Santo do Dia – 16/9/1966 – p. 9 de 9

Santo do Dia — 16/9/1966 — 6ª-feira

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Santa Hildegarda, de nobre família, teve visões e revelações que repercutiram em Roma; valor de visões e revelações privadas; o Papa as lê com agrado, mas não dá uma aprovação oficial; São Bernardo escreve a Santa Hildegarda; origem da expressão “Nossa Senhora o ajude”; profecias até o anti-Cristo; ataca a Revolução nascente; a falta do temor de Deus dá em revolta.

* Papel de visões e revelações * Quando dar assentimento a uma visão ou revelação * A notícia das revelações chega ao Papa. Descrição da cena * São Bernardo toma a palavra. Vigilância de um santo * Como nasceu a expressão “Nossa Senhora o ajude” * Santa Hildegarda glorificada pelo Papa. Pedem uma aprovação oficial * Profecias até o fim do mundo * Sentido da palavra “prelado” * Alerta com relação à Revolução * A falta do temor de Deus leva à revolta * Clero e nobreza: espírito elevado * Dai aos súditos disciplina * O verdadeiro católico e filosofia da História * Comprar na Europa as obras de Santa Hildegarda

Santa Hildegarda

Então, temos hoje… [falta palavra] …fazer o comentário do santo do dia de hoje. Hoje, 16 de setembro festa de São Cornélio Papa, São Cipriano, bispo de Cartago; no dia 17 de setembro — portanto, amanhã — temos Santa Hildegarda, Virgem.

Dela diz o Pe. Rohrbacher:

Nasceu no condado de Spanheim-Bingen, diocese de Maicus, no ano de 1098, de pais nobres e virtuosos.

Com idade de oito anos, foi levada ao mosteiro de Disibodenberg ou do Monte de Santo Disilod e colocada sob a direção da Bem-aventurada Jutta [Judith] Hurclitt, irmã do Conde de Spanheim-Bingen.

Dos oito anos aos quinze, viu sobrenaturalmente muitas coisas, das quais falava com simplicidade com suas companheiras, que ficavam maravilhadas, assim como todos que disso tiveram conhecimento.

Indagavam qual poderia ser a origem das visões. A própria Hildegarda observou, surpresa, enquanto via interiormente na sua alma ao mesmo tempo enxergava as coisas exteriores com os olhos do corpo, como de costume. O que jamais ouvira dizer houvesse acontecido a qualquer outra pessoa.

Desde então, presa de temor, não ousou mais entreter-se com pessoa alguma sobre sua luz interior. Contudo acontecia nas suas conversas dirigir-se a coisas ainda por suceder, e que pareciam estranhar aos ouvintes.

Esse estado de intuição sobrenatural, perdurou durante toda a vida. Tinha quarenta anos quando ouviu uma voz do Céu, ordenar-lhe que escrevesse tudo quanto visse. Resistiu durante muito tempo, não por obstinação, mas por humildade e desconfiança.

Aos quarenta e dois anos e sete meses, viu o Céu abrir-se e uma chama muito luminosa penetrou-lhe na cabeça, no coração, em todo seu peito sem queimá-la, mas aquecendo-a suavemente. No mesmo momento, recebeu [a] inteligência dos Salmos, dos Evangelhos e dos outros livros do Antigo e do Novo Testamento, de maneira a poder explicar-lhes o sentido, embora não conseguisse explicar gramaticalmente as palavras, pois não conhecia latim nem a gramática.

Como perseverasse e recusasse a escrever mais por temor, do que por obediência, caiu doente. Enfim, confiou sua preocupação a um religioso, seu diretor, e por intermédio dele, enviou-a à Congregação.

Depois de aconselhar-se com os membros mais sábios da comunidade, e ao interrogar Hildelgarda, o Prior ordenou-lhe que escrevesse, o que ela fez pela primeira vez. Imediatamente se viu curada e levantou-se da cama. Essa cura pareceu tão milagrosa ao Prior que não quis confiar apenas no seu critério. Foi a Mansarda contar o que sabia ao Arcebispo e às mais altas figuras do clero, e mostrou-lhes os escritos de Hildegarda. Isso deu motivo a que o arcebispo consultasse o próprio Papa.

Desejando Eugênio III ficar a par daquele prodígio, enviou ao mosteiro de Hildegarda, Alberon, Bispo de Verdum. Hildegarda respondeu com muita singeleza as perguntas que lhe foram feitas.

Tendo o Bispo apresentado seu relatório, o Papa mandou que lhe trouxesse os escritos de Hildegarda e, tomando-os nas mãos, leu-os em voz alta na presença do Arcebispo, dos Cardeais e de todo o clero. Também contou tudo quanto fora relatado pelos emissários por ele enviados, e todos os assistentes renderam graças a Deus.

São Bernardo estava presente, e também deu testemunho do que sabia, sobre a santa mulher, que ele visitara quando estivera em Grantfort e escreveu [-lhe carta] em que [a] felicitara pela graça por ela recebida, exortando-a a permanecer fiel à mesma. Pediu, pois, ao Papa, no que foi secundado por todos os presentes, que divulgasse tão grande graça concedida por Deus à Igreja, no seu pontificado, e a confirmasse com sua autoridade.

O Papa seguiu o conselho, escreveu a Hildegarda, recomendando-lhe que conservasse pela humildade a graça por ela recebida, e relatasse com freqüência tudo que lhe fosse revelado por intermédio do Espírito.

A santa relatou ao Papa Eugênio, em carta bastante longa, tudo quanto ouvira da voz celeste relativamente ao Pontífice. Anunciava uma época difícil, cujos primeiros sinais já se manifestavam. Os vales queixam-se das montanhas e as montanhas também sobre os vales, isto porque os súditos não mais sentem temor de Deus. Estão como que impacientes para subir aos cumes das montanhas, para acusar os prelados, em vez de acusar os próprios pecados. Dizem: “Sou mais adequado do que eles para superior.” Denigrem tudo que os superiores fazem, por inveja e por ódio à superioridade. Assemelham-se ao insensato que em vez de limpar suas roupas sujas, nada mais faz a não ser observar de que cor é a roupa do próximo.

As próprias montanhas — que são os prelados — em lugar de se elevaram continuamente nas cogitações íntimas com Deus, a fim de cada vez mais se transformarem na luz do mundo, descuidam-se e obscurecem-se; daí a sombra e a perturbação que reina nas ordens inferiores.

E porque vós, grande pastor e vigário de Cristo, depois de baixar luz para as montanhas, e conter os vales, dai preceitos aos senhores, e disciplina aos súditos.

O Soberano Juiz recomenda-vos: [que] condenais e repilais de junto de vós os tiranos importunos e ímpios, no temor de que para vossa grande confusão eles se imiscuam na vossa sociedade. Mas sede compassivo com as desgraças públicas e particulares, pois Deus não desdenha as chagas e as dores daqueles que O temem.

A santa abadessa fazia predições e dava conselhos semelhantes aos bispos e aos barões que, de toda parte lhe escreviam e a consultavam. Entre as mulheres, o mesmo que São Bernardo foi entre os homens.

Teve inúmeras revelações sobre as obras de Deus, desde a criação do mundo até a derrota do Anticristo.

Morreu no dia 17 de setembro de 1199, na noite de domingo para segunda-feira, com a idade de oitenta anos. A Igreja festeja a santa no dia de sua morte.

É uma biografia admirável, riquíssima em fatos, e que daria mais para uma conferência do que para um Santo do Dia. De maneira tal que não é possível expandir numa exposição rápida todos os dados que essa biografia contém.

* Papel de visões e revelações

Mas há uma noção — antes de entrar nos pormenores — há uma noção de conjunto que nós devemos considerar aqui, e que é o papel do profetismo dentro da Santa Igreja, o papel das visões e revelações dentro da Santa Igreja.

Nós estaremos numa época em que a Revolução estava começando. Os senhores ouviram aí expressões muito eloqüentes a esse respeito, mas, como a Revolução apenas estava nos seus albores, ainda havia muita fé. E os estilos todos eram impregnados pela fé que ainda existia.

O resultado é que os senhores têm uma santa religiosa. Essa religiosa começa a ter visões, essas visões são visões extraordinárias. Os senhores viram que as visões que ela tinha, conversando, falando, como se um dos senhores aqui conversando comigo, sem cessar de me ver e sem cessar de ver a sala em que estão, vissem também Nosso Senhor aparecendo, Nossa Senhora, fatos passados e fatos futuros se sucedendo etc. Essa santa tem visões e revelações e tem fenômenos extraordinários de vida mística.

Entra nela uma chama que a aquece e, milagre extraordinário: essa chama produz nela um efeito de alma. Sem ela entender o latim, ela vem lendo palavra por palavra, explicando o sentido das palavras, o que é ser gloriosamente analfabeto — porque naquele tempo realmente só se sabia o latim, e a língua corrente quase não era escrita, e quem não sabia o latim era tido como analfabeto. Ela não sabia o latim, mas tomava uma palavra, vamos dizer, por exemplo: “Hoc est corpus meus”. E ela, sem saber o que querem dizer essas palavras da Consagração, ela entretanto — estão no Evangelho as palavras — ela entretanto ia explicando e dando todas as interpretações do que estava lá dentro. Milagre frisante, verificado a qualquer hora e para confirmar bem a missão que ela tinha diante da Igreja de Deus. Então, além das visões, uma assistência contínua e clamorosa do Espírito Santo, um milagre inteiramente à mão.

Agora, espalha-se a notícia do milagre e as notícias chegam ao arcebispo. O arcebispo vai, procede a um inquérito. Como o inquérito parece dar conclusões interessantes, ele dá tanta importância às visões e revelações, que ele então quer que o Papa tome conhecimento.

* Quando dar assentimento a uma visão ou revelação

Os senhores estão vendo, portanto, um espírito diferente do de hoje. Hoje, quando se fala de visões, de revelações de santos: “Ah! ninguém é obrigado a crer nisso! A gente pode não crer nisto, e não ser nem um pouco herege; e por causa disso, não comete pecado nenhum, recusando a fé a isto.”[o verde é manuscrito] É bem verdade, do ponto de vista da ortodoxia, ninguém é obrigado a crer nessas visões; mas, ninguém pode ter os olhos fechados para a verdade conhecida como tal. E se uma determinada visão prova de si mesma que é verdadeira, essa visão a gente deve aceitar, não em virtude de um dever de ortodoxia, mas em virtude de um dever de probidade intelectual, de honestidade, isto a que todo mundo é obrigado.

E por isto, apuradas as provas, a coisa vai ao Papa, e o Papa então vai emitir o seu juízo sobre o caso. Quer dizer, o Papa não é dos que acham que a visão, e revelação, tudo isso é bobagem, só o que serve é a Sagrada Escritura. Ele compreende que Deus tem o direito de falar aos homens e de escolher os homens que queira para isto, e que se escolheu até uma freira, é muito possível que realmente a freira seja porta-voz de Deus.

Então, vamos examinar os fatos. Vamos examinar as provas, e se há provas, crê; se não há provas, duvida, ou se a coisa é provavelmente falsa, contesta; esta é a ordem da razão.

* A notícia das revelações chega ao Papa. Descrição da cena

Nós assistimos então a essa cena encantadora: uma notícia que chega e o Papa está reunido em conversa com seus cardeais e outras pessoas notáveis. Hoje é um tal corre-corre que o Papa não tem tempo de conversar; os cardeais também não têm, e essa idéia também nem se afigura aos nossos olhos.

Mas imaginem como seria lindo um São Pio X conversando numa sala, com um Cardeal Merry del Val, com um Cardeal Vivres e tudo, com vários outros cardeais, todos numa roda e conversando conversa séria, conversa nobre, conversa elevada, porque não tem rádio, não tem telégrafo, não tem telefone, as peregrinações para Roma são escassas, em relação ao que existe hoje. Enquanto as notícias vão e vêm, o Papa descansa e trata das coisas da Igreja, numa dessas conversar espirituais e superiores que valem por uma verdadeira oração.

Chega ali a notícia, o próprio Papa toma o trabalho de ler o relato para os cardeais e para os personagens presentes, e a gente não pode deixar… — tendo conhecimento do que foi o papel do grande São Bernardo no tempo dele, o herói da ortodoxia, o perseguidor, o implacável do emoliente e degradado Abelardo e de sua censurável Eloísa — quando a gente toma em consideração que ele foi o pregador das Cruzadas, quem deu os estatutos para a Ordem do Templo e foi o grande doutor de Nossa Senhora e o grande cantor de Nossa Senhora em sua época, nós rezamos todo dia orações compostas por ele: a Salve Regina, o Lembrai-vos, etc. Nós não podemos deixar de sentir um arrepio, vendo na narração que de repente se levanta, naquele círculo magnífico, de um Papa sentado no seu trono e com cardeais sentados em poltronas, isto em círculo, porque era assim que os reis conversavam naquele tempo. Eles conversavam sentados em tronos com degraus e, com dossel, e às vezes de coroa na cabeça. Bem, era a época em que as coisas eram as coisas mesmo, não era essa democracia desengomada e rasgada, e mal remendada, que nós temos hoje.

* São Bernardo toma a palavra. Vigilância de um santo

Bem, então de repente a gente vê que se ergue a voz máscula, sonora, de grande orador sacro, com flexões de devoção marial em tudo o que diz, e este santo faz elogio de uma outra santa. São Bernardo faz elogio desta Santa Hildegarda. Ele a conheceu, ele, com a experiência que tem das vias espirituais, ele sabe dizer que aquela é uma freira verdadeiramente virtuosa, mas…e aqui está São Bernardo inteiro. Porque ele achava que ela era virtuosa, escreveu uma carta a ela incitando-a à perseverança. É o antiliberalismo em pessoa, porque hoje a gente diz: “Não, carta eu vou escrever àquele que é ruim, porque vem assim; então eu mando uma carta a ele para ver se ele toma juízo, mas para quem já está andando bem, para que? Provavelmente vai dar certo pois ele já é bom.” Não é o critério de São Bernardo. Todo homem é falível, todo homem é fraco; enquanto o homem não morre ele tem o perigo de perder sua própria alma. E quando a gente vê uma pessoa que vai mal, escrever a ela para andar bem, para mudar de caminho e andar bem. Quando a gente vê uma pessoa que vai bem, até uma pessoa que vai otimamente, a gente primeiro se admira e dá graças a Nossa Senhora e em segundo lugar vem esta expressão tão corrente entre nós: “Nossa Senhora ajude!”

* Como nasceu a expressão “Nossa Senhora o ajude”

Essa expressão nasceu então; mas, de um pensamento assim, nasceu quando um de nós se aproximou da Rua Martim Francisco e que eu tomei contato com uma geração nova, tão predileta, benemérita, mas tão surpreendente, desconcertante, para mim que nasci em 1908! Eu os via excelentes daquele jeito, mas, geração nova… E eu olhava para eles e dizia: “Contanto que isto dure!” E na hora de ir embora eu dizia instintivamente: “Que Nossa Senhora te ajude!”

A idéia era: “Olhe bem: que Nossa Senhora dê a mão aqui, porque isto está muito bom, mas um ‘jeito’ de maneira que vamos acertar esta coisa.” Assim nasceu essa idéia.

Bem, São Bernardo não tinha diante de si a minha cara e capenga geração nova. Era a geração dos grandes tempos, dos cruzados, dos cavaleiros, dos guerreiros, dos doutores, dos “fassures” endemoniados que blasfemavam até o último momento, mas nisto mostravam que tinham uma responsabilidade mal exercida, mas que os levava até depois da sepultura.

Pois está bem, então diante desta freira, ultrageração antiga, personalidade profética, admirável, inundada de graça, fazendo milagres a todo momento, qual é a lembrança de São Bernardo? “Homem! está tão bom que é capaz de ir mal!” Cartinha: “Olhe, persevere direito!” Você vê, esse é o espírito católico; não é o espírito de confiança idiota — para não dizer “fassura” — na natureza de cada um, mas é desconfiança de todo homem, de mim e de cada um dos senhores que estão aqui, desconfiança contínua. Nossa Senhora não ajudando, as coisas não andam bem para mim nem para nenhum dos senhores.

É preciso pedir a Nossa Senhora forças a todo momento. Quando a gente está fraco, é porque está fraco; quanto está forte, para a força aumentar, porque se parar de aumentar, começa a cair! E portanto, é preciso um ato de generosidade contínua, constante, para estar insistindo nesse sentido.

* Santa Hildegarda glorificada pelo Papa. Pedem uma aprovação oficial

Então, Santa Hildegarda é glorificada pelo Papa e todos pedem ao Papa que publique um ato manifestando à Igreja de Deus essa grande maravilha que Deus lhe faz. O ato; não diz aqui, mas parece que não foi publicado, porque se tivesse sido publicado a biografia diria, não é possível um biografo como Dom Gueránger narra esse fato, narrar a vida de uma santa, sem dizer que a santa foi objeto de um citado elogio da parte da Santa Sé.

De maneira que, com a finura francesa — o Rohrbacher era alsaciano — com a finura francesa, ele deixou isso assim um pouco encoberto. Mas com hábito, na fresta dessas coisas eu não temo em meter a unha no pontal, e mostrar a coisa.

* Profecias até o fim do mundo

Bem, e depois então ele vem com referência à missão de Santa Hildegarda, o que é que essas profecias de Santa Hildegarda diziam. Ela profetizou muitas coisas, ela disse muitas coisas, ela descreveu a situação do tempo dela e fez profecias até o Anticristo. E isto tudo documentado com fartos milagres.

Por que a Providência quis que ela fizesse isso? A Providência quis porque, se tivessem tomado a sério isso aqui, esse texto que eu não conhecia — esse é um texto admirável — a Revolução podia não ter vindo. O profeta é aquele que adverte para evitar o castigo, para evitar o precipício, este é que é o profeta. Ele é profeta, [voz] da Providência vendo [que] se desviaria; e ao mesmo tempo tanto castigo se houver os desvios, se não forem evitados.

Então ela profetizou até o Anticristo. Quer dizer, com certeza toda a Revolução até o fim, e aqui vem então a explicação do igualitarismo, que nós consideramos uma das fontes da Revolução, junto com a sensualidade. O orgulho e a sensualidade são as fontes da Revolução “A”, tendenciosa, que gera, como os senhores sabem, os outros tipos de revolução. Na Revolução “A” tendenciosa, exatamente aquele orgulho, o erro que naturalmente produz é o igualitarismo.

* Sentido da palavra “prelado”

Os senhores vêem então a referência ao igualitarismo, mas há uma expressão aqui que nos pode induzir a engano, e a respeito da qual eu acho importante dizer uma palavra. Aqui fala de “prelado”; mas “prelado” na linguagem de hoje são os clérigos. Na linguagem da “Suma” e da Idade Média, e que se conservou até certo ponto na linguagem eclesiástica de certos moralistas até pouco antes do Concílio II Vaticano, “prelado” não era isso. Etimologicamente, o “prelado”, a palavra “prelado” quer dizer: aqueles que estão na frente, que foram selecionados, que são os principais. E São Tomás, em mais de uma ocasião fala expressamente em “prelados espirituais” e “prelados temporais”.

O “prelado espiritual” é o que nós sabemos, são os principais dentre o clero, e os “prelados temporais” são os principais dentre a sociedade civil. Portanto, os nobres, se quiserem ver as coisas assim; também alguns elementos da alta burguesia.

* Alerta com relação à Revolução

Então aqui fala da Revolução igualitária, ou do espírito igualitário, enquanto revoltado contra todas as desigualdades eclesiásticas e civis, principalmente como o problema é visto na “R-CR”. Quer dizer: a revolta protestante contra as desigualdades eclesiásticas e a Revolução Francesa contra as desigualdades civis. E aí os senhores vêm esse trecho verdadeiramente magnífico.

Eu corri muito, para comentar rapidamente esse trecho:

A santa anunciava uma época difícil, cujos primeiros sinais já se manifestavam…

Evidente que é a Revolução. Agora, as características:

O vales queixam-se das montanhas, as montanhas tombam sobre os vales.

É, portanto, uma crise completa. Porque se os vales estão em revolta, [e] as montanhas ruem. É um abalo universal. Precisamente como há o abalo universal na Revolução. Continua:

Porque…

Qual é a razão, portanto, desse abalo geral.

os súditos não sentem mais o temor de Deus, estão como que impacientes para subir aos cumes das montanhas, para acusarem os prelados, [ao] invés de acusarem os próprios pecados.

* A falta do temor de Deus leva à revolta

É a revolta dos que estão debaixo, eles não têm mais temor de Deus. E porque não têm mais temor de Deus, querem ser os maiores, não concordam de serem os que estão embaixo. Os senhores estão vendo a razão profundamente religiosa e moral da Revolução. É uma diminuição do temor de Deus, que produz o espírito de revolta igualitária.

Quer dizer, isso é “R-CR” a mais não poder ser de “R-CR”! Depois, continua:

Dizem: “Sou mais adequado do que eles para superior.”

Não é bem Revolução Francesa? O sufrágio universal, o povo que diz: “Nós mandamos melhor do que os nobres. Vamos organizar eleições, não são mais os nobres que governam, mas é todo mundo: o Zé Padeiro, o Zé Carniceiro, têm sua opinião a fazer para as eleições”.

Bem:

Denigrem…

Quer dizer, pintam de preto, falam mal, tudo quanto os superiores fazem. Porque os superiores andam mal? Em parte talvez, ela não diz, mas ela dava a razão principal:

por inveja.

E aqui vem o igualitarismo expressamente indicado por ódio à superioridade. Quer dizer: ódio à desigualdade enquanto desigualdade, é bem exatamente o igualitarismo. Não pode ser mais claro, não é?

Assemelha-se a um insensato que ao invés de limpar suas roupas sujas, nada faz [que] observar de que cor é a roupa do próximo.

Quer dizer, as pessoas do povo têm culpa, têm uma má vida. Em vez de corrigir sua má vida, começam a apontar a má vida dos que estão em cima. Depois ainda continua:

As próprias montanhas…

Isso é, os prelados, quer dizer, os nobres, os clérigos e burgueses, se quiserem.

em vez de levarem continuamente as comunicações íntimas com Deus, a fim de cada vez mais se transformarem na luz do mundo, descuidam-se e obscurecem-se.

* Clero e nobreza: espírito elevado

É o “ensabugamento” da nobreza e do clero. A nobreza e o clero devem ter um espírito elevado. O próprio do nobre é ser uma espécie de tocha de sublimidade em todos os ambientes onde ele está; elevar os costumes, elevar a arte, elevar o ambiente, com vistas a Deus, com uma finalidade fundamentalmente religiosa.

Agora vejam o “ensabugamento” como está expresso aqui, e que é que acontece com eles:

Descuidam-se de se elevar e se obscurecem.

O “sabugo” é bem isso. Descuida de elevar seu pensamento, ele gosta de conversar que descansa bem de “Caxambu” para cá, como é que é a estrada; ele discute o negócio qualquer do Pelé etc., etc., as coisas elevadas não. Conversinha “terra-terra”, “microlice”, “chacunnière”. E então começa o obscurecimento. A luz da graça vai se apagando naquela alma, não é isso? É isso, era o que acontecia com aquela gente.

Bem. Daí a sombra e a perturbação que reina das ordens superiores, a inveja dos inferiores e a própria maldade dos inferiores resulta do “ensabugamento” dos superiores. Isso é profundamente arquitetônico: os pastores espirituais se descuidam, a grei cai.

E porque vós, grande pastor e vigário, deveis buscar luz para as montanhas, e conter os vales…

Tarefa do Papa: chamar o clero, chamar a nobreza, reprimir, comunicar a luz e conter os vales. Em vez de fazer revolução social, em vez de estar falando a respeito da justiça social em termos imprudentes, conter a Revolução. Essa é que é a obra repressiva. E então:

dai preceitos aos senhores e disciplina aos súditos.

Bonito é isso, hein!? “Aos senhores, disciplina”.

aos senhores preceitos, aos súditos disciplina.

* Dai aos súditos disciplina

Isaías diz: “O pai que poupa a vara a seu filho, odeia seu filho.” Conter é isso: é meter medo, depois vem o carinho, depois vem o apoio. Greves, revoltas etc…primeiro fiquem quietos e acabem com a greve e se ponham em paz. Depois eu vou atender, vou ver o que é que há. Mas nessa atmosfera não! Assim não tem conversa, assim tem espada. Evidente! Bem.

O soberano Juiz recomenda-vos que condeneis e repilais de junto de vós, os tiranos importunos e ímpios, no temor de que para vossa grande confusão eles se imiscuem na vossa sociedade.

Quer dizer, os jovens maus e ímpios devem ser expulsos de junto do Papa.

Mas sede compassivo com as desgraças públicas e particulares, pois Deus não desdenha [as] chagas, e as dores daqueles que O temem.

* O verdadeiro católico e filosofia da História

Quer dizer, o Papa que tenha zelo pela Igreja, e pela sociedade civil, e não fique de braços cruzados. Bem, e aí fala das visões dela, a respeito do Anticristo. Porque [é] que Deus quis que ela desse essas visões? Porque o verdadeiro católico tem que ter uma filosofia da História. Ele deve saber que sua época é um elo entre o passado e o futuro, e interpretar os acontecimentos de sua época não como acontecendo só hoje, mas como nascidos de mil fatores do passado e gerando mil coisas no futuro.

É um processo, como diz a “R-CR”. Quer dizer, é uma coisa que gera outra, que gera outra, que gera outra, que gera outra. Então, para nós conhecermos este processo, veio esta revelação.

* Comprar na Europa as obras de Santa Hildegarda

Eu não sabia que essas revelações fossem tão completas a esse respeito, mas esse Santo do Dia produz um resultado útil, e o resultado é que eu vou mandar comprar na Europa as obras de Santa Hildegarda em algum lugar onde elas estejam esquecidas, empoeiradas, vetustas. E se eu as receber e as ler, eu vou fazer em Belo Horizonte uma conferência sobre ela.

Com isso, que Nossa Senhora os ajude a todos.

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