?! É a força e a pureza da alma que se entregou a Nossa Senhora. É um dos símbolos do varão verdadeiramente católico; é uma das descrições dos “apóstolos dos últimos tempos” que devem ser verdadeiros Anjos.

Que ideal para nós, que tantas vezes somos moles, somos fracos, somos tíbios… Pedir a Nossa Senhora que nos faça como o Anjo da Ressurreição. Há uma pedra no caminho para que o Reino de Maria se implante. Oxalá fôssemos nós esse Anjo! Ágil, forte, majestoso como o relâmpago, puro como a neve, que empurra de lado a pedra da Revolução e faz com que a pedra da Contra-Revolução com os seus ungüentos chegue até o lugar da Ressurreição! Que maravilha seria uma coisa dessas para Nossa Senhora!

Bem, continua. Os senhores vejam outra coisa interessante: a presença do Anjo causar um terremoto. Por que a presença de um Anjo causa um terremoto? É tal a superioridade da natureza do Anjo, é tal a sua grandeza, que há uma espécie de incongruência entre a natureza e ele. E compreende-se que na proximidade de certos Anjos com a matéria, a matéria estremeça, a sua fragilidade estremeça. Mas, bendita a terra que tremeu pela presença do Anjo! Bendito o Anjo que fez tremer a terra! Essa é a terra que treme para dar glória a Deus, depois de ter tremido de indignação por causa do deicídio que tinha sido realizado! Entre os dois terremotos, há uma espécie de harmonia, de simetria: o terremoto do castigo, mas depois o terremoto da graça, o terremoto da presença do Anjo, da reconciliação e da aliança. São dois fatos tão grandes, que eram dignos de serem celebrados por terremotos.

* Maria Madalena corre para falar com o chefe da Igreja; o senso de hierarquia

Mais adiante:

De medo dele, assustaram-se os guardas e ficaram como mortos.

Os guardas viram o Anjo. Ficaram como mortos.

Maria viu a pedra afastada do sepulcro e foi correndo ter com Simão Pedro e o outro discípulo que Jesus amava.

É uma coisa curiosa, mas tem-se a impressão de que ela não sentiu o terremoto. E nem viu o Anjo na sua natureza angélica, mas ela viu que o sepulcro estava aberto. Das três, aquela [de] quem o Espírito Santo no Evangelho mais fala que amava Nosso Senhor, é Maria Madalena. Os senhores vejam que coisa bonita: em vez de ter a coragem de entrar no sepulcro, ela entendeu que o fato era tão augusto que não cumpria a ela fazer isso. É o senso hierárquico e antiigualitário da Igreja que se manifesta desde esses albores, apesar de alguns miseráveis falarem da igualdade na Igreja das catacumbas. Ela não faz isto, ela vai correndo falar com o chefe da Igreja. Ela vai contar o que ela viu, para que aquele tome as providências que as circunstâncias pedem, porque não é a ela que cabe.

Vejam, de um lado, toda a beleza do papel do sexo feminino: o amor que leva o ungüento que ele constitui dentro da Igreja. Mas vejam a jurisdição do homem e a jurisdição de São Pedro, da Hierarquia. Acontece o fato: ela, que estava com o coração transbordante de amor, vai falar com ele. Agora os senhores vão ver como esse senso de hierarquia, dentro, não dá falta de distância psíquica jamais, mas dentro da efervescência da hora, não perde em absoluto os seus direitos. Os senhores vão ver o resto da narração como continua.

Ela disse: “Tiraram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde O puseram”.

Ela olhou, ela não entrou. Ela foi logo avisar.

As outras mulheres viram também a pedra afastada do sepulcro, e entrando não encontraram o Corpo do Senhor.

Elas tiveram menos a idéia da hierarquia, ou sabendo que a hierarquia foi avisada, elas então entraram. E algumas coisas seguiram, são assim, mas é bonito que o primeiro pensamento foi para São Pedro.

* Anjos proclamam a Ressurreição

E aconteceu que, estando elas consternadas por esse motivo, eis que se apresentaram junto delas dois homens vestidos de roupas deslumbrantes.

Quer dizer, os Anjos tomaram a forma de homens, e para nós compreendermos o que eram essas roupas deslumbrantes, nós temos que nos lembrar como eram as roupas daquele tempo. Nós não podemos imaginar dois Anjos vestidos com paletós e com as calças [com] que os senhores estão, e muito menos vestidos com os infames suéteres e roupas de malandro de hoje. Porque é inimaginável um Anjo aparecer de paletó refulgente e de gravata deslumbrante, quando é o paletó e a gravata, não é verdade?

Há uma tal vilania nos nossos trajes que nós não ousamos fazer monumentos com os nossos trajes. Quem é que faz um monumento em bronze com uma pessoa com calça, calcinha, paletosinho, bengalinha? Não é possível, não é? Eram as túnicas que se usavam naquele tempo, e essas têm dignidade. E então, apareceram dois Anjos com forma de homem, de modo alvinitente, brilhantes, e eles se põem a falar.

O que é muito bonito é a gente ver que os dois falam como um e é um cântico mais ou menos como nós ouvimos há pouco. Quer dizer, os dois cantam uma só coisa. Eles representam, evidentemente, todos os Coros dos Anjos. Esse dois aqui indicam a pluralidade de Anjos empenhados na missão e, naturalmente, as vozes deles não seriam duas vozes iguais, mas duas vozes que (se) faziam harmonia, e eram –– o Evangelho não fala em música, nem em canto, devia ser uma proclamação –– e eram dois arautos que anunciavam, portanto, esse fato. E o mais engraçado é que no fim eles falam no singular como se fossem um só: “Tal missão me foi dada”. Tal é o uníssono deles, tal é a união das almas que amam a Deus. Aqui vem então a mensagem deles:

Não temais, porque sei que procurais a Jesus que foi crucificado. Por que procurais entre os mortos Aquele que está vivo?

Há uma certa censura na pergunta, uma certa censura no meio dessa alegria: “Por que procurais entre os mortos Aquele que está vivo?” Os senhores vão ver desenvolver-se o pensamento a respeito.

Depois:

Não está aqui, mas ressuscitou como tinha dito…”

Aqui vem a coisa:

“…como tinha dito. Recordai-vos do que vos disse Ele.”

Recordai-vos”. Há uma certa censura àquela insuficiência de Fé que, com exceção de Nossa Senhora, teve toda aquela gente. Então:

Quando estava ainda na Galiléia Ele disse:”

Agora, as palavras de Nosso Senhor, citadas pelo Anjo:

É preciso que o Filho do Homem seja entregue nas mãos dos pecadores, que seja crucificado e ressuscite ao terceiro dia.’

Foi a citação, como quem diz: “Essas foram as palavras, lembrai-vos agora e confundi-vos”. Mas isso era dito de tal maneira que sendo uma lição, não era, entretanto, para produzir no momento uma contrição. Tanto é que, a gente vê que, em vez de elas sentirem contrição, sentiram alegria. Elas começaram a se alegrar.

Vinde ver o lugar onde foi posto o Senhor, e ide prontamente dizer aos seus discípulos e a Pedro que Ele ressuscitou.”

Os Anjos confirmam: a missão delas não fazia bis in idem com a missão de Madalena. A missão de Madalena era dizer que o sepulcro estava vazio. Elas deviam dizer que dois Anjos apareceram e que anunciaram a Ressurreição.

Agora, por que é que os Anjos não falaram a Pedro? Os senhores estão vendo que se pode fazer a conjectura: aquelas que foram fiéis ao pé da Cruz receberam a mensagem. Aquele que não estava lá presente, não recebeu a mensagem. Era o Papa, era o Príncipe dos Apóstolos, não recebeu a mensagem. Alguém me dirá: “Mas por que São João Evangelista, então, não estava presente?” Os senhores vão ver que ele fez questão de dar preeminência a São Pedro no fato. A narração seguinte estabelece isso. Então, disse:

Ele ressuscitou e vai adiante de vós para a Galiléia. Aí O vereis.”

Quer dizer: “Como Ele vos disse: eis que vos preveni”.

Quer dizer, o Anjo também mandou um recado aos Apóstolos. No meio das alegrias, tiveram a sua parte.

Então, recordaram-se elas das palavras de Jesus.

Quer dizer, é claríssimo que elas tinham ouvido, que elas sabiam e tinham esquecido. Se a expressão não fosse muito trivial, a gente deveria dizer que elas tinham “zuppado”. Dentro da agonia e da angústia, se elas fossem “geração-nova”, a gente poderia dizer que elas tinham perdido a distância psíquica e tinham “zuppado” as palavras de Nosso Senhor.

Então, diz o seguinte:

Então, recordaram-se e, saindo, fugiram do sepulcro, porque as tinha acometido o tremor e o pavor, e a ninguém disseram coisa alguma, por estarem possuídas de medo.

Mas não é um medo de castigo. A gente entrevê que é o contato com a coisa augusta, com a coisa enorme, não é? Elas ficaram quietas. Agiram bem ou agiram mal? Eu não encontro no Evangelho esclarecimentos para isso.

* Amor e espírito hierárquico de São João: chega primeiro, mas espera por São Pedro

Entretanto, saiu Pedro e aquele outro discípulo, e vieram o sepulcro. Ambos corriam juntos, …

Mas eles tinham a notícia da outra, de que o sepulcro estava vazio. Ambos corriam juntos. Agora vejam quão significativo é:

mas aquele outro discípulo…

O discípulo a quem Jesus amava.

correu mais apressado do que Pedro.

É claro que pode ser que São Pedro fosse mais velho, que ele fosse um pouco estropiado, compreende-se, eu compreendo bem. O fato é que o que amava mais corria mais. O amor corre.

E chegou primeiro ao sepulcro. Inclinando-se, viu os lençóis postos no chão, mas não entrou.

O amor levou-o a ir depressa, mas é o mesmo amor que o levou a dar precedência àquele a quem Nosso Senhor tinha dado a precedência. Ele não entrou, esperou que São Pedro entrasse. Os senhores vêem como está aqui o espírito hierárquico da Igreja e como o tal correr dele não era um correr sem distância psíquica. Era um correr cheio de ordem, era uma pressa cheia de falta de pressa. Era tão equilibrado, tão santo: “animam suam in manibus suis semper tenens”, segurando a própria alma nas suas próprias mãos, que na hora de chegar — que é quando a gente da “geração-nova” está mais embalada —, ele parou. Ele pára e espera São Pedro chegar. Quanto respeito, quanta reverência. Mas tudo passou para a História.

Bem, agora continua:

Chegou, pois, Simão Pedro que o seguia…

Coisa repisada, “que o seguia”; isso é dito várias vezes.

* O sudário e a dignidade da Face de Jesus

e entrou no sepulcro e viu os lençóis postos no chão. Mas o sudário, que estivera sobre a cabeça de Jesus, não estava posto com os lençóis, senão estava dobrado e num lugar à parte.

Os senhores vêem a beleza do respeito ao corpo humano e, portanto, ao Corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo. Há uma dignidade da cabeça, há uma dignidade da fronte, há uma dignidade da face, que é algo de especial no homem e por causa disto, o sudário, que tocou na Face, não estava colocado junto com os outros panos. Mais ainda: os panos estavam no chão. O sudário estava num lugar à parte. A gente entrevê que era um lugar mais distinto; talvez uma anfractuosidade da pedra, talvez alguma outra coisa assim, ali estava o sudário.

A gente fica abismado, porque Nosso Senhor Jesus Cristo é todo Ele adorável. Pudéssemos nós oscular qualquer parte de seu Corpo, a planta de seus pés sagrados, seria uma honra que nós jamais mereceríamos! Pois dentro do sagrado há como que uma distinção. Olhem que há união hipostática de todo o Corpo santíssimo d’Ele, mas há uma distinção: o sudário estava colocado de lado. O sudário estava posto em outro lugar.

Isso encontra consonância com uma coisa que eu sempre pensei: é que o Santo Sudário de Turim não era esse sudário. O Santo Sudário de Turim tem a Face e o Corpo inteiro. E ainda uma notícia publicada nos jornais ontem, transcrevendo um artigo do “Osservatore de la Domenica”, dando os estudos de um médico sobre esse assunto, ainda esse artigo dizia: que o médico, que à la européia, estudou durante quarenta anos o Santo Sudário de Turim –– isso é muito europeu –– chegou à conclusão de que aquele Sudário de Turim é a mortalha em que ele foi envolto, mas não é o sudário que tocou na sua Face. Não é, portanto, o pano que O recobria por ocasião da Ressurreição.2

* O Coração de Jesus teria se rompido em dois

A notícia dizia uma coisa que para quem tem entranhas e tem um pingo de sentimento, é sumamente tocante e alimenta extraordinariamente a devoção ao Sacratíssimo Coração de Jesus.

A notícia dizia que esse médico sustentava que a causa mortis de Nosso Senhor foi que o seu Coração, de sofrimento, o seu Coração físico, de carne, rompeu-se em dois. E dá lá uma explicação médica, que eu não seria capaz de repetir aqui. Enfim, nessas ou naquelas condições, com uma dor extrema o coração se rompe. E com o Coração que se rompeu, Ele morreu. Impressionante: rompeu-se, [assim] como o Coração, cindiu-se o véu do Templo.

Agora, os senhores vejam que prova mais tocante de amor a nós Ele poderia dar, do que de um Coração que por amor de nós se rompeu em dois. O que mais nós esperamos? O que mais nós podemos imaginar? Eu gostaria que isso pudesse ser comprovado, para que se pudesse pôr uma invocação especial na Ladainha do Sagrado Coração de Jesus: “Ó Coração que se rompeu em dois.3

* O sofrimento da Nossa Senhora ante as dores de seu Filho

Se isso é verdade, os senhores podem imaginar o que sofreu Nossa Senhora que, com certeza, soube disso, quando Ela soube que o Coração do Filho d’Ela se rompeu em dois? Pensem na mãe de qualquer um de nós: o que é que ela sentiria se ela soubesse que seu filho sofreu tanto que morreu porque o seu coração se partiu? Normalmente, eu penso na minha: ela morreria. Assim são as mães.

Bem, como era Nossa Senhora? O que Ela sofreu nessa ocasião? Quantas mortes Ela teria preferido sofrer a passar por isso! Mas Ela quis isso. Ela quis que o Coração d’Ele eventualmente se tenha partido em dois. Porque se era esse o desígnio de Deus para a nossa redenção, tanto, tanto, e tanto Ela quis a nossa redenção, que Ela terá querido isso.

Mas nossa é um modo de dizer. Ainda que fosse só a minha, tudo isso teria por Deus sido dado por bem empregado. De maneira que cada um de nós deve raciocinar a respeito desses fatos, como se esses fatos tivessem ocorrido só em favor dele. E nós compreendemos aqui o que é a doçura do Coração de Jesus. Porque depois disso vem a Redenção, vem o perdão, vem Pentecostes, vem a Igreja, vem, enfim, toda a suavidade da Civilização Cristã, toda a grandeza da Civilização Cristã. Aqui os senhores compreendem o que essas coisas querem dizer. Como isso é impressionante.

Bem, como eu me alongo demais, vamos adiante.

Então, pois, entrou também aquele discípulo que primeiro tinha chegado ao sepulcro.

O Evangelho repisa bem: depois e só depois entrou o discípulo fiel. São João, se fosse “mega”, não teria podido dizer: “Bem, São Pedro é o chefe, mas eu tenho direito. Quem estava ao pé da Cruz, não era eu? Agora chegou minha vez; eu vou lá”. Não. Então, e só então… porque este era o chefe. Aquele que ama é verdadeiramente assim. Ele não quer o primeiro lugar. Ele quer amar. E ainda que aquele a quem ele ama queira dar o primeiro lugar a outrem, ele quer isto e quer aquele primeiro lugar para o outro. Porque ele soube amar. Que lição para nós!

Bem:

E viu e acreditou.

A gente fica pasmo. “Viu e acreditou”. Ele deixa entender que com todo o amor dele, foi naquela hora que ele acreditou. E era o discípulo amado.

Pois ainda não compreendiam a Escritura, que Ele devia ressuscitar dos mortos.

O pito das mulheres foi bastante grande para que a gente entenda a referência a eles. Tanto mais que eles ainda não compreendiam.

E os discípulos voltaram de novo para casa.

Por que voltaram? Porque Nosso Senhor disse que ia aparecer para eles na Galiléia.

Tendo Jesus ressuscitado de manhã, no primeiro dia da semana, apareceu primeiramente a Maria Madalena, da qual havia expulsado sete demônios.

Como é curiosa essa referência, não é? Nesta hora lembrar isso. Mas é que é a vitória d’Ele sobre o demônio, e a identificação, é aquela para quem Ele fez tão grande bem, aquela na qual Ele fez uma tão grande maravilha. É a beleza da contrição e do perdão: primeiro apareceu para ela.

* A primeira a ver Jesus Ressuscitado

Os senhores estão vendo que é um “primeiro-primeiro”, o primeiro, “superprimeiro”. Quem é que foi A primeira a quem Ele apareceu? Os senhores já estão vendo: na primeira hora, o primeiro raio de beleza, o primeiro momento, evidentemente foi para Nossa Senhora. A gente costuma contemplar o encontro de Nosso Senhor com Nossa Senhora na Via Crucis. Eu não conheço coisa mais bonita. Mas eu conheço uma coisa tão bonita: é o encontro d’Ela com Ele ressuscitado. A alegria d’Ela, o “Magnificat” d’Ela. O que isso terá sido? Só no Céu é que nós poderemos saber.

* Esquecimento do anúncio da Ressurreição e alegria ao constatá-la

Bem:

Ora, estavam junto ao sepulcro, na parte de fora, chorando. Enquanto choravam inclinou-se, olhou para o sepulcro…

Eram as mulheres que estavam.

e viu dois Anjos vestidos de branco, sentados; um à cabeceira, e outro aos pés, onde tinha sido posto o Corpo de Jesus. Disseram eles:

Os Anjos.

Mulher, por que choras?”

Como se fosse uma só mulher.

Respondeu-lhes ela: “Porque tiraram o meu Senhor e não sei onde O puseram”. Dizendo isto, voltou-se para trás e viu Jesus, de pé, mas não sabia quem era Ele.

Por que isso? Não parece ter alguma relação com a espessura deles a respeito da Escritura? Não sabiam eles…

[fim da fita]

Quer dizer, que beleza de cena! Quanta coisa ela se lembrou quando Ele disse para ela: “Maria”. Aquelas mil vezes em que Ele disse para ela, com afeto, “Maria”, aquilo tudo acordou na alma dela. Então, ela entendeu. E ela disse logo o que, com certeza, mil vezes, ela tinha dito para Ele em vida: “Mestre!”, “Raboni!”

Disse-lhe Jesus: “Não me toques”.

A gente vê que ela queria ir de encontro a Ele. Os senhores vêem que linda intimidade dela com Ele. Ela O viu e foi de encontro. Com certeza, quis segurá-Lo, quis beijar as mãos, qualquer coisa assim, ou os pés. E Ele disse essa palavra: “Não me toques”, e deu a razão: “…porque ainda não subi para meu Pai”.

Razão, para mim um tanto misteriosa, sublime e misteriosa. Há uma grandeza nisso, há toda a distância entre esta vida e a outra vida: “Eu não subi ainda para meu Pai, mas Eu já estou do outro lado do rio da morte, o rio da morte continua a correr entre nós, embora Eu esteja ressuscitado. Eu não estou ressuscitado para esta vida. Eu já estou ressuscitado para o Céu. Não Me toques. Mas vai dizer aos meus irmãos” –– olhem o afeto, chamando os discípulos de irmãos, os Apóstolos de irmãos –– “que Eu subo para meu Pai e vosso Pai, para meu Deus e vosso Deus”. Estava pronunciado o perdão, e as coisas continuavam no diapasão da alegria.

E assim está terminado o Santo do Dia.

*_*_*_*_*

1 No microfilme estava: “da luz”.

2 Quer parecer que esse sudário cobriu a face por cima do Santo Sudário, pois este deveria estar em direto contato com a face e com o Corpo inteiro do Redentor, recebendo assim a impressão de suas imagens.

3 No microfilme estava: “O Coração se rompeu em dois”

Sala dos Alardos