Santo do Dia (Auditório da Santa Sabedoria – Rua Pará) – 7/10/1968 – 2ª-feira [SD 108] – p. 5 de 5

Santo do Dia (Auditório da Santa Sabedoria – Rua Pará) — 7/10/1968 — 2ª-feira [SD 108]

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A Batalha de Lepanto e Santo Isidoro de Peluzia

Eu desejo que as orações que nós façamos no fim da reunião, sejam em união com a renovação da Consagração a Nossa Senhora, que está sendo feita pelo grupo da Saúde agora à noite.

Hoje, 7 de outubro é festa de Nossa Senhora do Rosário. Essa festa foi instituída em comemoração da vitória de Lepanto, alcançada nesse dia contra os turcos que ameaçavam a Europa. Estendida à Igreja Universal em ação de graças pela derrota do crescente em 1716 na Hungria. O crescente como os senhores sabem bem, é a Lua crescente, ou seja, é o símbolo da Turquia, do poder Otomano, portanto de algum modo da religião maometana. E com isto, aliás, eu estou dizendo mal, não é, não é um símbolo nacional que se tenha tornado religioso, é o contrário, é um símbolo maometano que entrou para bandeira da Turquia, e naquele tempo a grande potência maometana era a Turquia. Não é?

Bem, amanhã nós temos a festa de Santo Isidoro de Peluzia. Não é possível nós realizarmos um Santo do Dia tratando apenas do santo de amanhã sem ter uma referência à batalha de Lepanto. A batalha de Lepanto foi tantas vezes comentada entre nós aqui, que eu quase não saberia o que de novo dizer a respeito dela.

Eu me lembro com alegria, não sei se Dr. Paulo se lembra desse fato, que nós tivemos a oportunidade de ver a tenda do sultão da Turquia tomada em 1716, na “armería del Escorial”, lembra-se disso? Não? Ah! Uma maravilha de tenda, eles eram “fassures” mas faziam coisas bonitas, não é? Toda trabalhada em pequenas meias luas, etc., e os objetos da tenda, tudo isso está lembra-se da “armeria del Escorial”? Não? Um museu de armas anexo ao Escorial. Ora! Onde estava até a espada que São Luiz mandou de presente a São Fernando não se lembra não? Bom, Dr. Pedro Paulo e Dr. Carlos Alberto devem ter visto. Também não? Olala! Bem, então também não há muito comentário a fazer a respeito do caso. Recomendo que vão ver. Tem essa verdadeira relíquia lá. Uma espada dada por São Luiz, para a luta dele contra os maometanos. Então era um cruzado da luta contra os maometanos da Terra Santa, oferecendo uma espada a um cruzado, primo irmão e também rei na luta contra os maometanos da Espanha. São as duas grandes cruzadas que por assim dizer se enfeixam e se osculam neste presente, infelizmente a capa da espada desapareceu, resta só a lâmina. E a lâmina não é bonita de vez, por que o que pode ser a lâmina de uma espada? Não é? Até surpreende, desaponta um pouco pelo tamanho, porque é uma espadinha. A gente imagina São Fernando, São Luiz, homenzarrões colossais empunhando espadas capazes de rachar de meio a meio muçulmanos enormes. Mas os homens antigos eram muito menores que nós. E por causa disso todas essas coisas tinham uma estatura menor. Estatura física. Sobre a moral eu prefiro não tecer comentários, passar por cima.

Bem; eu gostaria de dizer, entretanto, que a batalha de Lepanto, me é muito cara pelo seguinte aspecto.

Eu dei hoje recomendação, que já deve ter chegado a dr. Paulinho, de entremear com Santos do Dia, algumas narrações de feitos heróicos praticados por católicos ao longo da História. Cruzadas, Guerra de Reconquista, Chouannerie, depois a guerra dos Cristeros no México, a revolução… a guerra civil espanhola, na medida em que foi um extermínio de comunistas etc… Não é? A batalha de Lepanto também.

Agora por que razão é que eu gosto especialmente da batalha de Lepanto?

É que em geral criou-se um vício de que quando se fala de heroísmo católico, é um heroísmo que consiste em morrer, ou então em receber bordoada. Então acaba a narração de uma vitória, um dos autores xaroposos, católicos dos últimos 50, 80 anos sempre assim, o bom mancebo voltou para casa sem nariz, ou sem braço ou espancado desse jeito ou daquele jeito. Então retiram-se com muita dor e muito sofrimento, os valentes guerreiros depois de uma inútil resistência. Bom, eu compreendo que seja muito bom perder o nariz por amor a Nosso Senhor Jesus Cristo. (Eu tenho impressão de que até há muita gente aqui a quem faria muito bem em perder o nariz por Nosso Senhor. Muita pretensão e muito milecanismo, uh! Baixava com isso que era uma beleza. Seria uma amputação que realizaria bem o que diz Nosso Senhor, é melhor entrar perneta ou caolho no Reino dos Céus do que ir inteiro para o inferno. Fazia muito bem para muita gente perder a ponta do nariz. Eu não, de propósito não olho aqui para o nariz de ninguém, mas faria muito bem para muita gente). Bem, mas a questão não é essa, é que a plena figura do heroísmo católico, não consiste apenas em apanhar, mas bater. E não consiste apenas em perder, há um belo heroísmo em perder, mas [também]em ganhar! Em triunfar!

Esse aspecto militante, atacante, triunfal, que existe precisamente na batalha de Lepanto, me encanta. Eu registro esse aspecto e passo para frente

Vamos tratar de Santo Isidoro de Peluzia. São tantos os santos da Igreja que a gente a todo momento dá com nomes de que nunca ouviu falar em minha vida. Santo Isidoro, o lavrador eu já ouvi falar. Santo Isidoro de Peluzia não. Nem sei bem onde é Peluzia, parece que é na Itália, não tenho certeza. Século V. Bispo. Grande lutador contra as heresias.

Um sofista, Asclépio, em uma de suas cartas a Santo Isidoro, recomendava-lhe que moderasse sua linguagem. Respondeu o Santo:

Não creiais que mudarei de tom e que me tornareis um fraco bajulador. Ao contrário ou cessais de me dar tais conselhos ou eu vos expulsarei do número de meus amigos.

Sim senhor! Isto, isto é cumprimento do conselho de Nosso Senhor no evangelho! Do preceito não é conselho, seja vossa linguagem “sim, sim! Não, não!” Os senhores estão vendo isto daí como vai? Como corre direito? Querem que eu repita? Os que quiserem levantem o braço. Ah! Meus distraídos! A frase é essa: um tal Asclépio, que era um herege, ariano, escreveu uma carta a santo Isidoro, recomendando que ele atacasse menos fortemente os arianos. Santo Isidoro deu-lhe a seguinte resposta: “Vós não deveis, vós Asclépio, não deveis crer que eu mudarei de tom e que me tornarei um bajulador fraco. Ao contrário: ou vós cessais de me dar tais conselhos(quer dizer, o conselho de ficar laranja) ou eu vos expulsarei do número dos meus amigos”. Quer dizer, não tolero conselhos idiotas, se quiser me dar um conselho idiota desses em que importa uma traição à causa católica, eu o corto do número dos meus amigos. Isto é que é responder, não é verdade?

Depois ao bispo de Teón. Carta de Santo Isidoro de Peluzia ao bispo de Teón:

Somos igualmente culpados. Tanto quando vingamos nossas injúrias como também quando não sentimos as que são feitas a Deus. Quando se tratar de nós , usemos de toda indulgência quando nos ofenderem. Quando entretanto foi Deus ultrajado, não devemos suportar.

Está claro ou prefeririam que eu pusesse isso em linguagem corrente? Os que prefeririam linguagem, não foi distração eu entendo bem Os que preferem linguagem corrente levantem o braço. Vamos ver um pouquinho.

Quer dizer, ele diz o seguinte. Que ele… que há duas em matéria de injúrias, há duas formas de culpa. Uma forma de culpa é quando nos injuriam a nós pessoalmente e que nós nos vingamos. Nós não devemos nos vingar das injúrias que nos fazem. Esse é o primeiro princípio. Agora outro princípio.

É outra forma de culpa. É quando nós não vingamos as injúrias feitas a Deus. A estas injúrias nós devemos vingar. É uma obrigação. Isto são palavras de um santo, canonizado pela Igreja para servir de modelo para nós. Bem. “É preciso tremer de indignação quando se vê Deus injuriado”.

Tremer quer dizer estremecer de indignação quando se vê Deus injuriado.

Vede, entretanto, como somos fracos. Somos sensíveis a ponto de não querer perdoar nossos inimigos e só temos doçura contra aqueles que se elevam contra Deus.

Os senhores vêm que isso é velho, não é?

Moisés não agia assim embora fosse o mais suave dos homens. Ele não deixou de se encolerizar contra os israelitas quando fizeram o bezerro de ouro e sua cólera nessa ocasião foi bem mais santa do que toda a doçura que acaso houvesse mostrado. Elias elevou-se contra os idólatras. João Batista contra Herodes. São Paulo contra Elimas. Isto sempre para vingar a injúria feita a Deus. Quanto a eles esqueciam-se sem dificuldade daquelas que lhes eram dirigidas.

É verdade que Deus é poderoso bastante para se fazer justiça, mas ele quer entretanto que as pessoas de bem detestem o pecado e o façam detestar. E é nesta conduta de zelo que os santos faziam consistir a virtude e a verdadeira filosofia.

Os que desejam que eu dê um apanhado disso em português básico, levantem o braço que eu dou de bom grado. Bem, o que ele acaba de dizer aqui em duas palavras é o seguinte: que era bom que as pessoas a quem ele se dirigia, vissem como eram fracas. Ele diz o seguinte:

Vede entretanto como somos fracos.

Isso é o modo antigo de dizer como vocês são fracos. É muito desagradável chegar para o auditorio dizer: “Vocês são fracos, vocês têm tais defeitos. Então é um modo “Ancien Regime” de dizer nós somos fracos. Mas é claro que o santo não era fraco.

O santo era o modelo de fortaleza. Não é? Mas era uma bondade dele colocar-se no meio dos outros. Me lembro de um santo que pregava para leprosos e que quando falava com eles dizia “Nos leprosos…”, porque fica muito desagradável dizer “vocês leprosos”. Não é? Da a impressão que empurra de lado, não é? Então ele dizia “somos” Mas os senhores não devem supor que um santo pudesse ter essa fraqueza, é impossível, a Igreja não o teria canonizado. Bem, então ele disse, eu vou por na linguagem como é o fundo das coisas. Ele dizia aos ouvintes dele: “Vede como sois fracos, vós sois sensíveis a ponto de não querer perdoar vossos inimigos”. Quer dizer quando vos fazem uma ofensa pessoal, vos ficais muito sentidos. E não conseguis perdoar. Entretanto contra aqueles que ofendem a Deus, vos apenas tendes doçura. Era o caso de nós fazermos aqui um pequeno exame de conciência.

Nos quatro ou cinco últimos dias, é impossível que alguém não nos tenha feito uma ofensa por pequena que seja, um atrito qualquer. Nós vimos pecados contra Deus de toda ordem, basta sair à rua. O que é que mexeu mais com os nossos nervos foi o pecado contra Deus ou a desatenção feita a nós? É um exame de consciência tão bom esse, não?

Se eu fosse irreverente eu o dirigiria até o auditório verde. Mas não tenho essa irreverência, eu me dirijo aos senhores. Bem, nestes últimos dias os senhores não ficaram exacerbados com alguma desatenção que lhes foi feita? É bem provável não é? Bem ficaram igualmente exacerbados com alguma desatenção diante de algum pecado que viram? Quem sabe se nós merecemos as palavras de Santo Isidoro de Peluzia. Não é? É bem possível!

Eu volto a dizer é uma boa ocasião para um exame de consciência. Bem, depois ele acrescenta. Ele dá exemplos dos santos que não eram assim. Que eram violentos no castigar as ofensas feitas a Deus. Mas sabiam perdoar as ofensas feitas a eles. Ele disse:

Moisés era o mais suave dos homens, mas se encolerizou com os israelitas quando fizeram o bezerro de ouro. Bem, Elias levantou-se contra os idólatras e pediu fogo do céu que os exterminou.São João Batista indignou-se com Herodes. São Paulo com Elimas.

Quer dizer, porque? Porque esses eram pecadores, eram idólatras, eram homens de um vida impura. Deus se indignou com eles, os profetas se indignaram contra eles. Quanto às ofensas feitas a estes santos pessoalmente, eles se esqueciam sem dificuldade. Isto é o que ele explica aqui. Bem, em outra ocasião Santo Isidoro de Peluzia, disse:

Com as pessoas de bem é preciso mostrar-se suave, paciente, humilde, mas com os arrogantes e orgulhosos é preciso saber usar um tom firme.

Quer dizer, com as pessoas que vem com tristeza do mal que fizeram a gente pode ser bom. Quando o indivíduo vem se jactando do mal que fez é preciso pular em cima dele.

Aqueles olham a doçura como uma virtude, eis porque devemos usá-la para consolá-los.

Quer dizer aqueles que se arrependem de seus pecados, são pessoas inclinadas à doçura. Os que não se arrependem são petulantes. Mas os últimos só entendem à força. É preciso mostrar-lhes toda firmeza para quebrar seu orgulho.

Com essa conduta sábia e prudente sustentamos uns e humilhamos outros. Não se ganha todo o mundo com métodos iguais.

É uma esplêndida consideração. Ao pecador arrependido a gente trata de um jeito, ao que não é pecador arrependido a gente os trata de outro jeito.

Bem, com isso eu queria terminar dizendo uma palavrinha aos senhores a respeito do seguinte.

Se os senhores tiverem dificuldade em acompanhar o santo do dia, por causa do texto de um sentido assim um pouco torcicoloso, não tenham dúvida de me levantar sempre a mão. Porque do contrário os senhores perdem o tempo e eu também. Eu fico falando coisas que ninguém entende e os senhores entendem coisas que ninguém falou. E muito melhor os senhores levantarem a mão,, e da parte a parte, ganharmos tempo. Não é? A franqueza é uma virtude altamente desejável.

De maneira que eu com mais freqüência vou passar a interrogá-los sobre se a ficha está clara. É um modo indireto de não os obrigar a dizer que eu não fui claro, mas se eu mesmo não fui claro, também os senhores levantem o braço que eu com todo gosto me explico. Com isso então, vamos rezar pelos nossos irmãos da Saúde.

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Auditório da Santa Sabedoria – Rua Pará