Reunião
Normal – 15/09/65 – 4ª feira .
Reunião Normal — 15/09/65 — 4ª feira
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As relações mais íntimas de ordem intelectual, antídoto para o democratismo, quando se “guardam todas as proporções” * “Só sabe verdadeiramente obedecer quem conhece os firmamentos de quem manda”. Necessidade de “jornais-falados” * A importância da crítica para adquirir um espírito seletivo, e a docilidade que deve ter o subordinado para ser assumido pelo espírito do superior * Arrojo na planificação, prudência na execução, perfeição dos detalhes: qualidades do Mal. Foch admiradas pelo Moisés da Lei da Graça * Aplicação para os soldados da Contra-Revolução em nossos dias dos princípios extraídos do artigo, o Moisés da Lei e da Graça brinda seus filhos com esplêndida “vue d’ensemble” R-CR
[Nota: Está muito confuso nos microfilmes quando se trata de leitura do texto e quando são palavras do Senhor Doutor Plinio; os erros serão corrigidos na revisão final]
Eis que, enfim, estais de volta. Devo esforçar-me por agora em fazer o quadro daquilo que foi minha colaboração com o general Foch. É o mais delicado do que me propõe fixar nessas memórias. pois trata-se de minha pessoa e de nossas relações mais íntimas de ordem intelectual.
* As relações mais íntimas de ordem intelectual, antídoto para o democratismo, quando se “guardam todas as proporções”
Os senhores vêem a idéia curiosa de que as relações mais íntimas entre dois homens são as de ordem intelectual. Hoje em dia intimidade quer dizer liberdade de dizer coisas inconvenientes, de dizer coisas prosaicas, de bater nas costas. É a intimidade da baixa de nível. Aqui não: os senhores vêm uma intimidade de alto nível. A verdadeira intimidade é a intimidade intelectual, é a fraternidade nas idéias. Isso é que é intimidade. Mas como se pode falar de intimidade intelectual para quem não tem intelecto. É uma coisa impossível.
A democracia é uma eliminação do intelecto. Os hábitos democráticos estabelecem a intimidade prosaica, que é uma coisa execrável. Aqui os senhores estão vendo uma intimidade ainda em base tradicional. É uma intimidade de ordem intelectual.
Mas não hesito em abordar esse assunto porque guardadas todas as proporções, o general procedia do mesmo modo com qualquer oficial que ele incumbisse de um trabalho especial, guardadas todas as proporções.
Os senhores vêem como essa expressão vem a propósito. Porque se o general tivesse a mesma intimidade com qualquer um, dava exatamente em democracia, dava em porcaria. Guardadas todas as proporções, quer dizer, por mais íntimo que seja de alguém é intimo guardadas as proporções que há entre ele e esse alguém. E ele diz ainda mais: ele não diz: guardadas as proporções, mas guardadas todas as proporções. Há muitas proporções, várias proporções, todas elas precisam ser guardadas. Todas elas precisam ser guardadas. Os senhores compreendem como está bem dito isso, portanto.
Chegada a esta altura das narrações, a confiança que me depositava meu chefe tinha já há algum tempo posto [ilegível] colaboração no quadro e no ambiente onde ela se desenvolveu até o fim. E não é sem emoção que me lembro dessas palavras: eis que enfim estás de volta, pelas quais me acolhia, em outubro de 1914, na praça de Russel, depois de alguns dias de separação.
É muito bonito isso. Um chefe mega gosta de dar a entender que ele não precisa de seus subordinados, e que qualquer subordinado para ele dá na mesma. Ele se sente diminuído dando a entender que precisa de alguém? Isso não. É um grande chefe que compreende que tem seus homens indispensáveis, e que sabe dizer isso de um modo ameno, de um modo afável, no momento oportuno.
Aqui os senhores estão vendo o reconhecimento de que lhe fazia falta a ele o general Weygand…
— Adolpho, tem lugar aqui na frente.
Bem, como se viu…
Há um exemplar desses para o Dr. Adolpho?
Aliás, os exemplares que estiverem sobrando é melhor deixar aqui para as pessoas da Pará e da Martim que entrarem poderem pegar. Ter aqui para o Dr. Adolpho. Obrigado. Página 8, Adolphinho.
* Princípio de autoridade, hierarquização de planos e eficácia
Como se viu, sempre que o general lá estava, meu tempo lhe pertencia. Ele tomava de meu tempo o que queria e eu utilizava o que restava para tratar das questões de segundo plano, para as quais ele se apoiava em mim.
Está uma definição perfeita. O chefe trata de assuntos de primeiro plano. E o subordinado dele é sobretudo um pau-mandado para resolver com ele as questões de primeiro plano. Quer dizer, está para isso. Está à disposição.
Agora, as questões de segundo plano pertencem ao primeiro que está abaixo do chefe. Mas como são de segundo plano, passam à segunda plana e só são resolvidas depois que o chefe utilizou o seu auxiliar imediato inteiramente, para as questões de primeiro plano que ele queria.
É, os senhores estão vendo uma teoria do mando que vai sendo exposta aí, e discretamente, sem fanfarronada. É com aquela …. francesa, que é qualquer coisa de absolutamente incomparável. Continua:
Sem dúvida, a direção de um Estado Maior de exército, com todo trabalho que exige de seu chefe, a direção de seus escritórios e de seus grandes serviços teria sido incompatível esse modo de trabalhar.
Aqui falta uma palavra.
… a cabeça de meu Estado Maior de grupo de exército [ilegível] perfeitamente a esse regime e podia, sem faltar a nenhuma obrigação, [ilegível] dobrar ao método de trabalho de meu chefe.
Os senhores estão vendo bem a expressão como é hierárquica e bem achada. Não é ele que impõe um método de trabalho ao chefe, mas ele aceita o estilo do chefe, a personalidade do chefe e se amolda ao chefe. Porque cabe ao planeta e não o planeta ao satélite. O que supõe, entretanto, um chefe que tem um estilo com o qual a gente possa se amoldar. Porque se é um chefe … [ilegível] não se pode pedir as pessoas ser [ilegível] e [ilegível]. Evidentemente. Quer dizer, tudo repousa numa harmonia.
Dava-me a possibilidade de o servir da melhor forma.
Os senhores estão vendo a frase como está magnífica: o servir da melhor forma. Os senhores estão vendo como a frase está magnífica: o contrapeso: ele se amoldava ao chefe. Mas o chefe era tal que dava a ele a possibilidade de servi-lo do melhor modo possível. Aqui está a teoria da inter-relação entre planeta e satélite muito bem estabelecida.
* No “au jour le jour” do Mal. Foch manifesta-se a necessidade da confiança
Agora, continua:
Vivendo o dia todo com ele, presente a todas as visitas que fazia e àquelas que recebia, quando julgava que nisso nosso trabalho podia tirar proveito, [ilegível] ignorava de seu pensamento, nem sobre os grandes assuntos, como dizia, nem sobre as pessoas e as coisas.
Isso é uma coisa fundamental no chefe. Ou o chefe tem confiança nos seus subordinados para que os seus subordinados conheçam tudo quanto ele pensa, ou não há relações de chefia bem estabelecidas.
De maneira que esse conhecer inteiramente é coisa fundamental, não é isso: Chefe mega pensa que ele fazendo mistério, não é: brumoso.
Agora, eu vou resolver uma coisa parâmica. E olha assim para o subordinado, para ver que lindo efeito isso causa, que ele sobe. Não, ele sai, porque mostra que não é verdadeiramente chefe.
Normalmente o chefe deve ter algumas pessoas de sua confiança que conheçam tudo quanto ele pensa. Os senhores encontram uma aplicação disso na vida do Catolicismo, em que — eu vou me servir de expressões do próprio Weygand — guardadas todas as proporções, nós todos conhecemos tudo que devemos conhecer, e sabemos tudo aquilo que é necessário saber para poder acompanhar o movimento. Tanto jornal falado, tanta informação, tanta reunião tem, como fim primeiro, estabelecer exatamente uma adequação, estabelecer uma proporção, estabelecer uma comunicação entre o chefe e aqueles que, guardadas todas as proporções são chefes e os vários subordinados.
Sabia onde ele queria chegar e conhecia os limites impostos pelas ordens recebidas, as dificuldades a vencer e os obstáculos a evitar.
Quer dizer, conhecer o limite das ordens recebidas, quer dizer, até onde a ordem não vai, conhecer quais eram as dificuldades a vencer e quais eram para evitar, decorre de conhecer inteiramente a mente do chefe.
Isso explica aos senhores também porque [é] que a gente deve prestar tanta atenção nos jornais falados, deve prestar tanta atenção nas reuniões de sexta-feira, dadas pelo fio; é com a idéia de que a gente deve saber inteiramente qual é a meta política, quais são os altos horizontes de quem deve dirigir o grupo, para a qualquer momento nós sermos capazes de obedecer em qualquer direção.
* “Só sabe verdadeiramente obedecer quem conhece os firmamentos de quem manda”. Necessidade de “jornais-falados”
Não é capaz de obedecer verdadeiramente quem não conhece os horizontes, quem não conhece o firmamento que tem diante dos olhos aquele que manda. De maneira que há uma necessidade prática disso, e uma necessidade de primeira plana. E, é uma das razões, não é a razão A, é a razão C, mas é uma razão que por si só justificaria as reuniões de sexta-feira, ou os jornais falados, é exatamente o saber obedecer, conhecendo os últimos horizontes do que vai ser mandado. Nós continuamos:
Bastava uma vez, já estava certo sem ter necessidade de outros esclarecimentos, de trabalhar conforme as suas concepções e seus métodos de realização.
Eu acho que aqui há um pequeno erro. Deve faltar “bastava uma ordem, basta uma voz”, deve ser isto.
Essa vida em comum deu-me dele um tal conhecimento que antes mesmo que ele abrisse a boca, um gesto, uma expressão de fisionomia dizia-me o que iria falar e em que sentido.
Os senhores estão vendo aqui o que é o contato humano superior. O chefe é conhecido. Não se trata apenas de conhecer as ordens recebidas burocraticamente, mas conhecer a pessoa do chefe. De maneira tal que na pessoa dele toda meta política dele, toda a metafísica dele, toda a mentalidade dele é conhecida. E com uma expressão de fisionomia, ele já muitas vezes dá uma primeira idéia, uma primeira modelação das ordens que ele vai dar. Isso é o chefe verdadeiramente chefe. Esse é o subordinado verdadeiramente subordinado, que presta assim atenção no seu chefe, que procura aprender no seu chefe, como num livro, e procura ler no seu chefe como num livro. Isso é que é verdadeiramente convívio entre planeta e satélite. Continua:
Atribuíram-me, como mérito, o fato de que eu o teria comprometido, compreendido e feito compreender. Sinceramente creio que todo chefe de Estado Maior gozando de sua confiança, chamado a participar de sua existência e a seguir o trabalho de seu pensamento como eu fui admitido a fazê-lo, teria alcançado o mesmo resultado do que eu.
* Num artigo brilhante, a descrição sintética das qualidades do verdadeiro chefe, e seu embrincamento com os súditos
Aqui há uma pequena enumeração que a gente deve considerar, porque tudo nesse artigo é intencional. Não há uma palavra posta por acaso à maneira de deputado da assembléia legislativa estadual, vereador; diz torrentes de coisas que podia não dizer, que dava na mesma. A conclusão era a mesma. Quer dizer, não tem conclusão. Aqui cada coisa é como numa jóia bem desenhada, onde cada pedra preciosa tem seu papel decorativo, tem sua razão de ser.
Então, aqui os senhores vêem:
Sinceramente, creio que todo chefe de Estado Maior…
Agora, as qualidades de chefe de Estado Maior: primeiro, gozar da confiança do chefe; segundo, chamado a participar de sua existência. É a segunda vez que ele põe em realce essa idéia. É portanto, oportuno que eu diga uma palavra sobre ela.
Chamado a participar da existência: verdadeiramente, as relações de chefia e de subordinação só tomam a plenitude que devem ter quando o chefe e o subordinado participam da mesma existência. Essa história de se encontrar um pouquinho, de falar um pouquinho e pensar que isso dá para uma relação de chefia e de subordinação, é um engano. Ou há um puro [o que?] em comum das existências, um participar das existências, ou não tem nada. E é exatamente uma das glórias de nosso grupo é que a existência de todos nós é participada.
Nós estamos continuamente juntos uns dos outros. E é uma das razões pelas quais, humanamente falando, o Grupo tem tanta coesão. É porque a nossa existência é participada. Mas é participada longamente. Nós nos encontramos de manhã, encontramos à tarde, encontramos à noite. De noite, quando chega a hora de eu me despedir, eu nem sei bem com que eu estive e não estive durante o dia. Isso entre os senhores e eu.
Isso entre os senhores entre si; isso todos os dias, o ano inteiro, anos a fio. Isso forma um embricamento de personalidades, que é um dos segredos da vida do grupo. Do senhor … de cuja tática de vaporização alguns dos senhores, pelo menos, estão lembrados, e que parece que não deixou muitos admiradores aqui, eu recebi um conselho em sentido contrario, não é? Diz: por que tanto convívio? É perda de tempo. Era melhor reduzir esse convívio a folhas escritas que circulam, e depois os senhores se dispersam por aí e vão levar…. graine por toda parte. É o contrário da teoria do Foch. Mas por que? É porque é um francês de quinta, enquanto aqui é um homem que tinha cabeça; francês de primeira.
Então, “participar da existência”, e aqui outra coisa curiosíssima. Ele falou, há pouco em intimidade intelectual. Ele dá aqui a definição muito interessante de intimidade intelectual, que é o seguinte:
Seguir o trabalho de seu pensamento…
Quer dizer, ver o homem não quando ele apresenta a resolução feita, mas ao contrário, enquanto ele está elaborando a resolução, enquanto ele está hesitando quanto à conceituação do problema, enquanto ele está cambaleando para encontrar a solução verdadeira, enquanto ele está penando, enquanto seu pensamento dá vais e vens, de maneira tal que quando a gente vê o homem apresentar a fórmula final, tudo — no itinerário da fórmula— foi visto.
E então a gente conhece o homem e conhece o produto do pensamento, muito melhor do que simplesmente olhando nas folhas do seu… Pensamento do senhor…, não, conhece nas folhas perfeitamente. Mas o pensamento do marechal Foch se conhecia muito melhor exatamente nessa elaboração. E é um dos deveres do chefe. E deixar exatamente que a elaboração de seu pensamento fique a nu. Eu já pensei nisso ao considerar aquelas máquinas do Estado de São Paulo que ficam com um vidro em baixo, quem passa vê o jornal sendo feito. A cabeça do chefe deveria ser assim. Deveria ter vidro para os seus cooperadores verem as suas idéias nascerem. Mas nascerem com as imperfeições, os erros, com tudo aquilo que caracteriza a elaboração da idéia verdadeira, afinal.
* A importância da crítica para adquirir um espírito seletivo, e a docilidade que deve ter o subordinado para ser assumido pelo espírito do superior
É por causa disso que, em geral, se guardam e se estudam os verdadeiros críticos literários e os historiadores estudam os originais dos grandes livros. É para ver como é que o escritor titubeou, hesitou. Eu já vi, por exemplo, páginas de composições de Chateaubriand. Ele escrevia com um espaço grande entre uma linha e outra, às vezes, e às vezes com espaço apertado para terror dos secretário dele. E, depois, andares de palavras, e depois arabescos corrigindo, sempre com terror para o secretário.
Um secretário poca diria: mas por que o senhor não escreve de outro jeito? Não, nos imponderáveis da cabeça dele aquilo é melhor escrever assim, não vale a pena poupar o serviço dele para ganhar outro secretário, ou melhor, para ganhar o do secretário. isso é exatamente o secretário errado, que tem as duas mãos esquerdas. É claro.
O secretário ambidestro, que tem as mãos direitas, que sabe se dobrar à personalidade do chefe, compreende que isso é cacete, mas que no trabalho dele tem coisas cacetes como tem no do chefe. E deve se lembrar que se para ele o cacete é copiar, para o chefe ainda foi muito mais cacete encontrar cinco adjetivos para ir colocando um em cima do outro, e riscando. Cada um arca com sua caceteação. Feliz aquele cuja caceteação é apenas de copiar. É evidente. Bem, vamos adiante:
Então, seguir o trabalho de seu pensamento, como fui admitido a fazê-lo.
Isso é um modo de dizer como tive a honra de fazê-lo, como tive a honra de ser admitido a isso.
Teria alcançado o mesmo resultado que eu, pois correm… abrir uma brecha na lenda do seu hermetismo. Segundo certos autores, ele não se exprimia a não ser por aforismos ou por enigmas.
Quer dizer, isso é um tormento para qualquer pessoa. A gente pergunta qualquer coisa e o chefe dá uma resposta enigmática. Jupiter dizia que não sei o que… Bom, lá vou eu entender o [que o] oráculo de Delfos falava. Isso é o chefe inumano, gagá, mega. Isso é horroroso. Não sei se é porque eu também sou muito duro para decifrar aforismos, eu tenho particular horror a isso, mas enfim…
Por enigmas, quando não, somente por um gesto.
[O que que vamos fazer? Avançar, recuar. Não, marechal, que solução deu à reclamação do chefe do Estado Maior canadense?]?
Bom…
Ahn não, hoje chegarei a dizer que o marechal Foch deixará de ter exatamente como em Saint Etienne, exatamente como Monsieur de Turenne…
É o grande Turenne que nosso Carlos Alberto desprezava.
… suas obscuridades. Mas sob condição de me explicar a respeito delas.
Quer dizer, ele tinha obscuridades, mas era sob a condição da gente, dele entender quais eram essas obscuridades. E agora vem um trecho que eu acho que é dos mais bem sacados desse tratado, é a teoria das obscuridades do chefe. Não é que eu esteja pleiteando a minha própria causa, mas enfim aqui vai a teoria.
* Na “teoria das obscuridades do chefe” nosso Pai e Fundador insinuava seu estilo de pensamento e convidava os seus a entrarem em seu espírito
Essas obscuridades não estavam em seu pensamento…
Isso não se dá com o meu.
… sempre simples e claro, mas também na expressão desse pensamento, nem também na expressão desse pensamento que, por ser sempre original, e às vezes abrupta, não era por isso menos capaz de chamar a atenção, e menos compreensiva. Eles provinham da dificuldade que sentia seu interlocutor, em segui-la.
Isso é o auge da humildade e da delicadeza.
Bem, vejam os senhores, portanto, um pouco a teoria da expressão do pensamento. O pensamento tem que ser simples e claro, primeiro. Segundo: a expressão também deve ser simples e clara. É o contrário do Rui Barbosa, por exemplo.
Eu estou lendo um livro de descalçadeira no Rui Barbosa. Aliás, um livro interessante: pertence aqui à biblioteca e para alguém que tenha curiosidade desse gênero de coisas, vale a pena folhear. Ler é tremendamente indigesto: Rui, o mito e o homem. Mas então, para descalçar o Rui, cita trechos do Rui. E eu refresquei um pouco minha memória, de uma ou outra coisa, que eu fui obrigado a ler, imperativamente, do Rui, quando eu era pequeno. Porque eu só lia o Rui, obrigado.
É como um fortificante chamado óleo de fígado de bacalhau, que a gente toma em pequeno. Era só obrigado, não havia outro meio. Assim também o Rui, só obrigado. Mas dessa vez não foi obrigado; é pelo desejo de encontrar no que ele escreveu fundamentos para críticas contra ele, portanto, por raiva dele, eu li.
* Fazendo a crítica de um dos “padroeiros da boçalidade”
Mas aí eu vi o vácuo e a futilidade desse homem. Esse homem achava o seguinte, aquele homem: que para dar ênfase a uma coisa, em vez de dizer a respeito dessa coisa três adjetivos que dissessem coisas diversas, era preciso pôr três adjetivos sinônimos. Compreende-se uma vez ou outra. Mas como processo absolutamente crônico da ação…: essa coisa é branca, alva, imaculada, já se entende, não é verdade?
Não, era uma acumulação inútil do sinônimo. Isso é o contrário da simplicidade. Os senhores vão ver mais adiante o elogio da simplicidade. Então, o pensamento tem que ser claro e simples.
Bem, agora, não pode ser acaciano. É, portanto, bom que por vezes seja original. Quer dizer, dizer perpetuamente coisas que todo mundo já está vendo aonde vai chegar, é de desolar. Pelo menos, de vez em quando, tem que ter qualquer coisa que tenha a chama do novo; porque o original não quer dizer biscornuto, extravagante, não. Original quer dizer que tem origem nele, que ele pensou e que ninguém antes dele pensou. Não é engraçado, não. Não é chanchada. Bem, continua:
Às vezes, abrupta.
É o estilo francês, não é? de vez em quando, bam, lá vem aquilo à maneira de um trambolhão. Mas um trambolhão que faz cintilar coisas inteligentes. É como quem chacoalhasse estrelas: sairia chispas de toda ordem. É abrupto, mas que abrupto!
* Discernimento dos espíritos e adaptabilidade do Sr. Dr. Plinio ao proferir conferências
Bem, então:
Não era por isso menos capaz…
Aqui não está bem.
… de chamar a atenção, de reter a atenção.
É um erro a gente falar de tal maneira que os outros tenham dificuldade de prestar atenção. É uma coisa que eu sigo muito quando eu faço conferência, é o nível de atenção dos meus ouvintes. Quando eu começo a prestar… a notar que uns tantos ouvintes começam a não prestar atenção, fato crônico em toda conferencia, ao menos quando o conferencista sou eu — há uns tantos ouvintes que não prestam atenção, eu já qualifico: porque … uns ouvintes que têm uma cara de gente que nunca presta atenção em nada.
Então, não ligo. Mas quando tem cara de gente que presta atenção, eu já compreendo que a conferência tem que sofrer, na hora, uma adaptação. Porque, do contrário, o número dos que prestam atenção vai caindo. E, no fim, é o deserto. Palminhas [ilegível] e todo mundo se dispersa.
Quer dizer, é um trabalho que é preciso exercer quando a gente faz a conferência, e que até quando é chefe e dá ordem, a gente tem que ter.
Quer dizer, a gente tem que se dar ao trabalho de procurar ser tão interessante quanto a parcimônia dos recursos naturais da gente permita. Mas não se tem o direito de ser cacetíssimo, nem para os mais íntimos. Mesmo porque o tédio, ora, quando se começa a ser cacete é muito gostoso ser cacete, porque a gente se deita em cima dos outros… está todo mundo trabalhando e até rezando, se ele quiser.
Bem, então…
Ele era capaz de chamar a atenção, reter a atenção e compreensivo se bem que a ordem e a clareza tivessem na primeira linha das qualidades da sua inteligência.
De toda inteligência. Se a inteligência é desordenada e confusa, fique por si mesma, não presta para nada.
Ele podia desnortear por seu modo sintético de se exprimir, indo diretamente ao essencial, saltando sobre os argumentos intermediários, como também sobre as contradições aparentes, derivando igualmente de raciocínio não explicitados.
Tudo isso são enfermidades muito freqüentes e todos nós a sentiremos em nós. Eu sou o primeiro a senti-las muito em mim.
— Fernando, tem lugar aqui, se você quiser.
Bem, … quer pedir para o Solimeo urgir a ligação para Amparo, sim?
Quais são esses inconvenientes?
* Presunção errada, precipitação, outros defeitos a serem evitados quando se fala em público
Primeiro lugar, é o modo muito sintético de se exprimir. Quando a gente pensou longamente sobre uma coisa, e reduz a uma fórmula, a gente tem o direito de pensar que dando a fórmula, a gente tem o direito de pensar que dando a fórmula todo o mundo entende o que tem dentro. É muito freqüente esse defeito.
Outro defeito é o seguinte: saltar sobre os argumentos intermediários. Como a gente já pensou, a gente dá as grandes etapas dos argumentos. Mas o outro que está tomando contato com o pensamento não se contenta com isso. Ele quer todas as etapas, senão ele não vê o encadeamento.
Não perceber que as contradições aparentes podem afligir o amigo com quem a gente está conversando. E, sobretudo, a dificuldade de explicitar os raciocínios.
Isso é uma dificuldade para mim, muitas vezes, tremenda. E eu creio que, mais ou menos, todos nós devemos ter isso. Um exemplo.
Ninguém apreciava mais do que ele as faculdades do espírito com todos os domínios. E, entretanto, acontecia-lhe manifestar mau humor contra os dons de certas pessoas. Não é que os recriminasse por ter [ilegível] esses dons, mas porque não os utilizavam suficientemente.
Quer dizer, ele às vezes, [quando] via uma pessoa muito dotada, ficava nodoso; é porque a pessoa zuppava os seus próprios dotes, o que acontece também. Os senhores hão de concordar.
No trato das questões militares, os que o conheciam imperfeitamente, tinham dificuldade de colocar-se em seu regime de pensamento. Como o automóvel ele poderia estar em marcha direta ou em primeira velocidade.
Porque essa marcha direta? Quer dizer a mais alta velocidade.
Em marcha direta assim chamamos o vasto domínio da concepção. Ele via tão vastamente e tão longe que era necessário galopar firme para segui-lo.
Isso é propriamente o chefe. Quando trata de plano, a linha geral do plano, audaciosíssima, magnífica. Agora, depois, quando trata da execução, muito devagar.
* Arrojo na planificação, prudência na execução, perfeição dos detalhes: qualidades do Mal. Foch admiradas pelo nosso Pai e Fundador
Quer dizer, planificação arrojada, rápida. Execução pensada, prudente, calculando passo a passo. Isso é propriamente o chefe. Então, terceira velocidade para a concepção. Depois, muito devagar na execução. É esplêndido esse pedaço do Weygand.
Em marcha direta assim… etc.
Quando, pelo contrário, em primeira velocidade, isto é, às voltas com a dificuldade da execução, considerava que nenhuma contingência era negligenciável, e a levava até o pormenor, com investigações destinadas a evitar toda má execução, e qualquer esquecimento.
De maneira que depois de ter o espírito pairado nos mais altos problemas da estratégia militar e de ter perguntado como evitar que houvesse uma ruptura de relações entre o Estado Maior Britânico e Americano, por exemplo, para a ofensiva final contra a Alemanha, [um] probleminha: temos nós bastante polainas para os soldados exercitarem isso? O que é preciso para ter polainas? Marechal, há uma rivalidade entre tal departamento e tal outro para fornecimento de feltro de polaina. Existe outro tecido que não feltro que sirva para polaina? E lá vai de questãozinha a questãozinha até chegar uma pequena amabilidade para o senhor João Ninguém, que é o homem-chave das coisas. E quantas coisas tem como homem-chave o senhor João Ninguém. Quer dizer, passa-se das estrelas para os vermes.
Quem não souber fazer as coisas ao mesmo tempo, não presta nem para as estrelas, nem para os vermes. É preciso saber fazer.
No que que nós estávamos? Ah, sim.
E se tinha cavalgado o Pégaso…
Eu não sei bem como se deve dizer isso. O Rui Barbosa devia saber perfeitamente…
… era necessário descer dele e se colocar com o marechal no terra a terra do caso concreto a resolver.
E ele poderia ter dito do “casinho”, porque quem diz bem o casinho é paspalho.
Tal pessoa então que numa troca de [ilegível] precedente tinha percebido que pensava curto demais, se via no outro dia chamado a exame meticuloso das questões que comparadas às abordadas na véspera, pareciam-lhe minúsculas.
Exatamente.
* Aplicando o célebre dito do “quem não sabe descer das estrelas aos vermes…” cunhada pelo Sr. Dr. Plinio nessa série de conferências
Vamos dizer, por exemplo, um sujeito que tenha — eu tenho experiência disso, lumbago, por exemplo — ele não pode nem levantar-se muito nem agachar-se muito. É porque ele tem o tronco impedido no seu movimento. Agora, um que seja destro, pelo contrário: ele vai ao minúsculo e ele se ergue na ponta do pé. Ele tem todos os movimentos. Esse é o mediano. Só tem o movimento comum. Ele nem sobe às grandes questões, nem tem humildade suficiente para compreender a importância das minúsculas. É o mediano, é o medíocre. Isso é o medíocre.
O outro é o Foch, é o homem que sabe as coisas. Bem, o interlocutor, então, não compreendia mais. Isso é …. Eu não compreendo mais nada. É mais ou menos como uma pessoa que, não sei, tomou o reflexo de Pavlov, tanto subiu e desceu a perspectiva, que o sujeito diz: “bom, cansaço dos materiais; eu ouvi dizer que até ferro cansa, barras de ferro de vez em quando cansam.
A coisa degringola. Assim também dá. Bem, onde é que está essa história?
A mudança poderia ser mais desconcertante ainda quando se produzia no decurso de uma mesma conversa.
É, o homem que chega e diz: como disse aos senhores, estou empenhado em associar todas as outras nações do mundo a meu plano. Para isso eu comecei por mandar comprar blocos de escrever. Como? Que é isso? Mas, realmente, às vezes é preciso começar por aí. E o general dizia um “vire a página”, outra expressão favorita dele, ou mesmo por um simples gesto virava essa página imaginária. Quer dizer, …., mudou de assunto. A gente está vendo o medíocre fritar. Se esse medíocre fosse humilde, ele não seria medíocre, ele seria apenas mediano. E acabaria se adestrando e nunca se fritaria. Mas os senhores estão vendo nós, complexos, preguiça, demônio tentando no meio, etc., e tudo junto.
(Sr. –: E também quando o general dizia “vire a página”.)
Ainda bem, ainda bem.
É então necessário mudar de velocidade e se pôr no mesmo regime que ele, sob pena de fazer nascer certos agastamentos. …
Isso aqui não era louvável, naturalmente.
* O debique francês é pior que o murro alemão e o ressentimento brasileiro!
E agastamento de francês é um agastamento do outro mundo. Falou-se muito do murro alemão. Eu não sei se o agastamento francês, debicativo e ronronante não é uma coisa pior do que o murro alemão. Porque um murro é uma ofensa; a pior ofensa não é desagradável como um debique merecido. Isso é o que pode fazer de pior. Chamar de cretino, passa. Mas dizer um dito oblíquo por onde o sujeito tem a vivência da coisa, da própria cretinice, é muito pior. É claro. Piumm, lá vai. Porque na injúria, a gente pode sempre responder por dentro: não sou.
Mas quando o sujeito pôs a mão da gente na cretinice da gente, como é que não sou?
Isso não era sempre fácil de fazer compreender àqueles que me punham questões antes de serem introduzidos ao general. Muitas vezes perguntavam-me eles: Ele está de bom humor? Mas é claro, como sempre, eu tentava lhes responder, ou melhor eu era tentado a lhes responder; somente, não o deixem de mau humor.
Aqui, por exemplo, está o dito francês, que põe a mão do interlocutor na bobeira do próprio interlocutor. Quer dizer, não jogue contra as regras do jogo, que ele não fica de mau humor. Ou seja, se alguma coisa mancar, é você. Mas está dito de tal maneira que o sujeito põe a mão. É o gênio francês. Muito pior do que dizer simplesmente: não seja bobo. Porque a gente diz: não sou bobo. Mas aqui, não. Quase que a gente lambe a própria bobeira. O que fazer? É terrível o estilo.
Depois também, brasileiro quando toma uma dessas fica com um complexo de quinze dias de complexo, consecutivos: baixa, vingança. Os senhores conhecem a deformação que teve sur le pont d’Avignon. É uma cançãozinha francesa para lá de linda: Sur le pont d’Avignon, on y danse, on y danse tout então rond: sobre a ponte de Avinhão, a gente dança, dança, formando círculos. Isso foi abrasileirado e deu uma canção caipira, cantada no ritmo do Sur le pont d’Avignon e que é a seguinte: Sobre a ponte da vingança, todos passam, todos passam… —sur le pont d’Avignon on y danse tout en rond.
Depois disso é só pegar feijão com farinha, amassar assim e comer com a mão.
Não o deixem de mau-humor, não o compreendendo, ou lhe repetindo várias vezes o que ele terá compreendido da primeira vez. Entrem depois desse parênteses, no vivo de nossas ações de trabalho. Para melhor ganhá-lo, diferenciarei aqui…
Não pode ser ganhá-lo, há um erro.
… ainda duas ordens de idéias, as quais todas as questões que nós tínhamos a tratar podem mais ou menos se reportar as que se relacionavam com uma concepção de uma operação de guerra, as que se relacionavam com sua execução.
* Uma ordenação perfeita aplicada à arte de guerrear
Divisão perfeita: primeiro a gente concebe um plano e é toda uma ordem de problemas; depois a gente trata da execução do plano. É toda outra ordem de problemas.
Clareza e precisão. A atividade guerreira do general Foch está como que impregnada pelo adágio napoleônico: A guerra é uma arte simples e toda de execução.
Eu pergunto o que não é simples e todo de execução, depois de ter sido, segundo a expressão pitoresca do meu amigo João Sampaio, “creada” convenientemente, ou melhor “craneada” convenientemente.
Também considerava ele que nessa execução nada deveria ser negligenciado. O teor de uma ordem regulando essa execução era, de sua parte, o objeto dos cuidados mais atentos.
Agora vai ver como é que se faz uma ordem.
Quando ele próprio redigia era, no mais das vezes — não nas mais das vezes — sob a forma de uma nota com sua bonita escritura regular, cujos parágrafos numerados se sucediam com uma lógica implacável.
Vejam aqui que os senhores conhecem muitos chefes que não têm uma bonita escritura regular. Quanto aos parágrafos numerados, fazer em parágrafo e dar um número a cada parágrafo equivale a dizer ao leitor o seguinte: isso aqui é no cosmos. Pare e engula isso antes de engolir a parte segunda. E como quem pega os vários pratos do menu e diferencia. Esse menu tem batata: mas espera um pouquinho, mas o que é: salada de batata, é sopa de batata, é bolo de batata, não. É assim: é tal coisa, primeiro uma coisa, depois outra, depois outra. E coma cada coisa de sua vez.
Esses parágrafos, seguindo com uma lógica implacável.
É assim que uma ordem é dada. Fulano, está vendo aquele monte? Suba lá. E depois mate o homem que está aí. Espere um pouco. Pense antes de perder o folego. Então você não perderá o folego.
Bem, e a respeito da qual, depois de a ter lido e examinado sob todos os pontos de vista, a gente se dava conta de que não faltava nenhuma idéia, nenhuma palavra.
É a perfeição da ordem bem dada. Também não precisa mais elogio nenhum. Está a ordem perfeita. Os senhores estão vendo que o Weygand, várias vezes, procurou encontrar, procurou ver se encontrava uma frincha na ordem do Foch. Não encontrou nunca. Porque examinar sob todos os pontos de vista, quer dizer, procurou defeito em tudo. E ainda mais francês.
* Fritando superficialidades…
Se era eu o autor, ele submetida o texto a um exame terrível.
É uma das muitas coisas em que o subordinado precisa ter paciência. É exatamente em dar uma coisa em que ele pensa que está perfeita e ver o homem considerar debaixo de um ângulo que ele não tinha considerado quando redigiu. Então, tudo aquilo muda. De losango, passa a sair círculo. Grande desaponto!
Fazia-me ler esse texto e se abandonava sua leitura para eu comentar, é porque não estava suficientemente claro para ele próprio. Aí, como por toda parte, a clareza, a precisão, lhe pareciam coisas indispensáveis, pois para ele a largueza do espírito e o vago não eram sinônimos.
Isso é muito freqüente em brasileiro. Fulano é um espírito largo. Você vai ver o que é, diz coisas vagas. Isso é divagar, é um sujeito que é um divagador, não é um espírito largo. Espírito largo é que vê largamente coisas precisas. Isso é que é.
Uma frase que faltasse á clareza, era detida sempre: o que o senhor quis dizer? Resposta: tal coisa. Resposta: pois bem. Diga tout bêtement, quer dizer, não empole, não enrole. Diga com a naturalidade da conversa caseira o que você quis dizer, que sai direito. Mas diga. E era verdade. Tinha muitas vezes chegado a uma frase obscura porque as formas habituais do vocabulário militar se prestam mal à expressão da idéia. Mas se dissesse tout bêtement, quer dizer, sem pretensões teóricas, o que queria dizer, meu texto retomava a clareza e a idéia encontrava novamente sua força. O quanto o general era exigente sobre o fundo, sobre a justeza da expressão, tanto se mostrava largo sobre a forma, quer se tratasse de instruções pessoais, de ordens de operações ou de simples notas.
Quer dize, a ordem não é para ser bonita, não é para ser literária. Há certo tipo de advogados, por exemplo, que quando faz escritura pública, faz um requerimento, se preocupa exageradamente com a beleza do português. A correção, sempre. A beleza, não. Por quê? É outra coisa, não é literatura, não é madrigal. Cada coisa tem seu propósito. Uma ordem também: tem que ser simples e clara. Não vá procurar fazer literatura.
Não se preocupava com nenhum formulário de ordem. Não lhe havia notado, com alguma ironia, no seu curso da Escola de guerra, que o ilustre Berthier fazia questão de que todas as caixetas da ordem fossem cheias?
Quer dizer, portanto, não dizer também coisa assim muito esquemática, em que entra pelo meio algumas acacianas. A gente só diz aquilo que o indivíduo de si não percebe. O resto salta. isso faz parte do método. O método, portanto, é de dizer aquilo que o outro não sabe. E não de fazer uma espécie de esquema do sabido e não sabido. Isso é bobagem.
* Na hora da ação a exigência até dos minutos!
Uma vez estabelecido definitivamente um texto, o general não tolerava o menor atraso na confecção do material, do documento pelo Terceiro Bureau.
Os senhores estão vendo passar de uma elaboração mental muito alta, para uma coisa prática. Tem que andar depressa.
Feito o documento, esse lhe era levado logo que pronto, sendo a hora da assinatura um rito desconhecido entre nós.
Numa guerra não se concebe isso, não é? Às seis horas da tarde se assinam as ordens. Quer dizer, uma ordem sofre duas, três horas de delonga só porque não chegou a hora de ser assinado. Não tem conversa.
Relia-o ainda com atenção e exigia sua imediata remessa. O Estado Maior havia se adestrado desde o começo a não faltar a essa prescrição. A esse respeito não posso manter outra coisa se não citar uma passagem de suas memórias, das quais o general Requin quis dar-me conhecimento.
Agora passa ao Requin, os senhores vão ver como desce um pouco o nível. Não é a concisão do Weygand. É um fatinho um pouco anedótico, enfim. Mas o fato é mito curioso. Como? É.
Se três minutos depois que eu tinha dado uma ordem urgente… Ah, “Os poucos oficiais que trabalhavam, em 1914, na prefeitura de Kassel, se lembram, sem dúvida, da brusca aparição do general Foch, e dessa apóstrofe que nos lançou, sem nenhum preâmbulo, pela porta entreaberta: se três minutos depois que eu tenha dado uma ordem urgente para o destacamento do Exército da Bélgica, o automóvel que a deve levar não seguiu, quem quer que sejais, eu mandarei preso por 30 dias, por motivo infamante.
Tá-tá, está acabado. Pois é claro.
Está no auge da batalha. Os minutos pesam enormemente na decisão. Aquele mesmo homem que os senhores viram ontem trabalhar na calma de uma como que abadia beneditina, conta os minutos. Os senhores dirão: Mas Dr. Plinio, era o caso de fazer uma ameaça dessas? Isso não poderia ser mais amável: peço aos senhores a gentileza de… etc. etc. Isso corrompe tudo dentro da disciplina militar. Porque se é preciso seguir, nós devemos usar o modo mais direto, e o modo mais direto de fazer os homens andarem é o medo. Os senhores dirão: Ah, mas o zelo, o amor de Deus. Olhem, querem ter muito zelo? Comecem por pensar no inferno, porque elimina uma porção de obstáculos e a pessoa corre.
* Aplicação à vida interna do Grupo
De maneira que dentro do exército — é claro que a vida do grupo não é bem exatamente disso, mas tem seu tanto disso, heim! — mas para um exército não há outro modo. A coisa é essa.
Ele já havia desaparecido e nós nos olhávamos estupefatos, o coronel Weygand com os outros. Nós não sabíamos do que se tratava, mas o prestígio do general Foch era tal que qualquer um de nós pensava: ele deve ter razão.
Atitude pouco comum a brasileiro. Fica ressentido, vai olhar pela janela.
Bem, fizemos um rápido inquérito. O suboficial estafeta não estava no assento do seu automóvel quando a ordem lhe foi levada. Havia ido procurar seu capote, em vez de o ter junto de si. O substituto de serviço não tomara automaticamente o lugar de seu colega, e o general Foch, observando de sua janela (é claro), mandou marcou sete minutos antes da partida do carro. Renovamos imediatamente a experiência. O coronel Weygand escreveu uma ordem. Dois minutos após ela estava registrada e o estafeta partia.
Adiantou ou não adiantou? É assim que se tocam as coisas.
Abordamos agora a concepção. Pondo-me à vontade, o general me convidara, desde o início e de uma vez por todas, a lhe falar sem temor a respeito de qualquer assunto, a nada lhe ocultar a respeito do meu modo de ver, mesmo se o sentia oposto ao seu.
Isso é esplendido. Nas relações planeta-satélite, é magnífico. É assim que deve ser.
E isso não era um modo de dizer. Seu horror à adulação e sua sinceridade intelectual confluíam no seu desejo de sentir em seu colaborador imediato a personalidade e a necessidade de resistência.
Quer dizer, não é a resistência pela resistência, mas é que ele desse os obstáculos que realmente lhe pareciam, em toda sinceridade, que a coisa encontrava.
A única coisa que considerava a seus olhos não era de ver justo — justa não, ver justo, ver direito — o trabalho na discussão.
Nós já estamos acabando.
Tomemos o caso de uma idéia nova. O general a lançou com o seu “pense nisso”. Não se trata de um pensamento vago, mas de um estudo sério, destinado a chegar a um termo. Penso, portanto, e quando preparado, volto para lhe falar a respeito, se ele próprio não introduziu o assunto em nossa conversa, pois ele acelera sempre.
É outra tarefa do chefe. É estar sempre acelerando. Veja a diferença disso… você vá pensando. Ele nem diz: pensem isso. Vá pensando e tal coisa. Depois, quando eu encontrar com você nós conversamos. O coitado tomou isso a sério: olhe, eu pensei. No que mesmo? Não, nisso penso eu. Você, porque pensou nisso? Eu já resolvi. Horrível, contrário….
Bem, então o assalto começa:
Às objeções responde não por golpes agastados, mas por raciocínios, tomando em grande conta os argumentos que lhe são opostos [falta a palavra]. À medida que o assalto se prolonga…
Vejam que interessante descrever isso como um assalto; cordialmente falando tem um que de assalto, de defesa.
À medida que o assalto se prolonga, sua idéia se exprime com uma clareza e uma riqueza de características crescentes.
* No “bate-bola” interno a verdadeira aplicação do “diálogo”
É exatamente a vantagem do diálogo no bom sentido da palavra. É que obriga a explicitação. As dificuldades não são dificuldades de quem tem meu espírito, oposto ao do general. Mas são dificuldades técnicas de pensamento e de explicitação, e que ajudam no modo mais possante para a explicitação de uma idéia.
De maneira que é uma verdadeira colaboração.
É um método de trabalho [ilegível] nele. Trabalha discutindo como um esgrimista que prepara o [ilegível] fazendo assalto com o ajudante de esgrima, para distender os músculos e assegurar a justeza de seus golpes.
É o que nós chamamos bate-bola. Nas reuniões o MNF, por exemplo, isso Dr. Adolpho, Dr. Paulinho, Dr. Arnaldo sabem que isso se desenrola ao infinito, mas ao infinito.
Muita coisa que o Dr. Arnaldo e eu estivemos fazendo esses dias sobre o Diálogo, participa disso. Por quê? Porque é exatamente assim que se explicitam as idéias.
Se nada tivesse a me assegurar…
Não, … opor…
… ele ficaria quase queixou, far-me-ia descer em sua consideração, me incluir na categoria daqueles que Liautey chamava pitorescamente os bêni oui oui — parece direitinho —, porque não tinha encontrado em seu colaborador um dos serviços que pedia, o de ajudar a adesão, a expressão rigorosamente justa do seu pensamento.
É bem o trabalho da explicitação, mas feito por um indivíduo que tem o mesmo espírito que ele não um péssimo espírito contrário.
É isso tão verdade que um dia o general, tendo contrariamente a seu hábito, elevado o tema e interrompido o trabalho, voltou um instante depois ao meu escritório: o senhor sabe, disse-me ele, que quando me ponho em cólera não é contra o senhor, mas contra mim, porque não consigo fazer-me suficientemente compreender, se bem que sinta que tenho razão.
Está perfeitamente bem. O outro diria?
“Não, sabe, as brumas da minha cabeça…”
Não, não é. Eu tenho razão, estou vendo, estou sentindo, mas não sei dizer. Vamos continuar …
De fato, disso me apercebia, ele tinha sempre razão.
Em princípio, para um grande chefe, dá-se isso. Agora, se um grande subordinado que tem a coragem e dizer isso. Subordinado poca pensa outra coisa: eu aqui dou este beliscão nele. Eu tirei dele cada coisa, saiu cada bobagem. E enfim, no fundo, os outros não percebem o meu valor, e só percebe o dele. Por isso é que ele é chefe. mas se percebesse o meu dava um chefe… Isso é subordinado sabugo.
* O confronto entre a verdadeira grandeza do Mal. Foch e a “carantona” do De Gaulle
Jamais compreendi tão bem como junto a ele o sentido profundo dessa observação de Maurice…
Um dado interessante para os senhores saberem o que De Gaulle não é: olhem para aquela carona, olhem para aquela espécie de massa carnuda onde a testa é grande e não representa nenhum papel na fisionomia — os senhores olhem para aquilo e imaginem se ele era capaz de um sistema de trabalho desse. Absolutamente não. Ele desandaria em discurso: Grandeur de la France, mas ele fugia disso, porque falta toda a seriedade.
Na grandeza do marechal Foch reconheci todas as simplicidades.
Isso eu acho estupendo. Porque ou uma grandeza é feita de todas as simplicidades, ou é o De Gaulle.
Mas a mais emocionantes, para o seu colaborador imediato, foi a que consistiu, da parte dele, em confiar a seu colaborador o seu pensamento no simples traje de seu despertar.
Eu acho isso uma coisa estupenda.
Quer dizer, a forma, vamos dizer, pensar de pijama. Como a gente levanta da cama, quer dizer, com o cabelo desarranjado, com o pijama amarrotado, assim as idéias nascerem na cabeça dele todas amarrotadas ainda e desalinhadas. E irem juntos alisando, passando a ferro e ajeitando a idéia, até dar na coisa final. Acho uma coisa magnífica isso.
Depois, essa forma bonita, como isso está expresso aqui. Isso é fazer bonito. Não é usar palavras empoladas.
Poucos homens, creio, poderão permitir-se uma tal ausência de artifícios.
É claro, porque a idéia mesmo quando nascia, toda engrouvinhada, não nascia aleijada, e não nascia abraçada apegadamente a uma besteira.
É que para enfrentar, sem enfeites, a plena luz, a beleza é indispensável.
Dito francês, não exige mais nada. Acabou-se. Nem eu posso comentar.
O pensamento do general, mesmo quando ainda não se tinha revestido do seu traje de gala…
Os senhores então vendo a expressão engraçada: o contrário do pijama inicial.
Tinha sempre uma beleza: a da potência.
Eu acho isso magnífico. Quer dizer, mesmo nascendo isso aqui é que é fogo, tinha qualquer coisa dentro. Não era uma dessas idéias que vão ganhando força a medida que caminham, chupando a força dos outros, mas nasce forte.
Potência de penetração, de extensão, de equilíbrio…
Vejam as três ordens de potência como estão bem expressas. A idéia tem três dimensões. Ela tem a penetração, ela tem a amplitude e ela tem o equilíbrio. É uma pequena teoria da idéia, exposta de passagem, mas quão bem; que me faz considerar exatamente esse artigo aqui, um tratadinho.
* Nosso Pai e Fundador aconselha a guardarmos esse artigo sobre o Mal. Foch por ser um pequeno tesouro
Eu aconselharia aos senhores que cada um guardasse esse artigo. Isso é um pequeno tesouro.
Que pouco a pouco ligará em torno dela os governos e os comandos aliados e pela qual será posto em terra um inimigo corajoso, forte e bem organizado.
Vejam bem, heim; é essa potência do pensamento do general que vai alcançar tudo isso. Mais do que as armas, mais do que todo o resto, é a potência em três dimensões do pensamento do general, e falar sobre isso. Os senhores vêem como isso dignifica o homem, põe a alma no primeiro plano, como é uma concepção espiritualista das coisas, ao contrário da concepção materialista.
Certas personalidades política, certos escritores, tanto franceses como estrangeiros, julgaram poder me atribuir o papel que recuso ao chefe do Estado Maior de um verdadeiro chefe eu teria inspirado o marechal Foch”. Que coragem de recusar uma coisas dessas” Que dignidade.
É um erro, que a honestidade mais elementar me obriga a retificar. A honestidade, mas também uma indignação contra essa necessidade sádica, por demais freqüente entre nos, de tender a diminuir tudo quanto é grande, com risco de atentar ao patrimônio francês e dar armas aos estrangeiros, que eles não são os conservadores de nossas glórias.
Entra aí o chauvinismo francês, com uma pontinha de graça francesa, mais uma vez.
A inveja, le peché mignon des mediocres…
“Peché mignon” é o pecadinho engraçadinho.
… “dos medíocres”…
E é bem verdade.
… os leva a baixar os homens de gênio por golpes dessa natureza.
É verdade, é a dentada da cobra no calcanhar. Não consegue porque à altura do grande homem, então inveja: eu vou diminuí-lo quanto puder. O que é bem parecido com o non serviam de Satanás, seja dito entre parênteses.
Certamente não chegarei a dizer, por falsa modéstia, que não prestei serviço a meu chefe. Se isso fosse, não me teria feito a honra de conservar-me junto de si por muito tempo.
Essa coisa brasileira: o sujeito sobe às tribunas: meus senhores, eu devo começar por pedir desculpas de estar aqui falando, porque eu sei que sou indigno de estar aqui falando, porque eu sei que sou indigno, eu sou o último dos homens, um ignorante, um tartamudo.
Bem, então, saia e vá embora. Se você está convencido disso não deveria ter subido. Se subiu, vá embora. É claro.
Poupei-me à preocupação e ao cansaço de todas as tarefas secundárias.
É estupendo, como dignidade, como autenticidade, como verdadeira superioridade de alma.
Provando-me pela exatidão e a consciência, ou melhor, provando-lhe, pela exatidão e a consciência …, que podia guiar-se sobre mim quanto ao seu cumprimento. E para as grandes tarefas, trabalhei com ele como seu temperamento reclamava que trabalhasse.
* Admirável postura de Weigand diante de Foch
São as duas tarefas: no pequeno, foi um executor perfeito. No grande, ele adaptou-se ao temperamento do chefe, temperamento ao qual era possível adaptar-se, ele se adaptou ao temperamento do chefe e fez o trabalho de maiêutica com o chefe. É, não precisa mais nada.
Por aí contribuí para a manutenção de seu belo equilíbrio.
É bem verdade e é a coisa mais preciosa que se pode querer.
Como lhe poupei agastamentos, esforçando-me em arredondar os ângulos em torno dele.
Quer dizer, fazendo compreender como era o chefe, e evitando irritações contra o chefe.
Por essa forma, poupei-lhe, com a calma e a serenidade, o tempo da meditação.
O quanto isso vale. Ter poupado o tempo do chefe, não é isso? Para que? Para que ele pudesse pensar. Para que pensar? Porque foi o pensamento do chefe que ganhou a guerra. Ele não estava ganhando horas-tanques, nem horas-fogo, nem horas-avião, ele estava ganhando horas muito maiores, ele estava ganhando minutos-pensamento. Esses minutos pensamento valiam por tudo.
Isso é uma concepção de categoria. O resto é de lo último. Onde é que está essa história? Ah, em torno dele, não é?
Por essa forma poupei … E penso, o serviço mais eficaz que podia prestar-lhe, pois, assim como se diz de um modo excelente, pois assim como se diz de um modo excelente era necessário uma presença que jamais prejudicasse a sua solidão…
Falta alguma palavra aqui. Ah me disse de um modo excelente, é isso, é.
… era necessário uma presença que jamais prejudicasse sua solidão.
Isso é estupendo. É uma dessas fórmulas que merecem terminar um artigo como esse.
Os senhores entendem bem qual é a presença que não prejudica a solidão: é aquele que pensa na mesma direção, que intervém na hora certa, que ajuda a elucubração mental da solidão. Não é exatamente o tagarela que quebra a solidão. Isso é uma coisa, para esse, para o caso do Foch fazer o que outro dia li de um escritor francês.
Os senhores conhecem a fórmula que o nosso Dr. Fábio gosta tanto de empregar nas suas horas de bom humor, e que é a fórmula honneur et plaisir, que se usava no século passado na França, na hora da apresentação. Em vez de dizer um banal “prazer em conhecê-lo”, dizia: “eu tenho honra e tenho prazer em conhecê-lo”.
Então, honneur, plaisir. Um escritor que tinha medo, com certeza de interlocutores que não ajudassem a solução, a solidão mas atrapalhassem, escreveu do lado de fora aquela frase assim: visitam me fazem plaisir.
Acabou-se também. Ainda francês; uma pirueta, piummm! É como um vôo de gaivota, vai lá de cima e belisca o coitado embaixo.
Minha satisfação era grande quando entrando em seu escritório, via um pouco inclinada para trás a sua poltrona, com o cachimbo ou charuto entre os dentes, refletindo diante de seus mapas. Dessas meditações saía sempre algo de bom, ou de grande.
Está perfeito.
Também ele é que tinha conseguido o tempo-mapa do general. Aos visitantes que o surpreendiam nesse momento e que nas horas de êxito vinham trazer-lhe as homenagens e louvores, ele dizia: eu nada faço. É Weygand que faz tudo; pois tinha ele a generosidade, bem pouco comum nos homens altamente colocados, de exagerar os méritos daqueles que o servem. Essa generosidade, tão largamente manifestada a meu respeito, me obrigaria mais ainda a não deixar subsistir qualquer equívoco sobre o que foi nossa colaboração.
* Simplicidade, chave de ouro para fechar um artigo brilhante
Depois …. como é simples não? Depois… os senhores, eu seria capaz de instituir aqui um prêmio: quem é que poderia me dizer um modo melhor de terminar esse artigo. Não tem. Com toda simplicidade. Quer dizer, fechou com chave de ouro. Conclusão: ele à força de se esfregar no Foch, ele tomou, por osmose, algo da carga do Foch. Não tem mais anda. É um grande homem escrevendo um grande artigo sobre um grande tema. E esse tema é: eu não fui o primeiro. Vejam como é o primeiro. Esse é um grande tema….
Engrandecidíssimo, engrandecidíssimo. Bom, conclusão, eu volto a dizer: eu recomendaria aos senhores que conservassem esse artigo. Porque como os senhores vêem, cada linha desse artigo tem chispas. A gente poderia fazer uma semana de comentários desses, se quisessem. É que ainda o artigo se prestaria a isso. Bem, para terminar nós temos as perguntas.
Algum dos senhores, do lado de cá, quer me fazer perguntas? Algum dos senhores do lado de cá? Algum dos senhores do lado de lá?
(Sr. –: …)
É verdade. É tanta, tanta aplicação, que a gente até quase perde um pouquinho o pé. Eu diria, em vez de aplicação, vamos dizer assim uma espécie de adaptação da linha geral, em vez de uma espécie de aplicação de cada ponto concreto, talvez fosse melhor.
Nós podemos dizer que nós estamos numa guerra? Nós podemos dizer que nós somos um exército? Até que ponto isso é verdadeiro e até que ponto isso é falso? A partir disso, até que ponto os grandes princípios essenciais desse artigo se aplicam a nós. Vamos tratar num plano geral, me parece melhor…. de incandescer os ânimos e de suscitar… e ódios, que a gente conheça.
* Aplicação para os soldados da Contra-Revolução em nossos dias dos princípios extraídos do artigo, o Senhor Doutor Plinio brinda seus filhos com esplêndida “vue d’ensemble” R-CR
É freqüente nos historiadores de hoje os senhores encontrarem essa observação: Tal revolução não degenerou em guerra religiosa pela habilidade de tal político. Naturalmente um político fassur — pela habilidade de tal político, evitando os ódios incomparáveis que a guerra religiosa suscita. Porque no fundo, como a religião envolve tudo da vida, e envolve pelos seus ângulos mais altos, nada ocasiona guerras mais tremendas, do que a diferença de religião. Os senhores dizem: está bem, mas isso é numa época em que os homens são religiosos. E numa época em que os homens não são religiosos?
A luta do homem que é vítima do indiferentismo religioso contra o homem religioso, é uma luta que tem todos os ódios, que tem todas as …. da guerra de religião. Os senhores têm, portanto, de fato uma verdadeira guerra e uma guerra terrível, que é a guerra de religião.
Também terrível porque os senhores encontram dois extremos nunca houve ódio maior à Igreja do que o ódio que existe hoje; nunca houve um ultramontanismo mais amoroso da Santa Igreja, do que o nosso. De maneira que os senhores têm dois extremos novamente. Por fim, nunca houve um número tão grande atacando tão poucos. E por aí os senhores vêem, mais uma vez, a guerra tremenda e a nossa obrigação de valorizar todos os recursos para essa guerra.
Agora, se num sentido nós estamos em guerra, noutro sentido nós não estamos. Não é no sentido mais alto; é no sentido mais baixo. Dentro da concepção Weygand, em que a guerra era sobretudo desenvolvimento do pensamento do marechal, nós exatamente estamos numa guerra que é exatamente a substância da guerra, é uma guerra de pensamento. E não tem o lado mais baixo da guerra, que é o entrechoque dos corpos. Tem o lado mais alto da guerra que é o entrechoque das idéias.
De maneira que nossa guerra é verdadeiramente uma guerra, mais ainda do que essa guerra, exigindo a concentração do pensamento e exigindo a concentração, o esforço, exigindo, enfim, toda uma vida mental que a guerra comum já exige, mas ainda mais do que a guerra comum, por causa da natureza da guerra em que nós estamos empenhados. No que consiste essa guerra?
Essa guerra consiste, vamos dizer, no que consiste o estudo dessa guerra? Me perdoem a verdade acaciana, mas o estudo dessa guerra consiste em estudar essa guerra. E estudar essa guerra consiste em ler a Revolução e a Contra-Revolução, em conhecer a Revolução e a Contra-Revolução, porque essa é a teoria e a prática de nossa guerra. Consiste em ler os nossos outros livros, em ler o Catolicismo, com olhos da R-CR, procurando ali dentro a confirmação dos princípios da R-CR, procurando acompanhar as reuniões de recortes com ouvidos de R-CR e procurando presenciar a mesma vida de todos os dias com o senso de observação de quem analisa as coisas à luz da R-CR.
Quer dizer, vendo em tudo o choque da Revolução e da Contra-Revolução, o choque dos espíritos, o choque dos métodos opostos, ajustados a cada espírito; as variações das técnicas, a gradação das últimas metas e das metas mais próximas, a diferença no conceber e depois a diferença no executar. Procurar perceber como é que a direção do grupo considera os problemas e depois como ela executa os problemas, procurando ver através de cada uma dessas coisas um método, procurando ver através de cada uma dessas coisas um estilo; procurando ver, portanto, um tônus, que é o tônus dominante em tudo, em cujo conhecimento a gente acaba conhecendo verdadeiramente tudo.
Então, por essa forma, vivendo dessa forma, dessa maneira, é que nós verdadeiramente conduziremos bem essa guerra. Portanto, não é, por exemplo, fazer o seguinte: …. quais são as novidades do dia? Primeira pergunta é: o que será que eu fiz? Ah, não sabe a novidade do dia? é que eu peguei tal coisa assim, estava assim. Dr. Eduardo, Dr. Fernando ou qualquer outro, mandou, eu fiz assim. Bem, se no dia não houvesse muita gente que fizesse isso, o dia não tinha prestado para nada. A novidade do dia não é essa.
A gente pergunta o seguinte: em função das grandes metas do grupo, quais foram os fatos importantes que aconteceram? Isso sim. Não é aquilo que eu fiz, o que caiu debaixo de meus olhos, porque eu deveria ter passado o dia inteiro, com os olhos atentos nessas metas, atentos nessa visão R-CR, fazendo meu serviço como se eu não tivesse que pensar nele, mas com o olhar de minha alma posta nessa observação. E é assim que eu então saberia as novidades verdadeiramente novas do autêntico dia que se passou. E não o dia superficial, de aparências, com os problemas… à primeira vista.
* Aplicação à vida interna, com elevação de vistas
Isso posto, a gente depois faz a aplicação nas relações de pessoa a pessoa aqui dentro. As relações de pessoa a pessoa devem ser essas: nós somos uma articulação de chefes e de subordinados, até o escalão em que não há mais subordinados. E nós devemos, então, cada um em relação ao respectivo chefe, procurar ser Weygand; e cada chefe, em relação ao seu subordinado — guardadas todas as proporções, não vamos fazer megalice — bem, guardadas todas as proporções, tem que procurar ser Foch.
Quer dizer, saber objetar, saber conversar, saber repousar o nosso chefe das atividades secundárias, amoldarmo-nos ao modo de ser dele e, por essa forma, haurirmos dele o espírito e o estilo que vem de cima. Quer dizer, há uma espécie de articulação que de proche en proche chega até o mais alto escalão. E é por essa forma que nós podemos fazer uma aplicação desses princípios.
Bem, terceiro lugar, na ordem da ação, uma grande coisa preciosa que ele nos dá, é a precedência do pensamento sobre a ação. E eu poria assim: a precedência da oração sobre o pensamento, a precedência do pensamento sobre a ação. Mas não é uma precedência assim: eu primeiro rezo, depois penso, depois executo. Mas eu primeiro rezo e de vez em quando lanço uma jaculatória ao longo do pensamento e da ação. Eu primeiro penso, eu depois penso, mas quando for agir eu vou agir pensadamente, de vez em quando.
E é por essa forma que a minha ação terá toda a elevação de metas, tendo o descortínio de horizonte, todo o espírito sobrenatural, toda a precisão e toda a exatidão nos pormenores que a verdadeira ação deve ter. É por essa forma que eu terei praticado, de modo excelente, as virtudes cardeais que estão todas compendiadas nisso.
Isso é, até certo ponto, um tratado de virtudes cardeais: a prudência, a justiça, a fortaleza e a temperança. Tudo isso combinado dá ao homem do pensar superior e elevado, ainda que ele tenha apenas a tarefa do Manuel. Porque tal é a dignidade do homem que até a tarefa do Manuel pode ser exercida com sublimidade; oque não quer dizer o Manuel caricaturando o chefe, mas quer dize revolucionário Manuel manuelando.
Depois é preciso, por essa forma, enfim, com essa elevação de vista, fazer tudo, de maneira que não só as ações que são pecado ou não pecado, mas em todas as nossas ações, se note esse acerto, essa elevação, essa oportunidade, essa força, essa destreza, e essa justiça, que são as características de todo operar do verdadeiro varão de Deus.
No dia em que cada membro do “Catolicismo” tiver esse espírito, eu tenho a impressão de que se eu tiver morrido, os meus ossos se revolvem de alegria na sepultura, de tal maneira é isso o que eu desejo numa comunidade do “Catolicismo”, ou melhor, como a finalidade do “Catolicismo”. Não sei se eu respondi adequadamente à sua pergunta.
Meus senhores, mais alguma pergunta, ou não? Não havendo perguntas, eu creio… José Fernando. Você ia perguntar alguma coisa?
(Sr. –: …)
* Nosso Pai e Fundador indica como se deveria escrever uma boa hagiografia
É, e a nossa, como eu disse ontem, muito maior. Aliás, é preciso dizer o seguinte: isso aqui não é um tratado completo. Sobre essa mesma matéria haveria muitas outras coisas a dizer. Mas é um tratado que diz excelentemente, e de um modo vivo, coisas que muita gente não diz.
Eu gostaria que uma vida de santo fosse escrita assim. Para mim, hagiografia é isso, não é? É ver num santo, à la Weygand, as qualidades de um santo que são isso aqui sublimado, levado ao ponto sobrenatural e muitíssima coisa mais do que isso.
(Sr. –: …)
É, exatamente, analisar uma coisa dessas. Analisar em São Pio X o jogo das virtudes cardeais. Depois, a sabedoria. Não, são sempre virtudes fragmentárias. Ele era casto, nunca mentiu e, por exemplo, nunca roubou. Por que que diz isso dele? Porque caiu no meu conhecimento três fatos provando isso. Mas isso pinta todo o santo? Isso pinta os vestígios dele que eu alcancei. Faça uma historiografia descente. Estude o homem inteiro, leia a vida inteira, e não pegue três fatinhos; pegue o homem na sua totalidade. Mas totalidade a heresia branca não gosta.
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