Santo do Dia (Rua Pará) – 3/7/1965 – Sábado [SD 025 e 026] – p. 4 de 4

Santo do Dia (Rua Pará) — 3/7/1965 — Sábado [SD 025 e 026]

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Santo Irineu e São Leão II, que apesar dos cinco séculos de distância têm um traço comum, vingaram a honra da Igreja * A Igreja tem muita misericórdia com o que reconhece que anda mal, bate no peito e pede perdão, mas expulsa de si aquele que afirma que o mal é o bem e que o bem é o mal, ou seja, aquele que luta para dentro d’Ela disseminar o mal * Quando a fé definha, comporta-se como se estivesse envelhecendo, não sentindo aquela fundamental incompatibilidade dela com o que lhe é oposto * Representamos a intransigência porque representamos a fé viva, pois o intransigente é vivo e só aquilo que é muito vivo não transige

* Santo Irineu e São Leão II, que apesar dos cinco séculos de distância têm um traço comum, vingaram a honra da Igreja

Hoje se comemoram dois santos:

São Leão II, Papa e Confessor, que aprovou as Atas do Sexto Concílio Ecumênico para condenar a falta daquele que, no dizer do Santo, “em vez de purificar esta Igreja Apostólica, permitiam que a Imaculada fosse maculada por uma traição profana”. Século VII.

Festa também de Santo Irineu, bispo e confessor, que criou … [inaudível]… a oração da liturgia. Deus deu-lhe a graça de destruir as heresias pela verdade da doutrina. Lutou contra os gnósticos. Século II.

Os senhores estão vendo que foram dois santos, dos quais um foi papa, e o outro bispo, mas viveram a uma grande distância, no tempo, um do outro, uma vez que um viveu no século II (Santo Irineu) e o outro viveu no século VII (São Leão). Uma grande distância, porque quando ouvimos falar em século II e século VII, temos impressão, nós que estamos no século XX, que os séculos II e VII foram muito próximos um do outro e que se perdem no nosso olhar e no rumo do tempo, formam uma coisa só. Mas, na realidade, entre o século II e o século VII, podemos calcular o que representa imaginando quinhentos anos de agora. Quer dizer, a distância que havia entre esses dois santos, a distância cronológica, é mais ou menos a que havia entre o Brasil ao tempo do seu descobrimento, e o Brasil de hoje. Então, compreende-se como esses santos viveram distantes um do outro.

Ora, esses dois santos, a uma tal distância de lugar, a uma tal distância de tempo, e sobretudo a uma tal distância de nós, a liturgia faz com que a figura deles se levante junto hoje para veneração dos fiéis, as duas figura se levantem juntas tendo um traço comum que está consignado aqui e que é este: eles combateram a heresia, eles expulsaram os hereges de dentro da Igreja e, segundo diz a liturgia aqui, com isso eles vingaram a honra da Igreja. Porque o herege presente dentro da Igreja, maculava, por sua presença, a Igreja, que é imaculada. Por causa disso, a honra da Igreja exigia essa expulsão do herege, exigia que o herege fosse posto fora, porque não pode haver coexistência pacifica, não pode haver coabitação normal entre o bem e o mal, a verdade e o erro. Não pode haver em nenhum lugar, mas sobretudo não pode haver dentro da Igreja Católica, que é por excelência a montanha sagrada da verdade e do bem, que repele de si horrorizada aquele que dentro dela toma a defesa de erro e do mal.

* A Igreja tem muita misericórdia com o que reconhece que anda mal, bate no peito e pede perdão, mas expulsa de si aquele que afirma que o mal é o bem e que o bem é o mal, ou seja, aquele que luta para dentro d’Ela disseminar o mal

Os senhores me dirão: “Mas, afinal de contas, qual é, afinal, o papel da misericórdia dentro disso?”.

A Igreja tem muita misericórdia, e ela não expulsa de si aquele que reconhece que anda mal, aquele que bate no peito e pede perdão por andar mal. Mas aquele que dentro da Igreja afirma que o bem é o mal e o mal é o bem, aquele que dentro da Igreja luta para disseminar o mal, a este a Igreja expulsa horrorizada. Por duas razões:

Primeiro, porque ele perde as almas que estão dentro da Igreja. Em segundo lugar, por uma razão mais alta, que é uma razão de heterogeneidade fundamental: ela é heterogênea com quem faz isto, e ela não pode suportar a seu lado quem faz isto.

Isto por que é? Em última análise, isto está na própria natureza do princípio de contradição. Tudo aquilo que é vivaz, pelo próprio fato de ser vivaz, tem um horror àquilo que é contrário, e repele o que lhe é contrário com toda força e vivacidade.

Isto é, por exemplo, no mundo animal. A gente toma, por exemplo, um bicho que é vivo, que está na força de sua idade, se ele se encontra com um fator contrário, ele reage violentamente.

Por exemplo, um gato. Se uma mosca nele pousa, o gato salta, ou melhor, o gato toca a mosca com violência. Mas se se trata de um gato velho, se a mosca pousa no gato e o incomoda, o gato faz aquele gesto com negligência, faz aquele gesto com este esforço. Por quê? Porque vivo, na medida em que é vivo, tem horror àquilo que lhe é contrário.

E a Igreja, cuja vida é eterna, é perene, é sobrenatural, tem o horror normal e contínuo daquilo que lhe é contrário. Por isto está na índole dela ejetar para fora de si o herege, ejetar para fora de si o foco de mau espírito. E o fato de ela se manifestar indolente, o fato de ela se manifestar preguiçosa, pouco apressada na repressão do mal, tudo indica que aqueles de seus filhos ou aqueles de seus representantes que são assim, têm dentro deles a fé num estado de declínio, a fé num estado de ocaso.

* Quando a fé definha, comporta-se como se estivesse envelhecendo, não sentindo aquela fundamental incompatibilidade dela com o que lhe é oposto

Quando a fé está no estado de aurora, quando a fé está no meio-dia, ela é intransigente. Quando a fé definha, quando a fé começa a envelhecer, quando ela começa a murchar, ela começa então com os conchavos, começa com as apropriações. E ela não sente aquela fundamental incompatibilidade dela com aquilo que é o oposto a ela.

Então compreendemos — porque a Igreja insiste na liturgia, porque o que eu li aos senhores são trechos da liturgia — quando na festa do santo ela canta a glória do santo, ela insiste como título de glória do santo de que ele ejetou para fora da Igreja os maus. Aqui diz, “ele teve a graça de esmagar os maniqueus, ele teve a graça de expulsar da Igreja um horror que maculava a Igreja imaculada”.

Qual é a razão disso?

A razão, evidentemente, é a seguinte: que a Igreja quer mostrar a plenitude da fé, a virtude, a vivacidade da fé, são opostas a essa composição, a esse transigir que hoje tão freqüentemente se vê, e que exatamente deve ser considerado por nós um dos sintomas mais alarmantes que existem dentro da Igreja atualmente exatamente o senso da tolerância, da composição, da inércia, quando é o contrário.

Então aqui temos mais um ângulo para considerarmos nosso apostolado.

O ângulo que devemos considerar aqui é o seguinte: devemos representar junto da Igreja a intransigência. Mas nós representamos a intransigência porque representamos a fé viva, porque o intransigente é vivo e só aquilo que é muito vivo é que não transige.

* Representamos a intransigência porque representamos a fé viva, pois o intransigente é vivo e só aquilo que é muito vivo não transige

É, portanto, a vivacidade da fé, a intransigência de fé, o espírito do entendimento da fé, é isto que nós devemos representar dentro da Igreja. É para isso que nossa vocação nos chama e é este dom — porque isto é um dom que desce do Céu, é um dom que passa sobre nós como um favor obtido pelas orações de Nossa Senhora — que devemos reconhecer humildemente, que nos vem de fora, que a ele nós simplesmente correspondemos e que devemos pedir sempre, sempre, sempre a Nossa Senhora que nos dê um acréscimo desse dom. Devemos pedir isso mesmo porque as circunstâncias dentro das quais nós vivemos são muito difíceis.

Essas circunstâncias se prendem à vida de São Leão II. A ficha dele diz que ele aprovou as atas do Sexto Concílio Ecumênico, que condenara a falta daquele que, ao dizer do papa São Leão II, em vez de purificar essa Igreja apostólica, permitiu que a imaculada fosse maculada por uma traição profana.

O nome daquele que não está dito aqui. Entretanto, quem era “aquele”? Era o Papa Honório. O Papa São Leão II disso isso de seu antecessor Honório.

Ele teve essa dificuldade tremenda de ter vivido no tempo de um papa do qual se podia dizer isso, em relação ao qual o concílio, que se reuniu depois dele, tomou uma atitude de condenação, naturalmente porque a infalibilidade não estava empenhada nisso. Mas, afinal de contas, tomou uma atitude de condenação.

Os senhores compreendem que dias difíceis viveu esse santo.

Se alguns dos senhores vive em dias assim, estude a situação, e se vive em dias assim, peça a esse santo que lhes dê toda aquela medida de superior fidelidade à Igreja e superior fidelidade ao papado, que fez com que ele, santo e papa, entretanto se julgasse no direito e no dever de usar uma frase dessas.

E aqui fica a recomendação para a noite de hoje.

Os senhores vão amanhã repetir aquilo que eu chamo uma façanha …

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