Santo do Dia (Auditório da Santa Sabedoria) – 8/12/1966 – 5ª feira [SD 227] – p. 4 de 4

Santo do Dia (Auditório da Santa Sabedoria) — 8/12/1966 — 5ª feira [SD 227]

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A Imaculada Conceição, modelo de combatividade e intransigência * Quando se forma uma idéia altíssima de algo sublime, cria-se uma condenação severíssima do oposto: é a intransigência * A visão do mal, por causa da estrutura do espírito humano, reforça o amor ao bem * A combatividade é conseqüência da intransigência: quer o extermínio completo do mal, não quer senão esse ideal * O que importa eliminar sobretudo é o mal, a má lei, e não tanto o homem * A Imaculada Conceição tem altíssima noção da glória de Deus e quer essa glória, com combatividade acendrada * Pedir a Nossa Senhora um lampejo dessa combatividade nas formas definidas e precisas que nos competem

* A Imaculada Conceição, modelo de combatividade e intransigência

Como a nossa capela está em reforma, nós não podemos dar à nossa cerimônia o caráter de costume, e vamos fazer o Santo do Dia aqui mesmo.

Fazer mais um comentário a respeito de Nossa Senhora da Conceição.

O comentário que se poderia fazer aqui é a respeito de Nossa Senhora da Conceição vista enquanto modelo de insuperável combatividade e de intransigência.

Como é que nós poderemos ver isso bem? No que é que consiste a combatividade, no que é que consiste a intransigência e porque é que nós podemos dizer que Nossa Senhora é, enquanto concebida sem pecado original, o modelo de combatividade e de intransigência?

Nessas duas virtudes, da intransigência, da combatividade, a primeira logicamente falando é a intransigência.

* Quando se forma uma idéia altíssima de algo sublime, cria-se uma condenação severíssima do oposto: é a intransigência

A intransigência consiste no seguinte:

Quando a gente tem bem claro no espírito o que é que é o bem e como é que a coisa deve ser para ser boa, quando a gente tem [isto] levado até o ponto de sublimidade, e compreendendo a mais alta expressão do bem a respeito dessa coisa como deve ser… Vamos dizer, por exemplo, um bom sacerdote, a pessoa compreender bem o que é o sacerdote, compreender em toda a sua sublimidade o sacerdote o que é, compreender então a virtude sacerdotal em toda a sua sublimidade o que ela é, formar uma idéia da virtude sacerdotal, não uma dessas ideias assim pequenininhas, uma impressão colhida aqui, lá ou acolá, mas que é uma idéia que corresponde à alta realidade contida no sacerdócio, então quando a pessoa tem essa alta idéia, ela se torna verdadeiramente intransigente. Porque como ela compreendeu e amou um ideal altíssimo, ela, necessariamente, lança uma condenação severíssima sobre aquilo que dispôs esse ideal. Porque ela compreendeu até o fim, porque ela amou até o fim, ela pode perceber, ela pode sondar toda a malícia que há no contrário. Por causa disso, rejeitar o contrário, completamente, intransigentemente, quer dizer, não tolerando.

Isto é que é verdadeiramente a intransigência, que vem exatamente desta alta concepção da coisa verdadeira e boa, dessa alta aceitação da coisa verdadeira e boa, que gera, então, a rejeição daquilo que é ruim.

E esse é um dos seus aspectos mais miúdos do que seus aspectos menores.

* A visão do mal, por causa da estrutura do espírito humano, reforça o amor ao bem

Bem, formada a intransigência, pode-se dizer que de algum modo a visão do mal, por causa da estrutura do espírito humano, a visão e consideração do mal até reforça o amor ao bem. Porque com o contraste do mal a pessoa percebe melhor quanto o bem é bom. E por causa desse modo no contraste do mal encontra um meio de amar ainda mais o bem.

O ultramontano compreendendo bem toda a sublimidade da causa ultramontana, mas então nos seus mais altos aspectos, nas suas mais altas e imponderáveis razões, pode também perceber bem toda a dignidade, toda a excelência que há numa vocação ultramontana. E percebendo isso, ele compreende bem o que é que um membro do grupo deve ser.

Por causa disso, ele forma de nossa vocação uma idéia altíssima, uma idéia que ele ama muito, e ele se torna intransigente para com todas as fraquezas na vocação, para com todas as deficiências na vocação, para com todos aqueles que de fora procuram atrapalhar a vocação.

Quer dizer, dessa alta idéia vem então uma recusa. Mas na consideração do mal ainda vem um reforço dessa alta idéia como ela deve ser.

* A combatividade é conseqüência da intransigência: quer o extermínio completo do mal, não quer senão esse ideal

Agora, o que é que é combatividade?

A combatividade é uma conseqüência da intransigência. Quem é inteiramente intransigente, deve querer o extermínio completo do mal que ele tem em vista. Se não ele não seria intransigente. E o extermínio ele deve querê-lo numa hora de exaltação e ele deve querê-lo numa hora de depressão também. Não existe para ele outra coisa senão o desejo de fazer aquele extermínio. Aquele extermínio deve encher a sua vida como um verdadeiro ideal. E ele não deve sossegar enquanto ele não tiver liquidado aquilo que de fato ele queria liquidar.

Aí vem aquela combatividade, quer dizer, aquele desejo de eliminar, e de eliminar de fato, de eliminar sem deixar vestígios, sem deixar raízes, de maneira que nunca possa renascer aquele mal. Eliminar de maneira a envergonhar o mal derrotado e fazer com que, [por meio] isto, os outros tenham horror dele e por causa disso não queiram praticar o mesmo mal, mas pelo contrário ainda amem mais o bem.

É propriamente esta posição que é a combatividade. E esta posição é uma filha da intransigência.

Por exemplo, no Direito português antigo havia uma coisa, dois modos de indicar essa execração do mal muito sintomáticos. Por exemplo, com o nosso Tiradentes fizeram isto assim, não é? O homem foi enforcado, depois foi esquartejado e postas da carne dele colocadas ao longo das estradas explicando que era para solene escarmento dos povos. Para os povos compreenderam solenemente quanto mal ele tinha feito. Quer dizer, é levar a combatividade ao último ponto.

Outra força era a expressão portuguesa “reduzir a pó e a fogo”. Não é? Se o sujeito, enfim, queria liquidar o sujeito por uma condenação por um crime horroroso, matavam, e até matavam aos poucos, pauladas nas juntas, tormento da roda, etc. Por fim matavam, depois de terem morto, queimavam, pegavam as cinzas e jogavam no mar. Quer dizer, não tem nada mais que ficar.

Essa é a combatividade verdadeira que não quer que fique nem as cinzas e que fique apenas uma recordação de horror daquilo que foi feito.

* O que importa eliminar sobretudo é o mal, a má lei, e não tanto o homem

Agora, como é que isto se relaciona, esta combatividade assim, que às vezes pode ser fria, mas que é tremenda, é inexorável, não pára nunca, só sossega com a eliminação, essa… eu não digo aqui, eu não estou me referindo diretamente à eliminação da pessoa, posso chegar até lá, mas não é o que eu tenho em vista. É a eliminação daquele mal, daquele mau costume, daquela má lei, daquela má idéia, daquela má doutrina. É preciso eliminar isso que é muito mais difícil do que matar um homem.

Matar um homem na hora de uma cólera, [qualquer] um pode matar. Está cheio de criminosos que matam homens por aí. Mas querer matar uma instituição, uma idéia, querer matar o mal, esse é que é o ponto característico da eliminação.

* A Imaculada Conceição tem altíssima noção da glória de Deus e quer essa glória, com combatividade acendrada

Está bem, então que relação tem isso com a Imaculada Conceição?

Nossa Senhora sendo concebida sem pecado original, Ela não tinha em si absolutamente nada que fosse ruim. E ela tinha todas as facilidades para dar à graça de Deus uma correspondência perfeita a todo o momento. De maneira que nEla a grandeza natural e a grandeza sobrenatural entravam em uma fusão, entravam numa harmonia profunda e estupenda. E deu como conseqüência que Ela tinha como ninguém uma altíssima noção da glória de Deus, da santidade de Deus, das exigências de que todas as coisas dessem glória a Deus, e por causa disso um altíssimo horror daquilo que o mal representava. Então uma combatividade acendrada, no sentido de execrar toda forma de mal.

E é por causa disso que a gente compreende como Nossa Senhora é comparada como um exército em ordem de batalha: Castrorum acies ordinata. Ou como d’Ela se diz que Ela sozinha esmagou todas as heresias em toda a terra.

Por que é isso? É exatamente porque Ela é o modelo de combatividade, que nós podemos sondar melhor através desse privilégio de sua Imaculada Conceição.

* Pedir a Nossa Senhora um lampejo dessa combatividade nas formas definidas e precisas que nos competem

Então o que é que nós devemos pedir a Nossa Senhora na noite de hoje?

Nós devemos pedir um altíssimo grau de amor que leva a gente a querer ser intransigente de um modo insondável, de um modo inconcebível.

Eu me lembro de Santa Terezinha do Menino Jesus na “História de Uma Alma” dizer o pesar que ela tinha de não poder ser um guerreiro que, nos confins da terra, estivesse manejando a lança contra os inimigos de Deus.

É assim que é a alma de um santo. Em todo o lugar quer verdadeiramente combater nas formas mais precisas e mais definidas do combate.

Então, isso nós devemos pedir hoje, esse lampejo de combatividade ligado à santidade. E que se liga àquela forma especial de pureza daqueles que verdadeiramente são filhos de Nossa Senhora, daqueles que verdadeiramente procuram ter o espírito de Nossa Senhora.

Isto dito, nós vamos passar às nossas orações, e eu pediria que o coro se reunisse num ponto adequado.

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