Santo do Dia (Rua Pará) – 28/7/1965 – 4ª feira [SD 024 e 187] – p. 5 de 5

Santo do Dia (Rua Pará) — 28/7/1965 — 4ª feira [SD 024 e 187]

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São Vitor era autoritário e enérgico, e por isso seria mal visto na atualidade por não ser “ecumênico” no sentido moderno da palavra * Por uma questão disciplinar, São Vitor foi enérgico com os cristãos da Ásia, que celebravam a Páscoa em um dia conforme o uso judaico * Santo Inocêncio I, outro papa enérgico e firme * Santo Inocêncio I viveu na época da queda do Império Romano do ocidente, em que parecia que todos os castigos acumulados pela Roma antiga despencavam sobre a Roma cristã * Enquanto os grandes papas agiam com energia, os imperadores romanos adotaram atitudes ecumênicas, permitindo “ecumenicamente” aos bárbaros adentrarem o Império, sem violência * Nossa Senhora das Necessidades, invocação corolária à de Nossa Senhora Auxiliadora, que apareceu mais tarde

* São Vitor era autoritário e enérgico, e por isso seria mal visto na atualidade por não ser “ecumênico” no sentido moderno da palavra

Hoje é festa de, no nosso calendário, do Bem-Aventurado João Soretti, de que eu já falei ontem, e é festa também de São Vitor, papa e mártir, e de Santo Inocêncio I, também papa e mártir. Ou melhor, Santo Inocêncio I é papa e confessor, não é mártir.

São Vitor é um papa muito antiecumênico e que provavelmente estaria mal visto hoje em dia. A biografia dele é essa, de acordo com D. Guéranguer:

São Vitor nasceu na África. Ele sucedeu ao papa Eleutério, por volta do ano 189, e reinou dez anos e, nos diz o Liber Pontificalis, morreu mártir.

Autoritário e enérgico,…

Hoje não se deve ser autoritário nem enérgico; deve ser ecumênico, doce, transigente para com tudo quanto não seja a peste ultramontana.

ele foi clarividente defensor da tradição.

Hoje a gente deve ser clarividente defensor do progresso e não da tradição.

Ele excomungou Teodoto,…

Não se deve excomungar ninguém, a não ser os ultramontanos. Também é outro erro dele.

que ensinava que Cristo não era senão filho adotivo de Deus.

É outro erro, porque a gente deve afirmar o que tem de comum com os outros e não o que tem de contrário.

Ele diz que Cristo não é senão filho adotivo de Deus. Ele reconhece, afinal, uma tal ou qual filiação de Cristo em relação a Deus. Ora, nós reconhecemos a plenitude dessa filiação, eles reconhecem uma parte, nós temos parte com eles e eles parte conosco. Portanto, aí está a base de um diálogo ecumênico.

Esse papa, infelizmente, canonizado, um homem pouco compreensivo e que exatamente sua falta de tino diplomático levou-o até o martírio, coisa que ele podia perfeitamente ter evitado, se ele soubesse fazer concessões, esse papa, então, fez esse erro: em vez de iniciar um diálogo, excomungou Teodoto.

Não contente com esse erro, cometeu outro:

Condenou os montanistas da Frigia, que não queriam conduzir-se senão de acordo com revelações privadas.

Ora, nós sabemos que religião é um assunto de foro interno, que emana do fundo da pessoa. Não é possível, não é admissível como é que então uma pessoa possa não se guiar por revelações privadas, se tiver vontade disso. É outro erro dele.

* Por uma questão disciplinar, São Vitor foi enérgico com os cristãos da Ásia, que celebravam a Páscoa em um dia conforme o uso judaico

Ele, por fim, proibiu o uso das igrejas da Ásia, que celebravam a Páscoa no mesmo tempo em que os judeus, na lua cheia de abril, qualquer que fosse o dia da semana.

Quer dizer, ao menos para os judeus desse tempo, a Páscoa era celebrada no plenilúnio de abril, qualquer que fosse o dia da semana em que caísse esse plenilúnio, assunto de caráter, afinal, disciplinar, em que ele poderia ter cedido. Tanto mais que, afinal de contas, os judeus não são deicidas, não se compreende porque não haveria de se entender bem com esses judeus.

Como estão vendo, é um homem que caminhou de erro em erro.

No seu reino o papado cresceu muito em prestígio…

É outro erro pior do que todos, é o fecho de tudo. Precisamente o que se trata de não conseguir.

e fez sentir sua ação em toda a Cristandade.

O que é positivamente muito pouco colegial.

Os senhores estão vendo que se trata de um homem completamente desatinado. Mais desatinado ainda é que o tenham posto na honra dos altares.

* Santo Inocêncio I, outro papa enérgico e firme

Agora as conseqüências dos erros de São Vitor se refletem na vida de Santo Inocêncio.

São Vitor, no segundo século, tinha confirmado por atos o primado de Roma. Com Santo Inocêncio I nós vemos que esse primado é longo tempo uma tradição reconhecida pela Igreja.

É exatamente o sucumbir da colegialidade.

E o papa lembra, com autoridade, aos bispos…

Nesse fato, os bispos estariam tentados a subtrair-se disso. Exatamente a gente vê formar-se a CNBB, as federações de bispos, o direito de legislar, etc. Se fizesse isso, ele teria andado muito melhor.

Esse pontífice, originário de Albano, reinou de 401 a 417, e sua infatigável solicitude estendeu-se a toda a Igreja. Suas Decretais fazem lei na Espanha, na Gália e na Itália. Ele exigiu dos bispos de Constantinopla, Alexandria e Antioquia, a reabilitação de São João Crisóstomo, injustamente deposto. Ele censurou o bispo de Jerusalém por sua negligência. Ele ratificou a condenação lançada contra os bispos de África, contra os pelagianos que negavam a necessidade da graça.

Seu reino, entretanto, foi contristado pela tomada e saque de Roma, pelos bárbaros de Alarico, em 410, enquanto ele estava ausente da cidade. Ele tomou a peito reerguer a cidade de suas ruínas e mostrou grande caridade socorrendo as vítimas.

Santo Inocêncio é um dos maiores papas do quinto século.

* Santo Inocêncio I viveu na época da queda do Império Romano do ocidente, em que parecia que todos os castigos acumulados pela Roma antiga despencavam sobre a Roma cristã

O que é bonito ver em Santo Inocêncio é a luta em que ele está empenhado. Ele está empenhado numa luta tremenda, numa das épocas mais trágicas da História, uma época que até tem algo de parecido com a nossa. É precisamente o período da queda do Império Romano do Ocidente, em que parece que todos os castigos acumulados pela Roma antiga se despencam afinal de contas sobre a Roma cristã, que estava ensabugada. Porque é uma coisa tremenda, mas assim que os cristãos saíram da catacumba, um ensabugamento que já havia neles antes, revelou-se com muita clareza.

Então começam dois fenômenos simultâneos, e a simultaneidade desses dois fenômenos, ou dessas duas ordens de fenômenos, não é suficientemente posta em evidência pelos historiadores. Porque, ao mesmo tempo, é a invasão dos bárbaros, no que atinge o Estado e que também atinge a Igreja, porque os bárbaros eram pagãos, ou então heréticos arianos, mas ao mesmo tempo que havia essa invasão de bárbaros, havia o eclodir de heresias de todos os lados.

* Enquanto os grandes papas agiam com energia, os imperadores romanos adotaram atitudes ecumênicas, permitindo “ecumenicamente” aos bárbaros adentrarem o Império, sem violência

E nós vemos então a Igreja às voltas com ataques iguais ou maiores do que aquele que sofria o próprio Estado. E nós vemos o destino diverso das duas organizações. Porque enquanto o Estado romano, podre, desaparece, a Igreja encontra grandes papas, papas nada ecumênicos, papas batalhadores e lutadores, que lutam não por meio de concessões, mas deitando excomunhões de todo lado e ferindo, portanto, de todo lado.

Pois bem, o resultado é esse:

Os imperadores romanos adotaram uma atitude ecumênica em relação aos bárbaros, eles permitiram que os bárbaros atravessassem, transpusessem pacificamente o Reno e o Danúbio, que eram os limites naturais do Império Romano, permitiram que transpusesse para que os bárbaros não o transpusessem violentamente, e ofereceram terras aos bárbaros, com esperança de que eles se localizassem nas fronteiras aquém dos rios, e não invadissem o império. Os bárbaros transpuseram debaixo dos olhos das legiões romanas com os braços cruzados, e depois de fixados na orla ocidental desses rios, eles invadiram o Império.

Pelo contrário, esses papas não tiveram atitude ecumênica. Deitaram raios de excomunhão de todo lado, lutaram sem se incomodar com as conseqüências, defendendo a doutrina de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Resultado: o Império soçobrou e a Igreja, conduzida por papas como Santo Inocêncio I, pelo contrário, subiu aos mais gloriosos destinos. Foi nessa época que se forjaram os primeiros grandes homens que foram o ponto de partida da Idade Média, e não precisa dizer mais nada do que isso.

Essas são considerações que nos levam bem a compreender o acerto de uma atitude enérgica na direção das coisas da Igreja e na proteção da verdade.

Vamos pedir, portanto, a esses dois santos que nos ensinem uma fidelidade inquebrantável a esse elogio, ou a essa energia com a qual a causa da Igreja deve ser defendida. E por mais que exemplos em sentido contrário nos sejam dados nos dias de abominação nos quais vivemos.

* Nossa Senhora das Necessidades, invocação corolária à de Nossa Senhora Auxiliadora, que apareceu mais tarde

Deixo aqui duas fotografias de uma imagem de Nossa Senhora, invocada no Ceará como Nossa Senhora das Necessidades. A fotografia é curiosa e a invocação mais ainda.

Noto aqui a freqüência com que Nossa Senhora é vista pelos cristãos sob esse aspecto de Auxílio dos Cristãos, Nossa Senhora sempre pronta a ajudar, sempre pronta a atender, principalmente quando se tratam de dificuldades espirituais.

Nossa Senhora das Necessidades é uma invocação corolária de Nossa Senhora Auxiliadora, que apareceu mais tarde. E como Nossa Senhora Auxiliadora é a imagem, ou melhor, é a invocação que está representada na imagem que se encontra em nossa capela, pareceu-me interessante mostrar aos senhores que raízes antigas tem na piedade brasileira essa idéia de Nossa Senhora dos Remédios, Nossa Senhora dos Aflitos, Nossa Senhora das Necessidades, convidando de todos os modos os homens a terem confiança nela e a rezar por Ela.

Eu pediria a Excelência que encerrasse a nossa reunião.

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