Santo do Dia (Auditório da Santa Sabedoria) – 8/10/1964 – 5ª feira [SD 108] – p. 3 de 3

Santo do Dia (Auditório da Santa Sabedoria) — 8/10/1964 — 5ª feira [SD 108]

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Vencendo o mau gênio, Santa Brígida ensina a caminhar em mares sem fundo, contra muralhas sem portas e obstáculos sem solução * O amor exige uma fé cega, em condições incompreensíveis, sobretudo na Bagarre * Nosso fundador foi feito para lutar contra os inimigos da Igreja e não contra seus filhos, e sua vida foi esta, no meio de non-senses * Calma, segurança e certeza de que tudo se resolve

Hoje é festa de Santa Brígida, viúva, de sangue real, da Suécia. Foi princesa da Merícia. É novena de Nossa Senhora Aparecida.

* Vencendo o mau gênio, Santa Brígida ensina a caminhar em mares sem fundo, contra muralhas sem portas e obstáculos sem solução

De Santa Brígida eu me lembro apenas um episódio da vida dela, de maneira que é apenas esse episódio que eu vou comentar.

Ela foi casada com um marido de um gênio muito difícil e que provou muito o temperamento dela. Ela era uma pessoa muito irritadiça e naquele contato com o marido teve que se dominar e acabou afinal de contas vencendo o gênio muito desagradável, muito duro que ela tinha. Depois disso, ela fez uma peregrinação para o Oriente, ela se santificou e voltou para Roma. Mas então aí tendo renunciado à condição régia que ela tinha e vivendo como uma espécie de freira.

Quando ela chegou ao fim da vida dela, em que a grande luta tinha sido contra o temperamento impulsivo, o mau gênio, etc. e tal, aparece uma coisa que para ela foi uma catástrofe. É que todo aquele mau gênio renasceu, e toda aquela luta parecia perdida, porque ela tinha conseguido dominar o temperamento dela, tinha conseguido reduzir aqueles ímpetos, etc., e via aquilo tudo renascer e desabotoadamente. Ela teve que retomar a luta toda de novo, venceu a luta e então morreu em paz.

Não era — comentam os hagiógrafos — que ela tivesse consentido alguma coisa ao mau gênio nem era um fenômeno de decadência dela. Mas Nossa Senhora que tinha sopitado esse mau gênio por uma graça especial, provou-a por uma última prova, fazendo uma espécie de uma coisa que tinha umas características de non-sens, de uma coisa sem sentido.

Porque é mais ou menos sem sentido uma vida que a pessoa faz, faz, faz, constrói uma obra espiritual e de repente aquela obra espiritual parece desabar. Deve-se ter confiança na Providência e, na velhice, retomar aquele trabalho espiritual.

Ela não tinha nenhuma culpa pelo que estava sucedendo e, com uma grande sujeição a Nossa Senhora e uma grande confiança em Nossa Senhora, refez todo o trabalho para apresentar a sua alma ao Criador.

Era, portanto, uma espécie de cúmulo de vencer o mau gênio. Porque a última coisa depois do mau gênio completamente vencido, era aceitar a provação que há em que Deus faça uma coisa dessas.

Exatamente aqui está um requinte da vida espiritual a respeito do qual nunca será suficiente insistir.

A Providência Divina nos pede em muitas ocasiões da vida, quer da vida interior, quer da vida de apostolado, quer da vida privada, nos pede que enfrentemos situações que parecem sem sentido, que nós caminhemos de encontro a muralhas que não têm portas, a mares que não têm fundo, a obstáculos que não têm solução, e depois, quando a gente se aprofunda naquilo, aquilo se abre, aquilo se move, e a gente continua a andar.

* O amor exige uma fé cega, em condições incompreensíveis, sobretudo na Bagarre

Isto é frequentíssimo na vida. É na vida espiritual, como na vida de apostolado e como na vida privada. E essas coisas Nossa Senhora faz para as almas que chama para as maiores finalidades, Ela faz para as almas que ama mais especialmente. Essa espécie de non-sens é exatamente uma prova de amor.

O que pede uma prova de amor? Pede uma fé cega, depois da qual vem sempre uma grande graça.

Eu digo isto para alguém ou algum que esteja nessas condições. Ou alguns. Mas eu digo também para os que não estão nessas condições, porque é preciso preparar o espírito para provas dessas quando elas vierem. A pessoa não compreende por que é que a prova vem, passa a prova toda protestando porque a prova está vindo, mas se compreendesse, se não protestasse, tornaria a prova mais breve, e no fim compreenderia o sentido que aquilo tem.

É mesmo uma constate de muitas vocações excelentes, … [inaudível]… do Catolicismo, é exatamente isso. De maneira que é preciso preparar o espírito para essa idéia e enfrentar a prova, porque Nossa Senhora é assim bem servida. É preciso enfrentar essa idéia porque em todo o Antigo Testamento e no Novo Testamento, nós encontramos homens de Deus que são provados por esta forma e são homens de Deus especialissimamente amados. De maneira que é preciso meter isso na cabeça e ir preparando reservas de energia, reservas de disposição para quando isto acontecer.

(…)

Uma das piores provas que a gente vai atravessar durante a Bagarre é a impressão de que a gente está diante de coisas que não têm sentido, de que não há mais solução, não há mais caminho para nada, e depois a gente vê que há solução, que há caminho e que tudo no final se esclarece. De maneira que é fundamental para nossa vocação ter bem na mira esta constante que Nossa Senhora põe dentro de nossa vida.

* Nosso fundador foi feito para lutar contra os inimigos da Igreja e não contra seus filhos, e sua vida foi esta, no meio de non-senses

Eu estava uma [vez] contando… me desculpem fazer uma reminiscência particular, mas afinal é tão frisante que se pode dizer porque é uma coisa que a vida inteira me causou verdadeiro horror: foi a idéia de briga entre católicos.

A única tentação que tive em minha vida de deixar o movimento católico, foi logo no comecinho das minhas atividades, quando um senhor … [inaudível]… abriu na minúscula Ação Universitária Católica daquele tempo uma cisãozinha contra mim. Eu fiquei tão desanimado… eu me lembro ainda andando de bonde pelo Viaduto do Chá para ir para uma reunião deles, numa noite garoenta, chuvosa e ruim, e eu tomando todos os ventos num bonde aberto no Viaduto do Chá, de pernas trançadas no bonde aberto e lutando contra aquela tentação de deixar tudo. E a minha idéia era esta: “Eu sou feito para lutar contra os inimigos da Igreja, eu não sou feito para lutar contra os filhos da Igreja”.

Tempos depois eu li uma vida de Santa Teresa de Jesus, gostei muito desta vida. Quando fechei o livro, eu fechei e disse o seguinte: “Está bom, isto graças a Deus é para ela. Mas eu fui suscitado para lutar contra a Revolução, contra os comunistas, eu não fui suscitado para lutar dentro da Igreja”.

Ora precisamente a minha vida inteira foi uma luta dentro de Igreja. Quer dizer, se eu tivesse podido prever isto, eu quase desmaiaria. E tive que aceitar uma coisa que durante muito tempo me pareceu um perfeito non-sens.

Quantos outros non-sens dentro de minha vida eu poderia apontar. Pilhas de non-sens, de coisas que não têm sentido simplesmente, mas que a gente vai enfrentando, vai se adaptando, vai se fazendo pequeno, vai se obedecendo à vontade de Nossa Senhora que fala pela voz dos acontecimentos e depois a gente vai compreendendo que devia ser assim, que foi bom que tivesse sido assim, etc.

* Calma, segurança e certeza de que tudo se resolve

De maneira que eu recomendaria muito aos senhores que, meditando isto e sabendo que os senhores devem mais ou menos trilhar as veredas que eu tive que trilhar, os senhores se preparassem para isto também. É uma forma de ato de humildade. É nós compreendermos que nós devemos nos colocar diante de Nossa Senhora como escravos chineses, feitos para obedecer sem discutir. Ela é que manda, Ela é que dispõe, e que, portanto, Ela tem o direito de nos fazer passar pelas evoluções que Ela entender, para afinal de contas chegarmos aos resultados que Ela quiser. Porque obediência é isto, confiança é isto e amor é isto.

De maneira que peçamos a Santa Brígida para vincar bem essa idéia em nosso espírito: calma, segurança e certeza de que tudo se resolve e tudo se explica, mesmo nos momentos em que tudo parece insolúvel e inexplicável. É uma constante de nossa vocação.

Vamos rezar.

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