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Reunião — 13/1/1966 — 5ª feira
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A arte de conversar - II
Vamos retomar nossos assuntos de ontem. Íamos tratar da conversa, arte de conversar, etc., etc. Eu queria que me fizessem um favor, é o seguinte serem implacáveis nessa reunião agora, porque e uma coisa difícil de expor, de explicar e, sobretudo, difícil para a minha caríssima geração ultranova, em parte por culpa da minha geração, eu vou daqui a pouco dizer porque, e para perder tempo eu e vocês também aprendendo uma coisa que não esta clara é jogar tempo fora, não temos o direito de fazer isso e, portanto, eu vou expor e depois vocês vão fazer as perguntas, etc., etc., na linha do que eu vou dizer, está certo?
Vamos dizer o seguinte: vocês conhecem a doutrina de que a história da Cristandade que veio desde a Idade Media até a Revolução Francesa, e de algum modo até nossos dias, apresenta uma certa linha crescente de decadência, mas a par da linha de decadência apresenta uma certa linha em que continha a haver algum progresso, quer dizer, algumas virtualidades da Civilização Cristã, secundárias, etc, etc, ainda continuam a se desenvolver. Eu me lembro que eu empreguei numa ocasião para explicar esse fenômeno, para descrever esse fenômeno, que existe também nas coisas vivas que não são políticas ou sociais, a imagem característica do seguinte: sabem que em um defunto cresce barba. É uma coisa tremenda, mas é assim. Por exemplo, se um sujeito morre meio barbeado, uma barba incompleta, no dia seguinte na hora de enterrar pode ser que ele esteja indecente, de maneira que até se faz barba em defunto para enterrar em condições convenientes. Já morreu, mas apesar dele estar morto cresce algo nele. Quer dizer, um resto de vitalidade orgânica, que já não é vida, ainda existe nele e é até capaz de fazer crescer alguma coisa.
Nessa linha no século XVII e no século XVIII nasceu uma flor da Civilização Católica que morreu no século passado, e que deitou um pouco de barba ainda nesse século, mas já era o fim, e essa flor era propriamente o salão e a conversa. O salão era o seguinte, eram certas casas onde moravam pessoas que conversavam muito bem e que por causa do atrativo da conversa reuniam grupos de pessoas que iam lá para conversar, e era, portanto uma forma ancestral do club, ou então uma forma ancestral da Sede, a arte de conversar desenvolveu-se com tal brilho, ficou uma coisa tão magnífica, que passou a ser reputada a mais alta distração da vida, um prazer no mais alto do que dançar, passear à noite de barco em gôndola como em Versailles, com lanternas, do que fazer viagem, do que fazer guerra que eles reputavam, um prazer, e uma coisa do gênero, do que comer, do que ir ao teatro, do que tudo, era antes a arte de conversar que era reputado o maior prazer da vida. E esta arte, e vamos dizer, foi uma distração nova e um brilho novo do espírito humano que apareceram. Esta arte foi depois combatida pela revolução e feneceu. Ela tinha todas as regras de uma arte e todas as importâncias de uma arte, e da mias alta arte, porque é a arte do convívio humano, a arte de conversar passou a ser a arte do convívio humano. E esta arte por seu lado foi o principal modo de tocar a opinião pública. A Europa se encheu de salões, e cada salão, cada sujeito que freqüentava um salão, esquematizando um pouco, tinha ele mesmo um salão para gente mais “poça”, que por sua vez tinha outros salões, e pelo jogo dos salões se fez esta coisa imponderável que foi a propulsão da opinião européia, propulsão aliás, revolucionária, ,nos séculos XVII e XVIII. Eu sustento que para a expansão do Grupo o cultivo atualizado da arte de conversar é indispensável. Primeiro para o grupo inteiramente na sua vida existir como dede, em segundo lugar para ele atrair gente e para ele se expandir. De maneira que algo sobre esta arte de conversar eu gostaria de dizer agora. É como estão vendo uma verdadeira arma de Revolução ou de Contra-Revolução. Eu reputo que quem não tem essa arma é um cata-cego, não um cego, mas um cata-cego. Sabem o que é cata-cego, vai assim , vê algo mais muito para pouco. Ou se quiserem é um tartamudo, um gago tão gago que quase não fala na ordem da Revolução ou melhor, da Contra-Revolução, do manuseio da opinião pública. Eu sustento que isso vale para 1966.
Pergunto se o conceito que eu dei está claro ou não. É portanto um jogo cujas regras se devem conhecer. Eu já digo batendo no peito que minha geração um pouco disso ainda conheceu mas não ensinou isso aos senhores. Dom Pedro Henrique não ensinou a arte de conversar para absolutamente ninguém, Dr. Geraldo Brotero também não, não vejo também no Dr. Martins características de um causar deslumbrante embora ele tenha algumas tiradas. Alguma coisa de vez em quando ele diz que se aproveita. Não tenho o prazer de conhecer os pais dos outros, mas tenho sérias suspeitas que se enquadram na regra geral, seríssimas suspeitas de que se enquadram na regra geral, inclusive num país onde a arte de conversar é um pouco, é mais a arte de falar do que de conversar. Esta idéia está bem clara e a importância da coisa está bem clara.
Eu vou dizer uma coisa horrorosa mas que afinal de contas a gente deve dizer. Eu tenho impressão que se eu não tivesse procurado haurir a arte de conversar da geração dos meus tios avós e de minha avó conversar, eu prestei longamente atenção. Eles conversavam um tanto bem, depois eu li uma descrição da arte do Conselheiro Jão Alfredo conversar, e ele era danado, os inimigos políticos de João Alfredo tinham medo de conversar com ele, porque diziam que ele era bom na tribuna, excelente na conversa em grupo e incomparável na conversa individual, que era a gradação João Alfredo. O resultado era que o pessoal tinha medo de falar com o João Alfredo porque ele enrolava a coisa. Outra coisa também que faz parte da arte de conversar mas é uma coisa preciosa, é a arte de cumprimentar, a arte de dizer bom dia. A coisa mais banal do mundo, a arte de dizer bom dia, mas quanta coisa a gente diz num bom dia, quantos pingos nos is num bom dia, quanta gente a gente estimula e quanta gente a gente põe numa atitude interrogatória num bom dia, é incomparável. O lado prático do bom dia e da boa noite é único. Nada mais prático do que a velha cortesia. Se eu não tivesse procurado aprender isso eu creio que eu teria desfalcado a formação do Grupo de um de seus melhores fatores. Porque o Grupo se formou no início na base de conversa. Isso é fora de dúvida.
E ainda hoje um pouco da ação que eu possa desenvolver dentro do Grupo vem da arte de conversar. Por aí os senhores podem imaginar como a arte de conversar bem aproveitada que recursos pode dar.
(Dr. Eduardo: O senhor não acha também esse assunto útil para aquela campanha de cochichos que o senhor pretende fazer com o Diálogo, como ação sobre a opinião pública?)
Também nessa linha. A melhor arte de tocar a opinião pública é gente que saiba conversar. Agora os senhores compreendem também um pouco uma outra coisa. Analisando a estrutura do Grupo os senhores compreendem que na minha intenção ao fazer Sedes era fazer o Grupo até certo ponto funcionar como salão, aquele salão antigo, em que as pessoas cultivavam a arte de conversar e através da arte de conversar movem uma porção de coisas. E o pouco que o Grupo tem nesse sentido, porque infelizmente tem muito pouco, o pouco que o Grupo tem nesse sentido ainda daí vive o pessoal do Grupo. Os senhores querem ver a prova disso, os senhores imaginem que no Grupo não houvesse as poucas conversas que há o que é que o Grupo seria. Por aí os senhores vêem, ainda a importância atual da arte de conversar.
Agora eu vou tratar da arte de conversar, primeiro quanto ao assunto tratado, em segundo lugar quanto à escolha do assunto, em terceiro, como se portar com os interlocutores e quanto o cumprimento como arte de inaugurar e de encerrar a conversa. Vou procurar resumir o mais possível, mas penso que dará para tratar do caso.
A arte da conversa está baseada propriamente na seguinte idéia: que a conversa é um modo de duas pessoas ou mais tratarem um assunto, não de acordo com aquilo que elas tem vontade de fazer no momento, e portanto como quem baba e como quem boceja, mas para dar ocasião a ela e ao interlocutor de desenvolverem o assunto, de tratarem de todos os aspectos do assunto e de analisarem a [fundo?] o assunto. Quer dizer, há dois modos de conversar: um modo por exemplo, eu estou sentado aqui na sala, entra por exemplo o Eduardo, eu estou lendo a Folha, o Eduardo está lendo a Gazeta. Eu vou digo para o Eduardo: olhe que notícia interessante. Quando está lendo outra notícia e diz: é verdade.
Daqui a pouco o Eduardo me lê uma notícia. Eu também digo: é verdade.
Aqui cada um está egoisticamente seguindo o fio de seu pensamento, está pensando o seguinte: se ele quiser falar sobre o que me interessa e nos termos que me interessa eu até tenho pilhas de coisas para dizer para ele, sobretudo se ele quiser ficar quieto e eu falar indefinidamente. Mas como eu já sei que ele é um pau, e sobre o que me interessa ele não fala, então eu vou ficar quieto e não falo nada e se falar comigo eu amorteço a conversa. Quer dizer que só sai conversa quando por um verdadeiro jogo de bicho, uma loteria, acontece que dois estão simultaneamente com vontade de falar a mesma coisa, aí a conversa anima. Esse é o modo de matar qualquer conversa. A conversa deve ser considerada como um verdadeiro dever , de um dever de educação. Em face da pessoa com quem a gente está, a gente do mesmo modo conversa, quer dizer, desenvolve um certo assunto inteiro. A gente faz isso do mesmo modo como por exemplo a gente tira o sapato diante do outro, não tem propósito um de nós aqui dentro, está muito quente, tira o sapato. Uma bomba, o que aconteceu aqui? Pois bem, eu reputo isso menos destrutivo do convívio comum, do que ao entrar aqui querendo falar sobre um assunto, os outros sobre outro, ninguém sai do tema que quer. Há um princípio portanto em matéria de conversa que é: quando dois ou mais estão juntos eles tem que desenvolver um determinado tema, que nós vamos ver daqui a pouco como vai ser tratado, e como é escolhido, mas conversando com vontade como quem está de fato disposto a entrar por aquele tema adentro e abrir, quer dizer, dar opiniões, dar conceitos, que convidem o outro a um comentário. Isso é que tem que ser. E o outro ainda que não esteja com vontade de conversar sobre aquilo ele trata daquilo. E aqui que nasce o suco da conversa. É quando os dois conhecem as regras desse jogo e então quando eles derem acordo de si, o mais insípido dos temas passa a ser interessante. Até sobre astronomia quando a gente sabe conversar a conversa é interessante, e é muito mais interessante do que a conversa que há na minha casa ou na casa dos senhores, onde não se pratica a arte de conversar em que a conversa não é nada porque é conversa. Sabe que eu encontrei a tia fulana hoje na rua. Única resposta possível, é, ela estava bem disposta? Não há outra coisa possível não é verdade?
Como é que a gente trata o tema de maneira a ser desenvolvido. Nunca procurando dizer a respeito do tema a palavra final. Mas é procurando dizer a respeito do tema algo, que a gente entrevê que dentro daquilo é que possa interessar mais ao interlocutor e que dê ao interlocutor a oportunidade de ele dizer alguma coisa. Quer dizer, ,essa conversa doutoural definitiva, por exemplo, vamos dizer, Gregório me diz: Dr. Plinio vão vai mudar a mão de trânsito aqui. Eu dou uma resposta que fecha. É verdade, eu já li hoje no jornal. É o mesmo que pegar sua boca e meter uma pedra dentro. Ainda que eu saiba que de fato já foi mudado, eu digo em primeiro lugar: você tem toda a razão, para confirmar, porque é uma coisa que te coloca à vontade para conversar, e digo, eu até já li no jornal, e já digo uma coisa que te convida a dizer qualquer coisa. É até muito bom porque o automóvel entra pela Jaguaribe, enfim, digo qualquer coisa. Você já sabe o que eu tenho que dizer. É verdade a rua Jaguaribe anda muito cheia. Aliás todas as ruas de São Paulo andam cheias. É um jogo de peteca onde sempre a gente diz uma coisa ao outro que convida ao outro a dizer mais alguma coisa, que facilita, é um empurrar a bola para o outro, e não é bancar o bobo, doutor das regras, que diz uma coisa definitiva e fica olhando para ver o que o outro tem a dizer. É sempre empurrar a bola para alguma coisa que a gente percebe que o outro pode dizer mais adiante. E nesse ponto qualquer tema é tema de conversa e a gente quando começa o jogo, tudo quanto é jogo é tão interessante em si, que a gente jogando com o interlocutor, que não seja um bicho preguiça, que queira conversar também, a gente acaba percebendo que a menor das conversas acaba tendo seu atrativo, acaba tendo sua amenidade, e que se dá esse fato curioso, que conversando sobre bobagem mais dez minutos de repente nesse jogo aparece sempre um tema interessante e que a conversa desliza para esse tema sem querer. O encontro do tema interessante dá-se como que organicamente no trato da coisa. E aí então a conversa esfuzia e dá uma coisa muito boa. Naturalmente a conversa não dá mais do que está na cabeça dos interlocutores, isso é evidente, e portanto eu não posso pretender que uma conversa, por exemplo, feita vamos dizer, por uma pessoa de natureza, eu sei que não há nenhum aqui, portanto eu falo, muito silenciosa e que responde por monossílabos, esse gênero de gente que pensa antes de responder.
A gente diz, sabe que vai mudar o trânsito aqui. A pessoas pensa um pouquinho e diz: Não ouvi dizer, porque primeiro recordou todas as conversas últimas que teve a respeito de trânsito.
Isso gela qualquer pessoa. O que eu digo é o seguinte: a conversa é tão interessante quanto possível, dada as duas pessoas que conversam, em segundo lugar ele é sempre interessante, do melhor causeur do mundo com o pior, desde que o outro seja causeur, queira conversar também. É interessante para o melhor não é só para o pior, desde que o outro queira conversar também. E é esta tendência, eu resumo os dois princípios da conversa, tendência a abrir o assunto de maneira a ele ser considerado nos mais variados aspectos, e em segundo lugar, tendência de sempre dizer alguma coisa que facilite o interlocutor de responder uma outra coisa. Essa são as duas condições da conversa.
Eu falaria daqui a pouco da escolha dos temas da conversa, porque já o assunto ficou meio indicado.
[D. Bertand pede para repetir os princípios.]
Os princípios são esses: a gente sempre tratar do assunto não na medida, eu vou dar três princípios no lugar de dois. Primeiro princípio é: Ir para a conversa, não querendo tratar do tema que está na cabeça da gente, ou de um tema de exclusivo interesse da gente, mas disposto a tratar de qualquer tema. É como quem vai jantar em casa dos outros e está disposto a comer qualquer comida. É uma obrigação… [ilegível] …. Segundo ponto: a conversa deve ser tal que a gente trata do tema não com a tendência para fugir dele, mas com a tendência de abri-lo inteiro, de dar ocasião no modo de tratar do tema de ser considerado em todos os aspectos. Terceiro: sempre ao responder a outra parte, de dar uma resposta tal que já dê um certo elemento para dizer mais algo. Nunca uma resposta que seja difícil ele tirar mais algo.
Naturalmente isso supõe tirocínio como todo jogo. Todo jogo se aprende na prática e não apenas na teoria. E supõe parceiros que queiram aprender o jogo. Mas antigamente, no século XVIII, um pouco no século XIX havia aulas de conversação, manuais de conversação, livros, cursos de conversação, de tal maneira isso é uma coisa que se aprende. De maneira que quem sai de casa e vem pra o público já deve vir no estado de espírito conversativo, não pode estar como quando está de pijama em casa, levanta de manhã, está claro que não está conversativo. Mas assim como a gente se penteia para aparecer em público, a gente se põe em termos conversativos para aparecer em público. O espírito conversativo já é essa preliminar.
(Leo observa: A geração nova por falta de substância ou de apetência, não consegue fazer isso de uma maneira orgânica, só consegue fazer de tal maneira forçada que a outra pessoa percebe que é forçada e daí a conversa morre, etc. Pergunta: Convém forçar essa ponto?)
[Dr. Plinio promete responder adiante.]
Vamos tratar agora da escolha do assunto. A escolha do assunto é o seguinte: é uma bobice que eu tenho notado em muita gente, inclusive até nos primeiros tempos de contacto com a Martim, salvo a reverência, a idéia seguinte, que a conversa desde o começo tem que ser interessantíssima. O sujeito senta com o outro já dizendo um princípio filosófico prodigioso. Isso é uma megalice. Não é verdade? Mata a conversa. Não é isso, a conversa, toda a conversa começa por um tema banal que está ao alcance dos dois interlocutores. É um tema banal que está ao alcance dos dois interlocutores. È um tema comum entre eles. Se eles não são, sendo moradores do mesmo bairro, eles conversam sobre o trânsito, se eles são de um outro país e nunca se viram: Você nasceu na Transilvânia, muito interessante. Diga pelo menos que têm um irmão chamado Silvio. É a primeira das saídas. Procure no tema um elo comum banal, porque o elo banal é a coisa natural. E é horrível começar forçar a coisa. Imagine por exemplo, eu vejo o Eduardo, o Eduardo Brotero, ele deve ser descendente do Cons Brotero. Sou apresentado a ele e logo digo: Descende do [Cons?] Brotero? É artificial é uma conversa esquisita não é verdade? Primeiro falo a respeito de qualquer coisa e depois se for preciso chego até o Cons. Brotero, mas vamos por etapas, não vai assim. Da banalidade tocada assim como eu estou dizendo, desta banalidade, a gente deve estar a procura para ver um pouco qual é o tema de que o outro gasta dentre os temas de que a gente gosta. Deve ter uma certa prática de olhar para ele e dizer, esse aqui, a minha cota de conversa com ele não vai a não ser até tal ponto. Ele é por exemplo fazendeiro de café e gosta de falar sobre café, eu estou vendo que a cabeça de lê é um saco de café. Eu preciso encontrar algo cafeiforme, com que, sobre o qual eu fale com ele, e tem que encontrar, enquanto eu estiver conversando eu estou procurando um traço comum entre o café, ele e eu para tratar uma conversa café. O mais baixo dos níveis é: você é fazendeiro de café? Eu tenho vários parentes que são fazendeiros. Em que zona você é fazendeiro? Meus parentes são fazendeiros em tal outra zona. De repente ele diz: eu tenho um compadre naquela zona. A gente pergunta muito interessando quem é? Se de repente é um parente da gente é um alívio, a gente conhece, fala sobre aquele homem, mas dá um começo de conversa que tem um certo calor, depois que pegou a bobina, porque o primeiro é pegar uma conversa qualquer. Esse é o primeiro tema para fazer pegar conversa. Depois que pega o tema, trata de tema que é sempre um tema de interesse comum entre o interlocutor e a gente.
Terceira questão… [ilegível] …é procurar daí como vai para o lado doutrinário. E ver como eu tiro uma doutrina. De repente o homem dá uma opinião e ou eu contradigo ou eu concordo e dou um princípio e daí então procuro puxar a conversa para o lado da doutrina, o que supõe por sua vez um certo tirocínio. Mas a questão é que sem um certo tirocínio não se aprende nada. Quer dizer, os senhores poderão me dizer: é dificílimo. É como um jogo de xadrez, aprendendo o movimento das pedras. Alguém olha e diz: eu nunca vou aprender isso. Então meu caro você já entra aqui achando que nunca vai aprender então não aprenda. Eu pressupondo que uma pessoa diga: o que foi patrimônio da humanidade durante séculos eu posso aprender. E aqui muito resumidamente estaria a escolha do tema, e estaria depois a arte de conduzir a conversa para esse tema, muito esquematicamente. Então o que disse o que fica até certo ponto entendido aí.
Você vê por onde é que corre. Está tão, tão resumido que eu me pergunto se isto tem utilidade. É quase uma experiência. Vocês quase me deveriam dizer o contrário. O que seria preciso para que isto tivesse utilidade.
[Perguntam qual é a segunda etapa.]
A primeira etapa é pegar uma conversa qualquer, é entabolar uma primeira interlocução chegar a uma que tenha certo fogo, a segunda etapa é desta primeira interlocução chegar a uma que tenha certo fogo e que se mantenha, terceira etapa é tirar daí algo que é do interesse da gente, então num sentido mais alto, mais doutrinário, enfim, aquilo que é possível.
[Leo pergunta se o interlocutor percebendo que o assunto está forçado até que ponto convém ir nesta hora]
Quando a gente tem bastante tirocínio o outro nunca deve perceber que a gente está achando cacete o assunto que está se tratando. A gente deve sempre, ele pode achar que a gente está com interesse maior ou menor, mas que aquilo seja forçado não pode nunca. É uma coisa que com a prática não pode acontecer nunca.
(Martim Afonso: Até que ponto quem inicia a conversa deve forçar a nota para ele, que deu início ao assunto não adquirir defeitos nessa linha e… [ilegível] …)
O critério de certeza aí é sempre o seguinte: se a gente percebe que está determinando o interesse dos outros, ou que caminha para determinar, está bem, quando não caminha, qualquer coisa está errado. Um dado positivo é a outra parte que se trata de interessar. Como eu digo na medida do possível.
(Leo: Dr. Plinio, o senhor enunciou o princípio de que, duas pessoas estando juntas, normalmente deve haver uma conversa. É uma regra de educação. Agora, mesmo partindo de temas banais, para nós a coisa, pelo menos inicialmente é bastante difícil. Pergunto se convém forçar uma coisa qualquer tão artificial que talvez mais mate a conversa do que… [faltam palavras] …)
Não, eu vou dar muito mau exemplo mas é o que me ocorre. Aula de dança. Uma aula de dança não se recomenda ao sujeito que não sabendo dançar comece a pular em cima dos pés dos outros. A gente recomenda que o sujeito comece a dançar com jeito porque é um direito dele, mas não, custe o que custar de maneira a por um salão em polvorosa. Quer dizer o tirocínio nunca deve ser custe o que custar, mas deve ser de tímidos ensaios iniciais que a gente percebendo que não vão a gente volta atrás, mas a gente recomeça incessantemente, mas sem exatamente forçar, porque o que eu chamo forçar é exatamente não uns tímidos ensaios, que não forçam, então um passo para frente, outro para trás, mas é o querer fazer a coisa custe o que custar, e o modo de ficar irremediavelmente comprometido é querer fazer custe o que custar nunca como ficar calado até onde houver uma oportunidade de conversar, e recomeçar os ensaios com uma infatigável boa vontade. A gente acaba aprendendo.
(Leo considera: situação típica em que isso acontece é a viagem longa.)
Quantas vezes já notei isso. Duas pessoas combinando horários e eu penso comigo mesmo. O que esses dois vão falar durante o caminha. Calculo que haja vácuos enormes, ou não, uma hora logo de começo.
(Gregório: Dá para rezar vários rosários.)
Naturalmente nisto existe bom senso. Por exemplo, imaginem que eu vou viajar de avião. Há muita gente que na decolagem do avião fica apreensiva, eu não vou discutir se é uma fraqueza ou não, mas fica, eu não vou logo no começo sentar com o sujeito e dizer: está funcionando mal, e já, já engajar uma conversa com ele, porque eu percebo que o coitado está apreensivo com qualquer coisa. Depois outra coisa, nas viagens, grandes silêncios são de direito natural. É uma coisa insuportável estar conversando horas em seguida, porque tudo isso tem invólucros de bom senso, evidente. Mas que quando… [ilegível] …
[Alguém pergunta o sentido da palavra tirocínio.]
É a prática, experiência. A qualidade do sujeito que é experiente chama tirocínio, vem do tiro, o hábito de dar tiro e acertar no alvo. O atirador tem tirocínio. Então por analogia.
(Martim Afonso: Dr. Plinio, nesse quadro qual é o direito de cidadania das conversas banais, nos dois sentidos; uma conversa de grupo, por exemplo, compreende-se que numa reunião inteira se desenvolvam apenas conversas banais; em segundo lugar, em conversas fora de reuniões, quer dentro do grupo, quer com outras pessoas….)
No grupo a conversa banal se justifica desde que todos estejam com vontade de sair dela para uma coisa mais alta, e não estejam encontrando a porta de saída. Portanto a preocupação consiste exatamente em não tomar o gosto da banalidade enquanto banalidade, mas estar organicamente à procura de um assunto mais alto. Se dá o gosto da banalidade enquanto banalidade a conversa começa a ser má.
(Martim Afonso: Pode-se dizer que é normal que haja longas conversas assim, e que é melhor haja conversas assim do que não haja conversa nenhuma.)
Eu tenho impressão do seguinte: Não se deve dizer que é melhor, mas, sim, que é menos mal e sempre com cuidado com os riscos que se possa acarretar. Porque por um hábito longo que existe no grupo, isto acaba dando o risco de alimentar o gosto pela banalidade. Por outro lado, com uma certa boa vontade não é difícil sair uma conversa melhor.
[Dr. Plinio responde a segunda pergunta de Martim Afonso a qual era: se é normal ou não, que estas coisas existam.]
É sobretudo na geração de vocês, enquanto não tomam o hábito, etc., etc., é normal que exista.
(Martim Afonso: E em que relação a conversas fora do grupo.)
Nas conversas fora do grupo com as pessoas que a gente aproxima, a regra é a mesma. É ter uma conversa até conseguir organicamente passar para os pontos que interessam a gente. E portanto em alguma medida… [ilegível] …, com todos os perigos que pode trazer, do mesmo modo como dentro do grupo de dar [um certo hábito, etc.?]
(Martim Afonso: Quer com relação às conversas dentro do grupo, quer com relação às conversas fora, não existe um lado onde se possa considerar que é o, digo, um limite especialmente com as conversas fora, um limite de suportabilidade em relação à outra pessoa)
Sim, porque a conversa fora do grupo, sobretudo, supõe a alguém que nem sabe conversar e que não está querendo conversar, muitas vezes. De maneira que é muito delicado. Portanto, a arte também é de não se impingir a pessoa. Se a gente percebe que a pessoa não está querendo conversar, etc., etc., não se pendurar, uma das coisas que mais desprestigiam é a gente se impingir. É melhor a, oras tantas, depois de ter feito um razoável esforço, largar alguém, do que perceber que a pessoa está achando cacete, que a gente está colado. Desprestigia e não adianta nada.
(D. Bertrand: Às vezes vê-se o nosso pessoal doutrinando uma pessoa que está se aproximando e dando mais do que a pessoa pode digerir. E a pessoa perde o pé na realidade, fica nodosa, não entende.)
[Dr. Plinio concorda e considera:]
Isto eu sinto e percebo de longe, sobretudo com apostolado de pessoas de boa família, que são habitualmente os mais cretinos, mais vidro, e com mais má vontade.
[O trecho a seguir aparece riscado no microfilme]
(Mas cheio de banalidade e é… [ilegível] …. Martim Afonso lembra o caso do Marcos Ribeiro Dantas que veio a São Paulo, foi cercado com tal insistência por várias pessoas, todas dizendo as mesmas coisas, que ao ser doutrinado pela enésima vez por alguém disse a dada altura: “Espere um pouco, vamos devagar que eu chego lá”)
[José Lúcio lembra outro caso semelhante… [ilegível] …com um rapaz com quem conversaram por volta de duas horas para convencê-lo de certos princípios doutrinários.]
Eu me pergunto se essas regras que eu acabei de dar aqui, e que afinal de contas são muito primárias, elas não fariam adiantar nosso apostolado enormemente. Portanto, apesar de ser muito difícil aprender, eu… [ilegível] …que… [ilegível] …fazer dessas regras, se não vale a pena, aí… [ilegível] …bater com força por causa da grande importância. Eu vejo que é preciso, da parte de D. Bertand e de vocês, um senso de adaptação enorme [dado o que?] eu acabo de dizer. Mas a questão é a seguinte, depois que a gente pensa um pouto no caso, é preciso querer tocar [seriamente?] as coisas para frente sem dominar essa arte? Esse é o problema. E o que é que é então para considerar. Portanto, de um lado eu tenho a impressão que luto por… [ilegível] …um certo assunto, mas por outro lado… (ilegível) …anda de… (ilegível) …E logo a primeira pergunta é entre… (ilegível )…essa conferência que… [ilegível] …tirar [isso?]
Eu tenho a impressão que a única utilidade, o único jeito possível, é fazer o que sugeriu D. Bertrand… (ilegível) …é o de [falar?] isso, ter guardado, o fazer um pouco de exame de consciência, de vez em quando, sobre o modo como está utilizando isso. Quer no apostolado, quer nas conversas do grupo, não vejo outro jeito. Talvez daqui a um mês, daqui a dois meses se pedirem uma reunião, apresentando as dificuldades que notaram a respeito, para a gente a partir dessas dificuldades vivas desenvolver, qualquer coisa assim. Mas é uma coisa que precisa ser transposta, nosso movimento precisa ter uma grande equipe de gente que converse bem. Os senhores notem bem eu não estou falando em conversa aristocrática, nem estou falando em conversa intelectual brilhante, isso é outra questão, eu estou falando numa conversa autêntica e animada, eu estou pedindo pouco. Não estou falando de nenhuma das condições, não indispensáveis, mas boas da conversa, que é vocabulário abundante, não estou falando disso, eu sei que não devo tocar nesse ponto sei que é um ponto proibido. Desejo saber se sobre este assunto conversa a mais o que fazer ao que distribuir isso, e por exemplo, ser ouvido pelo Alcacer, pelos veteranos da Aureliano e mais algum outro, e depois me dizerem as dificuldades vivas que aparecem. Há alguma coisa mais a fazer ou não.
(D. Bertrand deseja saber algo sobre o aspecto sobrenatural da conversa pois, diz ele, às vezes não se está conseguindo que a conversa saia, mas rezando-se algumas jaculatórias a conversa desenvolve, muitas vezes conversas abençoadíssimas [mas?] a primeira vista não se esperaria tal resultado. D. Bertrand pede alguma coisa a respeito deste aspecto.)
Sempre que uma conversa toca um ponto que diz respeito a qualquer tema considerado à luz da doutrina Católica, é uma oração. Porque a oração é a elevação da mente até Deus, e a consideração de alguma coisa segundo Deus é oração, e tem a promessa de Nosso Senhor que quando dois ou mais estiverem reunidos em meu nome eu estarei entre eles. Uma conversa católica é uma oração, que pode inclusive ter ares de oração a ser considerada ao lado sobrenatural. É também mais meritória [porque?] pra conversa que não tem aridez, a oração é tanto uma coisa mais meritória quando… [ilegível] …quando… [ilegível] …
E por exemplo e as dos senhores de e… [ilegível] …e conversarem… [ilegível] …aridez é uma coisa que tem um verdadeiro mérito, não é um fracasso, uma coisa que tem um verdadeiro mérito porque é uma oração. Como neste caso a conversa… (ilegível) …totalmente é uma ação da graça nas pessoas que estão conversando, toda a ação da graça se move com orações, se obtém com orações, e é preciso estar irrigando a conversa a toda hora com jaculatórias para o senhor fazer viver aquilo na gente e no outro, abrir a alma do outro, etc.,etc. E a conversa está sobrenaturalmente tocada como quem toca uma oração e uma operação da graça. A bem dizer sempre que eu estou fazendo uma coisa católica, está fazendo como uma pessoa que pega um maçarico e faz aquela luz passar pelo maçarico, quer dizer, a luz é a graça, é preciso que a eletricidade passe pelo maçarico, é preciso que a graça entre no que a gente está dizendo e então do lado sobrenatural é capital isto.
(D. Bertand ainda considera que para ele é especialmente no início que rezar tem mais resultado.)
[SDP concorda dizendo que é no início que se deve pedir pois o início é sempre o mais difícil.]
Antes de entrar na análise do relatório eu precisava especificar uma coisa que ontem eu não matizei tanto quanto depois de uma certa reflexão. Eu acho que eu deveria matizar. Eu disse o seguinte: que nós poderíamos ser em São Paulo vinte vezes mais do que nós somos. É preciso dizer que não seríamos vinte vezes mais do que nós somos em qualquer classe social. Esta é uma outra questão. A nossa classe é uma classe mais ingrata do que uma classe social menos elevada, porque é o pessoal mais corrompido, mas… [ilegível] …, mais deteriorado, mais acretinado, é de algum lado a… [ilegível] …. E até de um certo ponto de vista é a borra a que vem nos maiores preconceitos… [ilegível] …onde a gente explica que o movimento de classe social…(faltam palavras)…as condições postas são muito ingratas. [E então decorre?] o seguinte: na nossa classe social a gente deve fazer… [ilegível] …que é, de parar muita gente, passar por muita… [ilegível] …logo em… [ilegível] …uma… [ilegível] …não… [ilegível] …
Porque aí é perder um tempo que não é proporcionado. Há um grano salis a introduzir que eu [acho?] muito importante. Estão, … [ilegível] …vocês me dirão, mas o senhor mesmo não nos diz que em que se consiga aí, vale por vinte, cinqüenta por mais que se consiga em outro setor.
Dr. Plinio diz: é bem verdade, mas quando não se consegue não se vai fazer um esforço destemperado, que não tem propósito. Isto até pelo contrário dá em desprestígio é uma coisa que a gente não deve fazer, estar testando uns esforços, umas alquimias, não deve ser. Rezar bastante, fazer um certo esforço, quando a gente vê que é quase impossível, solta, pega outro. Mesmo porque a gente tendo, vamos dizer, um grande batalhão da outra classe, e começando a mostrar na rua, isto é um impacto nos dessa classe muito grande e é por onde então a gente arromba a porta, a gente não entra pela porta da frente mas entra pela porta do fundo, mas entra, e o que importa é entrar. Eu pego por exemplo cinqüenta rapazes da Saúde e ponho vendendo em frente daquela Igreja em forma de ferro de engomar. Então, há uma série de cretinos vítreos de lá que…(faltam palavras)…sobretudo e eles vêem entre os outros alguns conhecidos.
Quem sabe se eu diria alguma coisa enquanto não chega o tal relatório do José Lúcio. Eu tenho a impressão que a dificuldade mais importante que D. Bertrand e vocês vão encontrar, a outra parte, quando se trata de apostolado fora, a outra parte não têm a menor noção de como se conversa, e mais ainda não tem vontade de conversar. Porque o outro vem para [fazer o papel de bacalhau até… [ilegível] …do óleo de fígado de bacalhau?] nós faremos o papel do homem e eles fazem o papel de bacalhau, quer dizer, eles são carregados. Como ele não tem nenhuma intenção conosco, não quer nada, eles querem se deixar carregar, ele vai – se é que… [ilegível] …carregar… [ilegível] …Porque é muito difícil fazer conversa com quem não quer e não sabe conversar. Eu tenho a impressão que a dificuldade concreta mais importante é essa. E naturalmente isso supõe antes de tudo [uma?] outra coisa, a gente não querer conversar [tudo o que é?] … [ilegível] …o transe…. [ilegível] …a gente está… [ilegível] ……não que… [ilegível] …que… [ilegível] …é cretino. A gente não deve estar assalta[do?]. Isto é o pior possível, mas eu tenho a impressão que é preciso se resignar com a situação de que o sujeito é besta mesmo, e como parceiro besta a gente tem que fazer ou um jogo de genial ou um jogo semi-besta.
Agora, enquanto nós não estivermos na categoria do genial que não é atingível em um só pulo, então, então nós vamos ficar na categoria do jogo semibesta, quer dizer, conversa pode coisa “poça”, etc., etc., até o sujeito perder um pouquinho, ficar um pouco mais à vontade, e para conseguir que ele fique um pouco mais à vontade o único jeito que tem é fazê-lo falar dos assuntos que interessam a ele. Quando uma conversa vai fracassando pergunta ao sujeito pelo assunto que interessa a ele. Em geral o assunto que interessa a ele é o mundinho dele, é o exame dele, é o esporte dele, o tio dele, a fazenda, se ele gosta, se ele não gosta, o que é, o que não é, fazer falar um pouquinho. Porque é a força de a gente estar com um sujeito assim uma vez, duas vezes, cinco vezes, que ele instintivamente vai correspondendo ao jogo da conversa, porque é uma coisa meio instintiva, instintivamente ele vai correspondendo, vai melhorando um pouco, e vai se conseguindo tirar alguma coisa dele. Não em todos os casos mas em certos casos. E nos casos em que isto não adianta, não adianta mesmo, não se pode fazer nada. Não estou sustentando a tese de que por exemplo, a gente pode fazer conversar um [mudo?], seria impossível, é uma coisa que vem aos poucos, com gente, [com alguns?] Serve sobretudo para tocar para frente os mais aproveitáveis, essas regras de conversa, servem sobretudo para isso, de um lado elas servem muito também para ir fazendo com que alguns entrem no grupo da conversa e que possa tocar para frente, mas que haverá alguns refratários que não entram nunca, isso eu acho uma coisa indiscutível. Portanto os senhores não devem ficar com remorso quando não… [ilegível]…absolutamente nada com algumas pessoas, porque é inevitável com o gênero de gente… [ilegível] …e tola que existe hoje em dia. Isso é a regra das regras.
Agora, há uma regra do outro sentido e que essa… [ilegível] …que é muito mais importante, é a seguinte: ou estas regras são praticadas pelos senhores dentro do grupo e com aqueles que sabem conversar e que [conversam?] para adquirir um tirocínio pois só com os de fora isso não se adquire. Vamos dizer, nas conversas do venerando e colendo Alcacer, na preclara Aureliano, usar estes métodos para fazer com que dentro do grupo se conversa, e fazer o apostolado da conversa dentro do grupo, para esta Comissão aqui é quase mais importante do que conversar com o pessoal de fora. Aqui está a questão das questões. Vamos dizer por exemplo, D. Bertand e os senhores chegam nos respectivos grupos, vai aquela conversinha, rasinha, castinha de todas as noites, se não há um tirocínio para elevar o nível da conversa de acordo com as regras que eu dei, quando chega na hora de falar com gente de fora, não adianta nada. O pressuposto e a regra das regras é aplicarem essas regras entre si. Concretamente falando e talvez fosse interessante passar essas reuniões sobre conversa no Alcacer, talvez fosse interessante escrever e por na mão de todos para lerem. Talvez fosse interessante fazer na Aureliano com um certo grupo da Aureliano, com os veteranos, um núcleo outro qualquer, uma acima a ser estudada e do mesmo modo como se faz no Alcacer, mas ver se encontra um batalhão de choque, disposto a fazer entrar as regras da boa conversa dentro do Grupo. Tenho a impressão que para todo o nosso movimento isso seria incomparável porque dentro de um grupo funcionando bem, onde a conversa funciona bem, o apostolado da conversa para fora vai bem. Ao contrário não adianta nada. E esse me parece o conselho mais prático para dar. Dar com um pouco de cuidado de um ponto, faria que essas regras de conversa fossem usadas dentro do grupo por vocês, assim adquiria um tirocínio para conversar com os de fora, que essa é a TFP. … [ilegível] …é que seria interessante portanto que… [ilegível] …a fita sobre a conversa e fazer ouvir pelo Alcacer, fazer ouvir setor da Aureliano e depois vocês então… [ilegível] …e fazer oferecer boa conversa com os outros também, um verdadeiro apostolado sistemático de conversar sobre as boas regras, coisa muito mais importante para a boa vida do que seria conversar para captar gente de fora.
Dr. … [ilegível] …reuniões da Comissão… [ilegível] …apresentando as dificuldades encontradas para Sr. … [ilegível] …,dar o controle de como ela está fazendo, das dificuldades que encontra as dificuldades chegaram até mim, eu gravo em pedaço de fita, volta para a reunião e com isso vai resumindo. Senão isto tudo se esvai numa nuvem de teorias áureas como nuvens pairando no passado do grupo.
(Sr. João: Às vezes entra um elemento de mau espírito ou está de má vontade que azeda inteiramente a conversa.)
Com indivíduos de mau espírito ou de má vontade, o erro é dizer o seguinte: é verdade, ele está de mal espírito agora, eu vou fazer bem para ele, então vou dissentir com ele e levá-lo até a parede, isto é dar a ele o centro do jogo. O que a gente faz com um sujeito de mau espírito é não dar ocasião para a gente: eu penso não sei o que, etc, etc. Resposta interessante, um sorriso frio e: como eu ia dizendo… [faltam palavras]…
[é dado um exemplo mas a fita esta censurada]
Dr. Plinio diz que com pessoas assim o melhor é ignorá-las com toda cortesia e nunca zangar. Deixar rolar sobre ela a máquina compressora do silêncio de todos os modos possíveis.
(Gregório: Faz uma consideração que não se ouve)
Há nó e nó. Há nó de gemer e nó de berrar. Se der nó de gemer faça, se der nó de berrar tome cuidado. Só que não deve haver provas diante dos outros de que ele está sendo maltratado. É deixar ele sem provas de que ele está sofrendo violência, porque essas provas ele exploraria junto aos outros.
(Martim Afonso: O senhor falou de gente que não fala, deixar a pessoas falar nas coisas dela. Em geral a pessoa falar das coisas dela, não indo além de um certo limite, a pessoa pode se embombar em uma coisa errada e às vezes pode acontecer que a conversa fica completamente só naquilo, porque focalizada errada não tem mais concerto.)
A questão é a seguinte: este recurso de fazer o outro falar sobre seu próprio mundinho é quando a dificuldade da conversa está chegando a um ponto de estouro, de tal maneira há pouco assunto que o único remédio é os dois ficarem quietos, é o fracasso do encontro, falta assunto, fica um olhando para o outro, então a coisa chegou mesmo no chão. Para evitar uma coisa dessas, para evitar que se prolongue este estado, vale a pena para lançar mão desse recurso heróico.
Não quando a conversa está simplesmente difícil mas há esperança de tocar bem, mas é para evitar colapsos. Se for para evitar colapsos vale a pena esse recurso. Também vale se a pessoa tem bastante destreza para conversar e nota que o outro está achando cacete a conversa, então a gente fazer falar um pouco do mundinho dele serve, mas a propósito de qualquer coisa sair daquele assunto. Mas isso supõe um pouco de destreza da parte de quem conversa.
(Martim Afonso: Ficar conversas inteiras falando do mundinho aí não.)
Aí não. Mundinho entra apenas como uma espécie de balão de oxigênio. Seve para começo de assunto, ou para evitar que o assunto role. Porque às vezes há uns tipos assim, ele vai dar uma resposta que mata. Você pergunta para ele: Como vão seus exames: resposta: Vão bem obrigado. Você diz em que faculdade você esta estudando? Eu já disse… [ilegível] …na faculdade tal. É dos tais sujeitos que respondem e não dão uma [deixa] Portanto para evitar situações de aflição em todas as gamas a gente entra de passagem com o mundinho, pronto para sair dele logo que possa, um recurso transitório.
(Martim Afonso: Há um outro problema que se dá tanto dentro como fora do grupo. Às vezes a gente se vê no meio de uma conversa e que ou a gente faz o que o senhor faz nas conversas com a gente ou então a conversa não vai para frente.)
[Dr. Plinio pergunta o que ele faz.]
(Martim Afonso: Quando a gente não quer ou não sabe falar é preciso que alguém seja o professor da conversa, fala, e interpela um, interpela outro, e você o que acha. Isso é bom, é lícito dentro do grupo no caso de se estar com pessoas do grupo, ou fora, estando com pessoas fora do grupo.)
Esse recurso assim como eu uso é um recurso pessoal, cada pessoa tem lá seus recursos. Portanto não é assim inteiramente imitável. Para um ter seu modo de se defender, de agir que é muito individual e que se trata de encontrar. Se a pessoa tem certeza de por esta forma levantar o tema e interessar, vale a pela, se a pessoa não tem certeza disso é muito arriscado, porque então encontra uma espécie de fronda geral. E isso tanto no grupo como fora do grupo.
(Martim Afonso: [não se compreende])
Se a pessoa nota, se a roda nota que a conversa com isso sai positivamente lucrando ela perdoa a dominação. Ela se indigna quando não é em qualquer roda que eu faria isso. Vamos dizer que eu vá falar numa roda de homens de negócios, para os quais é assunto novo, alguém diz: Sabe que a lei do selo foi revogada? Nesse ambiente, mande aqui para baixo, não vou entrar em e de repente falar de Henrique IV. Vocês compreendem que não vai. É preciso me adaptar. É provável que nessa roda eu faça um papel muito apagado, por prudência.
O [Veslaima?] tem uma poesia, ele não presta para nada mas a poesia dele diz qualquer coisa, em que ele descreve de um fato que se deu em um navio. Uma daquelas aves que voam pelo mar e de repente cai machucada no tombadilho. Então começa a andar com os pés sem muito jeito. Então o ridículo daquele que é feito para mais e que quer fazer um papel num palco menor do que o dele é mais ridículo do que quando ele quer fazer um papel num palco maior do que o dele. Então um de nós começar a ser esforçado por falar sobre a lei do selo fica mais ridículo do que se quisesse bancar o mega. Em muitas rodas falo pouco, deixo passar, ar que eu tomo então para não ficar de baixo, um ar [assistindo?] muito de cima, mas não posso pretender empalmar a conversa.
(Martim Afonso: Existe uma outra solução que não essa de dirigir a conversa para o problema do diálogo e a reunião plenária?)
Em reunião plenária acontece o seguinte: que não tem solução nenhuma o problema quando você fala uma roda de pessoas que não estão dispostas a não conversar sobre o que quereria, quer dizer, a pessoa precisa estar disposta a não conversar sobre o que quereria e conversar com resolução sobre o tema que o plenário possa aceitar, e que nunca [é o tema o ideal?] de cada, raras vezes é o tema ideal de cada um. Se isso não é assim, não tem solução, não é que faça uma conversa dessa sair. Eu para uma conversa, e supondo a geração de D. Bertrand e de vocês, a conversa é sempre sobre a tese que interessa mais ou menos a todos e sobre a qual todos corajosamente conversam, a espera… [ilegível] …de repente… [ilegível] …te. Mas fora disso quer empalmar a conversa… [ilegível] …para ela tocar para frente não adianta. A não ser quando a gente tem um tema tal que desperta, [tira?] o ambiente do letargo. Há um estado de letargo interlocutório em que o sujeito se senta, aliás eu vejo isso freqüentemente no grupo, o sujeito senta-se numa cadeira: bom, agora acabei de trabalhar e vou ficar aqui como numa poltrona de cinema, e fica assim, às vezes olhando para mim como se eu fosse um ator. Em… [faltam palavras] ….não se conversa assim nem é nada, nem é absolutamente nada. Isso é o contrário da boa educação. A boa educação é conversar. Roubar uma cadeira numa roda e não estar disposto a entrar no assunto é uma tal falta de educação como limpar o nariz ou a orelha com o dedo, sem tirar nem por, para gente civilizada é isso exatamente. Noção que a minha geração nem sempre ensinou a vocês, aliás minha geração ensinou muito pouca coisa.
(Martim Afonso: Acontece muitas vezes numa roda em que não haja muita vontade de conversar, todos entrariam mais ou menos numa conversa se a conversa se fizesse, acontece que a certa altura, por uma razão qualquer dois começam a conversar sozinhos, estabelecendo um diálogo e todos os outros quietos, não porque os outros não queiram conversar, mas porque esses dois dominam a conversa. Como os outros também não tem muita vontade de conversar, e às vezes a gente é um dos dois, então a única saída que vejo é essa de apelar para a interpelação de um, de outro.)
Mas aí a interpelação precisa ser feita com muito jeito, não é propriamente fulano o que você acha mas é dizer uma coisa que dá uma oportunidade ao fulano de dizer … [ilegível] …quer dizer, por uns atalhozinhos que facilita os outros entrarem. Interpelar de fato, mas com jeito e não [exagerar?] Vamos dizer que a conversa seja sobre um tema [horroroso?] a candidatura do Costa e Silva e em que você e o [Poli?] entram… [ilegível] …resposta dessa questão. Estão voando alto… [ilegível] …da candidatura do Costa e Silva. Para interessar, vamos dizer, … [ilegível] …assunto é preciso ver um pouquinho qual é o aspecto… [ilegível] …poderia matar de tanto dizer uma palavra. Por exemplo: olhando para ele já vejo que… [ilegível] …, eu percebo … [ilegível] …ou… [ilegível] …que ele vê, em que ele gostaria muito de encontrar uma besteira, ou uma contradição dita por qualquer dos dois, entre o macaco e o Costa e Silva a respeito da respectiva candidatura. Então a gente de jeito diz, Gregório você notou tal coisa? Aí ele entra. Mas se eu chego para ele e digo: Gregório quantos eleitores terá Costa e Silva, uma coisa da qual ele nunca cogitou na vida, ele não entra. É preciso um senso psicológico e um jogo contínuo que faz exatamente da conversa o mais alto dos jogos. Não há bridge, não há nada que esteja a altura, de longe, do jogo da conversa.
(Martim Afonso: Existe ainda alguma outra solução?)
Não. Portanto não é tanto a interpelação como eu faço mas um convite. É procurar atrair.