Santo do Dia – 21/5/1965 – p. 4 de 4

Santo do Dia — 21/5/1965 — 6ª-feira

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A estrutura lógica da Salve Regina; vida, doçura, esperança nossa; sem Ela a vida seria um trágico absurdo; solidez da piedade católica.

* Nossa Senhora é nossa vida * Nossa Senhora nossa doçura * Para os céticos, a vida é um trágico absurdo * A esperança nossa * Admirável lógica da Salve Rainha * Salve Rainha bem rezada, arrimo nas necessidades * Veracidade da piedade católica

Salve Rainha II

O Santo do Dia será hoje dado mais rapidamente, dado o adiantado da hora. Lembro que é dia de São…Ou melhor, do Bem-aventurado Crispim de Viterbo, Confessor, ao qual já nos referimos ontem, e amanhã é festa de Santa Joana…

Virgem, filha de Dom Afonso V de Portugal, professou na Ordem de São Domingos, século XV. Inocêncio XII permitiu rezar seu ofício em Portugal e nas igrejas dominicanas. Continua a novena de Nossa Senhora Auxílio dos Cristãos e começa a novena de Nossa Senhora Rainha.

Continuaremos a falar a respeito de Nossa Senhora Auxílio dos Cristãos.

Considerávamos ontem a Salve Rainha e víamos a invocação “Salve Rainha, Mãe de misericórdia.” Devemos considerar agora as três invocações sucessivas: vida, doçura e esperança nossa. Que relação essas três invocações têm com as duas anteriores? Elas são a aplicação das duas invocações anteriores.

* Nossa Senhora é nossa vida

Em que sentido se diz que Nossa Senhora é nossa vida? Isso não é uma coisa que está no ar, mas é uma coisa que tem um sentido profundo. Alguém diz que algo é nossa vida, quando diz que se nós não tivéssemos [esse] algo, nossa vida não seria vida. Por exemplo, uma mãe poderá dizer de seu filho: “Meu filho é minha vida.” Quer dizer, sofro tanto por outros lados, tenho tantos aborrecimentos e contrariedades, que aquilo que torna minha vida respirável é meu filho.

Ou então, pode-se dizer que nossa vocação é nossa vida. Isto porque se não fosse nossa vocação, a vida para nós não seria vida. Seria uma coisa tão infeliz, tão miserável, tão sem sentido, com uns prazeres tão frustros e tão sem “eira nem beira”, que não seria vida. Nesse sentido, Nossa Senhora é verdadeiramente nossa vida. Se não houvesse Nossa Senhora, não teríamos nenhuma razão para esperar na misericórdia divina; se não houvesse Nossa Senhora, não teríamos nada que justificasse nenhuma esperança nossa, que justificasse nenhuma esperança do Céu, que justificasse qualquer alegria na Terra.

Tudo aquilo que torna nossa vida vivível é o conjunto de esperanças que a intercessão de Nossa Senhora nos autoriza a ter. E é por isso que Ela é nossa vida. Nós vivemos por Ela; se não fosse Ela, cairíamos desmaiados. Nossa Senhora é nossa vida.

* Nossa Senhora nossa doçura

Vida, doçura. O que é doçura de alguém? É exatamente o que torna algo doce, que sem aquilo não seria doce. Nossa Senhora é doçura para nós, porque é inteiramente doce, inteiramente afável, inteiramente agradável e condescendente com aqueles que A invocam. E é porque Ela é assim que existe doçura em nossa vida. Todas as outras coisas de nossa vida não teria doce [doçura?] se não fosse Ela.

Ela nos obtém a graça, obtém a graça para os outros; Ela é que obtém, portanto, a virtude, e a virtude é o que há de doce na vida. A vida seria a coisa mais amarga e sinistra do mundo se não fosse a doçura da virtude. E das virtudes, aquelas especialmente que têm um traço particular de doçura. Nossa Senhora é, portanto, nossa doçura.

* Para os céticos, a vida é um trágico absurdo

Um cético do século passado, Anatolle France, dizia que nada explica o trágico absurdo em que nós vivemos. Quer dizer, é uma coisa o contrário do doce; é um absurdo e um absurdo trágico. Para nós, reconhecemos que a vida é um absurdo trágico e achamos tolice que qualquer pessoa não pense isso. Mas esse absurdo trágico, que assim seria se Nossa Senhora não fosse uma aliança entre o Céu e a Terra, esse absurdo não o é por causa d’Ela. Ela é a doçura que dá bom gosto a essa coisa que seria amarguíssima, que é a vida humana. Compreendemos então em que sentido Ela é doçura.

* A esperança nossa

Esperança nossa” é a outra exclamação; “Vós que sois nossa esperança!” Notem bem: Vós não sois uma esperança nossa; vós sois a esperança nossa. É a única razão de nossa esperança, mas é toda nossa esperança. E nossa esperança é tal que, por causa de Vós, nossa vida se torna doce, a nossa vida é vida, porque Vós sois nossa esperança. Nossa Senhora é a grande esperança, porque Ela é Rainha e Mãe de misericórdia no sentido que falei.

Vemos então que o começo da Salve Rainha — que são afirmações ou exclamações em que o fiel se dirige a Nossa Senhora —­ são muito bem calculadas e têm todas elas um sentido profundo, preciso e admirável. Então, compreendemos a primeira parte: “Salve Rainha, Mãe de misericórdia, vida, doçura, esperança nossa, salve.” Terminou a saudação.

Começa depois a parte de petição: “A Vós bradamos, degredados filhos de Eva, a Vós suspiramos, gemendo e chorando nesse vale de lágrimas, etc., etc.” A saudação inicial, que é próprio quando nos dirigimos a alguém começarmos por fazer uma saudação. Essa saudação, muito inteligentemente lembra a Nossa Senhora por que razão é que vamos pedir o resto. Mas nos damos a nós mesmos também essas razões, para nos dar ânimo, nos dar fervor, nos dar confiança em nossa oração.

* Admirável lógica da Salve Rainha

Vejam os senhores, então, que a Salve Rainha, que muita gente titubeia sem nem sequer imaginar que tem uma construção tão racional, tão lúcida, tão perfeita, como é bem construída! A primeira parte é uma saudação bem marcada pelos dois “salve”: “Ave, eu te saúdo, Rainha, Mãe de misericórdia”, etc.

A segunda parte: “A Vós bradamos, degredados filhos de Eva, a Vós suspiramos gemendo e chorando nesse vale de lágrimas.” Aqui já é uma transição que mostra qual é a posição do pecador diante d’Ela.

Depois, a terceira parte, que é o raciocínio: “Eia, pois, advogada nossa, vossos olhos misericordiosos a nós volvei.” É um raciocínio acompanhado de uma súplica. Nós vos fazemos esse pedido por causa disso. São três partes muito bem calculadas: a glória d’Ela, a nossa necessidade. Depois vem nosso pedido. Vemos como isso tudo é admiravelmente bem pensado e que conteúdo de pensamento tem isso. Não é uma emoção, mas um pequeno tratado de teologia marial, com uma beleza literária muito grande, é verdade, mas de uma beleza que resultado do fundo e que se trata, exatamente, de analisar.

* Salve Rainha bem rezada, arrimo nas necessidades

E para que? Quando se tem em mente a Salve Rainha nos termos em que estou dizendo, pode-se estar em dia de aridez, pode-se estar sem vontade de rezar, pode-se estar seja de que jeito for: Aquilo é alguma coisa que se segura com a mão, porque compreende-se que pela teologia católica Nossa Senhora é assim.

E embora eu esteja com aridez, Ela nem por isso deixar de ser misericordiosa; embora eu esteja tentado, Ela nem por isso deixa de ser o que a Salve Rainha diz d’Ela. E eu tenho uma base firme para mesmo nos momentos mais difíceis da vida dirigir-me a Ela e ser atendido. Esse é o sentido do analisar-se racionalmente uma oração.

Quanta gente reza a Salve Rainha. Mas, quanta gente se põe sequer essa pergunta: essa oração pode ser dividida em partes? Quais são as partes lógicas dessa oração? Isso é uma espécie de catarata de palavras ou isso tem propósitos, tem divisões, seqüências?

* Veracidade da piedade católica

Os senhores percebem, através dessa análise, como é verdadeira a piedade católica. É uma piedade feita de uma fé, e é feita e raciocinada com espírito de fé, e que dá certezas que nos dão verdadeiramente meios de viver. É assim que é a piedade “ultramontana” verdadeira, ao contrário dessa “heresia branca” fofa que vive aí pelas igrejas.

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