Santo do Dia (Rua Pará) – 15/6/1967 – 5ª feira [SD 118] – p. 6 de 6

Santo do Dia (Rua Pará) — 15/6/1967 — 5ª feira [SD 118]

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Síntese biográfica de Santa Germana * Santa Germana, chamada a dar o exemplo da segurança sobrenatural em si mesma * Nosso grande título, a grande razão de nossa ufania é ser um filho da Santa Igreja Católica Apostólica Romana * A pastora feia, trôpega e deformada, mas que tem contato direto com o Céu * Na realidade, aqueles que mais entendem de fazer esmolas, em geral são os pobres * O milagre de Santa Isabel de Portugal reproduzido em Santa Germana * Graças a pedir a Santa Germana: segurança, amor à Igreja, combatividade

A festa de hoje é de Santa Germana Cousin. A síntese biográfica que nós vamos dar dela é tirada de Louis Veuillot. Em essência ocorreu o seguinte:

* Síntese biográfica de Santa Germana

Germana Cousin nasceu em 1579, em Vibrac, Toulouse, na época em que a França era assolada pelas guerras de religião.

Era uma época, portanto, de muita pobreza, porque as guerras de religião impediam, naturalmente, o desenvolvimento da agricultura e a escassez de víveres era muito grande.

Era filha de Leôncio Cousin, pobre lavrador, e desde criança, quando perdeu sua mãe, sua vida foi um sofrimento constante. Magra, desnutrida, escrupulosa, tinha, além disso, a mão direita deformada. Sua aparência levou-a a ser rejeitada pelo pai, que nunca lhe manifestou o menor carinho e nunca impediu a cruel perseguição que sua segunda esposa movia à enteada. A casa paterna de Germana, portanto, para ela era um lugar de martírio e não de repouso. Sua madrasta repreendia-a constantemente, obrigando-a a dormir num estábulo sobre duras enxergas. Proibiu-a também de aproximar-se de seus oito irmãos.

Germana, sem se incomodar, amava as criança com carinho especial, servindo-as sempre que podia. Deus inspirou-lhe o amor ao sofrimento e por isso aceitava com alegria essas humilhações, acrescentando-lhe outras austeridades. Toda sua vida só alimentou-se de pão e de água.

* Santa Germana, chamada a dar o exemplo da segurança sobrenatural em si mesma

Os senhores vão ver daqui a pouco outro aspecto da vida dela. Mas aqui está um conjunto de dados que incutem muito respeito, muita admiração.

Há determinadas figuras que nasceram para nos dar o exemplo da segurança em si mesma. E da segurança sobrenatural em si mesma e não da segurança natural. Porque elas são de tal maneira marcadas pela Providência, pela disformidade, por toda espécie de títulos que as colocam abaixo de todo mundo na ordem humana de valores, que dava para essas pessoas abrirem um buraco no chão e sumirem.

Assim os senhores estão vendo uma pobre coitada, órfã de mãe, escrupulosa, magérrima, com a mão direita deformada, uma coisa que de si desfigura qualquer pessoa, mas que ainda prejudica mais quando a pessoa é pobre e tem que trabalhar com seus próprios recursos, trabalhar com suas próprias mãos. Essa pessoa fica então mais ou menos inútil.

Essa pessoa mora, então, na casa de seu pai. E, sinal supremo do desprezo que todo mundo tem a ela, o seu próprio pai como que não a reconhece por filha, não a trata como uma filha, não lhe dispensa carinhos como a uma filha e a entrega à sanha da madrasta. Nós sabemos que a madrasta … [inaudível]… enteada, habitualmente, uma megera. Ela estava entregue à sanha e desprezo dessa megera, e vivia como uma criada na casa do pai. Dormindo numa dependência da casa, sobre duras enxergas, e fazendo o papel de pastora.

Essa pessoa podia, portanto, levada pela vergonha, levada pelo acanhamento, sumir, procurar fugir, ou ser uma pessoa … [inaudível]… revoltada. Não, ela se porta com extrema dignidade. Ela aceita a situação em que ela está, ela não se revolta, ela procura agradar as crianças que são filhos daqueles que a perseguem, e leva sua vida com dignidade, com simplicidade, na sua segurança de que ela tem um valor.

Ela é criatura humana, ela é batizada e ela é filha de Deus. E sendo filha de Deus, ela não precisa mais nada para levar a paz, para conduzir a paz bem alto, em frente a todos os outros. E ei-la, portanto, com modéstia e com naturalidade diante desse dilúvio de manifestações de pouco caso que vai conduzindo com espírito sobrenatural e superior à sua vida.

* Nosso grande título, a grande razão de nossa ufania é ser um filho da Santa Igreja Católica Apostólica Romana

Isso eu considero um lindo exemplo para nós, para nós compreendermos bem que nós não precisamos de títulos humanos para estarmos nos impondo ao respeito dos outros. Ainda quando os outros nos desprezam, nós temos títulos: nós somos filhos de Deus, somos filhos da Santa Igreja Católica, a título especial, somos filhos de Nossa Senhora.

Deus, em sua grandeza infinita, se sente agradado com nosso louvor. Ele deseja nosso amor e o aceita, e corresponde. Isso basta. Todo o resto não é nada, todo o resto não tem importância. O título de filho de Deus basta para tudo.

Conta-se o caso de uma filha de Luís XV que sentindo-se maltratada por uma criada, disse à criada com energia: “Você se esquece que eu sou filha do rei?”. E a criada que achava que o lado errado estava do lado da princesa disse: “Vossa Alteza se esquece que eu sou filha de Deus?”. É uma linda lição. É uma resposta que indica bem a segurança e a altaneiria da pessoa a quem basta a sua posição de católico.

Eu sou católico, achem dessa posição o que quiserem, riem como entenderem, admirem como quiserem, nada se acrescenta nem se tira à enorme segurança que eu tenho, à alegria fundamental que eu sinto, à ufania que eu experimento em ser católico, apostólico, romano, filho da Santa Madre Igreja Católica Apostólica Romana. Não se precisa mais nada.

Isso me dá o título para eu me apresentar aos olhos de qualquer um com sobranceria, com altaneiria. Não é preciso ser rico, não é preciso ser inteligente, não é preciso ser agradável, nem nobre ou qualquer outra coisa. Para eu usar, ter a sensação da minha dignidade, basta ser filho da Igreja Católica Apostólica Romana.

É claro que se além disso eu tiver outros títulos, melhor será. Mas eu não colocarei nenhum título ao lado desse. E é melhor ser lixeiro católico, a ser a rainha da Inglaterra e protestante. É melhor ser mendigo escrupuloso, com a mão direita deformada, todo deformado, mas católico, a ser o homem mais rico do mundo, mas não pertencer à religião católica.

Quer dizer, o nosso grande título, a grande razão de nossa ufania é ser um filho da Santa Igreja Católica Apostólica Romana.

E aí nós vemos a segurança, a paz, a tranqüilidade feita de fé de Santa Germana, diante de uma situação que dava para ela se humilhar e acabrunhar.

Eu creio que uma outra santa que nos deu uma grande prova disso, um grande exemplo disso foi Santa Joana de Valois. Também desprezada pelo marido, desprezada pelo pai, desprezada por todo mundo, por fim repudiada pelo marido. Mas ela conduziu a vida com dignidade, com serenidade. Fundou uma Ordem Religiosa, governou o feudo que ela recebeu depois de sua separação, e governou muito bem, morreu e recebeu a honra dos altares.

Quer dizer, o que ela tinha? Ela tinha isso: ela era católica. Então, com tudo quanto pudessem dizer dela, sendo católica bastava. Para sua segurança, seu cartão de visita estava pronto: católica, apostólica, romana.

É um título lindíssimo, e essa ufania de ser católico, é a raiz daquilo que Camões chamava “os cristãos atrevimentos”. É quando a gente tem essa ufania de ser católico que a gente se atreve, que a gente se lança, que a gente agride. Por quê? Não porque a gente seja mais na ordem humana das coisas; até talvez seja menos do que alguns. Mas não importa, não tem importância. O que tem importância é que eu sou católico, eu recebi o sinal do batismo na fronte. Eu sou menos … [inaudível]. Eu sou filho da Santa Igreja Católica, Apostólica, Romana, não é preciso mais nada. O resto é … [inaudível]… é acessório, é secundário.

Quer dizer, eu acho essa impostação fundamental e eu não perco ocasião de reafirmar esse assunto, de insistir nesse assunto. Isso se faz para nós necessário.

* A pastora feia, trôpega e deformada, mas que tem contato direto com o Céu

Agora os senhores vão ver os esplendores que Deus fazia para recompensar essa serva que tanto se ufanava da sua dignidade de filha de Deus.

Germana era pastora.

Os senhores sabem que pastor é um ofício muito poético. Mas na Europa … [inaudível]… não há ofício mais baixo do que de pastor. Realmente, tomar conta de bicho… Depois não tem nada de técnico, nada de veterinário, nada disso. É apenas uma espécie de guarda-civil de burro, de vaca, de carneiro, de cabra. Realmente é de lo ultimo. Então, ela era pastora, cabendo-lhe zelar pelos rebanhos de carneiros de sua família. Ela era perseguida pela família, mas zelando com verdadeiro desvelo pelos carneiros.

Conta-se que para ir à igreja deixava-os aos cuidados da Providência. Nunca nenhum animal extraviou-se ou ultrapassou os limites que ela estabelecia, marcando o chão com seu cajado; nunca foram atacados também por lobos.

Os senhores estão vendo a cena linda: a pastora feia, trôpega e deformada, mas que tem contato direto com o Céu; à qual Deus fala, à qual Nossa Senhora fala, que ouve a voz de seu Anjo da Guarda, que, portanto, em certas ocasiões tem vontade de rezar, e que por uma inspiração interior — porque sem uma inspiração interior isso não se compreende — ela vai com o cajado e traça os limites exatos. E depois com certeza avisa: “Olhe, vocês não saiam daqui”.

Quando ela volta, está tudo lá. Mas há uma proibição para os lobos entrarem também. De maneira que também nenhum lobo entra. Os anjos ficam zelando pelo rebanho, enquanto ela vai rezar e ela vai agradar a Deus Nosso Senhor pelo encontro dessa oração.

A desprezada, a pisada, a humilhada, esta vai à Igreja e Deus opera um milagre, e opera freqüentemente este milagre, é hábito de Deus … [inaudível]… este milagre, para Deus, na sua felicidade celeste inacessível, se alegrar entretanto, com a … [inaudível]… dessa pastora humilhada e desprezada por todo mundo.

Os senhores estão vendo quanto vale uma pessoa desprezada por um título injusto, mas que sabe carregar bem o seu desprezo.

No campo, Germana estava sempre em união com Deus. O terço era sua oração constante, assim como a saudação angélica. Grande era sua devoção à Santíssima Virgem, a qual pedia coragem para levar avante sua vida tão difícil.

Realmente é muito difícil levar avante uma vida assim. Porque é muito bonito pensar: “Ah, que beleza os carneirinhos, estou rezando as Ave-Marias, depois eu vou para o meu pobre catre”. Tudo isto é muito bonito, mas na hora de deitar no catre, na hora do frio, na hora de comer comida ruim, na hora de agüentar a cara da megera, na hora da megera contar para o pai que tinha perdido uma ovelha que não perdeu, e o pai dar uma punição injusta, receber tudo isso bem e ainda agradar os filhinhos da megera, isso não é fácil.

Isso é muito poético, mas não é absolutamente fácil. É preciso ter força para isso. E ela sabia onde ela ia procurar essa força. Ela ia procurar na oração, ela ia procurar aos pés de Nossa Senhora. Porque exatamente na oração está a fonte de toda a força.

* Na realidade, aqueles que mais entendem de fazer esmolas, em geral são os pobres

Ensinava o catecismo às crianças da vizinhança e era a protetora dos pobres, para quem levava os restos de sua casa.

Na realidade, aqueles que mais entendem de fazer esmola, em geral são os pobres. As pessoas muito ricas dificilmente são esmoleres. São as pessoas de fortuna média ou os pobres, que fazem esmola.

Eu conheço o caso curioso de uma senhora daqui de São Paulo que é riquíssima. Ela tinha uma casa na Rua Brigadeiro Luís Antônio, que ocupava, se não me engano, metade do quarteirão onde ela morava. Se não era o quarteirão inteiro. Os senhores podem imaginar um quarteirão na Av. Brigadeiro Luís Antônio, próximo à Av. Paulista, em qualquer tempo o que representa. Mas isso era a casa onde ela morava, e que não vendia. Ela tinha rendas para morar nessa casa. E ela tinha o ramo pobre da família dela, com o qual ela se dava muito.

Um belo dia, dois genros, … [inaudível]… péssimos meteram o pau em toda a fortuna dela e ela caiu numa pobreza igual ou maior da dos seus parentes pobres. Então ela teve esse comentário interessante, ela disse: “Engraçado, eu não pensei que pobre fosse mudar tanto. Se eu soubesse que vocês estão passando as privações que hoje passo eu, quando tinha dinheiro teria ajudado vocês”. Isso diz muita coisa.

Essa aí era pobre, mas encontrava jeito de ajudar os pobres. Então levava víveres, levava restos da casa para ajudar os pobres. Ela ajudava as crianças, ela ajudava os pobres.

* O milagre de Santa Isabel de Portugal reproduzido em Santa Germana

Com essa pobre pastora reproduziu-se um dia o mesmo milagre de Santa Isabel de Portugal. Sua madrasta perseguiu-a, julgando que houvesse furtado alimentos da despensa.

Podem imaginar que vida! Uma pessoa honestíssima e a megera:

Você roubou a rosca?

Não, não roubei.

Roubou! Onde é que está?

Ao abrir seu avental, ao invés de pão, como previa, só encontrou flores estranhas, nunca vistas e de inigualável perfume.

Os senhores conhecem o famoso milagre de Santa Isabel. Exatamente o marido dela aproximou-se e perguntou: “O que você leva aí?”. Ela disse que eram flores. Abriu o avental e os pães estavam transformados em rosas. Ela não podia contar ao marido que estava ajudando os pobres.

Aqui se deu a mesma coisa para proteger contra a cólera da megera. [Inaudível]… de uma grandeza! Ela fica alta como uma estrela, toca com a mão nas estrelas, e a megera fica do tamanho de uma formiga. Uma formiguinha enfezada e feia.

* Graças a pedir a Santa Germana: segurança, amor à Igreja, combatividade

Uma manhã Santa Germana não saiu, como de costume, para guardar seu rebanho. O pai foi encontrá-la morta sobre seu pobre leito. Era o ano de 1601, quando ela completava 22 anos.

Agora vem a glorificação.

O povo acorreu em massa ao seu enterro, pois histórias sem contas corriam a seu respeito.

Dentro de casa, dormia num catre… e a cólera da megera e o desprezo do pai não viram nada. Gloriosa em toda a região e pisada dentro de casa. Assim são certos filhos das trevas particularmente empedernidos.

Quarenta e quatro anos após sua morte seu corpo foi encontrado intacto, sendo reconhecido pela mão deformada.

Isso é muito bonito. Encontrar o corpo intacto é uma das coisas que favorece o processo de canonização. E o corpo dela foi encontrado intacto, e o caminho, portanto, para a glória dos altares foi aberto para ela através da mão deformada. A gente vê que a mão deformada que a levaria à glória é um símbolo da aceitação da deformação da mão. É uma coisa muito bonita que está expressa dentro desse fato.

Canonizada em 1867, em 1901 iniciou-se em Vidrac a construção de uma grande basílica em sua honra.

Nós queríamos saber o que aconteceu com a megera, o que aconteceu com o megero. Mas isso aí é uma outra história.

Que Santa Germana nos dê a graça dessa enorme segurança. Que nosso verdadeiro e único título de glória é sermos filhos da Santa Igreja Católica Apostólica Romana. Que ela nos alcance esse amor à Igreja pelo qual nós queremos ser da Igreja e não fazemos questão de mais nada nesta vida a não ser pertencer à Santa Igreja Católica. Que ela nos alcance a combatividade que ela certamente teve.

Ela tão humilde, tão modesta, tão apagada, parece o contrário da combatividade. Mas sempre que alguém tem uma virtude extrema, tem também no outro extremo a virtude oposta. Só as pessoas assim são as pessoas verdadeiramente combativas. Como só são pessoas verdadeiramente combativas aquelas que na hora da compaixão sabem também ser assim.

Então vamos pedir a ela que, por um ato de fé em que ela teve as virtudes que estão no extremo oposto daquilo que ela praticou, ela nos dê a virtude necessária para nosso estado, como ela teve as virtudes necessárias para o estado dela.

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