Santo
do Dia (Auditório da Santa Sabedoria) – 29/9/1966 –
5ª feira [SD 218] – p.
Santo do Dia (Auditório da Santa Sabedoria) — 29/9/1966 — 5ª feira [SD 218]
Nome
anterior do arquivo:
O patriciado e a nobreza que tinham perdido poder na Roma dos Césares, voltam com brilho na Roma Eterna, sobretudo no monaquismo * São Jerônimo, vingador da glória virginal de Maria * Como recompensa, Maria lhe encaminhava almas nobres da classe influente, com o que se conquistava toda a sociedade * O exemplo das modas, todas imorais, que nasce dos centros para a periferia mostra que essa influência ainda existe * O mesmo se dá no mundo intelectual: é dos centros universais científicos que a moda se espalha pelo mundo * É uma balela dizer que a moda vem de baixo para cima — É a grande lição de São Jerônimo
Eu lembro aos senhores que hoje é festa de São Miguel Arcanjo e que amanhã nós temos a festa de São Jerônimo, Confessor e Doutor da Igreja. Foi o doutor máximo das Escrituras e dele disse, ou melhor, ele disse de si mesmo que ele aplicou todo o seu zelo em fazer dos inimigos da Igreja seus inimigos pessoais. O Breviário diz dele: “Ele molestou os hereges com acérrimos escritos”. Sua relíquia se venera em nossa capela. Século V.
Nós estamos nas novenas de Nossa Senhora do Rosário e de Nossa Senhora Medianeira de Todas as Graças. E está marcado como direito aqui, que amanhã é o onomástico de Frei Jerônimo Van Hinten.
A respeito de São Jerônimo, D. Guéranger, no “L’Année Liturgique”, diz o seguinte:
Estranho fenômeno para o historiador sem fé: eis que, em torno deste dálmata, na hora onde a Roma dos Césares agoniza, se irradiam subitamente os mais belos nomes da Roma antiga. Crer-se-ia que eles estavam extintos desde o dia onde se tornou obscura entre as mãos dos parvenus da glória a cidade rainha. Nos tempos críticos, em que, purificada pelas flamas que os bárbaros incendiaram, a capital que eles deram ao mundo vai retomar seus destinos e reaparece, como por seu direito de nascimento, para fundar novamente a cidade eterna. A luta se tornou outra, mas seu lugar continua à testa do exército que salvará o mundo. Raros são entre nós os sábios, os poderosos, os nobres, dizia o apóstolo, quatro séculos antes. Numerosos eles são em nosso tempo, protesta Jerônimo, numerosos entre os monges.
* O patriciado e a nobreza que tinham perdido poder na Roma dos Césares, voltam com brilho na Roma Eterna, sobretudo no monaquismo
O pensamento está expresso com uma complexidade um pouco século XIX e, portanto, creio que não muito clara para a geração nova. Mas, com duas palavras, quer dizer o seguinte:
Roma estava decaindo. As antigas famílias às quais Roma devia a sua antiga glória política, essas famílias não estavam mais dirigindo Roma. Porque tinha havido um fenômeno de “marmiteirização” que era exatamente o pessoal adventício que tinha dominado Roma, deixando numa certa penumbra as famílias antigas. Mas essas famílias antigas que no começo do Cristianismo, no tempo em que elas dirigiam a sociedade civil, eram pouco numerosas entre os católicos, nessa época, que é a época de São Jerônimo, que é a época do fim do Império Romano, nessa época essas famílias eram muito numerosas entre os católicos.
Quer dizer, então, a nobreza e o patriciado romano tinham um papel de vanguarda na direção dessa segunda Roma, que não era mais a Roma dos Césares, que estava morrendo, mas era a Roma dos Papas que estava nascendo. E eles estavam na liderança da vida religiosa e da expansão católica no mundo.
Este é o pensamento de São Jerônimo, de D. Guéranger.
A falange aristocrática constituiu o melhor do exército monástico.
Quer dizer, o melhor das vocações para monges era de nobres.
Nesses tempos de sua origem no Ocidente,…
Em que o monaquismo, que já existia no Oriente, começou a nascer no Ocidente.
… ela lhe deixará para sempre seu caráter de antiga grandeza.
Quer dizer, o caráter da antiga grandeza da nobreza comunicou algo para a dignidade do monaquismo.
Mas nas suas fileiras, a título igual de seus pais e de seus irmãos, se vêem a virgem e a viúva, ao mesmo tempo o esposo e a esposa. É Marcela, são pessoas da nobreza que conseguem ser dirigidas por São Jerônimo, que será para ela o auxílio na tradução das Escrituras. E, como ela, Fabíola, Paula e outras que lembram os grandes ancestrais, os Camili, os Fabii, os Cipiões.
Camilos, Fábios e Cipiões eram grandes famílias nobres. E em linguagem mais simples também, ele acaba mencionando gente de grandes famílias nobres que estavam, como viúvas, ou como virgens, ou como esposo e esposa, sendo separado o casal para irem viver no estado monástico. Estavam, então, no estado monástico, e conferiam ao estado monástico algo de sua antiga grandeza.
* São Jerônimo, vingador da glória virginal de Maria
Ao mesmo tempo há essas palavras de São Jerônimo como vingador de Maria. Diz o seguinte:
Nesta altura, a refutação de Elvidius, que ousava pôr em dúvida a perpétua virgindade da Mãe de Deus, revelou em Jerônimo o polemista incomparável, do qual Joviniano, Venâncio, Pelágio e outros ainda, teriam que experimentar o vigor.
Eram hereges que ele esbordoou vigorosamente.
* Como recompensa, Maria lhe encaminhava almas nobres da classe influente, com o que se conquistava toda a sociedade
Como recompensa, entretanto, de sua honra vingada, Maria conduzia a ele todas essas almas nobres. Ele dirigia essas almas no caminho da virtude e, pelo sal das Escrituras, ele as preservava da corrupção da qual morria o Império Romano.
Então, aqui se completa este pensamento bonito como tarefa de São Jerônimo.
Ele não era apenas o grande herói que lutava contra os hereges, mas ele fazia esta obra, que era de salvar da podridão o que Roma tinha de melhor; e tomar precisamente o que Roma tinha de melhor, que eram as antigas famílias aristocráticas, e conduzi-las para a conquista do mundo, para a Roma dos Papas, e não mais para a Roma dos Césares. Isto ele fazia por uma obra de assistência espiritual à alta aristocracia romana, que já não tinha poder político, mas ainda era fabulosamente rica naqueles tempos.
Qual é a consideração que isto nos traz ao espírito?
A consideração que nos traz é como São Jerônimo tinha em mente a importância das elites para a direção da sociedade. E como ele soube compreender que um movimento católico que vise levar o mundo inteiro para a Igreja, que vise a cristianização do mundo, deve contar com todas as classes sociais, levando cada classe social a dar o contributo que lhe é específico. Portanto, a classe aristocrática prestigiar a expansão apostólica com o valor do nome, com o valor da fortuna, mas sobretudo com o valor de um certo prestígio indefinido que se ligava merecidamente às grandes famílias da aristocracia romana.
Quer dizer, ele compreendeu que fazendo tocar, fazendo acionar as classes mais influentes, havia um meio para acionar toda a sociedade, e para obter a cooperação dela inteira para a luta para o Reino de Cristo.
* O exemplo das modas, todas imorais, que nasce dos centros para a periferia mostra que essa influência ainda existe
Os senhores me dirão: “Mas, Doutor Plinio, isto é um plano que valia, que tinha realidade, na época — aliás, feliz — em que se reconhecia a desigualdade das classes sociais, em que havia, portanto, uma aristocracia, havia uma classe de cavaleiros que era uma classe semi-aristocrática, havia uma burguesia e havia uma plebe propriamente dita. Mas isto não vale mais na nossa época, porque na nossa época a direção das sociedades não pertence mais aos aristocratas. D. Hélder Câmara diz que pertence aos operários. Portanto, nós podemos nos desinteressar do apostolado dos aristocratas, nós podemos mesmo cantar les aristocrates à la lanterne, on les prendra, porque eles não têm mais importância nenhuma e acabou-se”.
E a resposta é muito simples.
Para dar apenas um fato numa exposição que eu quero que seja rápida, os senhores vejam que importância tem, numa impulsão geral do movimento revolucionário, a degradação das modas. É evidente que cada moda nova que vem, a moda da mini-saia, por exemplo, a moda do biquini, monoquini e outros horrores desse gênero, que cada moda dessas representa todo um esboroar da resistência à Revolução, todo um desatar de dinamismo rumo à Revolução.
Ora, como é que as modas entram? Aqui em São Paulo, em concreto, como é que uma moda chega? Uma moda chega assim ou assim? Começa uma moda a nascer de um modo X num bairro periférico de São Paulo, depois vai conquistando todo o centro da cidade e acaba entrando na alta sociedade? Ou é o contrário, a moda vem de Paris, a alta sociedade adota, as costureiras de grande luxo impõem, depois isso se propaga de proche en proche e chega, afinal de contas, às camadas mais modestas? É evidente que o segundo sistema é que se dá.
Nós podemos ver uma mocinha morando, não sei, vamos dizer, no bairro de Vila Anastácio, por exemplo — eu não sei bem onde é que fica —, ou no bairro da Coroa, ou do Limão, não sei, ou em Vila Maria, não sei. Nós podemos ver uma mocinha dizer o seguinte:
— Ih, eu estive passeando na Rua Itapetininga, ou na Rua Augusta, e vi que agora estão usando tal moda assim. Vamos usar também.
Outra diz:
— Ah, é assim? Vamos usar.
Nós não vamos, na Rua Augusta, ouvir dizer:
— Olha, sabe de uma coisa? Na Vila Maria, na Coroa, em Vila Anastácio, as mocinhas estão usando assim.
E a outra diz:
— Ah, vamos imitar!
É evidente.
* O mesmo se dá no mundo intelectual: é dos centros universais científicos que a moda se espalha pelo mundo
Isto para não considerar senão um ponto, para não considerar senão uma coisa.
Por exemplo, para considerar o aspecto intelectual. Como é que se irradia a moda? A moda intelectual. Porque eu me lembro uma conversa que eu tive uma vez com o Prof. Furquim e nós tratamos deste ponto, que há modas, nas várias ciências e disciplinas, como há modas para vestidos. Quer dizer, assuntos que caem da moda e está acabado, e outros que entram em moda. Como é que entra esta moda?
É assim: um professor primário genial da Vila Anastácio lança uma moda, isto conquista universidades, de proche en proche, através da Católica chega até a oficial, e depois repercute em Paris e Washington, e então a partir de Vila Anastácio se governa o mundo?
Ou é o contrário que se dá: há um impulso de moda que vem de alguns centros científicos universais, bate aqui na nossa faculdade, lá ela desperta o esnobismo intelectual dos professores de lá — dos quais não se excetua mais nenhum do esnobismo desde que o Prof. Furquim pediu aposentadoria —, desperta o esnobismo daquela gente, e de proche en proche, daqui a dois ou três anos, um professor primário de Vila Anastácio lança para os alunos uma palavra de ordem que partiu dos grandes centros europeus? Quem é que não vê que é assim?
* É uma balela dizer que a moda vem de baixo para cima — É a grande lição de São Jerônimo
Quer dizer, se há uma coisa que é uma balela, é dizer que a moda vem de baixo para cima. Ora, assim como a moda, as outras coisas não vêm. Não é verdade. Pode D. Hélder Câmara desiludir-se, não é verdade. Ele é a prova disto.
Nenhum vigário faria o tumulto que ele está fazendo como arcebispo. E é por quê? Porque as coisas vêm de cima para baixo e não de baixo para cima. E é por isto que toda a seqüela dele que afirma que as coisas vêm de baixo para cima ficou radiante quando conseguiram empoleirá-lo lá em cima, para ele fazer descer as coisas de cima para baixo. Porque sentiram que agiria com outra emprise e outra severidade.
Aqui está uma grande lição da vida de São Jerônimo e um título especial para nos recomendarmos a ele. Ele nos dar a lucidez suficiente para ter isto sempre em mente e as graças necessárias para fazermos apostolado desta importante verdade.
Hoje nós temos um aniversariante aqui: é o Dr. Luiz Duncan. De maneira que vamos rezar por ele.
*_*_*_*_*